PT: 36 ANOS DE UMA TRAJETÓRIA DE COLABORAÇÃO DE CLASSES E UM
INCERTO DESAFIO DE SER ACEITO COMO MAIS UM PARTIDO BURGUÊS NO SEIO DA ELITE
DOMINANTE
Por: Candido Alvarez
Fundador e ex-membro do
diretório do PT
O PT acaba de completar 36 anos de existência política em
meio a maior crise de sua história, seu mais profundo "inferno
astral". Como fundador do partido e antigo membro de sua direção, posso
dar um testemunho vivo de toda sua trajetória de colaboração de classes, desde
o ácido debate acerca de sua plataforma fundacional, passando pela disputa das
primeiras eleições em 1982 e a vitória para uma prefeitura de capital em
1985(Fortaleza), até o esgotamento do ciclo do gerenciamento estatal iniciado
em 2003. A Fundação Perseu Abramo, presidida pelo economista Marcio Pochmann,
acaba de realizar um seminário cujo tema foi "36 anos de PT: trajetória e
desafios", exatamente na busca de uma explicação para a atual crise do
partido e uma possível saída "honrosa". Afirmamos que a resolução do
complexo impasse político do PT ainda está muito distante e o que é pior sem
garantia alguma de um desfecho minimamente razoável para o partido. Não falamos
simplesmente da expectativa dos resultados das eleições de 2016 e 2018, sem
dúvida nenhuma muito importantes para o futuro imediato da legenda, mas sim da
variante histórica de um colapso definitivo do PT caso este não consiga ser
"assimilado" no seio das classes dominantes. Este é o ponto fulcral
da profunda crise política do PT, mesmo gerenciando o Estado burguês a mais de
doze anos em favor das corporações capitalistas, não conseguiu ser admitido no
promíscuo clube dos partidos tradicionais da ordem institucional, e hoje seus
"parceiros" comerciais burgueses são caçados como "marginais e
bandidos perigosos" apesar de representarem uma fatia muito significativa
do PIB nacional. Práticas absolutamente ordinárias e seculares na relação entre
partidos burgueses e grandes empresas, as comissões ou chamadas de
"propinas" pela midiotas, hoje se firmadas pelo governo do PT
representam o "maior delito nacional": O execrável mal da corrupção!
Parece que pouco adianta Lula repetir a exaustão que é um liberal e nunca foi
socialista, nem a esquerda petista e tampouco a direita burguesa lhe dão
ouvidos... Entretanto o inusitado paradoxo que perpassa a "crise
existencial" do PT é um produto acumulado de suas próprias dubiedades ao
longo de sua vida política, um partido que estampa no nome a independência de
classe e ao mesmo tempo desde sua origem rejeita categoricamente os desafios
programáticos do proletariado, como o socialismo revolucionário. Logo nos
primeiros debutes eleitorais de 1982,1985 e 1988 descartam alianças políticas com
outros partidos burgueses, para em seguida governarem municípios favorecendo
grandes empresas, principalmente no ramo do transporte urbano. Depois vieram os
governos estaduais em 90, 94 e 98, o "véu" da independência de classe
caiu por completo com as gestões voltadas para o capital em detrimento das
demandas populares. Já não poderia haver a menor sombra de dúvida que a vitória
presidencial de 2002 marcaria o início de um governo central capitalista,
lastreado na política de colaboração de classes. A Frente Popular no comando do
Estado Burguês, favorecida pela conjuntura econômica internacional impulsionou
grandes negócios e créditos para a burguesia tupiniquim, o PT entrou
definitivamente no rol dos partidos que empreendiam campanhas eleitorais
milionárias (talvez bilionárias até), mas passado o ciclo temporal do binômio
"crédito/consumo" se vê agora rejeitado como um partido burguês
bastardo e ironicamente responsabilizado por parte das elites dominantes pela
"formação do caráter corrupto dos maus brasileiros". Sem ainda
entender bem o motivo de tanta "traição e ódio" da parte dos que
tanto se beneficiaram com seus governos, o PT promove seminários e simpósios
nestes 36 anos de vida inutilmente buscando uma explicação "moral" para
sua "rejeição parental", quando na verdade a questão remonta a própria
luta de classes!
