terça-feira, 26 de novembro de 2013


Honduras: Do golpe “constitucional” de 2009 ao atual golpe “eleitoral” patrocinado pelo imperialismo ianque contra a centro-esquerda burguesa!

As feridas do golpe “constitucional” cívico-militar contra o presidente Manuel Zelaya, deposto em junho de 2009 pouco antes da realização de um referendo para a mudança na Constituição do país que entre outros temas abordaria a possibilidade da reeleição presidencial, estão mais abertas do que nunca em Honduras. Os resultados oficiais das eleições presidenciais ocorridas neste domingo, 24 de novembro, são expressão de uma grotesca fraude eleitoral para impedir que sua esposa, Xiomara Castro, candidata pelo Partido Libre (Liberdade e Refundação) seja proclamada presidente. A mafiosa cúpula do TSE claramente manipulou os resultados da apuração declarando-o “irreversível” para permitir que o candidato governista Juan Orlando Hernández, do PN (Partido Nacional) se declarasse antecipadamente eleito, tentando assim impor um fato consumado. Até agora, pouco mais de 60% das urnas apuradas, Hernández estava à frente com 34,14% dos votos seguido por Xiomara com 28,43%. Poucos minutos após o primeiro boletim do TSE, o candidato direitista se declarou ganhador. Sua vitória foi reconhecida imediatamente pelos presidentes do Panamá, Ricardo Martinelli, e da Colômbia, Juan Manuel Santos, dois homens que representam abertamente as posições da Casa Branca na América Latina. Já a embaixadora dos Estados Unidos, Lisa Kubiske, cinicamente disse ter visto “um processo transparente” em um claro apoio a fraude em curso. De acordo com a denúncia apresentada pelo ex-presidente Manuel Zelaya, o TSE não havia computado entre 19 e 20% das urnas por supostas anormalidades e inconsistências, justamente um total de quase 400 mil votos com o objetivo de alterar os resultados. Zelaya declarou que “Proclamo que não aceitamos os resultados do Tribunal Supremo Eleitoral. Se for necessário, iremos às ruas defender nossos direitos, como sempre fizemos. Protestamos contra esse resultado e o rechaçamos, porque nossas pesquisas de boca de urna e nossa contagem de atas confirmam que Xiomara ganhou a Presidência da República com mais de 3%”. Este cenário, que vem se tornando regra em toda a América Latina demonstra claramente uma ofensiva da direita, apoiada pelo imperialismo ianque, contra os governos da centro-esquerda burguesa, como no Paraguai mais recentemente, que vem demonstrando a completa incapacidade, pelo seu caráter de classe, de resistir consequentemente a estas investidas reacionárias!

Segundo Rixi Moncada, representante do Partido Libre no Conselho Consultivo do TSE, existe uma manipulação dos dados reais e uma fraude descarada para favorecer um dos candidatos: “Há mais de 1.900 atas de departamentos (estados) onde o Libre ganha contundentemente que não foram incorporadas ao sistema de contagem, mas transferidas a um denominado procedimento de escrutínio especial”. Moncada garantiu ter informes fidedignos que provam que foram introduzidos ao sistema de contagem “atas via escanner de lugares onde o escrutínio ainda não tinha sido concluído”. No Brasil este sistema fraudulento é ainda mais “eficiente” com o uso da urna “roubronica” que pode alterar os resultados através do software de totalização dos votos. Tanto Moncada como o candidato à vice-presidência, Enrique Reyna, disseram ainda que o que aconteceu neste domingo foi “uma clara fraude frente à vontade popular que, sem dúvidas, está sendo alterada através da transmissão irregular de resultados”. Reyna afirmou também que representantes das MER (Mesa Eleitoral Receptora) tinham atrasado o envio de atas onde ganha o Libre, para assim atrasar o aumento da vantagem. Além disso, ele acusou o TSE de “não contabilizar atas onde ganhamos e que estranhamente foram escanneadas com a ponta dobrada, para ocultar o número. Essas são as que foram enviadas para auditoria”. O ex-presidente Zelaya assinalou que um cálculo matemático pode estabelecer que, mediante o procedimento, mais de 400 mil votos foram excluídos dos resultados preliminares anunciados pelo TSE. Além disso, o ex-presidente do tribunal, Arístides Mejías disse que os membros do instituto aplicaram o truque de dar preferências arbitrariamente às atas nas quais o Partido Nacional vai à frente. Já Juan Barahona, primeiro candidato à vice-presidência e subcoordenador da FNRP (Frente Nacional de Resistência Popular) fez um chamado aos representantes do Libre para que “não abandonem as urnas e cuidem dos votos”. Ao mesmo tempo, pediu aos militantes e simpatizantes do partido “estar atentos e atentas a qualquer chamado feito pelo Libre”, declarando que “Este povo está disposto a defender esta vitória pela via legal, pela via diplomática, mas também nas trincheiras nas quais sempre estivemos nas ruas. Aqui ninguém se rende, ninguém, companheiros”. Por seu turno, o candidato governista Juan Orlando Hernández, do PN (Partido Nacional) disse que conseguiu seu triunfo nas urnas e que “não vai negociar com ninguém”, rechaçando as denúncias de fraude: “A voz do povo é a voz de Deus, passamos aos grandes acordos nacionais”, disse, ao reconhecer que a nova formação do Congresso vai incluir pelo menos dois partidos novos, entre eles o de Xiomara. “Já que o povo escolheu, vamos trabalhar”, disse, ao anunciar que nomeou uma comissão para a transição de governo: “Hoje anunciamos a todos os hondurenhos que amanhã começamos a trabalhar em um pacto nacional por uma vida”. Já a embaixadora dos Estados Unidos, Lisa Kubiske, cinicamente disse ter visto “um processo transparente” em um claro apoio à fraude em curso, que tem o aval dos generais da FFAA que deram o golpe “constitucional” em Zelaya há quatro anos. Em 2009, ele foi preso pelo Exército, pouco antes da realização de um referendo para a mudança na Constituição do país que entre outros temas abordaria a possibilidade da reeleição presidencial. A ação foi orquestrada pela Justiça e o Congresso Nacional, sendo executada por um grupo de militares que o expulsaram para a Costa Rica.

