terça-feira, 17 de setembro de 2013


Morre Gushiken: Um militante trotsquista que passou a ser “capo” formulador da política reformista da Articulação

A história política de Luiz Gushiken em muito se assemelha aos “melhores” quadros da antiga OSI, que acabaram abandonando a organização e o próprio Trotsquismo para ingressarem em outros “projetos” que poderiam render bem mais dividendos políticos e materiais. Falecido na última sexta-feira, 13 de setembro, aos 63 anos o ex-ministro da SECOM do governo Lula, em decorrência de um câncer generalizado, doença que vinha lhe consumindo desde 2002. Sua trajetória foi marcada pela militância política de esquerda que se iniciou já no final da década de 70. O “China”, como era conhecido no movimento estudantil, aderiu ao Trotsquismo durante sua militância na USP, sendo um dos dirigentes da tendência “Libelu” (Liberdade e Luta), corrente juvenil impulsionada pela Organização Socialista Internacionalista (OSI), ligada a Pierre Lambert (OCI francesa). A “Libelu” chegou a obter uma significativa influência no final dos anos 70, já que foi a primeira tendência política no movimento de massas a defender a palavra de ordem “Abaixo a Ditadura!” de forma pública e aberta. Como bancário do extinto Banespa participou ativamente das greves contra a ditadura militar, sendo inclusive preso por defender que os trabalhadores deveriam participar dos sindicatos “oficiais” e não desprezá-los como simples “escola do peleguismo”. Por conta da defesa desta orientação, Gushiken rompeu com a OSI (atual corrente “O Trabalho”) que postulava a política sectária e antitrotsquista de “sindicatos livres”, conquistando posteriormente o Sindicato dos Bancários de São Paulo. Logo após sua saída da OSI Gushiken e sua irmã mais nova tiveram um rápido flerte com a Causa Operária (atual PCO), mas rapidamente abandonaram o grupo por considerá-lo pequeno e vazio de quadros, pensamento próprio dos burocratas sindicais. Gushiken chegou a ser um dos fundadores da CUT na condição de presidente do sindicato dos bancários, aproximando-se pessoalmente de Lula (junto com toda uma leva de quadros oriundos de OT), na formação da “Articulação dos 113”, que agrupava o chamado “novo sindicalismo”. Em paralelo, Gushiken se dedicou à fundação do PT e foi eleito deputado federal por três mandatos consecutivos. Na condição de exímio estrategista e brilhante quadro político, foi o coordenador das campanhas eleitorais de Lula em 1989 e 1998. Como ministro de Lula e “conselheiro” da frente popular no Planalto foi até pouco antes de morrer um “capo” formulador da política reformista da Articulação e escapou da acusação de ser um dos petistas que integravam o esquema do “mensalão” na farsa jurídica montada pelo STF.

A ruptura de Gushiken com a OSI no final dos anos 70 foi produto do zigue-zague político da corrente lambertista que vinha de uma posição correta nas eleições de 78, convocando a construção de um partido operário independente ao mesmo tempo em que lançava a campanha do voto nulo nas eleições parlamentares e a denúncia do Colégio Eleitoral que “elegeu” presidente o general Figueiredo. Desgraçadamente, OT dava seus primeiros grandes sinais de degeneração, primeiro desmascarando o PT como mais um partido da transição golberyana para depois capitular vergonhosamente ao lulismo, identificando este fenômeno político como sendo a “materialização possível” de sua palavra de ordem em defesa de um partido operário independente. São aproximadamente mais de 30 anos de entrismo no PT, partido que serviu de manjedoura para acolher todos os quadros oportunistas formados na OSI, como o próprio Gushiken, Palocci, Clara Ant, Arlete Sampaio, Luiz Favre... Concomitante ao apoio da OCI ao governo de Mitterrand na França, a OSI, a segunda maior seção lambertista, realiza um giro de 360º e a “Libelu” substitui uma oposição sectária à formação do PT até então tido como uma “articulação burguesa” montada pelos militares por um adesismo sem princípios, desembocando grande parte de sua influência na corrente de Lula, a “Articulação”, que seria agora uma “direção classista de um partido operário independente”. Gushiken, a exemplo da maioria dos dirigentes da OSI, após um breve período de vacilação, integra-se a direção do PT e passa a ser um quadro formulador político-ideológico da “Articulação”, já com o viés do “novo sindicalismo” absorvido com a experiência das greves bancárias (quando teve a oportunidade de conhecer Lula), durante as quais o Sindicato dos bancários de São Paulo contribuía financeiramente para apoiar e sustentar os enfrentamentos dos metalúrgicos do ABC com os patrões e a repressão da ditadura militar. Neste período adquiriu grande prestígio nas hostes do lulismo que emergia no final da década de 70, ascendendo na hierarquia política da burocracia sindical-partidária. Quando a frente popular assumiu o governo federal, o “China” na condição de ministro de Lula na Secretaria de Comunicação (SECOM) se dedicou a negócios para parasitar o Estado burguês e as negociadas em torno dos poderosos fundos de pensão.

