quinta-feira, 12 de abril de 2012


Dez anos após o golpe de abril, Chávez fracassa em sua “via pacífica” ao “Socialismo do Século XXI”

Entre os dias 11 e 12 de abril de 2002, a Venezuela foi palco de um golpe de Estado orquestrado pelos EUA, que apontava para a instauração de uma brutal ditadura cívico-militar a la Fujimori. O golpe fracassou, mas demonstrou a disposição do então governo Bush de apostar em aventuras golpistas para aumentar seu controle econômico, político e militar sobre suas semicolônias. A recondução de Chávez ao poder, tutelado pelas FFAA e sob uma nova correlação de forças com a oposição burguesa, como demonstram as concessões políticas que fez posteriormente à direita golpista, apontaram para as massas venezuelanas a falência do projeto da “revolução bolivariana” e a necessidade de forjar um caminho proletário e revolucionário independente das frações burguesas em conflito, pois a “trégua” pactuada por Chávez com o imperialismo se baseou em um ataque ainda maior às condições de vida da população trabalhadora, como vemos hoje, dez anos após o golpe de abril.

Incrivelmente, quase todas as explicações para o fracasso do golpe de estado apontam que o erro dos golpistas foi ter “rompido com as instituições democráticas”, algo que não seria mais admissível nos tempos atuais, etc., o que não passa de uma balela democratizante para consumo da “opinião pública”. Os próprios EUA trataram de espalhar a versão de que torciam pela derrubada de Chávez, “mas apenas por vias democráticas”. Na verdade, a recondução de Chávez à presidência da Venezuela se deveu à sequência de atropelos cometidos pelo efêmero governo golpista encabeçado pelo presidente do sindicato patronal Federação de Câmaras, Pedro Carmona, em composição com a cúpula militar venezuelana, apoiados pelo imperialismo ianque. Decisivo para o fracasso, não foram o fechamento da Assembleia Nacional, a dissolução da Suprema Corte Venezuelana, e muito menos o alijamento da Central dos Trabalhadores Venezuelanos do governo, como destacam a mídia burguesa. Apesar destas medidas contribuírem para o isolamento da cúpula dos golpistas, é exatamente com elas que se iniciam quase todos os golpes. O problema residiu na fragilidade econômica do Estado venezuelano para suportar o aumento do parasitismo imperialista.

A base material da torpeza do golpe foi o excesso de medidas entreguistas tomadas em favor dos interesses do imperialismo, mas que ao mesmo tempo atentavam contra a existência do próprio Estado já bastante debilitado financeiramente, provocando a vacilação e retrocesso no golpe por parte da casta militar diretamente vinculada ao caixa do Estado. A principal estupidez cometida pelo novo governo foi o afastamento da Venezuela da OPEP, rompendo com sua política de preços e de cotas de produção, o que fez despencar o preço do produto no mercado mundial. Pois o “governo” Carmona cometeu este ato de loucura que precipitou seu fim. O benefício imediato dos EUA não pagava o risco de matar a galinha dos ovos de ouro, o Estado venezuelano. E sem ele, quem patrocinaria as FFAA venezuelanas? Estas medidas provocariam uma desvalorização absurda do petróleo exportado pelo país, e levariam a bancarrota financeira do Estado venezuelano em curtíssimo prazo. Os resultados desta abrupta desvalorização se alastrariam por todo o mercado mundial e poderia abalar profundamente ao conjunto dos países fornecedores de hidrocarbonetos. Por sua vez, a eliminação dos poderes do legislativo, da Constituição e do judiciário pelo governo provisório, instaurando um governo ultradireitista, assustou as burguesias latino-americanas, criando um grave precedente golpista, apontado contra elas mesmas, fato que contribuiu para a reprovação diplomática de quase todos os governos do continente, a exceção dos próprios EUA e da Colômbia. O golpe foi uma patetada da cúpula militar venezuelana, conduzida por um setor ultraentreguista das FFAA e pelo empresariado ligado à petroleira Venoco e à Fedecámaras, que se deram conta do “ato de loucura” que estavam praticando só depois de tê-lo iniciado.

