HÁ 90 ANOS DA EXPULSÃO DE TROSTKY DO PARTIDO COMUNISTA: EM
DEZEMBRO DE 1927, STÁLIN COMANDA A EXCLUSÃO DA OPOSIÇÃO UNIFICADA NO XV
CONGRESSO DO PCUS
Em dezembro de 1927, o XV Congresso do Partido Comunista da
União Soviética (PCUS) foi utilizado para condenar o “trotskismo”, exigir que a
Oposição Unificada abandonasse suas posições e decidir pela expulsão daqueles
que não se curvassem aquelas resoluções burocráticas tramadas por Stálin. O
congresso decidiu oficialmente que “a oposição rompeu ideologicamente com o
Leninismo, degenerou num grupo menchevique, enveredou pela via da capitulação
face às forças da burguesia internacional e interna e transformou-se
objetivamente num instrumento de terceiras forças contra o regime da ditadura
proletária”. Por isso o XV Congresso declarou a o conjunto da Oposição e a
propaganda dos seus pontos de vista incompatíveis com a permanência nas
fileiras do Partido. O congresso aprovou a resolução da reunião conjunta do
Comité Central e da Comissão de Controle para expulsar do partido Trótsky e Zinóviev e decidiu excluir também Rádek, Preobrajénski, Rakóvski,
Piatakov, Serebriakov, I. Smírnov, Kámenev, Sáfarov, Mdivani, Smílga. Os
expulsos que se subjugaram à chantagem e solicitaram a reintegração como
militantes, Stálin exigiu o cumprimento das seguintes exigências: A) Condenação
pública do trotskismo como ideologia antibolchevique e anti-soviética. B)
Reconhecimento público da política do partido como a única política justa. C)
Submissão incondicional às resoluções do partido e dos seus órgãos. D) Passagem
por um período de experiência durante o qual o partido verificaria a conduta
dos expulsos, decidindo no final, caso a caso, a sua readmissão. Na
auto-biografia “Minha Vida”, no capítulo “O último período da luta no Partido”,
Trotsky descreve esse momento dramático ocorrido em dezembro de 1927 com essas
palavras “Stálin preparava, entretanto o congresso do partido, desejoso de
colocá-lo diante do fato consumado da cisão. As chamadas conferências locais
que deveriam escolher os delegados ao congresso, estavam mais que realizadas
antes do que se abrissem oficialmente a ‘discussão’, ao passo que grupos
militarmente organizados dissolviam as reuniões à força de assobios e
cacetadas, usando de métodos puramente fascistas. Não é fácil imaginar coisa
mais vergonhosa que os preparativos do XV Congresso. Zinoviev e seu grupo não
tiveram dificuldade de advinhar que o congresso iria realizar politicamente o
esmagamento material da oposição, o qual fora começado nas ruas de Moscou e
Leningrado no décimo aniversário da Revolução de Outubro. A única preocupação
de Zinoviev e dos seus amigos era capitular a tempo. Não podiam deixar de
compreender que os burocratas stalinistas não viam neles, oposicionistas de
segunda jornada, o verdadeiro inimigo, mas no núcleo central da oposição, os
elementos ligados a mim. Esperavam que o rompimento ostensivo comigo lhes
valeria senão a benevolência do congresso, pelo menos o perdão. Não pensavam
que a dupla traição devia liquidá-los politicamente. Embora tenha enfraquecido
temporariamente nosso grupo por sua punhalada nas nossas costas,
condenaram-lhes eles mesmos, à morte política. O XV Congresso decidiu excluir a
oposição em bloco. Os expulsos foram postos à disposição da GPU.” Antes da
realização do congresso proprimante dito e diante do clima de tensão e
vigilância do aparato stalinista que controlava o PCUS, a Oposição Unificada
(Trotsky, Kamenev e Zinoviev) passou a se organizar retomando os métodos
clandestinos para divulgar suas ideias para o conjunto dos militantes. Por
outro lado, seu programa começava a ganhar forma. Na sessão do Comitê Central
de junho de 1926, Trotsky leu em nome da Oposição Unificada a “Declaração dos
13”, apresentando suas principais reivindicações. O programa esboçado pela
Oposição Unificada articulava diferentes pontos que convergiam para o
fortalecimento da classe operária no interior do Partido e do Estado na União
Soviética. O peso conferido à classe operária neste programa partia da leitura
dos oposicionistas de que a única garantia contra a consolidação do processo de
burocratização (além da revolução europeia) era a participação efetiva dos
trabalhadores nas decisões políticas, o que só ocorreria quando estes soubessem
o que realmente estava acontecendo no partido. Portanto, para a oposição
tratava-se de se dirigir a opinião pública, percorrer o maior número de células
e comitês possíveis para ganhar os operários para seu programa. Entre esta
pretensão e a realidade concreta havia uma grande distância, àquela altura o
