quinta-feira, 13 de março de 2014


Há 50 anos do grande comício da Central do Brasil: A burguesia nacional decidiu  “sacrificar” seu próprio projeto de país  com medo da ação independente do proletariado, optando pela via sangrenta de subordinação ao imperialismo

O grande comício da Central do Brasil, realizado há exatos 50 anos, no dia 13 de março de 1964, foi o último fôlego do governo nacionalista burguês do presidente João Goulart diante das forças mais reacionárias e golpistas, apoiadas pelo imperialismo ianque, que tramavam abertamente para implantar um regime político  semifascista da ditadura militar. Jango  e os generais que lhe davam “apoio” estavam conscientes de que a realização de um grande comício das massas radicalizadas aceleraria em muito a dinâmica golpista em pleno curso. Mas, pressionado pela ala “esquerda” de seu comando trabalhista, como Brizola, Darci e Almino Afonso, resolveu bancar a iniciativa, que envolvia vários segmentos políticos, desde as ligas camponesas, passando pelo CGT dos burocratas sindicais do PTB e até o velho Partidão. O comício pelas “reformas” superou todas as expectativas, não só pelo número de participantes, mas fundamentalmente pela radicalidade de suas reivindicações, que incluíram até o armamento dos trabalhadores. Durante o comício, que reuniu cerca de 300 mil trabalhadores e estudantes, Jango assinou decretos de nacionalização das poucas refinarias de petróleo existentes no Brasil e a desapropriação terras com mais de 100 hectares ao longo das ferrovias e rodovias federais, para fins de reforma agrária. Sem o apoio dos setores decisivos da burguesia financeira e industrial, que estava cada vez mais vinculada aos interesses do imperialismo, Jango prometeu implantar o projeto nacional reformista das chamadas “Reformas de Base”, em defesa das quais vinham crescendo as mobilizações de operários, camponeses e estudantes em todo o país. As “reformas” pretendidas inicialmente  pelo PTB “Janguista” nem de longe ameaçavam a ordem capitalista vigente, ao contrário eram parte de um projeto maior “desenvolvimentista” da burguesia nacional que buscava a ampliação de um mercado interno de consumo e a redução da dependência financeira e industrial do país em relação a economia norte-americana. Mas a alta cúpula militar não pensava exatamente desta maneira, apesar de uma ala de generais como Castelo Branco e os irmãos Geisel concordarem com a ideia de superar o atraso nacional pela via da industrialização do país. Este era o ponto de “acordo” entre Jango e seus  assessores militares mais próximos, que logo depois vieram a protagonizar o golpe fascista contra seu “comandante em chefe”, mas um “pequena” diferença política os separavam, era justamente o papel a ser jogado pelas massas proletárias e camponesas da nação. Para a “inteligência nacionalista militar” o proletariado urbano e rural deveria ficar completamente a margem de qualquer projeto “desenvolvimentista”, além de considerarem “sagrados” os vínculos comerciais do Brasil com os EUA. Na ausência do consenso com seu gabinete militar, Jango resolve tocar em frente o comício da "Central"  o que provocou a unificação “automática” dos oficiais supostamente “leais” a legalidade do governo (Castelo e Amaury Kruel) com os facínoras  golpistas do quilate de um Costa e Silva. Naquela histórica noite, onde milhares de trabalhadores afluíram ao chamado do governo, na expectativa  de uma brusca guinada à esquerda de Jango, um comando militar terrorista, comandado pelo coronel Murici, planejava um atentado a vida do presidente para precipitar o golpe naquele mesmo dia, foram contidos no local pelo general Orlando que lhes “pediu” mais duas semanas para “finalizar” a deposição  de  forma mais organizada. No palanque da “Central”  suando muito ao lado de sua bela mulher, Maria Thereza, Jango parecia já pressentir o seu fim, mas não se acovardou e desferiu seu “petardo trabalhista e nacionalista”: “Aqui estão os meus amigos trabalhadores, vencendo uma campanha de terror ideológico e sabotagem, cuidadosamente organizada para impedir ou perturbar a realização deste memorável encontro entre o povo e o seu presidente, na presença das mais significativas organizações operárias e lideranças populares deste país... A democracia que eles querem é a democracia para liquidar com a Petrobras; é a democracia dos monopólios privados, nacionais e internacionais, é a democracia que luta contra os governos populares e que levou Getúlio Vargas ao supremo sacrifício” (Trecho do discurso de Jango na Central do Brasil).

