sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Neste 29 de novembro, em homenagem ao Dia Internacional de Solidariedade ao Povo Palestino, republicamos o artigo histórico da LBI lançado no Jornal Luta Operária de novembro de 1995



A Questão Palestina à Queima Roupa!

Os "Acordos de Paz", celebrados entre a OLP e o Estado de Israel na capital norte-americana em 1993, e ratificados este ano com a "devolução" de algumas cidades ocupadas pelo exército israelense na faixa de Gaza e na Cisjordânia, longe de colocarem um fim aos graves conflitos que assolam esta região, como tenta passar o imperialismo e suas agências de propaganda, apenas reacenderam com mais força ainda, as profundas tensões que cercam a luta heróica do povo palestino contra o enclave sionista de Israel.

O ASSASSINATO DE RABIN

Os assassinatos do líder máximo do Jihad, Fathi Chqaqi e o premier Yitzhak Rabin, neste momento, são a demonstração prática que a resolução da "questão palestina" passa bem longe da farsa montada pelo imperialismo ianque, com o aval da direção da OLP, para montar um fantoche sob o controle de Israel chamado ironicamente de "autoridade nacional palestina".

Rabin, que há poucos dias tinha organizado o atentado terrorista que resultou na morte do dirigente do Jihad, organização islâmica que se opõe aos acordos de paz, foi assassinado quando saía de um comício do partido trabalhista que governa Israel desde 92. O ato público convocado com o lema em defesa do "processo de paz", na verdade era um comício eleitoral em função do enorme crescimento da direita israelense - o Likud, principal força da oposição - que exigia a antecipação das eleições parlamentares previstas para o próximo ano. O líder do Likud, Bynyamin Netanyahu, iria apresentar nesta semana ao Knesset (parlamento) uma "moção de desconfiança", caso fosse aprovada, seriam antecipadas as eleições gerais, com fortes chances de uma retumbante derrota trabalhista.

A grande imprensa e a polícia de Israel apresentaram o assassino, Nigal Amyr, como integrante do grupo Eyal, organização de extrema-direita. A viúva de Rabin responsabilizou o Likud pelo clima de terror instalado em Israel, no que rapidamente foi contestada sob a acusação de instigar uma guerra civil entre os próprios judeus. A única certeza comprovada é que o assassino pertencia ao establishment sionista, o que lhe serviu livre trânsito para disparar com grande facilidade contra o primeiro-ministro.

Apesar de várias manifestações de apoio ao assassinato de Rabin, oriundas principalmente de religiosos ortodoxos e colonos judeus dos territórios ocupados que o consideravam um traidor, o clima de comoção provocado pela forte pressão dos órgãos nacionais e internacionais de comunicação, levaram com que o Likud apoiasse a formação do novo gabinete, encabeçado pelo antigo chanceler Shimon Perez, assegurando desta forma a manutenção do cronograma eleitoral já estabelecido anteriormente e por, consequência, a permanência dos trabalhistas no poder.

O imperialismo tratou rapidamente de assegurar a continuidade dos "acordos de paz" como um caminho irreversível entre a OLP e Israel, apresentando Rabin como o grande artífice e mártir da paz, o que foi prontamente seguido pela "esquerda" de todo o mundo. Gorbatchev declarou: "o povo de Israel perdeu um líder de dons excepcionais" (OESP, 08/11/95). Por sua vez, Lula, no Brasil, foi até a embaixada de Israel para chorar pela perda "do maior nome da paz mundial" (FSP, 09/11/95).

Já o povo palestino, saiu às ruas, desde os territórios ocupados, passando pelo Líbano e Egito, para comemorar a morte do carrasco sionista que conheciam muito bem. Foi Rabin quem comandou o exército sionista na ocupação dos territórios palestinos na guerra dos seis dias. Mas não parou por aí, quando ministro da defesa em 1984, decretou a lei que determinava quebrar os ossos das mãos das crianças palestinas que atirassem pedras contra os soldados israelenses. E, para não pairar nenhuma dúvida sobre uma possível regeneração no período mais recente, foi o próprio Rabin, que em meio às negociações para selar o acordo de paz em 93, lançou um bombardeio nos acampamentos palestinos do sul do Líbano, matando mais de 150 civis e pondo 300 mil refugiados na estrada, em fuga da covarde artilharia sionista.

Foi um comunicado da Frente Popular para a Libertação da Palestina (FPLP), uma facção de esquerda da OLP, que melhor sintetizou o sentimento do povo palestino: "Estaríamos mais felizes se tivéssemos podido matá-lo nós mesmos".

A FORMAÇÃO DE ISRAEL COMO ENCLAVE DO IMPERIALISMO NO ORIENTE MÉDIO

O fim dos constantes massacres do povo palestino, assim como a realização da sua justa aspiração nacional para a constituição de uma verdadeira pátria, não passa, como já dissemos, pelos reacionários "acordos de paz" e a criação de um protetorado palestino sob as botas do Estado terrorista de Israel. Para os marxistas revolucionários, a caracterização de Israel como um enclave do imperialismo estabelecido contra a luta das massas árabes do Oriente Médio é fundamental para defendermos a sua destruição, como parte de um programa revolucionário para os trabalhadores palestinos.

Recuando um pouco na história da criação do Estado de Israel no território palestino, iremos compreender o real conteúdo desta operação, dirigida inicialmente pelo imperialismo inglês e finalizada pelo imperialismo ianque com o objetivo de extender definitivamente seu domínio sobre uma região estratégica, de vários ângulos: econômico, político e militar.

A maquiagem ideológica, que justificasse a criação de um país, a partir do quase nada, foi tomada emprestada ao movimento sionista pelo imperialismo britânico na primeira década deste século. O sionismo (referência à colina de Sion em Jerusalém) proclamava a necessidade de uma "regeneração" do povo judeu, que após a grande diáspora da Palestina, por volta do ano 70 da era cristã, teria se afastado de suas raízes produtivas, ligando-se exclusivamente as atividades comerciais e pecuniárias. Theodor Herzl, um dos fundadores do movimento, propõe "a conquista do trabalho pelo povo judeu" no retorno "à terra prometida" já em 1901. Sob o slogan "uma terra sem povo para um povo sem terra", os sionistas ‘esqueceram’ um ‘pequeno detalhe’, a existência de um milhão de palestinos que já habitavam aquela região há mais de 18 séculos!

O contexto histórico que marca a ascensão do sionismo é exatamente a profunda crise da economia capitalista, mergulhada em sua primeira grande guerra pela disputa de mercados, assistindo ao ressurgimento do nacionalismo exacerbado, colocando os judeus, particularmente os comerciantes e usurários em uma situação bastante delicada. Por outro lado, a vitória da revolução russa colocava objetivamente a possibilidade da absorção da cultura milenar do povo judeu em um patamar muito superior ao capitalismo, a construção solidária e multiétnica de uma nova ordem social, pondo um fim à discriminação nacional assassina que imperava na velha Rússia. O movimento sionista, que representa socialmente os interesses da grande e média burguesia judaica tenta responder a estas duas grandes questões - o colapso capitalista que elevava cada vez mais a segregação e o anti-semitismo e, ao mesmo tempo, a necessidade de uma profunda demarcação com os revolucionários russos, que abriram a possibilidade de uma assimilação pela via do socialismo debutante justamente em um país largamente povoado por judeus.

