quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014


Líbia destruída: Por que a mídia capitalista e os revisionistas do trotskismo estão em completo silêncio após três anos da suposta “revolução” que derrubou Kadaffi?

Um balanço político e social faz-se necessário após três anos das primeiras “manifestações” que se iniciaram na Líbia tendo como foco principal a cidade de Benghazi, localizada no leste do país. O silêncio da mídia “murdochiana” que saudou entusiasticamente o levante reacionário é completo. Já a esquerda que apoiou a suposta “revolução” que derrubou Kadaffi não está nem um pouco interessada neste debate crucial porque justamente sua política em favor dos “rebeldes” mercenários se provou uma aberta orientação pró-OTAN e ao imperialismo. Entretanto, para os marxistas revolucionários, este balanço é fundamental na medida em que novas “revoluções” made em CIA estão em curso no planeta, como vemos agora na Ucrânia. Os “rebeldes” líbios foram desde o início, em fevereiro de 2011, apoiados tanto pelos revisionistas do trotskismo como pelas potências capitalistas, como agora ocorre na ex-república soviética. Depois de ter sido bombardeado pela OTAN na maior operação militar desde a II Guerra Mundial, com as tropas das metrópoles imperialistas atuando em socorro aos “revolucionários, o território líbio foi arrasado. Estima-se que mais de 200 mil pessoas foram mortas e o país encontra-se agora divido sob o controle de grupos armados que disputam o domínio das reservas petrolíferas. O frágil governo do CNT, títere das potências capitalistas, na verdade não passa de um gerente que representa os interesses das grandes transnacionais. O quadro de desestruturação é tão grave que em janeiro de 2014 os combates entre clãs rivais deixaram dezenas de mortos. Os combates entre grupos tribais de etnia africana e árabe no estado meridional de Sabha, no sul do país, deixaram 86 mortos. A situação se complicou pela ocupação por milícias rebeldes de uma base militar na região, o que obrigou o premiê-fantoche Ali Zeidan a mobilizar tropas instaladas no estado de Misrata, a uns mil quilômetros de distância, para controlar a situação. Um boletim oficial, sem confirmação independente, assegurou que a base retornou às mãos das autoridades e que vários dos ocupantes, descritos como seguidores do líder líbio assassinado Kadaffi foram presos. Os combates entre milicianos Toubou, de origem africana, e os Awlad Suleiman, árabes, recomeçaram dias atrás, após um período de tensa trégua desde março do ano passado quando ambos se enfrentaram pelo controle de zonas petroleiras depois de um ataque dos primeiros. A erupção de violência tribal e o ataque contra a base aérea em Sabha agrava a situação de barbárie no país norte-africano, ameaçado de fragmentação pela recém-proclamada autonomia de uma porção do norte do país por milícias e chefes tribais que controlam quatro terminais de carga de petróleo. Como parte da farsa democrática montada pela OTAN, a Líbia vai eleger uma assembleia parlamentar agora em 20 de fevereiro para elaborar uma Constituição em meio ao impasse político mais de três anos depois da revolta que derrubou Kadaffi. O país do norte da África está tomado pelo caos, com um impasse no Congresso entre islamitas e um partido tribal entreguista, enquanto o novo exército treinado pela OTAN luta contra a resistência nacional. Pelos planos de Bruxelas, uma vez que a Assembleia Constituinte de 60 membros seja eleita, terá 120 dias para elaborar uma nova Carta, que seria, então, submetida a um referendo popular. Se o documento for aprovado, uma eleição para um parlamento-fantoche será realizada no fim de 2014. Mas até mesmo esse processo de elaboração poderá ser inviabilizado devido às diversas exigências e interesses de grupos tribais, regionais e étnicos que já disputam influência sobre o governo de Trípoli.

