terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

PT: 38 ANOS DE UMA TRAJETÓRIA DE COLABORAÇÃO DE CLASSES E UM INCERTO DESAFIO DE SER ACEITO COMO MAIS UM PARTIDO BURGUÊS NO SEIO DA ELITE DOMINANTE


Por: Candido Alvarez
Fundador e ex-membro do diretório do PT

O PT acaba de completar 38 anos de existência política em meio a maior crise de sua história, seu mais profundo "inferno astral". Como fundador do partido e antigo membro de sua direção, posso dar um testemunho vivo de toda sua trajetória de colaboração de classes, desde o ácido debate acerca de sua plataforma fundacional, passando pela disputa das primeiras eleições em 1982 e a vitória para uma prefeitura de capital em 1985 (Fortaleza), até o esgotamento do ciclo do gerenciamento estatal iniciado em 2003. A direção petista acabou de realizar um ato cujo tema foi "38 anos de PT: Sonhos, Lutas e Conquistas", exatamente na tentativa de dar uma resposta para a atual crise do partido e uma possível saída "honrosa" pela via eleitoral. Afirmamos que a resolução do complexo impasse político do PT ainda está muito distante e o que é pior sem garantia alguma de um desfecho minimamente razoável para o partido. Não falamos simplesmente da expectativa dos resultados das eleições de 2016 e 2018, sem dúvida nenhuma muito importantes para o futuro imediato da legenda, mas sim da variante histórica de um colapso definitivo do PT caso este não consiga ser "assimilado" no seio das classes dominantes. Este é o ponto fulcral da profunda crise política do PT, mesmo gerenciando o Estado burguês a mais de doze anos em favor das corporações capitalistas, não conseguiu ser admitido no promíscuo clube dos partidos tradicionais da ordem institucional, e hoje seus "parceiros" comerciais burgueses são caçados como "marginais e bandidos perigosos" apesar de representarem uma fatia muito significativa do PIB nacional. Práticas absolutamente ordinárias e seculares na relação entre partidos burgueses e grandes empresas, as comissões ou chamadas de "propinas" pela midiotas, hoje se firmadas pelo governo do PT representam o "maior delito nacional": O execrável mal da corrupção! Parece que pouco adianta Lula repetir a exaustão que é um liberal e nunca foi socialista, nem a esquerda petista e tampouco a direita burguesa lhe dão ouvidos... Entretanto o inusitado paradoxo que perpassa a "crise existencial" do PT é um produto acumulado de suas próprias dubiedades ao longo de sua vida política, um partido que estampa no nome a independência de classe e ao mesmo tempo desde sua origem rejeita categoricamente os desafios programáticos do proletariado, como o socialismo revolucionário. Logo nos primeiros debutes eleitorais de 1982,1985 e 1988 descartam alianças políticas com outros partidos burgueses, para em seguida governarem municípios favorecendo grandes empresas, principalmente no ramo do transporte urbano. Depois vieram os governos estaduais em 90, 94 e 98, o "véu" da independência de classe caiu por completo com as gestões voltadas para o capital em detrimento das demandas populares. Já não poderia haver a menor sombra de dúvida que a vitória presidencial de 2002 marcaria o início de um governo central capitalista, lastreado na política de colaboração de classes. A Frente Popular no comando do Estado Burguês, favorecida pela conjuntura econômica internacional impulsionou grandes negócios e créditos para a burguesia tupiniquim, o PT entrou definitivamente no rol dos partidos que empreendiam campanhas eleitorais milionárias (talvez bilionárias até), mas passado o ciclo temporal do binômio "crédito/consumo" se vê agora rejeitado como um partido burguês bastardo e ironicamente responsabilizado por parte das elites dominantes pela "formação do caráter corrupto dos maus brasileiros". Sem ainda entender bem o motivo de tanta "traição e ódio" da parte dos que tanto se beneficiaram com seus governos, o PT promove seminários e simpósios nestes 38 anos de vida inutilmente buscando uma explicação "moral" para sua "rejeição parental", quando na verdade a questão remonta a própria luta de classes!

Candido Alvarez, Secretário-Geral da LBI, ao lado de Antonio Sombra, 
dirigente da TRS, em campanha de rua contra a farsa da "Lava Jato"
Para que possamos compreender a crise e o atual impasse dos rumos do PT, é necessário resgatar um enunciado básico do marxismo completamente "esquecido" pelos agentes políticos da Frente Popular: Conquistar eleitoralmente a gerência do Estado burguês não significa o mesmo que obter o poder político do Estado capitalista. Este poder estatal nunca esteve nas mãos dos presidentes eleitos pelo PT (Lula e Dilma) e o que agora é completamente cristalino até para qualquer leigo, o poder de Estado se desloca para coagir e reprimir os quadros dirigentes do PT. Governo, regime político e judiciário são instâncias institucionais que mantém certo grau de autonomia entre si, porém o Estado subordina as demais instituições estando sob controle direto da classe dominante e não da presidência da república. Ao desconsiderar esta lógica de ferro da luta de classes o PT foi vítima de sua própria política social democrata, pensando que teria a eterna "gratidão" da burguesia independentemente de seus interesses de classe. Findo o ciclo econômico "neodesenvolvimentista" está colocado para a burguesia "convidar" os gerentes petistas a desocuparem o governo, como se recusaram a sair em 2014 a tarefa então é tirá-los "à força". A "caçada "institucional a Lula e outros dirigentes históricos do partido ocorre em pleno regime democrático e o que é pior sob a presidência da república ocupada por uma petista!