O fenômeno do chavismo nasceu como uma alternativa política burguesa para o esgotamento de exploração imperialista baseada exclusivamente no modelo monoprodutivo petroleiro e para o esgotamento do regime das oligarquias, o bipartidarismo (revezamento no poder dos partidos AD e COPEI) que governou o país durante mais de três décadas. Desde o levante popular do Caracazo em 1989, nenhum governo conseguiu reestabilizar a democracia venezuelana e com a eleição de Chávez, dez anos depois a burguesia pretendia canalizar o descontentamento popular para o terreno da institucionalidade. O chavismo surgiu prometendo eliminar a corrupção, desenvolver outros ramos industriais e salvar o Estado da bancarrota, aumentando a arrecadação de impostos sob a exploração local e os preços do produto em nível internacional, mas fracassou em todos os terrenos. O alto custo do parasitismo das oligarquias capitalistas locais e estrangeiras impede qualquer alívio nos cofres estatais mesmo quando sobe o preço do barril. A incapacidade do chavismo ou de qualquer setor da burguesia nacional de resolver minimamente as tarefas democrático-burguesas de desenvolvimento nacional pendentes, dada a dependência pusilânime que lhes mantêm atados ao imperialismo, colocou o governo Chávez num impasse e, ao invés de diminuir a dependência do país em relação ao petróleo, Chávez aprofundou o caráter petrolífero da economia. Trata-se de mais uma demonstração inequívoca de que não há saída progressista para a exploração e opressão nacionais fora do caminho da revolução proletária.

Se o golpe de 2002 fracassou pela falta de respaldo de setores do imperialismo, agora com a oposição tendo ampliado sua base social e eleitoral, gestam-se as premissas para a Casa Branca impor uma alternativa ao “Socialismo do Século XXI” pela chamada via democrática em 2012, porém sempre ancorada na chantagem das FFAA retirarem seu apoio vital ao chavismo, na medida em que cresce seu desgaste, produto da recessão econômica. O “Socialismo do Século XXI” vive um processo de profundo desgaste porque não passa de uma alternativa burguesa nacionalista com um corte demagógico socialista. Como não avança em nenhuma medida que de fato ataque a burguesia enquanto classe, não expropria os meios de produção e se nega a atender as demandas populares mais elementares, o chavismo acaba se desmoralizando junto aos trabalhadores e abrindo caminho para a volta da direita pela própria via eleitoral e parlamentar. Essa dinâmica política em favor do fortalecimento da direita pró-imperialista é um movimento quase inevitável da burguesia em países como Venezuela e Equador. Embora os governos da centro-esquerda ainda detenham o apoio popular majoritário vão perdendo paulatinamente sua base social para a oposição de direita que, pelo profundo desgaste destas gestões, se lançam como uma alternativa eleitoral viável para os capitalistas e, via de regra, usam as FFAA para chantageá-los.

A alta cúpula das FFAA, principal pilar de sustentação política do regime, que dará a palavra final da transição em comum acordo com Washington, buscará se apropriar do espólio político de um Chávez debilitado por seu estado de saúde, para comandar com mais legitimidade este processo. O certo é que todas essas frações, com interesses particulares dentro do aparato estatal, com ou sem Chávez, desejam manter o regime de exploração capitalista, seja com cores “nacionalistas” ou entreguistas. Por fim, Chávez sabe que a direita golpista está ávida para desferir um golpe letal contra seu governo. Esta manobra pode assumir a feição de uma falsa “mobilização democrática” tramada com a ajuda da CIA diante do agravamento de sua doença, com reivindicações, por exemplo, que se afaste da presidência ou abra mão de sua candidatura. O apoio do imperialismo aos ex-rebeldes na Líbia “vendidos” ao mundo como “amantes da democracia” é o modus operandi que a Casa Branca pretende usar na Venezuela para colocar em marcha a contrarrevolução.

Para os trabalhadores venezuelanos e latino-americanos, que acompanham apreensivos o debilitamento do quadro de saúde de Chávez e buscam intervir de forma independente no desenrolar dos acontecimentos, deve-se abstrair a lição de que é preciso, desde já, preparar uma alternativa política dos explorados tanto ao chavismo decadente como à direita reacionária. É necessário preparar o terreno para a construção de um genuíno partido revolucionário capaz de enfrentar a onda de reação “democrática” ou mesmo a direita fascista no caso de um novo golpe “cívico-militar”, fazendo um combate programático completamente oposto à cantilena pregada por toda sorte de revisionistas de que está em curso uma “revolução” na Venezuela, cabendo agora mais do que nunca segundo estes senhores, com a doença do “comandante”, cerrar fileiras em apoio eleitoral ao governo burguês centro-esquerdista de Chávez e sua corte.