ACORDO NUCLEAR: “RECUO” ATUAL DO IMPERIALISMO IANQUE TENTA
GANHAR TEMPO PARA DESARMAR O IRÃ
Durante audiência no Senado norte-americano nesta semana, o
secretário de Estado ianque John Kerry defendeu com veemência o acordo sobre o
programa nuclear iraniano ante o Congresso dizendo que "A verdade é que o
plano de Viena oferecerá meios mais fortes, mais duradouros e mais amplos para
limitar o programa nuclear do Irã do que qualquer outra alternativa de que se
tenha falado". Obama aspira que um acordo com o Irã e a abertura de novos
negócios para as empresas norte-americanas, deixe mais difícil para a oposição
interna dos republicanos revertê-lo. Por sua vez, com este acordo, os EUA
admitem que não tem neste momento correlação de forças para destruir o programa
nuclear do Irã, o que implicaria abrir outra frente militar em um país com 80
milhões de pessoas e com forte aparato militar no Oriente Médio. O objetivo
realista da Casa Branca é mantê-lo controlado para que a atividade de
enriquecimento de urânio do Irã esteja por baixo do limiar para a fabricação de
armas nucleares. Na terça-feira, o chefe da diplomacia iraniana, Mohamad Javad
Zarif, também defendeu ante o parlamento do país o acordo nuclear acertado com
as grandes potências capitalistas, classificando o texto de
"equilibrado": "Não deveríamos esquecer que todo acordo é uma
negociação e que cada uma das partes abre mão de algumas de suas exigências
para obter as que considera mais importantes, até que o acordo fique
equilibrado". A intervenção de ambos ocorreu após o apoio do Conselho de
Segurança (CS) da ONU ao pacto concluído há uma semana em Viena entre o Irã e
os cinco membros permanentes do CS. De fato há resistência de ambos os lados
porque os Republicanos desejam atacar militarmente o Irã o mais rápido
possível, tendo Israel como aliado nesta empreitada belicista. A oposição
republicana inteira apontou a artilharia para Obama. O pré-candidato
republicano à presidência, Jeb Bush, afirmou que o acordo vai causar uma
instabilidade enorme no Oriente Médio por “fortalecer o Irã”. No lado
democrata, a pré-candidata Hillary Clinton, não se mostrou muito entusiasmada. Em
um comunicado genérico, ela afirmou que ainda está estudando os detalhes, mas
que apoia a decisão. Obama reagiu às críticas dos republicanos e de Netanyahu:
"Nenhum deles apresentou a mim ou ao povo americano uma alternativa
melhor". Não por acaso, o secretário de Defesa dos Estados Unidos, Ash
Carter, visitou nesta semana Israel porque o chacal Binyamin Netanyahu fez
duras críticas ao acordo feito com o Irã. Carter participou de uma reunião a
portas fechadas com o ministro israelense da Defesa, Moshe Yaalon. Já setores
da burguesia iraniana, agrupados na Guarda Republicana e no Conselho Supremo
formado pelos Aiatolás temem que o pacto debilite a capacidade de defesa da
nação persa frente ao enclave sionista e ao próprio EUA. Tanto que segundo a
agência iraniana Tasnim, para o alto-comando da Guarda Republicana o texto da
resolução é inaceitável: "Algumas partes claramente cruzaram o limite
estabelecido pela República Islâmica, especialmente sobre as nossas capacidades
militares. Nunca vamos aceitá-lo" em uma clara tentativa de impor limites
ao governo Hassan Rohani (um moderado apoiado por reformistas), expressando uma
intensa disputa política entre as diversas alas que compõem o Regime dos
Aiatolás. O acordo tem por objetivo frear o desenvolvimento nuclear do Irã em
troca do alívio de sanções que causaram prejuízos de bilhões de dólares à
