sexta-feira, 3 de maio de 2013


Greve de ocupação dos metalúrgicos de Osasco em 1968: primeira grande reação operária contra a ditadura militar e um contraponto político ao “foquismo”

Morreu nesta terça-feira, aos 66 anos, José Ibrahim, líder da greve operária de Osasco em 1968, a frente do Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos de Osasco, um dos primeiros movimentos de resistência operária à ditadura militar. Após a greve, Ibrahim foi perseguido pelos gorilas de farda e ingressou na Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). Preso, foi torturado e mais tarde integrou o grupo de 15 presos políticos trocados pelo embaixador dos EUA Charles Burke Elbrick em setembro de 1969. Ele viveu dez anos no exílio, voltando ao Brasil ajudou a fundar o PT, mas foi gradativamente girando à direita ao ponto de hoje estar filiado ao PSD de Kassab e coordenar a UGT, central “chapa branca” de direita. A morte de José Ibrahin nos faz remontar 1968, quando paralelamente às manifestações estudantis, a luta contra os baixos salários fez explodir a greve dos metalúrgicos de Contagem (MG), em 16 de Abril, brutalmente reprimida. Logo depois, em Osasco (SP), a greve metalúrgica teve início em 16 de Junho, resultou na ocupação da fábrica Cobrasma (Companhia Brasileira de Materiais Ferroviários) pelos operários. A violenta repressão das Forças Armadas faz mais de 400 operários presos. O enfrentamento dos operários com as forças de repressão do regime faz com que essas greves não tenham apenas um caráter econômico, mas assuma uma forma nítida de protesto contra o regime militar. Esses episódios constituíram as primeiras grandes iniciativas do movimento de massas contra a ditadura e uma prova que era possível resistir aos gorilas pela via da luta operária, um contraponto político ao “foquismo” adotado pela maioria das organizações de esquerda da época.

A orientação burguesa do PCB e sua capitulação frente ao golpe militar provocaram uma série de rupturas políticas em suas fileiras. A paralisia do stalinismo oficial gerou um leque de organizações políticas (ALN, PCBR, VPR, VAR-Palmares), as quais expressando uma resposta desesperada da pequena-burguesia radicalizada, buscaram o caminho do foquismo e da luta guerrilheira para combater a ditadura militar. Reivindicando praticamente o mesmo programa etapista e stalinista do PCB, mas criticando sua tática de integração sindical e parlamentar ao regime burguês e, depois, a ação conjunta com a própria oposição civil à ditadura militar, essas organizações políticas viraram as costas para o trabalho sistemático de organização da classe operária nas fábricas e seguiram o caminho da luta armada praticada por pequenos focos de militantes, tanto através da guerrilha urbana, como por meio da guerrilha rural. Não por acaso, a esmagadora maioria dessas organizações estaria dizimada uma década após o golpe de 64. Essa orientação foi ainda mais desastrosa na medida em que setores da classe operária e do movimento estudantil ainda resistiam à ditadura militar até 1968. São exemplos desse combate das massas, a greve dos trabalhadores metalúrgicos de Contagem e Osasco, inclusive com ocupação de fábrica e a manifestação do 1º de Maio em São Paulo.

Em oposição ao oportunismo do PCB e ao foquismo pequeno-burguês de suas dissidências, a posição correta dos marxistas revolucionários diante do golpe militar deveria ser a defesa da formação de uma frente única proletária abarcando todos os agrupamentos operários revolucionários, capaz de tornar-se a espinha dorsal de um poderoso movimento de massas para a reconquista das liberdades sindicais, operárias e democráticas (partidos, sindicatos, imprensa, direito de reunião) estranguladas pela ditadura militar. Somente a retomada da iniciativa política da classe operária em torno da defesa de suas reivindicações políticas e econômicas e por meio de comitês de frente única, que unisse o trabalho revolucionário legal e ilegal, poderia consequentemente, inclusive, arrastar para a luta contra o regime de exceção amplos setores da pequena burguesia radicalizada, projetando as lutas operárias em curso, através da construção de comissões de empresas e de oposições sindicais para desbancar os agentes do capital da direção do movimento operário.