Trotsky, desmascarando as tentativas de apresentação do sionismo, como um movimento de características comuns ao socialismo, o define como um instrumento que estava sendo utilizado pelo imperialismo inglês: "mas os fatos de cada dia nos mostram que o sionismo é incapaz de resolver a questão judaica. O conflito entre judeus e árabes na Palestina adquire um caráter cada vez mais trágico e ameaçador. Eu não acredito de forma alguma que a questão judaica possa ser resolvida nos quadros do capitalismo decadente sob o controle do imperialismo britânico" (León Trotsky, Sobre a Questão Judaica).

A vitória da aliança franco-britânica sobre os alemães e seus aliados, entre os quais a Turquia na Iª guerra mundial, torna o imperialismo inglês o grande herdeiro do imenso e secular Império Otomano, que engloba todo o Oriente Médio. Em 1917, com o objetivo de estabelecer uma ‘cabeçeira de ponte’ na região, o governo inglês apóia a "construção do lar nacional para o povo judeu" na Palestina, através da célebre declaração de "Balfour". Toda a região é repartida entre Inglaterra e França, através dos acordos secretos de "Sykes-Picot", denunciados publicamente pelo partido bolchevique como a "partilha do covil sobre as nações oprimidas". São desenhadas fronteiras, criados países artificialmente como a Transjordânia (atual Jordânia) em 1921, tudo em função dos interesses econômicos do imperialismo europeu.

Mas a Palestina é a única nação que permanecerá sem qualquer rasgo de autonomia, ou seja, uma nação sem Estado, sem fronteiras nacionais, ficando sob o mandato inglês, confiado pela Liga das Nações em 1922. A partir daí o imperialismo britânico, através de magnatas do petróleo como o Barão de Rotchild, começa a financiar a emigração massiva de judeus na Palestina, que antes somavam apenas 25 mil, iniciando o processo de ocidentalização de um enclave, no meio do Oriente, em uma região que despontava pela riqueza do ouro negro e por sua localização estratégica do ponto de vista militar.

Com a ascensão do nazismo na Europa, em meados da década de trinta, o povo judeu assiste a vigorosa reaparição do anti-semitismo na sua forma mais violenta. Por sua vez, a União Soviética, dirigida pela burocracia stalinista, não mais representava uma alternativa de integração para o povo judeu. Muito pelo contrário, sob o tacão termidoriano, os revolucionários assistem ao renascimento do anti-semitismo em uma forma que não deixava muito a dever aos velhos pogrons tzaristas. A Oposição Unificada de Esquerda, formada por Trotsky, Zinoviev e Bukarin, entre outros, era definida pelo stalinismo como "união de judeus sujos vendidos a Gestapo". É neste marco que o sionismo, antes visto com muita desconfiança pelos trabalhadores judeus que o consideravam uma capitulação aos racistas, que preconizavam a expulsão dos judeus da Europa, vai afirmar-se como um grande movimento nacional de alcance de massas.

Na década de trinta, ocorre o grande fluxo migratório; em 1935, os judeus na Palestina já somavam quase 400 mil. A cidade de Haifa, a beira do Mediterrâneo, mais parecia uma cidade completamente europeia, no meio da cultura milenar do deserto. O objetivo imperialista inglês havia conseguido consolidar-se a passos largos. Os judeus, financiados com aportes massivos de capitais, formaram um verdadeiro Estado dentro do protetorado britânico na Palestina, inclusive com a criação de um exército próprio, as milícias do Irgun e Haganá encarregadas do extermínio de palestinos e árabes. Seu lema era "cem mil vidas árabes não valem a unha de um judeu". O sionismo transformou-se na reprodução do nazismo contra os povos árabes em seu próprio território.

Neste mesmo ano, explode a grande revolta palestina, com a deflagração de uma greve geral, que durou quase um ano. Somente em 37, o governo inglês consegue uma trégua, em função da vergonhosa traição do alto comitê árabe. Neste período, é enviada da Inglaterra a "Comissão Peel", encarregada de investigar os conflitos na região, concluindo pela primeira vez a necessidade da partilha da Palestina em dois Estados.

A iminente eclosão da II guerra mundial obriga a Inglaterra, ameaçada diretamente pelo nazismo, a procurar o apoio dos países árabes contra a Alemanha. Para atrair sua simpatia, em 1939, adota o chamado "livro branco", limitando a entrada de judeus na Palestina. Tarde demais, o imperialismo norte-americano, emergente no cenário mundial, abraça a causa sionista, passando a fornecer armamento pesado às milícias sionistas que ameaçam até o próprio exército inglês. Com a vitória dos aliados e o despontar da hegemonia norte-americana só resta à Inglaterra sua retirada do cenário. A recém-fundada Organizações das Nações Unidas, substituta da antiga Liga da Nações, através da iniciativa dos Estados Unidos, e com o apoio entusiástico da URSS, decreta em 1947 a divisão definitiva da Palestina entre um Estado judeu e outro árabe palestino. O stalinismo, após os acordos de Yalta, deixará o Oriente como uma área de influência do imperialismo ianque, além da consideração do sionismo, em sua versão trabalhista como um aliado político, com o qual desenvolverá uma frente popular em Israel. O velho partido comunista palestino logo mudará seu nome para israelense por considerar as massas árabes e palestinas como atrasadas e feudais.

Antes mesmo da oficialização do Estado de Israel, as tropas do Irgun retomam os massacres aos palestinos, como a chacina da aldeia de "Deir Yassin". Era o prenúncio do terrorismo sionista que irá assolar o povo palestino até hoje.

Exatamente no dia da proclamação oficial do Estado de Israel, 15 de maio de 1948, é declarada a Iª guerra aos países árabes. O novo exército de Israel, agora batizado "Tzahal", é abastecido belicamente pela Tchecoslováquia (membro do Pacto de Varsóvia) e Estados Unidos. Conseguindo uma triunfal vitória, alarga, desta forma, em três vezes o seu território traçado inicialmente pela ONU. O Estado árabe palestino estipulado pelo plano de partilha não consegue sair do papel, já estava morto antes de nascer. Restando ao Egito à anexação da faixa de Gaza e à Jordânia a anexação da Cisjordânia. Um milhão e meio de palestinos deixam o agora chamado Estado de Israel, expulsos de suas terras sob o bombardeio da aviação sionista, espalham-se pelo Líbano, Egito, Jordânia, Síria. 600 mil palestinos permanecem no Estado sionista, sem nenhum direito civil, tratados como cidadãos de segunda categoria em seu antigo território nacional, servindo de mão-de-obra barata que irá mover a engrenagem capitalista do enclave militar de Israel.