economia persa. As instalações nucleares e militares da República Islâmica
serão verificadas pela AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica). Assim
que o primeiro relatório da AIEA mostrar o cumprimento do pacto por parte de
Teerã, em 90 dias, as potências capitalistas deverão iniciar os preparativos
para levantar os embargos contra Teerã. O Irã aceitou limitar, por 15 anos, sua
capacidade de fabricar armas nucleares. O restabelecimento de relações entre
EUA e Irã, suspensas desde 1979, sofre forte resistência da Arábia Saudita,
Israel e Turquia, produzindo um emaranhado no sistema de alianças no
convulsionado Oriente Médio. O acordo celebrado entre o Irã e o chamado G5+1
(EUA, Reino Unido, França, Alemanha, China e Rússia) segue a política da Casa
Branca para Cuba, que podemos resumir como um “abraço de urso”. Obama acena com
o distensionamento das sanções econômicas, fato que gera simpatia popular,
enquanto exige concessões políticas, econômicas e militares gigantescas. Este é
o “modelo” das negociações com Havana e Teerã. Enquanto isto, o imperialismo
ianque recrudesce a ofensiva terrorista contra a Venezuela, o que gera a
pergunta para qualquer ativista de esquerda: Qual a “lógica” da política
externa dos EUA? Na arena diplomática os gestos de “boa vontade” do governo
Obama servem para emplacar Hillary na Casa Branca. Hoje a “mão estendida” de
Obama-Kerry para o Regime dos Aiatolás tem por objetivo liberar as forças até
então represadas diante dos conflitos com a Síria (aliada da Rússia e do Irã) e
da pressão de Israel contra qualquer aproximação com o Teerã. Com o “acordo”
com o Irã, que retardará por vários anos o programa nuclear persa, os EUA podem
ganhar tempo para conseguir se fortalecer para um saída militar futura, já que
os Clinton apoiam integralmente a “jogada” de aproximação com Cuba, o que não
pode ser dito da política para o Oriente Médio onde Hillary defende uma
imediata e agressiva ação militar contra Assad. Todas estas contradições estão
no tabuleiro político colocados no acordo. O certo é que as bases das
negociações colocam o Irã como alvo das inspeções dos observadores
imperialistas por 10 a 15 anos. Não negamos o direito do Irã de negociar com o
imperialismo o fim das sanções econômicas contra o país para se preservar como
potência regional contra as investidas de Israel e manter o nível de vida de
seu povo, justo objetivo almejado, porém alertamos que as bases do acordo atual
também fornecem tempo para o imperialismo organizar uma ofensiva militar futura
contra o país, como deseja a víbora Hillary Clinton que deve ganhar as eleições
ianques em 2016.
A vitória de Hassan Rohani, um clérigo moderado no espectro
xiita, foi montada justamente para evitar a polarização interna. A burguesia
iraniana deseja criar as condições para negociar um acordo com o imperialismo
ianque que impeça a agressão militar ao país persa em troca de amplas
concessões no terreno de sua soberania nacional, isolando os setores mais resistentes
a tal giro servil. A base para alcançar este novo objetivo é o recuo no
programa nuclear iraniano, uma exigência da Casa Branca para começar as
negociações. Quando Rohani foi eleito, Obama lançou um comunicado em que
declarou sua disposição de “colaborar” com o novo presidente. O falcão negro
afirmou que a eleição de Rohani era “um sinal potencialmente esperançoso se ele
fizer jus às suas promessas de campanha de ser aberto sobre o programa nuclear.