A LBI denunciou desde fevereiro de 2011, apesar da intensa campanha da mídia “murdochiana”, que os “protestos” em Benghazi se tratam de mobilizações reacionárias patrocinadas por forças políticas pró-imperialistas, com a imprensa burguesa mundial amplificando seu peso social e superdimensionando a repressão estatal supostamente desferida. Encerrado o capítulo da saída de Mubarak no Egito, como um rastilho de pólvora, as “oposições” saem em cena em toda a região arábica. Em países onde sócios menores do capital financeiro ianque demonstraram incapacidade social em continuar do poder, a Casa Branca orientou a transição “lenta, gradual e segura”, já que estavam ou ainda estão na lista negra do “terrorismo internacional” o “conselho” foi armar a oposição e dotá-la de todo apoio político na mídia mundial. Na Líbia, logo os apoiadores do antigo monarca Idris, apeado do governo pelos coronéis em 69, foram a ponta de lança inicial para fazer eclodir o suposto movimento de massas contra o “tirano sanguinário” Kadaffi. Os monarquistas não tiveram muito trabalho para agrupar várias oligarquias tribais, muitas das quais tinham estabelecido laços financeiros e comerciais com empresas imperialistas sediadas na cidade de Benghazi. Não demorou muito, os “rebelados” contra o caudilho nacionalista já dispunham de sofisticadas armas pesadas que passaram a apontar contra o próprio povo líbio que insistia em permanecer ao lado da “ditadura sanguinária” de Kadaffi. Os primeiros confrontos resultaram em centenas de mortes de civis logo atribuídas pela mídia imperialista ao exército regular líbio, espalham-se os boatos da fuga de Kadaffi e da contratação de mercenários africanos pagos para defender o regime de Trípoli. Surgem as primeiras dissidências e fissuras no campo do regime, “nutrindo” a reacionária oposição agora composta por generais que se venderam a OTAN, jovens yuppies funcionários das petroleiras europeias e os pioneiros monarquistas com sua bandeira do monarca Idris. Forma-se um governo provisório em Benghazi reconhecido pelo covil de bandidos conhecido como ONU, que já conta com um Banco Central e até uma empresa de exportação de petróleo, isto tudo em meio a uma guerra civil. Como sabemos muito bem, o imperialismo ianque não costuma fornecer armas a movimentos sociais e, muito menos, colocar suas tropas a serviço de nenhum agrupamento de rebeldes que lutam contra uma ditadura. A história da luta de classes nos ensinou que as armas do imperialismo servem a movimentos contrarrevolucionários, como no Vietnam, na Nicarágua, em Cuba ou Angola só para citarmos alguns exemplos mais cristalinos.

Toda esta orquestração estava voltada a debilitar o regime de Kadaffi no lastro do “efeito do dominó” desencadeado pela suposta “revolução árabe”, tudo ao melhor estilo das manipulações midiáticas feitas contra Chávez na Venezuela quando da época do golpe de abril de 2002 desferido em nome da “democracia” e “contra o autoritarismo”. A LBI foi a primeira corrente política a denunciar o caráter pró-imperialista das reacionárias “manifestações” em Benghazi e depois desmascarar os “rebeldes” mercenários a serviço da CIA, treinados no Catar com o apoio do Mossad. No curso do conflito denunciamos a genocida ação da OTAN contra o país norte-africano e defendemos a frente única militar com o governo de Kadaffi e a vitória da resistência contra as tropas abutres invasoras. No desenrolar da guerra se deu o brutal assassinato de Kadaffi em uma operação conjunta entre os “rebeldes” mercenários e os bombardeios da OTAN, que depois de meses atacando Sirte, centro da resistência, acabaram por dominar o país, ainda que existam de forma dispersa focos de oposição ao controle da Líbia pelos títeres do CNT. Enganou-se toda a matilha pró-imperialista que pensou que a morte de Kadaffi foi o ponto final da resistência nacional às tropas da OTAN, sem sombra de dúvida o tombamento em plena luta do coronel Kadaffi foi uma grande derrota de todos os povos do mundo que enfrentam a ofensiva imperialista, mas a guerra de libertação continua até hoje como reconhece inclusive o alto comando do Pentágono. A situação política atual da Líbia está marcada por uma guerra civil fratricida, só que desta vez com características bem mais complexas e totalmente fragmentadas. As milícias “rebeldes” iniciaram uma luta intestina pelo saque do país, disputando a “preferência” da intermediação dos negócios com as metrópoles imperialistas. Nem mesmo a cidade de Benghazi escapou da disputa “fratricida” dos rebeldes, a própria sede atual do governo do CNT foi invadida várias vezes por manifestantes que exigiam o cumprimento das inúmeras “promessas” feitas durante a empreitada para destruir as conquistas da revolução democrática que derrubou a monarquia corrupta. Por sua vez, houve o ataque, em setembro de 2012, à representação diplomática dos EUA na cidade de Benghazi, cidade até então considerada segura pela OTAN, que resultou na morte do embaixador na Líbia Christopher Stevens. O embaixador ianque teve um papel decisivo na operação militar que derrubou o regime nacionalista do coronel Kadaffi. Stevens coordenou desde Benghazi a oposição pró-imperialista que durante o regime dos coronéis já estabelecia profundos vínculos com empresas transnacionais de petróleo sediadas no litoral do Magreb. O ataque à representação ianque em Benghazi surpreendeu a equipe de segurança da CIA, realizada com morteiros e lança foguetes de alta precisão, fornecidos pela OTAN aos “rebeldes” anti-Kadaffi durante a guerra civil que destruiu o país, ou seja, foi obra de seus próprios aliados, as milícias fundamentalistas islâmicas que combateram junto a OTAN para depor o legítimo regime da revolução popular que destituiu a monarquia entreguista. Por ironia da história, as armas que assassinaram o embaixador ianque foram fornecidas pelos próprios abutres imperialistas que hoje saqueiam as riquezas do país.