Do velho Egito, surge um setor de jovens oficiais, sublevados contra a vergonhosa traição do Rei Faruk, que durante a guerra de 48 forneceu fuzis defeituosos ao seu exército. Tomam o poder liderados por Nasser. É o início do nacionalismo árabe que logo se espalha como um rastilho de pólvora pela Síria, Iraque e Líbano. Em 1956, Nasser declara a nacionalização do Canal de Suez, que estava sob o controle das grandes potências mundiais sendo o ponto econômico mais estratégico de todo Oriente Médio, aonde transitam dois terços do petróleo destinado à Europa. A reação do imperialismo é imediata, Inglaterrra e França preparam a operação militar chamada "expedição de Suez". Cabe ao enclave de Israel, desempenhar seu papel de gerdame do imperialismo na região. Seus tanques e aviões bem mais sofisticados e em maior número que os da artilharia egípcia, logo em dois dias ocupam o deserto do Sinai até as margens do canal. Em seguida, passam o controle da região para as tropas da ONU, seguindo a orientação direta do imperialismo ianque.

Passados quase 11 anos da ocupação do Suez, novamente Nasser, agora apoiado por uma ajuda militar da URSS, que se vê obrigada a interferir no palco das operações militares do Oriente Médio, desta vez ao lado dos árabes, devido ao perigo de uma incursão militar imperialista no seu território oriental, retoma a bandeira do Suez, exigindo que tropas da ONU se retirem do Egito. É o motivo para que Israel entre em cena, com o sinal verde dos EUA. A aviação israelense ataca, e em uma manhã a guerra está ganha. Seus blindados são enviados para todos os frontes. Em seis dias, o Egito perde Gaza e o Sinai até o Suez. A Síria perde as colinas de Golan, também retomando da Jordânia a Cisjordânia anexada em 1948 e ocupa definitivamente o lado palestino da cidade de Jerusalém, conseguindo quadruplicar suas fronteiras iniciais. Sem uma ação direta das massas e devido ao forte poderio militar imperialista é imposta uma nova derrota para as burguesias árabes. Para o povo palestino é um desastre sem proporções, passando a habitar os territórios ocupados na condição de prisioneiros políticos. Segue-se uma luta de guerrilhas na região, a partir de bases militares palestinas instaladas no sul do Líbano, que extende-se até hoje.

A essência de todos os conflitos militares travados na região reside na própria arena da luta de classes internacional, sendo a existência de Israel, um enclave militar artificialmente implantado no coração do Oriente, fundamental na repressão dos interesses do imperialismo mundial em uma região estratégica, pelas reservas petrolíferas, para o funcionamento da economia capitalista no planeta. É uma tarefa do conjunto do proletariado de todo mundo, inclusive o judeu, a destruição deste gerdame imperialista, no sentido de impulsionar enormemente a luta dos povos contra a exploração capitalista.

OLP DA RESISTÊNCIA ARMADA AO PACTO COM ISRAEL

A luta do povo palestino representa a vanguarda das massas árabes contra o enclave de Israel, abrindo desta forma a perspectiva da revolução proletária em todo o Oriente Médio. São, sem dúvida, as primeiras vítimas do sionismo, que pretende sua eliminação física enquanto povo, mas também são alvo da opressão das burguesias árabes que, ora os tem utilizado como bucha de canhão na barganha com os sionistas ora como inimigos perigosos, descarregando sem hesitação sobre estes violentos ataques.

O próprio surgimento da OLP esteve condicionado à tentativa das burguesias árabes de manipularem em seu benefício a luta dos palestinos. Encarregado por Nasser em 1964 de estruturar a OLP, Ahmad Chukeiri, seu primeiro presidente, não escreve em seu programa original a defesa de um Estado Palestino, nem tampouco a destruição de Israel.

Com o fracasso da via nasserista, após a humilhante derrota dos países árabes em 67, ganha corpo a organização militar palestina "Al Fatah", a Vitória, surgida no final de 59, sob a direção de Yasser Arafat e Abu Lyad que proclamava abertamente a necessidade da destruição de Israel, colocando-se politicamente à margem da OLP oficial de Chukeiri.

É a "Al Fatah" que vai dirigir a resistência à ocupação militar de Israel na faixa de Gaza. Durante três anos, o exército sionista não consegue sufocar a rebelião popular instalada na região. Logo depois, em 1968, na cidade jordaniana de Karameh, os fedayin, ou seja, os guerrilheiros palestinos orientados pela "Al Fatah", conseguem derrotar o exército sionista, criando pela primeira vez o símbolo da resistência palestina vitoriosa.

No ano seguinte, Arafat assume a direção da OLP, que adota em sua carta de constituição: "a destruição do enclave do imperialismo como condição preliminar para a unidade dos povos árabes". A partir daí, estrutura-se como um verdadeiro Estado Palestino sem território, criando instituições como o Conselho Nacional Palestino, um verdadeiro parlamento com representação das suas diversas facções sociais e políticas.

Para os revolucionários, uma caracterização correta da OLP deve começar pela consideração de seu caráter de classe determinado pela adoção de um programa político democrático-burguês, defensor da recomposição de uma economia capitalista na Palestina, ainda que a representação social da burguesia no interior da OLP fosse extremamente minoritária, em função da expropriação forçada levada a cabo pelo sionismo em 48 e 67. Mas a questão chave é determinar o campo de luta da classe operária mundial no enfrentamento entre as massas palestinas e o enclave sionista de Israel subsidiado pelo capital financeiro internacional. Nesse caso, não pode haver a menor hesitação entre os revolucionários, estamos no campo militar da OLP, apesar da dinâmica imposta por sua direção apontar, caso triunfasse sobre Israel, na instauração de um regime democrático-burguês, extremamente instável em função do armamento das massas palestinas. Trotsky definia assim uma posição justa diante da guerra civil espanhola: "O partido comunista devia lavar as mãos frente ao conflito entre monárquicos e republicanos burgueses? A defesa de semelhante política seria um suicídio... Nestas condições a luta heróica dos operários teve inevitavelmente que fortalecer o governo republicano, pelo menos temporariamente. Só pode negar isto gente que não tem nada na cabeça e sustenta a análise dos acontecimentos em frases banais." (León Trotsky, A revolução espanhola e a tática dos comunistas).