Para se chegar a esse ponto, precisamos que ele cumpra com as obrigações do
programa nuclear, e se ele fizer isso, haverá grande oportunidade para o Irã e
as pessoas desse país ter o tipo de futuro que seria justificável quererem”
(G1, 16/06/2013). Obama deseja que o atual presidente comande, sob as ordens de
Khamenei, um recuo do armamento e da defesa nuclear iraniano, o que significa
deixar o caminho livre para o enclave nazi-sionista de Israel não ter um
contraponto militar na região e para novas agressões contra países
não-alinhados automaticamente com os EUA, como é o caso da Síria! Rohani esteve
à frente das negociações nucleares entre 2003 e 2005 sob a presidência do
também “reformista” Mohammad Khatami. Na época, o Irã aceitou a suspensão do
enriquecimento de urânio após negociações com a troika europeia (França,
Grã-Bretanha e Alemanha), mas este caminho foi barrado por Ahmadinejad. Ele
cumpriu dois mandados como presidente do país e adotou uma conduta de relativo
enfrentamento com o imperialismo, tanto que o país é alvo de várias sanções
internacionais deliberadas pela ONU. Em função disso, ele foi claramente
alijado do processo eleitoral. Sua aproximação com o chavismo e a
centro-esquerda burguesa latino-americana contribuiu para ser rifado, além da
contestação pública de algumas decisões de Khamenei.
Lembremos que o objetivo central do Pentágono ao
desestabilizar a Síria é neutralizar o regime da oligarquia Assad para
debilitar o Hezbollah e seguir sem maiores obstáculos em seu plano de atacar
Irã. Ao que tudo indica, “preventivamente”, os Aiatolás agiram logo em busca de
um acordo com a Casa Branca e para isso “elegeram” Hassan Rohani, que já foi
negociador nuclear iraniano e, como representante dos chamados “reformistas”,
tem bastante trânsito junto à União Europeia, Israel e EUA. Também pesou nesta
decisão as sanções internacionais impostas ao Irã. As medidas provocaram um
aumento do desemprego, fizeram a inflação saltar para mais de 30% e causaram a
desvalorização do Rial em quase 70%. O atual presidente prega uma política mais
flexível em relação às grandes potências com o objetivo de amenizar as sanções.
A vitória de Hassan Rohani marcou o retorno dos chamados “moderados” e
“reformistas” ao governo persa, após um longo hiato iniciado depois das
manifestações contra a reeleição de Ahmadinejad em junho de 2009, chamadas a
época de “Revolução Verde”. Hassan Rohani apoiou os manifestantes que
protestaram contra o resultado das eleições e criticou o governo pela repressão
aos protestos. O imperialismo também deu respaldo às manifestações contra Ahmadinejad,
acusando-o de fraudar as eleições. Na época, não podendo derrubar o governo
iraniano, Washington buscou desestabilizá-lo, apoiando-se em um amplo setor da
burguesia iraniana, alinhada em torno da candidatura de Mir Hossein Moussavi,
uma caixa de ressonância das pressões imperialistas, turbinada após a campanha
midiática contra os resultados eleitorais. Desde então a Casa Branca
impulsionou a oposição interna contra Ahmadinejad. No lastro da vitória
alcançada com a fantasiosa “revolução árabe”, que promoveu com sucesso a
transição conservadora no Egito e na Tunísia além de derrubar o regime
nacionalista líbio e está impondo a desestabilização do governo da oligarquia
Assad na Síria, Obama veio trabalhando e pressionando para construir no Irã um
cenário de fortalecimento da oposição “reformista” que hoje volta novamente ao
governo, ainda que em sua versão mais domesticada pelo aiatolá Ali Khamenei. O
Regime dos Aiatolás entendeu a mensagem da Casa Branca e agiu “elegendo” Hassan
Rohani como parte de uma tentativa de um acordo prévio com o imperialismo. A
esperança ianque é que nos próximos anos se produza uma “mudança de regime” e
que surja um governo mais próximo de seus interesses, seja ele produto de um
processo evolutivo e pacífico – em que reformistas vão ganhando terreno e os
conservadores se marginalizando – ou por um giro mais brusco da situação por um
dinâmica social conflituosa. No caso de que este acordo se rompa, o cálculo de
Obama e seus aliados é que teriam um ano para organizar a resposta militar e
evitar que o Irã tivesse armamento nuclear.