Candido Alvarez, Secretário-Geral da LBI, ao lado de Antonio Sombra, dirigente da TRS, em campanha de rua contra a farsa da "Lava Jato" |
Para que possamos compreender a crise e o atual impasse dos
rumos do PT, é necessário resgatar um enunciado básico do marxismo
completamente "esquecido" pelos agentes políticos da Frente Popular:
Conquistar eleitoralmente a gerência do Estado burguês não significa o mesmo que obter
o poder político do Estado capitalista. Este poder estatal nunca esteve nas mãos
dos presidentes eleitos pelo PT (Lula e Dilma) e o que agora é completamente
cristalino até para qualquer leigo, o poder de Estado se desloca para coagir e
reprimir os quadros dirigentes do PT. Governo, regime político e judiciário são
instâncias institucionais que mantém certo grau de autonomia entre si, porém o
Estado subordina as demais instituições estando sob controle direto da classe
dominante e não da presidência da república. Ao desconsiderar esta lógica de
ferro da luta de classes o PT foi vítima de sua própria política social
democrata, pensando que teria a eterna "gratidão" da burguesia
independentemente de seus interesses de classe. Findo o ciclo econômico "neodesenvolvimentista"
está colocado para a burguesia "convidar" os gerentes petistas a
desocuparem o governo, como se recusaram a sair em 2014 a tarefa então é
tirá-los "à força". A "caçada "institucional a Lula e
outros dirigentes históricos do partido ocorre em pleno regime democrático e o
que é pior sob a presidência da república ocupada por uma petista!
A esquerda revisionista que acompanhou organicamente boa
parte da história do PT, ou mesmo a que agora retorna ao partido por outras
vias como é o caso do PCO, sempre apontou que a "primeira etapa" da
vida política petista teria sido " altamente progressista", esta
análise sem conteúdo de classe significa um gravíssimo equívoco! O PT não se degenerou quando veio a ocupar o
Planalto, apenas exerceu seu "direito" ,conquistado nas urnas, de
operar os negócios do Estado burguês, "direito" este que agora a elite
dominante quer lhe quitar com muito "ódio". Como uma organização que
jamais foi operária ou revolucionária, a
evolução política do PT ocorreu pela via programática de um partido
originalmente pequeno burguês até se consolidar como mais uma legenda da classe
dominante, com a peculiaridade de não ter em seus quadros nomes representativos
da burguesia nacional. Nesta trajetória de "transição", o PT
conseguiu deletar a referência classista dos primeiros anos de vida para
abraçar o discurso da " cidadania plena", o que obviamente para sua
liderança partidária representava o "direito de consumo" antes de
mais nada. Por isso mesmo o grande mote político do partido na atualidade foi
de ter levado " 30 milhões de brasileiros para obter acesso ao mercado de
consumo". A estruturação de um movimento de massas que viesse a romper os
limites de um " capitalismo com uma
face democrática" nunca nem passou "pelos pesadelos ou sonhos"
de Lula, sua tarefa e de seu partido era radicalmente oposta: " Fornecer
sustentabilidade ao capital" . Com uma plataforma de governo onde não
existia sequer a execução de uma única reforma progressista, as variações do
mercado impuseram a pauta do "modelo de gestão petista", a chegada da
recessão mundial desgraçadamente esvaziou o "saco de bondades" do
PT.
Entretanto nem mesmo todos os fatores mencionados por mim anteriormente, que fui o primeiro dirigente petista a
denunciar o caráter burguês da gestão municipal do partido em Fortaleza no ano
de 1985, não dão conta de explicar a ferocidade e violência destinada ao PT por
parte de " novos aliados e antigos adversários". Só poderá mesmo
haver uma única razão para o " ódio concentrado" das elites, ainda inconfessável até por
comentaristas bastantes críticos ao PT. Por ironia da história, o PT que teve
no mínimo duas vitórias roubadas ( 89 e 94)pela fraude oficial do TSE, teria
utilizado este mesmo instrumento estatal para evitar a eleição do tucano Aécio
Neves em 2014. Este elemento combinado ao esgotamento total do "milagre
econômico lulista" tem potenciado uma enorme pressão demolidora gerada a
partir das classes dominantes, desde o primeiro dia do segundo mandato da
presidenta Dilma. Como prognosticou o velho Marx em seu magnífico livro" O
dezoito brumário de Luís Bonaparte" : "O herói nacional pode virar
bandido da noite para o dia, tudo dependerá dos fatores da luta de
classes". Paradoxalmente ao comemorar 36 anos de existência política,
ostentando um "invejável currículo" de quatro vitórias consecutivas
para as corridas presidenciais pós regime militar, o PT e sua principal
liderança de massas poderão ser convertidos em os "piores bandidos"
que esta "honrada" pátria já conheceu em toda sua história
republicana, pelo simples e banal motivo de reproduzirem a mesma metodologia
utilizada por todos os partidos burgueses deste país: Comerciar os negócios do
Estado Capitalista! Esta prática secular e usual, em tempos de estagnação e
crise pode transformar-se no pior dos "pecados políticos" para uma
elite decadente , portanto após a sentença final o PT deverá ser crucificado!