A OLP protagonizará a maior oportunidade de encabeçar sua ‘revolução nacional’ na Jordânia, uma criação completamente artificial do imperialismo britânico no antigo território palestino, entregue à oligarquia beduína para que governasse sobre uma população composta majoritariamente por palestinos. Em meados de 70, acusando o regime "derrotista", uma alusão às constantes derrotas frente a Israel, do Rei Hussein de acatar a resolução 242 da ONU, que reafirmava o direito à existência de Israel, a OLP levanta a palavra-de-ordem de "todo poder à resistência" tomando o controle das cidades do norte do país, assim como os subúrbios de Aman. O Rei Hussein, com o apoio militar da Síria, lança seu exército contra os fedayin, causando mais de 5.000 baixas nos combatentes palestinos que, em setembro, são expulsos da Jordânia. A inferioridade militar e fundamentalmente a ausência de uma estratégia proletária, são os fatores determinantes pela derrota da OLP, que a partir de então privilegiará ações terroristas contra Israel principalmente fora do Oriente Médio.

Refugiados no sul do Líbano, espalhados em acampamentos próximos às principais cidades, os palestinos estabelecem uma importante aliança com a resistência dos trabalhadores libaneses em luta contra o regime títere do imperialismo francês. Estava mais uma vez colocada a possibilidade de uma revolução, desta vez com características nitidamente proletárias, já que a divisão social estabelecida no Líbano, rotulada pela imprensa mundial como sendo entre cristãos versus mulçumanos, refletia na verdade diretamente a luta entre explorados e exploradores.

Em função da ameaça da perda do controle no Líbano, o imperialismo francês aciona seu enclave na região, que sob o comando nazi-sionista Menahem Beguin desencadeia em junho de 82 uma operação militar de invasão do Líbano, chamada cinicamente de "paz na Galiléia". Agindo em conjunto com os milicianos falangistas, o exército sionista massacra mais de dois mil civis nos acampamentos palestinos de Sabra e Chatila. É apenas um primeiro aviso de sua disposição em aniquilar a OLP. A burguesia árabe não esboça a menor reação, e até colabora com a operação militar. Apesar de um cerco impiedoso de dois meses sobre Beirute, fazendo lembrar o cerco nazista no gueto de Varsóvia, as tropas da OLP conseguem uma retirada honrosa. Mesmo com o estabelecimento da ocupação, o exército sionista não consegue atingir seus objetivos, dizimar a OLP e assassinar Arafat. Ao contrário, pela primeira vez em sua história, Israel é sacudido por manifestações gigantescas, com mais de 300 mil pessoas nas ruas exigindo o fim da política assassina do Likud, impulsionadas pela oposição pequeno-burguesa pacifista. É neste momento que se faz sentir a ausência de um partido revolucionário que chamasse a unificação dos trabalhadores judeus e palestinos para derrotar o regime terrorista de Israel.

A direção da OLP começa a dar os primeiros sinais de que estaria disposta a aceitar uma negociação com Israel nos marcos dos acordos de "Camp David", (produto da nova correlação de forças originada a partir da guerra de Yon Kippur) firmados por Sadat e Beguin em 1978. Estes estipulavam a aceitação de uma autonomia relativa nos territórios ocupados pelo exército sionista além da devolução do Sinai ao Egito ocorrida de fato em 82.

Em dezembro de 87, jovens palestinos deflagram nos territórios ocupados a "Intifada", revolução das pedras, tomando de surpresa a própria OLP. Organizam-se greves e barricadas que enfrentam as atrocidades do exército sionista, deixando um saldo de mil mortos só no primeiro ano de combate. É neste contexto que surgirá a organização Hamas, "resistência", questionando a linha de profunda adaptação trilhada pela direção da OLP.

Utilizando-se da Intifada, apoiada apenas formalmente, como arma de barganha internacional, a direção da OLP em assembléia do Conselho Nacional Palestino, no ano de 88, decide por aceitar a resolução 242 da ONU, admitindo oficialmente pela primeira vez o direito de existência de Israel. Arafat inicia uma verdadeira cruzada pelo mundo, para vender a imagem de uma nova OLP, aberta ao diálogo e à colaboração com o sionismo. É a expressão da inconseqüência política de uma direção pequeno-burguesa, carente de um programa revolucionário que conduza as massas palestinas à vitória, adotando a linha pendular entre o foquismo inconsistente e o oportunismo capitulador frente aos genocidas sionistas.

Dando continuidade à sua nova política, denominada agora de "compromisso", tomando emprestado o termo do eurocomunismo italiano, ocorrem uma série de negociações secretas, entre a OLP e Israel que culminam com a realização das conferências pela paz em Madri e Washington, onde finalmente, Arafat e Rabin assinam o célebre "acordo de paz" que normatiza a formação de uma "autoridade nacional palestina" sobre uma pequena parte dos territórios ocupados em 67. A OLP, já totalmente fracionada, passa a ser encarada por setores cada vez maiores do povo palestino como a velha burguesia árabe com seus rompantes nacionalistas, mas sempre disposta a um acordo podre com os sionistas, desde que seus interesses sejam preservados.

A VERDADEIRA NATUREZA DOS "ACORDOS DE PAZ"

A burguesia mundial e o sionismo apressaram-se em apresentar os acordos entre Israel e a OLP como uma demonstração cabal da nova ordem mundial, estabelecida com a queda do muro de Berlim. Os sionistas jactam-se de abrirem mão de territórios como prova irrefutável de sua disposição de conviver pacificamente com o povo árabe-palestino. Já a OLP, considera a "declaração de princípios" firmada em Washington um primeiro passo no sentido da constituição de um Estado nacional. Mas o que realmente têm em comum o sioniosmo e a OLP, além da farta verborragia demagógica espalhada pelo mundo, é o temor que a luta das massas palestinas evolua à uma situação revolucionária, fugindo de seus respectivos controles. Qual é então a verdadeira natureza dos acordos de paz e seu significado para a luta de classes mundial?

Para Israel, trata-se fundamentalmente de debelar dois problemas vitais que ameaçam destroçar seu regime social, montado sobre o militarismo e a espoliação sobre o povo palestino. Quais sejam, a profunda crise econômica que atravessa e a necessidade de pôr fim a intifada que já dura quase seis anos sem interrupção.

O colapso da economia israelense, evidenciado na incessante queda dos índices da bolsa de valores e no profundo retrocesso de investimentos imperialistas em seu parque industrial, é o produto da própria crise capitalista internacional, em particular, do gigantesco déficit orçamentário norte-americano, gerando uma considerável redução do afluxo de capitais. Construído com enormes subsídios estatais do imperialismo ianque, o enclave de Israel não sobrevive sem esta "ajuda" voltada para o armamentismo como elemento propulsor de sua economia. Com a derrubada da URSS, os EUA iniciam um processo de aproximação com as burguesias árabes. A instalação de uma poderosa base militar na Arábia Saudita, durante a guerra do golfo e os acordos de cooperação militar, firmados com a Síria e o Egito, causaram em Israel a expectativa de um corte, ainda maior do que o já existente, nos subsídios e investimentos dos EUA em sua economia voltada para guerra.

A celebração dos "acordos de paz" por parte de Israel, significa a exigência para "distensionar" a região, abrindo, desta forma, a possibilidade de atrair investimentos de outros blocos imperialistas, como o Japão, por exemplo, além de facilitar a penetração de produtos israelenses nas economias árabes, até então obstruída por sanções destes, em razão da ocupação do exército sionista dos territórios palestinos.