Longe de expressar uma unidade do regime político, o governo
de Rohani demonstra a fissura crescente dentro da cúpula teocrática do Regime
dos Aiatolás, corroída pela sedução imperialista, que teve em Obama um poderoso
operador. Tanto a situação “linha dura” xiita quanto a oposição “reformista”
buscaram uma reaproximação estratégica com o imperialismo ianque, mas com clara
diferenças de grau e velocidade. Os revolucionários não são partidários do Regime
dos Aitolás no Irã, embora reconheçamos os avanços anti-imperialistas
conquistados pelas massas em 1979. Sempre alertamos que a burguesia iraniana,
diante de seu isolamento internacional e das sanções impostas pela ONU, estava
buscando um acordo estratégico com o imperialismo ianque e europeu. A escolha
de Hassan Rohani reforça tremendamente este rumo de aberta concessão política,
econômica e militar. Ainda assim, não está descartado um incremento da pressão
do imperialismo ianque e de Israel sobre o país, exigindo sua rendição
completa, perspectiva que sofre grande resistência interna, particularmente
pelas massas iranianas que viram a barbárie imposta à Líbia e a destruição em
curso na Síria. Justamente por isto, o governo de Hassan Rohani não está sendo
tranquilo, já que uma capitulação vergonhosa pode levar a enfrentamentos entre
as diversas alas do regime. Frente a esta situação ainda incerta, defendemos
integralmente o direito deste país oprimido a possuir todo arsenal militar
atômico ao seu alcance. É absolutamente sórdido e cretino que o imperialismo
ianque e seus satélites pretendam proibir o acesso à tecnologia atômica aos
países que não se alinham com a Casa Branca, quando esta arma “até os dentes”
Estados gendarmes como Israel com farta munição atômica.
Como marxistas revolucionários não dissimulamos em um só momento o caráter
burguês e obscurantista dos regimes nacionalistas do Irã ou do próprio
Hezbollah. Mas estes fatos em nada mudam a posição comunista diante de uma
possível agressão imperialista contra uma nação oprimida. Não nos omitiremos de
estabelecer uma unidade de ação com o Regime dos Aiatolás, diante de uma
agressão imperialista, ainda que este esteja claramente dando sinais que irá
capitular. Por esta mesma razão, chamamos o proletariado persa a construir uma
alternativa revolucionária dos trabalhadores que possa combater
consequentemente o imperialismo e derrotar todas as alas do regime, denunciando
desde já o papel servil do governo Rohani. É bom lembrar que os marxistas já
estabeleceram uma frente única com os aiatolás na derrubada do Xá Reza Pahlevi
e seu regime pró-imperialista, apesar de conhecermos o caráter de classe da
direção religiosa muçulmana. A perspectiva de um governo democrata comandado
pela víbora Hillary em 2016, mesmo com todas as concessões feitas pelo regime
dos Aiatolás e o governo Rohani, embutem uma vingança contra a humilhação
sofrida pelos EUA na desastrosa tentativa de intervenção militar no Irã, ainda
sob o governo democrata de Jimmy Carter. Não temos nenhuma dúvida que o império
pretende somar para suas empresas transnacionais as reservas de petróleo do Irã
às da Líbia e do Iraque para, desta forma, deter a hegemonia absoluta do
controle energético do planeta. Somente idiotas úteis à Casa Branca podem
ignorar estes fatos e declarar “solidariedade” às ações militares da OTAN
contra os “bárbaros ditadores” que se recusam a aceitar a “democracia made in
USA”. Os marxistas revolucionários defendem integralmente o direito do Irã a
possuir todo arsenal militar atômico ao seu alcance para se defender do
imperialismo e do sionismo. Porém, compreendem que a tarefa de defender o Irã
inclusive contra sua burguesia nativa está, antes de tudo, nas mãos do
proletariado mundial e das massas árabes. Somente elas podem lutar consequentemente
pela derrota do imperialismo em todo o Oriente Médio, abrindo caminho para
sepultar a exploração capitalista interna que condena a miséria os explorados
da região.