O Partido Libre está sendo vítima de sua própria política burguesa covarde, que marca a trajetória de Zelaya. Em junho de 2011, o presidente deposto retornou ao país com parte de um “acordo de reconciliação” celebrado com o atual presidente golpista Porfírio Lobo e patrocinado pelos governos da Venezuela e Colômbia. Este pacto reacionário, orquestrado pelo chavismo, permitiu que o governo parido da fraude eleitoral de 2011, montada após o golpe, responsável por assassinar barbaramente centenas de lutadores, fosse reconhecido por todos os organismos internacionais, inclusive com a reintegração de Honduras à OEA. O acordo também indicou a realização de eleições para este mês de novembro de 2013, tendo a participação eleitoral inclusive da Frente Nacional de Resistência Popular (FNRP) que, legitimando esta nova farsa, transformou-se em partido político e integrou uma frente ampla burguesa de oposição encabeçada pelo próprio Zelaya e sua esposa, escolhida como candidata justamente para em busca de um acordo político com os golpistas, já que Manuel Zelaya seria o candidato natural a presidente. Esse é o trágico desfecho provocado pela política de colaboração de classes da FNRP, apresentada até pouco tempo atrás por todo arco revisionista do trotskismo (LIT, PTS, PO) como embrião de um “novo poder” revolucionário em Honduras, tanto que foi saudada pelas correntes mais delirantes como a vanguarda de uma “insurreição” que estava em curso no país centro-americano.

Depois de celebrado o acordo arquirreacionário, Zelaya defendeu publicamente o retorno do país à OEA e o reconhecimento pela chamada “comunidade internacional” do atual governo de Porfírio Lobo, inclusive encobrindo cinicamente os crimes do regime golpista cívico-militar em curso no país. O oligarca, que se reclama “bolivariano”, afirmou: “O acordo permite criar as bases para a reincorporação de Honduras, com pleno direito, à comunidade internacional... É recíproco: se o governo e o presidente Lobo reconhecem os direitos democráticos que foram violados, a comunidade internacional tem obrigação de reconhecer o governo do presidente” (O Estado de São Paulo, 02/06/11) e arrematou: “Meu regresso é um passo importante para a reconciliação de Honduras e para honrar a luta mantida pelo povo pela democracia desta nação” (idem). Mediado na época por Chávez e Santos, como parte da política do presidente venezuelano de buscar cada vez mais uma aproximação com o imperialismo ianque, o acordo hondurenho previu o reconhecimento da FNRP como partido político, em uma clara medida de tornar a Frente uma fiadora do regime golpista parido das urnas no final de 2009. Tanto que a criação do partido está respaldada pelo ponto 6 do “Acordo para a Reconciliação Nacional e Consolidação do Sistema Democrático na República de Honduras”, assinado por Zelaya e Porfírio Lobo, que amarrou politicamente a Frente a ser avalista da farsa em curso, determinando “Velar pelo cumprimento de todas as garantias que a lei concede para que a Frente Nacional de Resistência Popular solicite sua inscrição ante o Tribunal Supremo Eleitoral e participe democraticamente nos processos políticos eleitorais de Honduras”, dispõe o documento. A transformação da FNRP em um partido de centro-esquerda foi parte da estratégia de Zelaya em estabelecer uma ampla coligação burguesa em apoio à candidatura de sua esposa nas atuais eleições de 2013. Tanto que o presidente deposto anunciou no aniversário do golpe de Estado o lançamento da candidatura de Xiomara, declarando sua completa submissão ao novo regime: “A única forma de fazer justiça em Honduras é nas urnas e é com o voto popular, para estabelecer um projeto político transparente de uma frente ampla” (Vermelho, 28/06).

Aos marxistas leninistas cabe mais uma vez a tarefa de denunciar a fraude desatada pelo governo golpista, o TSE e o imperialismo ianque, demonstrando que a oposição democrática burguesa encabeçada por Zelaya e a burocracia sindical na direção da Frente de resistência, tragicamente colaboraram para a consolidação da estratégia da oligarquia golpista e da Casa Branca, sabotando a reação operária em favor de negociações sob os auspícios da Casa Branca. Para barrar efetivamente a fraude faz-se necessário que os trabalhadores saiam às ruas para derrotar seus inimigos de classe. Mas desgraçadamente não é esta a política de Zelaya e Juan Barahona. A perspectiva revolucionária passa fundamentalmente por construir uma alternativa de poder dos trabalhadores, forjando no interior da vanguarda classista o embrião de um autêntico partido revolucionário. Nesse combate, é necessário ter como estratégia a defesa de um Governo Operário e Camponês em Honduras, única via capaz de libertar o país da dependência econômica norte-americana, parido como parte da luta pela revolução proletária mundial, que exproprie a burguesia em todas as suas facetas e derrote o imperialismo no continente!