A continuidade da Intifada que toma conta dos territórios ocupados, apesar dos enormes recursos destinados à sua repressão pelas tropas sionistas, são por outro lado, um dos motivos pelos quais Israel busca sua "paz". O fechamento sistemático de suas fronteiras para a força de trabalho palestina, bem mais barata e apta aos serviços mais pesados, em virtude das constantes sublevações palestinas, além de inúmeras greves que abarcam unitariamente trabalhadores árabes e palestinos residentes nas grandes cidades israelenses, já deram um prejuízo de cerca de 80 bilhões de dólares só nos últimos 5 anos.

A oposição estabelecida pelo Likud, ao contrário do que é divulgado pela grande imprensa, não diz respeito ao conteúdo dos "acordos de paz". Pelo contrário, foram eles mesmos que os iniciaram com Begin, mas somente nos seus ritmos e garantias que devem ser dadas aos colonos judeus situados em plena linha de fogo da "intifada".

Yasser Arafat e a OLP, manejando a justa aspiração do povo palestino para conquistar sua pátria, esforça-se em demonstrar que a instauração da ‘autoridade nacional palestina’ em algumas cidades da Cisjordânia e na faixa de Gaza é apenas a primeira etapa para a construção de um Estado soberano palestino. Nada mais falso e enganoso. Na verdade, a tentativa de estabelecer um regime colaboracionista em uma pequena faixa dos territórios ocupados pelos sionistas (representa cerca de 2% do território confiscado dos palestinos pela ONU em 47) corresponde a uma estratégia dos setores dominantes do povo palestino, altos comerciantes e banqueiros no exílio, atraídos pelas promessas de investimento capitalistas na região, cerca de 2 bilhões de dólares só dos EUA. A direção majoritária da OLP, apesar de alguns focos de oposição como a FPLP de Geoges Habache, acabou por selar um acordo renunciando a retomada dos territórios ocupados e pondo fim a todas as ações militares contra Israel, significando a traição histórica da luta do povo palestino pela destruição do enclave terrorista de Israel. A direção da OLP, ao transformar-se em polícia de seu próprio povo, coloca-se neste momento no campo militar de Israel para reprimir a intifada e todas as organizações políticas que continuam a lutar pela vitória definitiva das massas palestinas.

Os "acordos de paz" estabeleceram a ‘devolução’ de 7 cidades na Cisjordânia e toda a faixa de Gaza. A cidade de Hebron, em razão da presença de judeus, cerca de 500 em um total de 100.000 habitantes, ficará sobre o controle misto entre a OLP e o exército sionista. A "autoridade nacional palestina" não terá status de Estado, ficando proibida de estabelecer bases militares nos territórios ‘desocupados’. O exército Israelense continuará estacionado e com todo o domínio das zonas rurais que rodeiam as cidades, além do controle de todos os acessos por terra e mar. A maior cidade árabe-palestina da região, Jerusalém, permanecerá sob a ocupação absoluta de Israel.

Será mantida a proibição de qualquer retorno de refugiados palestinos, espalhados por todo o Oriente médio, que representam mais do dobro da atual população dos territórios ‘devolvidos’. Nas cidades sob o controle da OLP foi formada uma polícia palestina, tendo unicamente permissão para portar equipamento militar de baixo impacto, encarregada da repressão a "manifestações contrárias aos interesses de Israel". Sob nenhuma hipótese esta polícia poderá deter cidadãos israelenses. Em casos onde a polícia palestina não tenha condições de deter as revoltas populares, o exército sionista tem total liberdade para a intervenção. Os "acordos de paz" também não prevêem a libertação de prisioneiros políticos acusados de terem cometido "crime de morte" a qualquer cidadão israelense, como é o caso da brasileira Lâmia Maruf, condenada à prisão perpétua nos cárceres sionistas.

Falar de "autonomia" ou "autoridade" palestina é no mínimo uma grotesca farsa reacionária. Nem o direito mais elementar, como o do acesso às reservas hídricas, em uma região desértica, economicamente agrária, onde a população palestina é até proibida de cavar poços de água para consumo doméstico, foi permitido por Israel. O único rasgo cênico da "autoridade palestina" é a instalação de um Conselho Nacional, uma espécie de parlamento composto por 82 membros eleitos nas cidades sob o controle da OLP. Acontece que Israel terá o direito de veto, sobre qualquer decisão aprovada pelo ‘parlamento’ que venha ferir seus interesses.

Neste marco, a atual política do Estado sionista, batizada como "pacifista" é muito semelhante a do Apartheid na África do Sul em plena década de 50, quando criou os famosos "bantustões", territórios chamados de "livres", entregues a tribos colaboracionistas para que dessem cabo das revoltas do povo negro.

Com a completa desmoralização política da OLP, que passou ao papel de "polícia sionista" nos territórios ocupados, chegando a encarcerar vários ativistas contrários aos acordos de paz, as organizações que reivindicam a destruição de Israel e a continuidade da intifada conheceram um enorme crescimento em sua influência política, principalmente as de caráter fundamentalista islâmico, ligadas às burguesias árabes ainda beligerantes com Israel (Síria e Irã), como o Hamas, Jihad e Hezbolah, surgindo como uma alternativa radicalizada à traição histórica cometida pela OLP.

A estratégia do Hamas e Jihad consiste em converter o caráter da intifada a ações espetaculares de terrorismo contra alvos sionistas espalhados no mundo inteiro. Agindo desta forma debilitam a sublevação das massas palestinas, isolando-as cada vez mais dos métodos de mobilização permanente, como as greves e marchas populares. Estas organizações apostam em obter a ruptura dos acordos entre a OLP e o sionismo, não pela ação das próprias massas insurgentes, mas por meio do fortalecimento parlamentar da ultra-direita israelense, o que significa objetivamente colaborar com a preparação de um ataque ainda mais brutal e violento contra o povo palestino nos moldes do perpetrado pelo Likud em Sabra e Chatila.

Somente a construção do partido revolucionário, seção da IV Internacional, poderá dirigir o proletariado e as massas palestinas em uma luta conseqüente contra o enclave sionista de Israel e as direções colaboracionistas como a OLP. Esta é a tarefa fundamental de todos aqueles que se reclamam da gloriosa luta do povo palestino, ao longo deste século. Deixar essa tarefa nas mãos de direções teocráticas e simétricas ao sionismo na questão do racismo, como o Hamas e o Jihad, significa cometer outra traição, da mesma envergadura da cometida pela celebração do pacto OLP-sionismo.

