Exposições pelo mundo e comemorações na África do Sul rendem
homenagem aos 100 anos de nascimento de Nelson Mandela, o líder negro que
personificou a luta contra o apartheid durante décadas, ficando preso por 27
anos. Saiu da prisão em um acordo com a classe dominante e depois acabou
assumindo a presidência do país em 1994 como fruto de uma transição pactuada
com a burguesia branca e racista, sustentando assim um regime que mantém
vigente as brutais desigualdades sociais no país, como vimos nos massacres recentes
de mineiros negros pela polícia do governo do CNA a mando de multinacionais
britânicas. Não por acaso, as correntes frentepopulistas em nível mundial, como
o PT do Brasil a FSLN da Nicarágua declaram que Mandela sempre foi seu exemplo
político! Nascido em 18 de julho de 1918, em uma aldeia do interior, Mandela
estudou Direito em uma das primeiras universidades de seu país, onde conheceu
Oliver Tambo. Juntos, entraram em contato com o Movimento de Libertação
Nacional da África do Sul e se integraram ao Congresso Nacional Africano (CNA).
O Partido Comunista Sul-Africano, fundado em 1921, caracterizou o então regime
como um tipo específico de colonialismo, que oprimia e explorava os
trabalhadores e a maioria negra. Em 1944, já formado advogado, Mandela
participou da criação da Liga Juvenil do CNA, da qual foi eleito presidente em
1951. Nesse período, em 1949, o governo sul-africano aprova um novo regime
“legal” segregacionista: o famigerado “apartheid”. Esta foi a política oficial
imposta pelo imperialismo e a minoria branca desde o final da década de 1940,
não por coincidência após as experiências de campos de concentração nazistas e
no mesmo ano da imposição do Estado de Israel na Palestina, legalizou e
otimizou este sistema de mão de obra barata. A população trabalhadora
sul-africana foi balcanizada sem direitos políticos, trabalhistas, liberdade de
movimento, de expressão ou associação. Nas “reservas” se originaram os famosos
bantustões, “estados independentes bantos-tribais” sob o tacão do imperialismo
britânico, de onde os negros não poderiam sair se não tivessem passe concedido
pelo Estado capitalista racista. O governo dividiu o país para que 87% da terra
ficassem com os brancos, mestiços, e indianos; e os 13% restantes dividido
entre os “estados” negros (80% da população), aos quais era concedida uma
cretina “independência” controlada pelo exército sul-africano. Para justificar
a discriminação da população destes campos de concentração africanos, o governo
fazia um paralelo entre o tratamento que dispensava aos habitantes dos
bantustões e o que a União Europeia e os Estados Unidos davam aos imigrantes
ilegais vindos da Europa Oriental e América Latina, respectivamente. Dezenas de
massacres como o de Sharpeville (1960) e Soweto (1976) ocorreram para sufocar
as greves e levantes da resistência popular ao apartheid. Em 1950 o PC foi
formalmente proibido através da Lei de Supressão do Comunismo e em 1960 o CNA
foi banido, passando à resistência armada. Em 1964, o principal líder do CNA,
Nelson Mandela foi condenado à prisão perpétua. O apartheid provocou a formação
de uma frente popular no país, a partir da unidade das fileiras da oposição
nacionalista, sindicalista e stalinista negra.
A partir desse momento, intensifica-se a luta popular e, em 1952, Mandela, já fazendo parte do Conselho Executivo do CNA, lidera nacionalmente protestos que desafiam a nova lei imposta pelo governo de minoria branca. Mandela se vê forçado a entrar na clandestinidade em 1958, acusado com base na Lei de Repressão ao Comunismo. Em 1964, quando estava sendo julgado, afirmou: “Por várias décadas os comunistas eram o único grupo político na África do Sul que estava preparado para tratar os negros como seres humanos e seus iguais; que estavam preparados para comerem juntamente conosco; conversar conosco, morar e trabalhar conosco. Em função disso, há muitos africanos negros que, hoje em dia, tendem a igualar a liberdade com o comunismo”. Diante do recrudescimento da repressão, o CNA resolveu organizar a resistência armada e criou um braço armado: Lança da Nação. Nelson Mandela tornou-se o seu primeiro comandante-em-chefe. Saiu do país com outros companheiros para conhecer novas experiências de resistência anticolonial e fez treinamento militar com etíopes e argelinos. Quando, em 1962, retornou à África do Sul, Mandela foi detido e passou mais de 27 anos na prisão.