Gushiken, após romper com o Trotsquismo transformou-se inapelavelmente no “capo” formulador do reformismo da ala majoritária petista. Colocou-se a serviço até mesmo do governo FHC, na condição de artífice de profundos e vastos estudos acerca da privatização da previdência social e os fundos de pensão, com o objetivo de colocá-los nas mãos do capital financeiro. Tarefa a qual se dedicou com tamanho afinco e estresse que sofreu um infarto em 2001, trabalho que logo em seguida seria aplicado no governo Lula quando assumiu a presidência em 2003. Aliás, Gushiken foi um dos idealizadores da “Carta ao Povo Brasileiro” em 2002, na qual daria garantias políticas aos grandes capitalistas que um futuro governo Lula não iria se conflitar com os banqueiros, o latifúndio e/ou as multinacionais e que, portanto, os grandes capitalistas poderiam ficar tranquilos quanto a isto, contando inclusive com o aval da Rede Globo. Mesmo doente foi convocado por Lula em seu primeiro mandato para assumir a pasta de ministro-chefe SECOM, constituindo o denominado “núcleo duro” do PT ao lado de José Dirceu e Antônio Palocci. Tinha a incumbência de desenvolver projetos estratégicos de médio e longo prazos para o país voltados para beneficiar o capital financeiro entre outras várias atribuições políticas de contenção e engessamento do movimento operário. Pode-se dizer que era o ministro mais próximo de Lula. Em 2005, na crise política aberta com o “mensalão”, foi acusado de liberar antecipações de recursos do Banco do Brasil a fim de alimentar a extensa teia de corrupção no governo e de manipular os chamados fundos de pensão em benefício da Articulação, agora conhecida como “Campo Majorítário”. Para “livrar a cara” de Lula e da frente popular, Gushiken é “rebaixado” e posteriormente afastado do governo, mas dada a sua importância dirigente estrategista continuava ativo como “conselheiro” exógeno. Por sua proximidade com o ex-presidente Lula, foi implicado no atual circo midiático e na farsa jurídica do chamado “mensalão”, porém conseguiu ser absolvido por “falta de provas” já no ano passado no julgamento do STF.

A forma repugnante como os “grandes” quadros dirigentes do revisionismo, como Gushiken, se converteram em agentes e gestores do capital comprova mais do que nunca que se não há uma força programática do partido revolucionário, os elementos mais capazes do movimento operário são cooptados pelo Estado burguês utilizando para interesses alheios aos da classe operária a sólida experiência adquirida nos trâmites sindicais e na militância partidária, estes atributos fatalmente acabam sendo aplicados e usados a serviço da burguesia e da ordem capitalista. Gushiken, antes de seu falecimento já havia enterrado, num canto esquecido de seu passado, os resquícios de sua militância de esquerda no Trotsquismo, tornando-se conscientemente um dos pilares formuladores da política burguesa-reformista da “Articulação”. Esta é mais uma ácida lição que os revolucionários devem abstrair para que se possa travar um combate programático intransigente perante as novas gerações contra as tendências liquidacionistas do Trotsquismo diante da ofensiva contrarrevolucionária que marca a luta de classes em nível nacional e internacional. A morte de Gushiken é simbolicamente o enterro de uma geração de jovens quadros que se aproximaram do Trotsquismo, mas que literalmente acabaram como porta-vozes da política reformista do PT.