A ESQUERDA TROTSKISTA E A QUESTÃO PALESTINA

As principaís correntes que reivindicam de alguma forma o legado da IV Internacional em sua grande maioria tem oscilado, ora entre a capitulação ao nacionalismo árabe ora ao sionismo judeu. Uma das primeiras resoluções da IV Internacional dirigida por Michel Pablo, após a partilha da Palestina pela ONU, era marcada pela ausência de consignas revolucionárias adotando a democracia burguesa como alternativa ao regime sionista de Israel, ainda que denunciasse corretamente o confisco dos palestinos promovido pelo imperialismo com apoio da URSS, colocada da seguinte forma: "Abaixo a partilha da Palestina; Por uma Palestina árabe, unida e independente, com plenos direitos para a minoria nacional judia; Fora do país os ‘mediadores’ e ‘observadores’ da ONU; Pela eleição de uma Assembléia constituinte com sufrágio universal e secreto; Pela revolução agrária!"(Quarta Internacional, junho de 48). Era muito compreensível que as burguesias nacionalistas árabes e organizações como a OLP se mantivessem no marco de uma "Palestina laica e democrática" como forma de contraporem-se, à sua maneira e segundo seus interesses de classe, ao enclave do imperialismo no Oriente Médio. Mesmo postando-se incondicionalmente no campo de luta do povo palestino oprimido pelo imperialismo em sua justa aspiração nacional, ou seja, a conquista de uma pátria, os revolucionários internacionalistas não podem abster-se de levantar em alto e bom som que a forma mais conseqüente para lutar por uma pátria palestina passa por derrotar o imperialismo em seu enclave com o método da revolução socialista, e pela instauração de uma ditadura do proletariado na Palestina, abrindo a perspectiva da formação de uma Federação Socialista das Repúblicas Soviéticas Árabes.

A ótica do pablismo, no comando da IV Internacional, era de contrapor um regime democrático-burguês palestino, portanto capitalista, ao Estado racista, militarista e também capitalista de Israel, tentando passar a idéia da defesa de um programa democrático, através da convocação de uma constituinte, como uma justa reivindicação transitória. A "leitura" revisionista do Programa de Transição dava seus primeiros sinais. Em maio de 1948, Israel declarava sua primeira guerra de anexação ao território palestino, caberia aos revolucionários impulsionar prioritariamente não bandeiras democráticas, o que até poderia ser correto em outra situação, mas adotar um programa que potenciasse o povo palestino, em plena guerra civil, de uma estratégia para a tomada do poder, por meio de uma insurreição popular armada nas principaís cidades de Israel, ainda naquele período habitadas majoritariamente por trabalhadores palestinos e árabes. Foi a falta de uma estratégia e de um partido revolucionário no seio das massas palestinas que, sob a liderança de um antigo colaborador dos nazistas, Mufit de Jerusalém, Aminal-Hussein, ficaram subordinadas a impotência das burguesias árabes diante da ofensiva militar de Israel, levando à retumbante derrota de 1948. Quanto a menção da defesa de uma "revolução agrária" em plena etapa de decomposição capitalista, só pode ser concebida, no mínimo, como parte integrante da revolução socialista, que para a IV "pablista" não estava, nem de longe, colocada naquela região.

Os herdeiros mais ligados ao espólio do pablismo, reunidos no Secretariado Unificado, ao longo de sua existência, sempre trataram de legitimar a existência de Israel, sob os jargões do pacifismo pequeno-burguês. No mais recente conflito militar da região, a guerra do golfo, quando o Iraque era covardemente bombardeado pelo imperialismo ianque, murmuram o slogan da "paz", igualando uma nação oprimida ao agressor imperialista, justificando essa política criminosa em nome do caráter autoritário do regime de Sadam Hussein no Iraque. Trotsky definiu assim a posição dos revolucionários diante de uma guerra dessas características: "Em uma guerra entre uma república democrática imperialista civilizada e uma monarquia bárbara e atrasada de um país colonial, os socialistas devem estar inteiramente do lado do país oprimido, apesar de ser monárquico, e contra o país opressor, por mais democrático que seja" (León Trotsky, História da Revolução Russa, tomo 2). A derrota do Iraque, apoiado pelo povo palestino, significou um grande avanço da penetração imperialista em todo o Oriente Médio. Para o SU, o mais importante segue sendo a "democracia" e a "pacificação" de todos os conflitos do Oriente Médio. Não é nenhuma surpresa que estejam na linha de frente do apoio aos "acordos de paz" com o sionismo, convertendo-se na cauda política da OLP.

Os morenistas, agrupados na cambaleante LIT, caracterizam-se pelas enormes capitulações às direções nacionalistas e pequeno-burguesas dos povos árabes, o que, aliás, não é um privilégio de sua política somente para esta região. Para Nahuel Moreno, até as manifestações racistas da burguesia árabe são progressivas, chegando, ele mesmo a afirmar: "Hoje o racismo árabe é progressivo, destrói o Estado sionista" (Correio Internacional, nº 28). Até é possível afirmar que o nacionalismo árabe pode ser uma expressão "progressiva", ainda que muito limitadamente, quando se enfrenta com o imperialismo ou seu enclave sionista de Israel. Esta posição é completamente oposta a apoiar as expressões mais reacionárias das velhas classes dominantes do Oriente Médio, ou seja, o racismo e o fundamentalismo islâmico, que embotam a consciência das massas em luta, impedindo a unidade dos trabalhadores judeus e palestinos, para enfraquecer, desde o seu interior, o Estado de Israel.

A LIT assume, como seu, o programa de fundação da OLP, defendendo que "o estabelecimento de um Estado Palestino, laico, democrático, e não racista, poderá extirpar do Oriente Médio, a opressão, destruição e a guerra" (Correio internacional, nº 52). Uma coisa é nos colocarmos do mesmo lado militar da OLP (evidentemente, antes de sua capitulação ao sionismo) ou de qualquer outra organização que lute contra o enclave imperialista de Israel e, nesse sentido, os revolucionários não impõem nenhuma condição, política ou programática para estarem deste lado da barricada. O que não significa de nenhuma forma que devam rebaixar ou mesmo anular seu programa em favor da plataforma democrático-burguesa das direções nacionalistas ou pequeno-burguesas do povo palestino.

O capitalismo em sua atual fase de decadência imperialista concentra em uma única etapa, uma série de questões do seu desenvolvimento histórico. A resolução de uma pendência nacional milenar, como no caso da palestina, esbarra com os estreitos limites do capitalismo dependente na região. É tarefa dos revolucionários a incorporação das reivindicações nacionais, não a um programa burguês, como faz a LIT, e sim à dinâmica geral da revolução socialista. O Programa de Transição, analisando a tarefa dos trotskistas nos países atrasados, define da seguinte forma suas responsabilidades: "Os países coloniais e semi-coloniais são, por sua própria natureza, países atrasados, mas esses países são parte de um mundo dominado pelo imperialismo... Do mesmo modo são determinados os esforços políticos do proletariado dos países atrasados: a luta pelas tarefas mais elementares da independência nacional e da democracia burguesa é combinada com a luta socialista contra o imperialismo mundial." (Programa de Transição - Os países atrasados e o programa de reivindicações transitórias, León Trotsky)

A falência, comprovada historicamente, do conjunto das variantes nacionalistas e pequeno-burguesas (nasserismo, OLP), fizeram crescer enormemente movimentos anti-sionistas de caráter fundamentalista islâmico, reafirmando mais do que nunca a necessidade em construir um partido que aspire elevar-se à condição de direção revolucionária das massas palestinas. A maturação de um programa que inscreva a defesa de uma Palestina Soviética, baseada em conselhos de operários e camponeses palestinos e judeus é a única forma de soldar a aliança dos trabalhadores por cima das nacionalidades no marco de um regime socialista que elimine a propriedade privada dos meios de produção.

