Sob pressão da reação democrática, FARC anuncia libertação de todos prisioneiros políticos de guerra e o fim das “retenções”
O Secretariado do Estado Maior Central das FARC anunciou neste dia 26 de fevereiro a libertação unilateral de todos os prisioneiros políticos de guerra. Mas não “só” isso. A direção da guerrilha também decidiu pôr um fim à chamada política de “retenção” de adversários políticos para a obtenção de recursos financeiros. Em seu comunicado a FARC declara: “Muito se tem falado acerca das retenções de pessoas, homens ou mulheres da população civil que, com fins financeiros, nós das FARC efetuamos para sustentar nossa luta. Com a mesma vontade indicada acima, anunciamos também que, a partir desta data proscrevemos a prática delas em nossa atuação revolucionária. A parte pertinente da lei 002, expedida pelo nosso Pleno do Estado Maior, no ano de 2000, fica, por conseguinte, revogada. É o momento de começar a esclarecer quem e com quais propósitos se sequestra hoje na Colômbia”. Como se vê tratam-se claramente de medidas tomadas com o objetivo de buscar o chamado “diálogo” com o facínora governo Santos, no marco de um profundo isolamento político e militar da guerrilha. Ainda que consideremos justo que as FARC tomem medidas de autopreservação neste momento delicado do combate, pois a guerrilha tem todo direito de negociar a liberdade de seus presos políticos através da troca de reféns, definitivamente não é anunciando o fim das “retenções” e a libertação unilateral de todos os prisioneiros políticos de guerra o melhor caminho para se defender dos ataques do genocida regime colombiano, muito menos tendo ilusões de que este possa chegar a algum acordo com a guerrilha que não seja baseado na sua liquidação enquanto força política e militar.
Ainda segundo o comunicado das FARC “Sérios obstáculos se interpõem à concretização de uma paz concertada em nosso país. A arrogante decisão governamental de aumentar o gasto militar, o corpo de força e as operações, indica a prolongação indefinida da guerra. Ela trará consigo mais morte e destruição, mais feridas, mais prisioneiros de guerra de ambas as partes, mais civis encarcerados injustamente. Além disso, ela indica a necessidade de recorrer a outras formas de financiamento ou pressão política de nossa parte. Essa é a hora do regime pensar seriamente numa saída distinta, que comece ao menos por um acordo de regularização do confronto e da libertação de prisioneiros políticos”. Como se vê, a própria FARC reconhece que enquanto a guerrilha vai cedendo à pressão “democrática” por libertar unilateralmente os prisioneiros políticos, o fascistizante governo Santos incrementa sua ofensiva arquirreacionária em conluio com a CIA e o exército ianque. Diante disso, o que fazer? As FARC devem pactuar com o governo Santos a “paz” dos cemitérios ou chamar publicamente a unidade com o movimento operário para derrotá-lo? Somos partidários da segunda opção, ainda que estejamos cientes de todas as dificuldades que enfrenta a guerrilha!
Nesse sentido, é preciso dizer em alto e bom som que a captura de adversários políticos como prisioneiros de guerra é uma medida justa em meio à guerra que se trava na Colômbia. Os marxistas revolucionários defendem que a guerrilha recorra a tais medidas não só para o seu financiamento assim como para se defender dos ataques do regime narcoterrorista. Trotsky invocava Marx para refutar os filisteus que condenavam não apenas a utilização de reféns, mas a execução dos mesmos pelas forças insurgentes durante a Comuna de Paris: “Quando os Communards fuzilaram 64 reféns, entre os quais o arcebispo de Paris, Marx não hesitou um só instante em assumir a defesa dessa sanguinolenta ação da Comuna. Na circular do Conselho Geral da Internacional, Marx relembra que a burguesia usou o sistema de reféns na luta contra os povos coloniais e na luta contra seu próprio povo. E em seguida às execuções sistemáticas dos Communards prisioneiros, pelos reacionários: ‘Para defender a vida de seus combatentes prisioneiros, não restava à Comuna senão recorrer ao método dos reféns, habitual aos prussianos. A vida dos reféns foi perdida e reperdida pelo fato que os versalheses continuavam fuzilando os prisioneiros. Teria sido possível poupar os reféns depois da horrível carnificina com que os pretorianos de MacMahon celebraram seu ingresso em Paris? O último contrapeso oposto à barbárie do governo burguês – a tomada de reféns – deveria transformar-se numa irrisão?’” (A revolução e os reféns, L. Trotsky, 16/02/1938). Tragicamente, com o anúncio sistemático da libertação unilateral de reféns, as FARC vem abrindo mão da bilateral troca de prisioneiros políticos e por conta disso sofrendo golpes a granel e mortais, sendo que os últimos vêm acompanhados de uma profunda desmoralização em suas fileiras, no marco da ofensiva global do imperialismo contra as forças políticas e regimes que tem fricções com a Casa Branca.