aparato dirigente do partido já havia constituído uma rede de vigilância,
intimidação e repressão baseada em violências, ameaças, falsificações e calúnias
que eram praticados pelos próprios agentes do Estado. Este aparelho repressor
traduziu-se, por exemplo, durante as eleições dos delegados para a XV
Conferência do partido na fábrica Putilov em Leningrado, quando Zinoviev,
destacado membro da oposição naquela cidade, obteve somente 25 votos contra
1375. Apesar dos revezes, a Oposição Unificada recuperou parte de sua
influência através de suas denúncias contra a política nefasta do PCUS e da
Internacional Comunista em relação à revolução chinesa, cuja consigna de
revolução democrático-burguesa e a conseqüente submissão do Partido Comunista
Chinês ao Kuomintang, resultou no massacre de centenas de operários chineses em
Xangai. O próximo passo da Oposição Unificada foi concentrar todas as suas
energias na tentativa de participar do XV Congresso do partido que ocorreria em
dezembro de 1927. Com este propósito, em agosto deste ano os oposicionistas
elaboram sua plataforma, visando conquistar o maior número de adeptos possível. Segundo Isaac Deutscher, os oposicionistas
“prepararam uma exposição completa e sistemática das suas políticas, uma
plataforma como jamais foram capazes de apresentar antes”. Este documento foi
escrito por Trotsky, Zinoviev, Kamenev, Smilgá, Piatakov, além de um grupo de
jovens, sendo submetida, quando possível, aos grupos oposicionistas e às
células operárias. A plataforma da Oposição Unificada, o longo documento era
formado por 12 capítulos que analisavam questões como a situação da classe
operária, a industrialização, os soviets e o processo de burocratização do
partido. Em relação ao partido, a plataforma da Oposição Unificada pontuava que
a burocratização avançava a passos largos, suprimindo a democracia interna e
violando o legado bolchevique. Denunciava as Conferências e Congressos chamados
pela direção sem discussão prévia dos militantes e também a substituição da
disciplina revolucionária pela obediência inquestionável. O documento também
chamava a atenção dos militantes para o processo de substituição do partido
pelo seu aparato dirigente e também sobre os métodos repressivos deste aparato
contra os “bolcheviques-leninistas”. Em relação às propostas específicas da
plataforma da Oposição Unificada sobre os problemas apontados, o documento
propunha entre suas principais medidas: o restabelecimento do livre debate;
composição social do partido com uma maioria de proletários industriais;
restauração da resolução sobre democracia interna aprovada no X Congresso;
composição social do partido com uma maioria de proletários industriais; readmissão
dos oposicionistas expulsos e a reconstrução de um Comitê Central com a maioria
de trabalhadores. A plataforma afirmava peremptoriamente que a Oposição
Unificada estava convencida de que a classe operária iria provar ser capaz de
trazer o partido ao caminho leninista, ajudá-la neste processo era a principal
tarefa reivindicada pelos oposicionistas. Impedidos pelo aparato de publicar
sua plataforma na imprensa do partido, os oposicionistas conseguiram imprimir a
duras penas cerca de 30 mil exemplares do documento com o objetivo de coletar o
maior número possível de assinaturas e assim pressionar o aparato a aceitar sua
participação no XV Congresso. Neste sentido, os bolcheviques voltaram-se para
as fábricas e bairros operários para expor e defender sua plataforma. No livro
de Deutscher sobre Trotsky há um interessante depoimento do militante Victor
Serge sobre esta batalha da oposição: “Cerca de cinqüenta pessoas enchiam a
sala de jantar pobre, ouvindo Zinoviev que engordara e, pálido e despenteado, falava
com voz baixa. Havia nele algo de flácido e ao mesmo tempo muito atraente. (…)
No outro extremo da mesa sentava-se Trotsky. Envelhecendo a olhos vistos,
grisalho, de elevada estatura, encurvado, os traços fisionômicos marcados, era
cordial e encontrava sempre a resposta certa. Uma operária, sentada de pernas
cruzadas no chão, pergunta de súbito: “E se formos expulsos do Partido?” “Nada
pode impedir os proletários comunistas de serem comunistas”, respondeu Trotsky.
(…) Era simples e comovente ver os homens da ditadura do proletariado, ontem
ainda poderosos, voltar assim aos bairros dos pobres e falar, ali, de homem a
homem, procurando o apoio e os camaradas”. Como se observa, Trotsky se manteve
um Bolchevique-Leninista até a morte, quando foi assassinado por um agente de
Stálin no México.