A capitulação dos morenistas ao programa democrático-burguês significa, em última instância, uma traição ao próprio povo palestino, já que a realização de sua pátria, não virá pelas mãos do capitalismo putrefato, incapaz de satisfazer as reivindicações mais elementares dos povos oprimidos.

Sem a menor sombra de dúvidas, foi o Altamirismo quem mais operou ziguezagues no que tange à questão palestina e ao Estado de Israel. A finada TQI (Tendência Quarta Internacionalista), uma composição sem princípios entre o Partido Obrero e o POR de Guillermo Lora, chegou a estabelecer um pequeno núcleo de militantes no Oriente Médio, chamado de Liga Operária Palestina, LOP. Durante este período, adotaram posições muito próximas do morenismo, quando afirmavam: "a única saída histórica viável é uma república democrática na Palestina baseada na destruição do Estado sionista" (Causa Operária, nº 76).

A inconsistência política da TQI, logo a fez explodir, arrastando a LOP para o desaparecimento enquanto organização trotskista na Palestina. Altamira e seu Partido Obrero começaram também a mudar de posições, enxergando o sionismo com outros olhos...

Com a ascensão dos grupos islâmicos como direção política da chamada "causa palestina", protagonizando atentados terroristas no mundo inteiro, e em particular alguns na Argentina, o Partido Obrero vê que seu apoio à destruição do Estado de Israel, poderia afetar suas tão sonhadas pretensões eleitorais (Altamira é eterno candidato do PO seja qual for a eleição). Quando do brutal atentado à AMIA (Associação de Ajuda Mútua aos Judeus) em Buenos Aires, o PO não só compareceu, como também convocou, entusiasticamente, em conjunto com a embaixada israelense e os sionistas portenhos, uma caminhada em apoio ao Estado de Israel, exigindo por parte do governo Menem medidas repressivas enérgicas contra os possíveis responsáveis pelo atentado, ou seja, ativistas vinculados de alguma forma a organizações que lutam contra o enclave terrorista de Israel.

Longe de ser uma calúnia ou um exagero de nossa parte é o próprio PO que reivindica sua atitude: "O Partido Obrero foi a única corrente de esquerda que não só participou do ato contra o atentado, mas também chamou a fazê-lo com antecipação....No dia 20, garantimos a mobilização do nosso partido no ato, destacando a consigna: ‘a autêntica solidariedade é fazer justiça’, por sua relação com a consigna histórica ‘ justiça e castigo para todos os culpados" (Prensa Obrera, nº 424). Parece inacreditável, mas o PO e Altamira exigem que Menem "faça justiça" e o criticam pela lentidão como age no caso. Seria possível acreditar que alguém que se diga "revolucionário" pode confiar ao Estado burguês e seus tribunais a tarefa de "fazer justiça" contra organizações ou militantes que se utilizam do método equivocado do terrorismo, como forma de luta política? Parece que Menem ouviu os reclamos do PO, utilizando o atentado da AMIA para criar a Super-Secretaria de Segurança, um organismo voltado à repressão do movimento operário e popular argentino.

A posição assumida pelo Partido Obrero no caso AMIA, gerou o repúdio da vanguarda de esquerda na Argentina, o que lhe obrigou a uma série de retificações teóricas em seu arsenal programático. Segundo Altamira, o Estado sionista de Israel não seria mais um enclave do imperialismo na região, passando agora à condição de semicolônia oprimida, da mesma forma que os outros países do Oriente Médio. Em polêmica com o MAS, vejamos qual é a afirmação do PO sobre o caráter do Estado de Israel: "Que Israel é um Estado terrorista como afirma o MAS, no Solidariedade Socialista nº 479, é uma afirmação justa, mas dentro de determinadas condições." (Prensa Obrera, nº 426) para depois concluir: "O Estado de Israel é uma nação artificialmente criada por um acordo internacional entre o imperialismo norte-americano e a burocracia russa, que nasceu como uma semi-colônia ianque....É também o caso do Líbano que até 1975 foi uma colônia do imperialismo francês."(idem)

É o caso mais espetacular de mudança de posição que se tem conhecimento no movimento trotskista dos últimos 50 anos. Israel passa a ser considerada como uma semicolônia do imperialismo ianque, igual ao Líbano ou outros países oprimidos. Desta forma, o conflito palestino versus Estado sionista torna-se um conflito de iguais. "Pena" que os palestinos não tenham recebido mais de 500 bilhões de dólares em ajuda financeira e militar do imperialismo ianque, sem falar das armas nucleares estacionadas em território israelense apontadas para as cabeças de todos os povos árabes. Quais seriam as "determinadas condições" que o Estado de Israel, após exterminar mais de cem mil palestinos e árabes em todas suas beligerâncias pela região, deixaria de ser terrorista? Cabe ao próprio PO responder aos combatentes palestinos que impunham a resistência heróica da intifada.

Existem ainda alguns setores revolucionários e verdadeiramente internacionalistas do movimento trotskista, que a partir de uma crítica correta aos "acordos de paz", considerados como incapazes em "eliminar o massacre palestino", sacam conclusões equivocadas diante do embate real entre o povo palestino e suas organizações com o enclave terrorista a serviço do imperialismo ianque. Acreditam que "apoiar a substituição do Estado de Israel por um Estado burguês palestino é equivalente à idéia de atirar judeus ao mar". Se dermos conseqüência a afirmações desse tipo, concluiremos que a posição que o proletariado deveria tomar diante de todas as guerras sionistas contra os povos árabes, assim como da intifada dirigida hoje majoritariamente por organizações fundamentalistas islâmicas, seria a posição do derrotismo, ou seja, a derrota de ambos os lados em todos esses conflitos. Embora defendam a "necessidade de destruir o Estado racista de Israel não "enxergam" de que ponto concreto poderemos aplastar o Estado de Israel. Se é bem verdade que as burguesias e monarquias árabes já mostraram-se completamente impotentes, do ponto de vista político e militar para derrotar Israel, de modo algum significa que entre o enfrentamento de uma nação oprimida e outra montada como máquina de guerra do imperialismo na região podemos assumir a neutralidade ou o derrotismo. A intifada, hoje, é a ponta de lança para o povo palestino derrotar o sionismo. Renunciar nosso lado nessa trincheira, em nome do caráter reacionário do Hamas ou do Jihad é colocar-se objetivamente, independentemente das proclamações contra Israel, de malas e bagagens no campo militar do sionismo e seu regime assassino. O apoio dos revolucionários à legítima reivindicação da pátria palestina, que só poderá realizar-se plenamente sobre os escombros de Israel, é incondicional e independente da sua direção política, por mais reacionária e teocrática que esta seja.