A resistência do povo sul-africano continuou e alcançou um
nível inédito com a rebelião de Soweto, em 1976. Em meados dos anos 1980, o CNA
desencadeia uma campanha que intensifica as jornadas para isolar e debilitar o
regime racista, enquanto cresciam as manifestações de solidariedade
internacional e as forças armadas racistas sul-africanas são derrotadas em
Angola e na Namíbia, com o apoio da URSS e a participação das tropas
internacionalistas de Cuba. O processo de resistência heroica do povo
sul-africano ganhou força e apoio internacional, mas desembocou em uma saída
reacionária de “reconciliação nacional”. Orientados pelo programa nacionalista
burguês, a resistência popular se fortalece, mas sempre acenando para uma
negociação com o regime racista. A campanha mundial para a libertação de
Mandela atinge seu auge. No início de 1990, Nelson Mandela fez um acordo com o
governo racista de F. W. Klerk para promover a “transição pacífica para a
democracia”. O acordo foi uma enorme capitulação à burguesia racista branca e
ao imperialismo, com o compromisso de manter em pé os privilégios econômicos,
concordando em promover as políticas neoliberais em larga escala no País. Para
conter o avanço das massas populares, a frente popular que subiu ao governo foi
estruturada com base no acordo entre o CNA, a Cosatu e o PC que possibilitou
manter a estabilidade do novo regime até as enormes greves dos trabalhadores
mineiros que aconteceram neste ano. As medidas neoliberais se sucederam uma
atrás da outra. Independência do Banco Central; permanência no Ministério das
Finanças do ministro branco racista e neoliberal Derek Keyes; proteção à
propriedade privada a qualquer custo. Sob esta base a reforma agrária ficou
inviabilizada, apesar de ter sido uma das principais bandeiras históricas do
CNA e da luta do negro pobre. O programa econômico, publicado em 1996, levou a
colocar em pratica, de maneira plena, as medidas impostas pelo Consenso de
Washington, o que impossibilitou a melhoria das condições de vida das massas
trabalhadoras: mais privatizações a preço de banana, cortes nos investimentos
públicos e nos gastos sociais, ataques contra os direitos trabalhistas,
abertura comercial e cambial. Sob o controle total do imperialismo, o governo
do CNA continuou a pagar as dívidas contraídas pelo regime racista, o que, só
até o final da década, custou US$ 4,5 bilhões. No final da década de 1990, os
preços dos produtos básicos e o desemprego tinham disparado, milhões de pessoas
deixaram de ter acesso aos serviços públicos básicos, como água encanada,
energia elétrica e telefonia, devido à impossibilidade de pagar as altas
tarifas. A burguesia branca e os monopólios imperialistas continuaram
controlando a mineração, principal componente da economia, os bancos e os
principais setores, o que está na base do ascenso do movimento grevista desde o
ano passado. Lembremos que em agosto de 2012, a polícia da África do Sul matou
pelo menos 38 operários em greve em uma mina de platina em Marikana, nos
arredores de Pretória. Cadáveres caídos, envoltos por poças de sangue, podiam
ser vistos na mina controlada pela britânica Lonmin. Os agentes da repressão do
governo da frente popular dirigida pelo CNA de Zuma e Nelson Mandela abriram fogo
contra os três mil grevistas que estavam fazendo piquetes com comitês de
autodefesa, tendo em vista que dias antes a mesma polícia já havia assassinado
cerca de 10 operários. Este foi o maior massacre desde o chamado “fim do
apartheid”, quando o governo capitalista branco foi substituído pelo seu
gerente negro. Não por acaso, Lula afirmou que “O grande legado do Mandela foi
fazer com que o povo negro da África do Sul descobrisse algo que parece
simples, mas não é. Se a maioria era negra, não tinha o maior sentido de os
brancos governarem o país”.