A esquerda revisionista que acompanhou organicamente boa parte da história do PT, ou mesmo a que agora retorna ao partido por outras vias como é o caso do PCO, sempre apontou que a "primeira etapa" da vida política petista teria sido " altamente progressista", esta análise sem conteúdo de classe significa um gravíssimo equívoco!  O PT não se degenerou quando veio a ocupar o Planalto, apenas exerceu seu "direito" ,conquistado nas urnas, de operar os negócios do Estado burguês, "direito" este que agora a elite dominante quer lhe quitar com muito "ódio". Como uma organização que jamais foi operária  ou revolucionária, a evolução política do PT ocorreu pela via programática de um partido originalmente pequeno burguês até se consolidar como mais uma legenda da classe dominante, com a peculiaridade de não ter em seus quadros nomes representativos da burguesia nacional. Nesta trajetória de "transição", o PT conseguiu deletar a referência classista dos primeiros anos de vida para abraçar o discurso da " cidadania plena", o que obviamente para sua liderança partidária representava o "direito de consumo" antes de mais nada. Por isso mesmo o grande mote político do partido na atualidade foi de ter levado " 30 milhões de brasileiros para obter acesso ao mercado de consumo". A estruturação de um movimento de massas que viesse a romper os limites de um " capitalismo  com uma face democrática" nunca nem passou "pelos pesadelos ou sonhos" de Lula, sua tarefa e de seu partido era radicalmente oposta: " Fornecer sustentabilidade ao capital" . Com uma plataforma de governo onde não existia sequer a execução de uma única reforma progressista, as variações do mercado impuseram a pauta do "modelo de gestão petista", a chegada da recessão mundial desgraçadamente esvaziou o "saco de bondades" do PT.

Entretanto nem mesmo todos os fatores mencionados por mim anteriormente,  que fui o primeiro dirigente petista a denunciar o caráter burguês da gestão municipal do partido em Fortaleza no ano de 1985, não dão conta de explicar a ferocidade e violência destinada ao PT por parte de " novos aliados e antigos adversários". Só poderá mesmo haver uma única razão para o "ódio concentrado" das elites, ainda inconfessável até por comentaristas bastantes críticos ao PT. Por ironia da história, o PT que teve no mínimo duas vitórias roubadas ( 89 e 94)pela fraude oficial do TSE, teria utilizado este mesmo instrumento estatal para evitar a eleição do tucano Aécio Neves em 2014. Este elemento combinado ao esgotamento total do "milagre econômico lulista" tem potenciado uma enorme pressão demolidora gerada a partir das classes dominantes, desde o primeiro dia do segundo mandato da presidenta Dilma. Como prognosticou o velho Marx em seu magnífico livro" O dezoito brumário de Luís Bonaparte": "O herói nacional pode virar bandido da noite para o dia, tudo dependerá dos fatores da luta de classes". Paradoxalmente ao comemorar 38 anos de existência política, ostentando um "invejável currículo" de quatro vitórias consecutivas para as corridas presidenciais pós regime militar, o PT e sua principal liderança de massas poderão ser convertidos em os "piores bandidos" que esta "honrada" pátria já conheceu em toda sua história republicana, pelo simples e banal motivo de reproduzirem a mesma metodologia utilizada por todos os partidos burgueses deste país: Comerciar os negócios do Estado Capitalista! Esta prática secular e usual, em tempos de estagnação e crise pode transformar-se no pior dos "pecados políticos" para uma elite decadente, portanto após a sentença final o PT deverá ser crucificado! Nestas eleições gerais de 2018, a candidatura presidencial do PT aposta todas suas fichas na institucionalidade burguesa, buscando convencer a classe dominante que Lula será novamente um gestor responsável dos negócios capitalistas. Como a burguesia já descartou o nome de Lula para gerir no próximo período o poder executivo de seu Estado, inclusive inviabilizando sua candidatura através da caçada jurídico-policial por meio da famigerada “Lava Jato”, vem ganhando força dentro da esquerda reformista o nome de Guilherme Boulus, dirigente do MTST a ser lançado pelo PSOL, uma espécie da "laranja" de Lula no circo eleitoral. A tendência hegemônica no PSOL (US) fechou inclusive um acordo com a direção do PT para lançar Boulos candidato à presidência: na mesa da negociação três pontos, reeleição garantida para o deputado Ivan Valente, apoio seguro do PSOL no segundo turno para o nome da frente popular (possivelmente Fernando Haddad) e programa eleitoral de “reformas” que não afastem as alianças com a burguesia. Longe de serem um ponto de apoio para a luta dos trabalhadores no terreno eleitoral, tanto a candidatura Lula como a de Guilherme Boulos, são obstáculos políticos para o avanço da consciência das massas e da luta política e ideológica pela Revolução Socialista, com PT e PSOL patrocinando ilusões no circo eleitoral fraudado da democracia burguesa.