Ficando à margem da luta concreta do povo palestino, idealizando a "pureza" de uma revolução, sem mediações táticas como a formação de frentes únicas de ação como fez Lênin para aplastar Kornilov e a partir de abstrações como "Estado operário do Oriente Médio", sem nenhuma referência à luta da nacionalidade oprimida, o partido revolucionário jamais poderá credenciar-se como uma verdadeira direção de massas que se reserva o direito de lutar com métodos próprios da classe operária (greves, insurreições), mas a partir do mesmo campo militar da guerra contra o gendarme imperialista de Israel.

A vitória do povo palestino, mesmo na hipótese de uma direção burguesa, sobre Israel, significaria um enorme impulso em todas as lutas proletárias do planeta contra o imperialismo e, em particular, a ante-sala da revolução socialista no próprio Oriente Médio.

POR UMA PALESTINA SOVIÉTICA BASEADA EM CONSELHOS DE OPERÁRIOS E CAMPONESES PALESTINOS E JUDEUS

A "devolução" de algumas cidades nos territórios ocupados pelo exército israelense para as mãos da OLP, a converteu definitivamente em agência policial sionista do seu próprio povo. Já são freqüentes os enfrentamentos entre a OLP e os ativistas da intifada, resultando no encarceramento de várias lideranças do Hamas e Jirad. A completa falência política da estratégia pequeno-burguesa da OLP evidencia enormemente a necessidade da construção imediata de um partido operário revolucionário no seio das massas palestinas, cuja primeira tarefa passa por uma profunda delimitação programática com todas as variantes nacionalistas, pequeno-burguesas e teocráticas.

A questão determinante no atual momento, é saber qual será o destino da intifada, ou seja, como transformá-la em um ponto de apoio na derrota do gendarme imperialista de Israel, o que passa obrigatoriamente por sua capacidade em galvanizar um amplo movimento de massas, combinando greves operárias, marchas populares, ações militares, tendo como objetivo a sublevação das grandes cidades árabes e israelenses e a conquista do poder.

Para que isto torne-se uma possibilidade real, dois elementos são chaves. O primeiro, a saber, é a edificação da unidade entre os trabalhadores palestinos dos territórios ocupados com os trabalhadores árabes, palestinos e judeus das grandes metrópoles israelenses como Jerusalém, Haifa e Tel Aviv. Os operários judeus mais pauperizado são, na sua grande maioria, de origem sefaradim (árabes), pouco integrados ao regime econômico sionista, ao contrário da aristocracia arquenazim (judeus de origem européia) ou os colonos nazi-sionistas dos assentamentos agrícolas. Esta unidade deve ser construída sob a base de organizações operárias comuns, opostas pelo vértice à estrutura sindical oficial, dominada pela burocracia do partido trabalhista. Sem a efetiva aliança entre o proletariado árabe, palestino e judeu, tendo como eixo comum, a demolição do regime capitalista e racista de Israel, a intifada pode estar definitivamente condenada a ações isoladas, ainda que de brava resistência, mas que nunca apontarão suas armas no coração do monstro.

O segundo elemento, diz respeito à denúncia política sistemática das direções fundamentalistas islâmicas ou frente-populistas guerrilheiras (FPLP), que hoje dirigem a intifada, em função da capitulação histórica da OLP. Estes grupos, cada vez mais isolados das ações de massas, compreendem a luta contra Israel única e exclusivamente do ponto de vista de ações militares, servindo de barganha para as burguesias árabes (Síria, Irã, Iraque) negociarem em melhores condições acordos territoriais com o Estado de Israel, o que coloca a possibilidade de a qualquer momento também aceitarem algum acordo podre como fez a OLP. Seu objetivo em proclamar uma república fundamentalista da Palestina, é completamente reacionário do ponto de vista dos interesses históricos do proletariado, o socialismo, debilitando profundamente a unidade dos trabalhadores de todo o Oriente Médio, independentemente da raça ou credo religioso. Vale enfatizar, porém, que apesar da necessidade do estabelecimento de uma vigorosa delimitação com estas organizações, os revolucionários as combatem a partir do ângulo da inutilidade de suas ações para a revolução proletária, e nunca ao lado do Estado sionista, nem tampouco do imperialismo mundial. Condenamos energicamente a repressão descarregada por qualquer Estado burguês, seja os EUA ou Argentina, sobre os ativistas destas organizações, mais ainda, entre os constantes enfrentamentos do enclave sionista e o Hamas, estamos no campo militar deste último, subordinados à disciplina do nosso próprio programa e estratégia.

As ilusões que poderiam ser despertadas com a farsa dos acordos de paz, sobre os setores da população mais castigados e céticos por longos anos de sofrimento, se desfizeram antes mesmo de alcançarem alguma envergadura. A humilhação permanente dos sionistas sobre a malfadada "autoridade nacional palestina" tem contribuído em muito para isso. A tensão revolucionária que permeia a Palestina ocupada não conseguiu ser quebrada nem pela violenta reação militar, tampouco pelo pacto OLP-sionismo. Está aberta toda uma etapa, marcada pela resistência e grandes lutas que rapidamente porão abaixo o acordo traidor, colocando como centro a conquista de um verdadeiro Estado nacional.

A única alternativa que poderá dar uma resolução cabal à legítima reivindicação nacional do povo palestino, assim como livrar as massas e trabalhadores da região de seus gigantescos sofrimentos ao longo de vários séculos, é a defesa de uma Palestina Soviética baseada em conselhos de operários e camponeses palestinos e judeus. A expropriação do grande capital sionista, alimentado em décadas pelo imperialismo ianque, impossível de ser conquistada sem a destruição do Estado de Israel, garantirá a reconstrução da Palestina sob novas bases, trazendo para seu povo o progresso e a paz tão almejada durante mais de 50 anos de guerra de rapinagem imperialista na região.

O fracasso completo do chamado pan-arabismo claudicante em relação a Israel, revelou a impossibilidade em selar a unidade dos povos orientais sob a batuta do nacionalismo e do capitalismo tardio, dependente do imperialismo mundial. O máximo aonde as burguesias árabes chegaram foi na formação de um cartel petrolífero, a OPEP, preocupada em cuidar de seus próprios interesses às costas das necessidades mais elementares das massas exploradas. A verdadeira unidade de todos os povos milenares que habitam esta região, só será possível no marco de uma Federação Soviética das Repúblicas Socialistas Árabes. Cabe ao partido mundial da revolução proletária, a IV Internacional, conduzir essa tarefa até a vitória final.