É preciso entender que as medidas anunciadas pelas FARC estão sendo tomadas no marco de uma enorme pressão “democrática” de seus “aliados”, particularmente do governo Chávez. Esse há tempos vem exigindo que a guerrilha “entregue as armas, que forme um partido político”. Tal política trata-se de um chamado à completa rendição militar das FARC pela via de um acordo para esta se integrar ao simulacro da democracia burguesa colombiana. A proposta do chavismo tem como consequência direta e prática não só o enfraquecimento político da guerrilha, mas a sua completa exterminação física, tendo em vista a experiência das próprias FARC, que na década de 80 deslocou parte de seus quadros para a constituição da Unidade Patriótica e impulsionou um partido político legal, tendo como resultado o assassinato de cerca 5 mil dirigentes pelas forças de repressão do Estado, pilar mestre da democracia bastarda colombiana. Essa tragédia teve como base as mesmas ilusões reformistas hoje patrocinadas de forma requentada pelo presidente venezuelano. Mais uma vez, alertamos que ao narcotraficante regime burguês colombiano não interessa sequer a conversão da guerrilha em partido político desarmado, apenas sua extinção. A ofensiva militar imperialista na Líbia e na Síria apoiando-se na onda de “reação democrática” que varre o Oriente Médio é a prova do que afirmamos. Não por acaso, o mesmo Chávez que clama pela deposição das armas pelas FARC tem colaborado vergonhosamente com Santos na perseguição aos quadros políticos e militares da guerrilha, justamente porque o caudilho bolivariano deseja ter as FARC como moeda de troca em seus acordos com a Casa Branca, ainda mais com o agravamento de seu quadro de saúde.
Frente a essa conjuntura dramática, os revolucionários bolcheviques criticam publicamente as decisões tomadas pela direção das FARC porque estas medidas desgraçadamente levam paulatinamente a sua rendição política e não “só” militar. A direção pequeno-burguesa da guerrilha alimenta ilusões na mediação contrarrevolucionária de direções burguesas como Chávez e Dilma Rousseff, chegando mesmo a agradecer a “disposição generosa do governo que preside” a petista, que neste momento, sob a fachada “humanitária”, está a serviço de converter a guerrilha em uma força inofensiva para ser esmagada em futuro próximo. Através de concessões crescentes como a libertação unilateral dos presos políticos e a decretação do fim das “retenções” se aposta na via da conciliação de classes e na política de integração ao regime títere como prega a senadora Piedad Córdoba e seu movimento “Colombianos pela Paz”. Nesse sentido, consideramos uma utopia reacionária o PCB, que integrou a delegação brasileira ao fórum “Colômbia entre Grades”, realizado em nestes dias em Bogotá, defender uma “paz justa e democrática” no exato momento em que esta iniciativa política baseada na política de reação democrática está voltada a saudar as medidas anunciadas pelas FARC como uma prova de “boa vontade” da guerrilha. Na Colômbia, mais que em qualquer outra parte do mundo, hoje a simples luta sindical contra os patrões e as multinacionais exige a ruptura do proletariado com os limites da legalidade burguesa e a construção de milícias operárias armadas para desarmar os exércitos paramilitares e as escaramuças do aparato repressivo. Não é por acaso, que os mesmos moralistas pequeno-burgueses de “esquerda” se mostram tão preocupados com os danos que os métodos da guerrilha causam à consciência e à organização dos trabalhadores, sejam incapazes de conclamar a organização de milícias operárias para combater o assassinato sistemático de trabalhadores pelas milícias burguesas. Isso se deve porque tal tarefa deve ser encabeçada por um genuíno partido trotskista completamente independente da opinião pública burguesa e de sua moral, armado de um programa revolucionário capaz de preparar pacientemente a insurreição das massas colombianas. É vital para o movimento de massas colombiano organizar milícias operárias tão fortes que sejam capazes de acaudilhar atrás de si as organizações guerrilheiras, submetendo-as militarmente à democracia das assembleias proletárias para desarmar o aparato repressivo oficial e paramilitar assassino.
Frente ao cerco crescente neste momento de maior fragilidade das FARC, os marxistas revolucionários declaram seu apoio incondicional à guerrilha diante de qualquer ataque militar do imperialismo e do aparato repressivo de Santos. Simultaneamente, apontamos como alternativa a superação programática da estratégia reformista da direção das FARC baseada na reconciliação nacional com a oposição burguesa e a unificação da luta armada com o movimento operário urbano sob a estratégia da revolução socialista para liquidar o regime facistóide e organizar a tomada do poder pelos explorados colombianos. Em oposição pelo vértice aos revisionistas do trotskismo (LIT/PST) e dos estalinistas “moderados” que condenam as FARC pela adoção da luta armada, isolando-a ainda mais para que seja presa fácil da burguesia, defendemos que uma política justa para o confronto entre a guerrilha e o Estado burguês passa por aplicar a unidade de ação contra Santos, com a mais absoluta independência política em relação ao programa reformista das FARC. Ao lado dos heróicos guerrilheiros das FARC e honrando o sangue derramado pelos comandantes Afonso Cano, Manuel Marulanda e Mono Jojoy, que morreram em combate, apontamos como alternativa programática a defesa da estratégia da revolução socialista e da ditadura do proletariado, sem patrocinar nenhuma ilusão na possibilidade de construir uma “Nova Colômbia” sem liquidar o capitalismo e seus títeres.