As “Reformas de Base” eram apresentadas como uma solução para a crise gerada pelo atraso nacional. Visando a ampliação do mercado interno, medidas como a desapropriação dos latifúndios improdutivos e a distribuição de terras às massas camponesas tinham como objetivo, além de fomentar o crescimento do número de trabalhadores com poder de compra, estendendo os direitos trabalhistas às massas assalariadas agrícolas, aumentar a produção de gêneros alimentícios a baixo custo para ampliar o mercado consumidor de produtos da indústria nacional. Para aumentar o poder aquisitivo dos trabalhadores urbanos, além do salário mínimo, repouso remunerado, férias e 13º salário, o governo prometia uma nova política habitacional que estimularia a redução dos custos dos aluguéis. O projeto das Reformas de Base buscava também a ampliar o mercado externo por meio da ampliação das relações comerciais com os Estados operários, como China e a URSS. Para conter a sangria de recursos financeiros, propunha a limitações às remessas de lucro das empresas estrangeiras para o exterior.

Mas, em si, as “Reformas de Base” estavam longe de representar uma ameaça ao capitalismo. O ascenso do movimento operário e popular, cujas mobilizações, impulsionadas pela luta em defesa das reformas de base, vinham crescendo rapidamente desde o início da década de 1960, era o que realmente constituía o centro das preocupações da burguesia e do imperialismo ianque. As grandiosas manifestações de massas em defesa das reformas eram utilizadas por João Goulart muito mais para chantagear os setores reacionários da burguesia e o imperialismo, exigindo que estes fizessem a opção entre o projeto burguês nacionalista das reformas ou a revolução social e o comunismo. A essa chantagem, os setores conservadores da burguesia nacional, com o apoio da igreja católica e do imperialismo ianque, responderam com a reacionária Marcha da Família com Deus pela Liberdade ( que os neonazistas pretendem reeditar agora) e com golpe contrarrevolucionário de 1º de abril de 1964, como uma ação preventiva diante do crescimento do movimento de massas operárias e camponesas, que se manifestava em inúmeras greves e embriões de de duplo poder, como as Ligas Camponesas no Nordeste.

Na verdade, as "reformas de base" nunca sairiam do "papel", ou seja do plano das intenções nacionalistas da impotente burguesia brasileira.  Historicamente, estas reformas capitalistas constituem tarefas de uma revolução democrático-burguesa e, portanto, já não podem ser mais realizadas pela burguesia, que se tornou uma classe reacionária na atual etapa de hegemonia do capital financeiro. Na fase histórica do capitalismo monopolista em sua égide  imperialista, essas tarefas só podem ser realizadas por um poder revolucionário, como parte da revolução proletária e da construção do socialismo. O governo Goulart e dos setores nacionalistas da burguesia eram politicamente incapazes de levar adiante o seu próprio projeto reformista, o que ficou confirmado quando o governo não organizou qualquer resistência contra os golpistas, ao contrário demoveu toda a resistência militar ao golpe, deixando isolados todos que pretendiam organizar a luta armada.  Por sua vez, os stalinistas do PCB, que tinham o controle de parte di movimento operário, não desejavam a revolução socialista e a Ditadura do Proletariado, "preferindo" fazer das reformas nacionalistas do governo Jango e da política de colaboração de classes, os fundamentos de seu programa, preparando assim o caminho para a derrota sangrenta do proletariado.

Frente às “Reformas de Base” do governo nacional populista de João Goulart, as chamadas políticas de “inclusão social” dos governos da frente popular (Lula/Dilma) parecem uma "brincadeira inofensiva",  perfeitamente palatáveis e até elogiadas pela burguesia conservadora e o imperialismo. Mas, a enorme distância entre populismo do governo Jango e o atual governo da frente popular, apenas revela o profundo retrocesso ideológico e político do movimento operário nesses 50 anos. Porém, diante do acirramento da luta de classes, os governos burgueses sempre utilizaram as chamadas reformas estruturais ou de base como instrumento para enganar as massas trabalhadoras e preparar o caminho da derrota do proletariado. Hoje, portanto, o papel da vanguarda classista mais consciente, que reivindica o legado do Marxismo Leninismo , continua sendo o de construir um autêntico partido operário revolucionário  para assegurar a independência política da classe operária e apontar a revolução proletária e o socialismo como único caminho da vitória do proletariado.