sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

ELEIÇÕES GERAIS NO NEPAL: POLÍTICA DE COLABORAÇÃO DE CLASSES PAVIMENTA VITÓRIA DOS MAOÍSTAS QUE ENCABEÇAM GOVERNO DE PACTO COM A BURGUESIA


No final de 2017 uma coligação de partidos maoístas encabeçada pelos Partido Comunista Unificado do Nepal (PCN – UML) e o Partido Comunista (CPN), venceu as eleições gerais e indicou o primeiro-ministro, seu principal dirigente público, K.P. Sharma Oli. Segundo artigo publicado no site do PCB “Os comunistas venceram as eleições parlamentares e provinciais no Nepal. No Parlamento, a aliança comunista terá uma maioria de quase dois terços. O governo eleito terá cinco anos de mandato e, com essa maioria parlamentar, poderá reformar a Constituição de 2015 e aplicar seu programa político”. A vitória dessa “coligação maoísta” foi possível devido sua política de colaboração de classes, que vem de décadas, como já denunciava o artigo reproduzimos abaixo, elaborado em 2007, há dez anos atrás, mas que mantém toda sua atualidade, quando polezimamos com a Liga Operária (A Nova Democracia). Tanto que o texto divulgado pelo PCB, longe de apontar o caminho da ruptura revolucionária, afirma escandalosamente que “A aposta é que um governo estável atrairá investimentos e turistas ao Nepal e que os recursos possam ser utilizados no desenvolvimento da agricultura orgânica e na energia limpa (incluindo-se a energia hidroelétrica), o que aliviará o custo da importação de energia... É uma política que aponta para a conversão da agenda comunista em agenda nacional, e que vai pressionar as classes dominantes e castas superiores a não bloquear a política de desenvolvimento social. Trata-se claramente de um projeto nacional-desenvolvimentista, dentro de um processo de longa transição para o socialismo, tendo em vista as profundas contradições da sociedade nepalesa” (Comunistas vencem as eleições gerais no Nepal, 05.01). Ao contrário dos Maoístas, apontamos que as mais elementares tarefas democráticas pendentes (unidade nacional, abolição do latifúndio, liquidação do sistema monárquico) não podem vir pelas mãos de uma aliança dos comunistas com a autodenominada “burguesia progressista” e sim pela revolução proletária em ruptura com a ordem burguesa.

FRENTE POPULAR NO NEPAL: MAOÍSTAS INTEGRAM GOVERNO BURGUÊS DE UNIDADE NACIONAL

(HOME PAGE DA LBI 16/04/2007)

No final de março, o Partido Comunista do Nepal - Maoísta (PCN - M), que encabeçou nos últimos dez anos a luta armada no país, através do Exército Popular de Libertação (EPL), conquistando grande parte do território nacional, concluiu um acordo com setores da oposição burguesa, denominada Aliança dos Sete Partidos (ASP) e os partidos que apóiam a reacionária monarquia do Rei Gayanendra, sustentada pelos EUA, Inglaterra e Índia. O PCN-M passa a integrar um governo de unidade nacional interino até a convocação das eleições, previstas para 20 de junho, para uma assembléia nacional constituinte, que deverá pronunciar-se sobre o futuro da monarquia como forma de regime político no Nepal.

O acordo foi selado pelo líder maoísta Pushpa Kamal Dahal, conhecido como Comandante Prachanda e o tradicional político monarquista do país, membro do partido Congresso Nepalense, Girija Prasad Koirala, três vezes primeiro-ministro. As negociações foram abertas após abril de 2006, quando uma greve geral de 18 dias colocou abaixo o estado de sítio proclamado pelo rei, com o objetivo de liquidar a guerrilha maoísta.

O PCN-M terá cinco ministérios em um gabinete provisório comandado por Koirala. Pelo acordo o PCN-M irá iniciar o processo de dissolução de sua guerrilha de 15 mil homens, entregando suas armas, que ficarão sob “vigilância!” de inspetores da ONU, em 14 depósitos localizados em quartéis de Katmandu, capital do país controlada pelo exército real.

POR QUE OS MAOÍSTAS TRAEM A LUTA PELO SOCIALISMO?

A resposta a esta questão reside na própria estratégia política do maoísmo, herdada do “arsenal” da velha teoria stalinista da revolução por etapas, ou seja, primeiro estabelecer uma unidade com a “burguesia nacional” em nome da “revolução democrática” e depois, muito mais tarde, com o amadurecimento do capitalismo nativo, impulsionar a revolução socialista. A “diferença” entre a teoria clássica estalinista e o maoísmo consiste que este acredita que esta “transição” por etapas deve ser sustentada por uma organização armada que rejeite a via das eleições, como se a tática militar fosse o antídoto para evitar o velho reformismo estalinista.

Os dirigentes do PCN-M estão convencidos de que, depois de anos de luta armada para forçar a queda da monarquia, estão dadas as condições da primeira etapa da revolução e que, para isso, precisam colaborar na construção de um estado capitalista moderno no Nepal.

Pela “cartilha” estalinista, complementada pelas teses de Mao Tse Tung que agrega a necessidade da luta de guerrilha popular do campo para a cidade como elemento de pressão sobre os setores reacionários da burguesia, os maoístas fizeram do combate contra a monarquia e não contra o capitalismo e o conjunto do regime político, o eixo principal de sua estratégia, arrastando as massas para esse caminho da colaboração de classes.

