sábado, 26 de setembro de 2020

BOLÍVIA EM FOCO: REGIME GOLPISTA EM CRISE, RENÚNCIA DE ANEZ E LIDERANÇA DO MAS NAS PESQUISAS. FRENTE POPULAR PODERÁ VOLTAR AO GOVERNO CENTRAL NAS PRÓXIMAS ELEIÇÕES?

Quase um ano depois do golpe de Estado que depôs Evo Morales, banindo o presidente eleito do país, os dois candidatos que lideram as pesquisas são Luis Arce Catacora do MAS, que detém entre 30 e 37% das intenções de votos, e o ex-presidente Carlos Mesa, que tem entre 22 e 29%. Menos de um mês antes das eleições, nada parece resolvido e o governo golpista em crise, teve que abrir mão de sua candidatura, a da própria presidente Jeanine Áñez.

A saída repentina de Áñez se deve ao fato de estar perdendo o “apoio popular”, sendo que as últimas pesquisas deram a golpista cerca de 10% dos votos. Para não dividir o setor de direita, acabou renunciando com um discurso conciliador que poucos acreditaram. Seu governo foi marcado por uma grave crise econômica, potencializado com pandemia, surgiram casos de corrupção na compra de suprimentos médicos, além de inúmeras denúncias de violação de direitos humanos após os massacres perpetrados pelos militares em Sacaba e Senkata. Nada disso é surpreendente dado o caráter reacionário e neoliberal do governo Áñez que se impôs desde os primeiros dias, reprimindo as amplas massas, e reorientando a economia boliviana para os interesses  do capital financeiro internacional.

A legislação estabelece que se no primeiro turno se um candidato obtiver mais de 40% e alcançar uma diferença de dez pontos percentuais em relação ao segundo, ele será o vencedor. A pergunta que se coloca no atual cenário é se o MAS tem condições de vencer já no primeiro turno? Isso preocupa não apenas a direita reacionária, mas também alimenta as ilusões dos próprios apoiadores de Morales, que veem esperança de voltar aos anos em que o MAS governava. Ir para o segundo turno complicaria as esperanças de assumir o governo: todos os demais candidatos são atraídos para um campo conservador direitista que acabará apoiando o ex-presidente Carlos Mesa.

Arce foi ex-ministro da Economia do governo Morales, com um relativo saldo positivo na economia(venda de commodities para Europa)que o ajudou agora a manter um considerável peso eleitoral e dissipou a ideia de que o MAS não teria candidatos competitivos depois de Evo. O que Arce conseguiu como Ministro do governo do MAS, foi aproveitar a conjuntura econômica internacional favorável aos minérios bolivianos, para manter uma certa estabilidade  econômica no país.

Isso explica em parte como Áñez estava perdendo apoio para Arce, pois não conseguia conter a crise econômica minimamente. 

A Bolívia concentrou contradições desde a sua fundação, sobre a qual o governo de Frente Popular de Evo tentou colocar mediações, mas, sem tocar nas próprias bases sociais do capitalismo, não conseguiu nem nunca teve um projeto socialista. No ano passado (golpe) ficou claro que o racismo não foi erradicado, como ficou demonstrado pelas manifestações reacionárias contra o governo Morales. O MAS acabou traindo vergonhosamente a luta contra o golpe, deixando os movimentos camponeses e cocaleiros desarticulados e desarmados no confronto com a extrema direita. 

Um ponto extremamente importante para os desdobramentos da conjuntura latino-americana, é se o regime golpista, apoiado pelos EUA, permitirá que o MAS governe novamente. Seria algo raramente visto na história, que um governo golpista ceda o poder pacificamente para as forças que derrubou (mesmo  deixando Evo Morales fora da disputa). A situação política na Bolívia é bastante tensa, e tudo caminha na direção de um novo golpe, desta vez na forma de um estelionato eleitoral, e com a provável passividade do reformista MAS.