Como resposta à reação operária e ao recrudescimento da luta armada, em 13 de dezembro de 1968, o regime da ditadura militar, instituído pelo golpe fascista de 1º de abril de 1964, impôs o mais cruel dos Atos Institucionais, o AI-5 que, além de reeditar todas as medidas autoritárias do AI-2 de 1965 – intervenção nos estados e municípios, supressão de direitos políticos e cassação de mandatos parlamentares, suspensão de liberdades democráticas como o direito de livre manifestação e expressão, direito de greve, etc. – retirou também o direito de habeas corpus para os chamados “crimes” contra a famigerada Lei de Segurança Nacional. A intensificação da repressão política, a partir da instauração do AI-5, foi uma reação da ditadura militar diante do crescimento das manifestações de massas contra o regime. Acompanhando a onda revolucionária mundial de 1968, a classe operária e a juventude protagonizaram naquele ano importantes lutas contra a ditadura. No final de março, na repressão a uma manifestação estudantil no Rio de Janeiro, a polícia assassinou um jovem estudante de 17 anos, Edson Luis, provocando grandes manifestações de protesto contra a ditadura. Quatro dias depois, nova repressão policial às manifestações estudantis no Rio de Janeiro, matou o estudante José Aprígio e o escriturário David Neiva, deixou dezenas de feridos e mais de 200 presos. As manifestações estudantis contra o regime e sua política educacional culminaram na histórica passeata dos Cem Mil em junho de 68.

Naquele, momento histórico, infelizmente, faltou ao proletariado e à juventude um instrumento de centralização e direção política, o partido revolucionário capaz de assegurar a unidade do movimento em torno de um programa que apontasse a necessidade de derrotar a ditadura através da ação direta das massas, abrindo o caminho para a revolução proletária e o socialismo. As organizações de esquerda, que se multiplicaram desde que o stalinismo (PCB) tomou a posição traidora de não organizar a resistência ao golpe de 64, acreditavam, em geral, que a derrota de 64 devia-se mais à suposta incapacidade dos métodos de luta da classe operária do que à política de colaboração de classes do stalinismo e sua aliança com os chamados setores progressistas e nacionalistas da burguesia. Dessa forma, a maioria dessas organizações, sob a influência do foquismo, optou pela ação guerrilheira apartada das massas. Algumas delas, como o PCdoB, que empreendeu a Guerrilha do Araguaia, tomaram o caminho da “luta armada”, defendendo a estratégia política do etapismo stalinista.

O regime de exceção interrompeu o processo de evolução política e ideológica do proletariado e do campesinato pobre brasileiro e acabou por dar início à liquidação do PCB como partido hegemônico no movimento operário, em função de sua própria capitulação política. O combate à ditadura passou para as mãos das organizações políticas que defendiam a luta armada (ALN, MR8, PCdoB etc.). A resistência da pequena burguesia à ditadura por meio de grupos foquistas, e seu consequente fracasso nesta tarefa, reafirmam que só a classe operária organizada e armada por um programa revolucionário é capaz de derrotar a sanha militar pró-imperialista. A derrota das massas diante do golpe militar de 1964 e a ulterior imposição da ditadura por mais de 20 anos não eram inevitáveis, deveu-se não só à força política e militar da burguesia e do imperialismo, mas à traição da esquerda stalinista associada a direções nacionalistas burguesas. A ditadura militar assentou as bases econômicas para a destruição do parque industrial nacional em favor dos monopólios ianques, orientando a produção para o mercado externo, processo de rapina que se mantém até hoje, sob a égide do governo de frente popular petista, herdeiro da política de colaboração de classes do velho PCB.