Como se observa, após 30 anos da ditadura branca do
apartheid, o imperialismo tratou de operacionalizar uma distensão democrática,
retardada em quase duas décadas, tardia em relação às ditaduras europeias (franquismo
e salazarismo) e em uma década em relação às ditaduras militares de suas
semicolônias latino-americanas. Os seguidos governos do CNA negociaram os
acordos de garantias às corporações multinacionais mineiras e a burguesia em
geral, impulsionando uma burguesia negra que, no governo, após as eleições de
1994, adotou a estratégia neoliberal de “Crescimento com Igualdade e
Redistribuição” (GEAR). Na África do Sul, o desenvolvimento desigual e
combinado da luta de classes fez com que o retardo do fim da ditadura do
apartheid desembocasse na primeira experiência de governo de frente popular
como opção preferencial do imperialismo encabeçado justamente por Nelson
Mandela que deixou a prisão para ser eleito presidente da república. Se durante
o apartheid o imposto estatal cobrado às grandes companhias chegava a 48% dos
lucros, o governo do CNA reduziu estes impostos para 28%. Com a frente popular
negra, a burguesia imperialista racista logrou um ambiente politicamente bem
mais estável para fazer seus negócios por quase metade do preço que tinha que
pagar antes ao governo branco. Recentemente esse pacto social começa a ruir sob
o sangue dos operários negros! Em uma tentativa de justificar o papel
contrarrevolucionário dos governos do CNA, o PCdoB afirma: “A transição avança
e, em 1994, Mandela é eleito com 62% dos votos presidente da África do Sul.
Instala a Comissão da Verdade e da Reconciliação, e governa o país de acordo
com as novas condições históricas de defensiva estratégica das forças
socialistas e revolucionárias”.
Na África do Sul, o desenvolvimento desigual e combinado da
luta de classes fez com que o retardo do fim da ditadura do apartheid
desembocasse na primeira experiência de governo de frente popular como opção
preferencial do imperialismo. Após 30 anos da ditadura branca do apartheid, o
imperialismo tratou de operacionalizar uma distensão democrática, retardada em
quase duas décadas, tardia em relação às ditaduras europeias (franquismo e
salazarismo) e em uma década em relação às ditaduras militares de suas
semicolônias latino-americanas. O CNA negociou entre 1990 e 1994 os acordos de
garantias às corporações multinacionais mineiras e a burguesia em geral,
impulsionando uma burguesia negra que, no governo, após as eleições de 1994,
adotou a estratégia neoliberal de “Crescimento com Igualdade e Redistribuição”
(GEAR) que teve a sua maior expressão no governo Mbeki. Se durante o apartheid
o imposto estatal cobrado às grandes companhias chegava a 48% dos lucros, o
governo do CNA reduziu estes impostos para 28%. Com a frente popular negra, a
burguesia imperialista racista logrou um ambiente politicamente bem mais
estável para fazer seus negócios por quase metade do preço que tinha que pagar
antes ao governo branco. Agora esse pacto social começa a ruir sob o sangue dos
operários negros e a divisão da Frente Popular!
Com a renúncia de Zuma por pressão do imperialismo em acordo
com uma ala do CNA é preciso construir um partido trotskista revolucionário do
proletariado negro da África do Sul para derrotar a frente popular e a direita,
superando as ilusões no CNA, no PC e na COSATU através da luta revolucionária
pela expropriação do imperialismo e de seus sócios burgueses, brancos ou
negros. Só por esta via a maioria da população explorada e milenarmente oprimida
poderá emancipar o continente africano do capitalismo racista e desenvolver as
forças produtivas rumo ao socialismo, pondo fim definitivamente aos massacres
para impor a espoliação do país pelas transnacionais.
A trajetória de Mandela, um líder reverenciado por seu povo,
mas que de fato foi um instrumento útil para o imperialismo reforça que é
preciso construir um partido trotskista revolucionário do proletariado negro da
África do Sul para derrotar a frente popular e faça-o superar suas ilusões no
CNA, no PC e na COSATU através da luta revolucionária pela expropriação do
imperialismo e de seus sócios burgueses, brancos ou negros. Longe de somar-se
ao coro hipócrita de apologia da figura de Nelson Mandela, os marxistas
revolucionários agora e sempre denunciam a capitulação e integração do CNA ao
regime burguês pró-imperialista na África do Sul, maquilado de “democracia
popular”. Por esta razão neste momento reforçamos que só pela via da revolução
proletária e do socialismo a maioria da população explorada e milenarmente
oprimida poderá emancipar o continente africano do capitalismo racista e
desenvolver as forças produtivas rumo ao socialismo, pondo fim definitivamente
aos massacres e à espoliação do país pelas transnacionais.