Um artigo publicado no Boletim 52 (agosto de 2006) do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos (Cebraspo), impulsionado pela Liga Operária no Brasil, faz um histórico do surgimento dos maoístas do Nepal e reafirma essa plataforma nacionalista-burguesa: “Uma fração de comunistas aplicando a teoria da luta de duas linhas criticou duramente o desvio revisionista do Partido e organizou-se, em 1995, para reestruturar o Partido. Daí surgiu o Partido Comunista do Nepal-Maoísta (PCN-M) que se declarou por um Estado laico, pela abolição da monarquia, por uma nova Assembléia Constituinte e que, no ano seguinte, convocou o povo para a Guerra Popular... No começo não havia mais que 70 militantes integrados no Partido, mas logo já estavam organizados em diversos bolsões de esquerda, com o objetivo de derrubar a monarquia adotando a tática de Mao TseTung de “cercar as cidades a partir do campo”?

Os experimentados dirigentes do PCN-M, presos a essa orientação desastrosa, parecem não entender que para o imperialismo o rei é só uma figura decorativa. A Casa Branca tentará mantê-lo na medida que seja possível, mas podem descartá-lo a qualquer momento que necessitar, com o objetivo de deter o curso revolucionário da luta dos trabalhadores, aceitando inclusive a instauração de uma república burguesa.

Justamente por essa política suicida, os maoístas apóiam o acordo nas condições ditadas por Koirala, que os prometeu que a assembléia constituinte discutirá a questão da monarquia como sua prioridade número um, mantendo intacta a própria estrutura da economia capitalista no Nepal.

Por essa razão Prachanda declarou que a meta do PCN-M no governo é assegurar eleições para assembléia constituinte “limpas, livres e sem um ambiente de medo” (www.nepalnews.com, 31/03), se comprometendo a não impulsionar greves e lutas que “causam inconvenientes ao público geral” (idem).

O resultado final dessa aliança é a conformação de um governo de frente popular, um gabinete de unidade nacional, onde os maoístas garantem a base social do governo e os partidos burgueses controlam os ministérios chaves, pavimentando o caminho para a contra-revolução, seja pela via “democrática” ou fascista.

O SIGNIFICADO CONTRA-REVOLUCIONÁRIO DA “REPÚBLICA DEMOCRÁTICA” NO NEPAL

Em entrevista ao jornal Nepal News, em 28/09/06, o membro do birô político do PCN-M, Baburam Bhattarai, revelou o conteúdo de classe burguês da reivindicação dos maoístas pela assembléia constituinte e a instauração de uma república “democrática”.

Questionado sobre a possibilidade da ruptura dos acordos com a ASP, o dirigente maoísta foi categórico: “Isso seria um desastre para o país e para o povo. Não vamos pensar que isso vai acontecer (...) Sabemos que várias forças estão tentando sabotar os acordos, mas a unidade entre os sete partidos, o PCN-Maoísta e a sociedade civil deve ser mantida até a realização de eleições livres e justas para a assembléia constituinte (...) Se a unidade entre os sete partidos, o nosso e a sociedade civil for reforçada, podemos derrotar a monarquia e assegurar o estabelecimento de uma república democrática e a paz no país”. Levando essa posição às últimas conseqüências, o PCN-M defende a instauração de uma república democrático-burguesa para conter a luta das massas no marco da paz entre as classes sociais, da mesma forma como defendia o stalinismo e a oposição burguesa republicana na Espanha na década de 30, responsável pela ascensão do franquismo.

Baburam Bhattarai, quando perguntado se seus militantes voltariam à guerrilha no campo, caso os resultados das eleições da assembléia constituinte não fossem favoráveis ao PCN-M, revelou uma orientação ainda mais escandalosa, completamente adaptada ao regime, seja ele monárquico ou republicano: “De maneira nenhuma. Não voltaremos à selva. Em primeiro lugar pensamos que o povo do Nepal irá apoiar o nosso programa nas eleições para a assembléia constituinte, caso essas eleições forem justas e limpas. De qualquer maneira, assumimos o compromisso de aceitar os resultados das eleições, mesmo que não correspondam à nossa expectativa. Se assim for, continuaremos um combate pacífico até alcançar a mudança progressista que preconizamos”.

Por fim, interrogado se os quadros de seu partido “não se importam de operar numa economia de mercado”, Bhattarai respondeu como um típico político nacionalista-burguês “Somos contra uma economia baseada nas forças cegas do mercado. Não há economia de mercado pura em nenhuma parte do mundo. Por interesse nacional, todos os países colocam limites ao mercado (...) Um país pobre como o nosso não pode enveredar por uma absoluta economia de mercado”.

Não por acaso, os maoístas do Nepal são saudados tão entusiasticamente pela Liga Operária do Brasil. Essa corrente maoísta (um racha do arqui-reformista MR8 em meados de 90), igualmente a seus congêneres asiáticos, deliberou no seu III Congresso, realizado em novembro de 2005, que defende o “estabelecimento da República Popular do Brasil”, comprometendo-se a “respeitar e assegurar a propriedade da burguesia nacional (média burguesia), na cidade e no campo” (sítio www.ligaoperaria.org.br).

POR UMA REPÚBLICA OPERÁRIA E SOCIALISTA NO NEPAL

A tarefa de enterrar a monarquia está nas mãos dos trabalhadores e camponeses como 
parte de uma plataforma diretamente ligada à luta direta pela instauração da ditadura do proletariado.  As mais elementares tarefas democráticas pendentes (unidade nacional, abolição do latifúndio, liquidação do sistema monárquico) não podem vir pelas mãos de uma aliança dos comunistas com a autodenominada “burguesia progressista”. Esta, assim como sua ala mais reacionária e monárquica, está umbilicalmente ligada ao imperialismo, que subjugará o país sob a forma de uma república burguesa.

Os explorados nepalenses devem superar os limites políticos impostos por suas direções maoístas, construir um partido operário revolucionário para travar uma luta aberta contra o conjunto da classe dominante, pela sua expropriação, para impor, pela via da revolução proletária, uma república soviética, baseada em conselhos de operários e camponeses pobres.