Neste quadro de crise da ocupação imperialista, que tenta inutilmente dar uma fachada democrática ao novo regime, a tendência das massas é de luta contra o embuste que prometia “liberdade”, mas acabou trazendo a fome e o desemprego para o proletariado líbio, destruindo suas conquistas sociais históricas que o colocavam no mesmo patamar de países europeus, segundo a própria ONU. O desemprego a falta de habitação e a fome castigam severamente as massas, destituídas de todas as suas conquistas sociais históricas após a ascensão do governo do CNT. Os amos imperiais dos bandos “rebeldes” só cobram a “fatura” da guerra e pouco se importam com a miséria do povo. O país que apresentava, até o início de 2011, o maior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) da África, um PIB per capta superior ao brasileiro e uma taxa de crescimento de 10,64%, segundo dados do próprio FMI, encontra-se agora às voltas com uma infraestrutura liquidada, principalmente pelos “bombardeios humanitários”. Está em curso a divisão do país por grupos tribais ligados ao imperialismo ianque, francês e britânico. Longe dos salões luxuosos dos “Amigos da Líbia”, as ruas das principais cidades do país são ocupadas agora por milícias armadas, onde tiroteios, sequestros e torturas tornaram-se lugares comuns. As vítimas preferenciais desses grupos formados pelos ex-rebeldes são os simpatizantes do antigo regime e africanos subsaarianos. Registre-se que essas ocorrências são todas pós-queda de Kadaffi e, obviamente, não têm causado sequer suspiros de indignação em nome dos “direitos humanos”. Três anos depois do suposto início da “revolução” na Líbia está claro que a vitória da OTAN, que teve o apoio de grande parte da esquerda revisionista do trotskismo sob o pretexto de combater uma suposta “ditadura sanguinária”, significa o recrudescimento da ofensiva imperialista contra os povos e nações oprimidas que se incrementa desde a queda do Muro de Berlim e o fim da URSS. Os alvos imediatos desta arquirreacionária cruzada moderna são particularmente no Oriente Médio o Irã e a Síria, mas também tem como objetivo próximo a Venezuela, o Estado operário cubano e a aniquilação das FARC. Por outro lado, está ocorrendo uma verdadeira invasão da África, na medida em que o imperialismo ianque via AFRICON (Comando Militar da África) está instalando tropas em 35 países a começar pela Líbia, Sudão, Argélia e Níger. O objetivo desta ofensiva é recuperar o mercado e a exploração do território que estava sendo alvo da influência chinesa. A nova intervenção imperialista na região do Magreb africano foi extremamente facilitada pela ação da OTAN na Líbia ano passado. Agora que as potências capitalistas fizeram do território líbio uma verdadeira base militar, se sentem mais livres para impor seus interesses na região.

Atualmente, o genuíno trotskismo se posta ao lado da resistência nacional líbia em combate aos trânsfugas que, como a LIT, se colocam a serviço da Casa Branca em nome da defesa da fantasiosa “revolução árabe”, clamando para que a mesma sanha neocolonialista seja vitoriosa na Síria e no Irã. Lembremos que o PCO, que hoje critica as posições pró-imperialistas do PSTU, também apoiou os “rebeldes” líbios e a época declarava: “A crise na Líbia, governada pelo ditador Muamar Khadafi, se agrava mais a cada dia que passa. As manifestações estão crescendo e a repressão está sendo extremamente violenta contra os manifestantes. Somente nas manifestações que estão ocorrendo nesta sexta-feira (18/02) foram mortos 27 pessoas, sendo 20 em Benghazi e 7 em Derna. As manifestações, assim como ocorreu no Egito, pode (sic) derrubar o Khadafi e sua política de apoio ao imperialismo” (sítio PCO, 18/02). Somente correntes de “esquerda” muito degeneradas moral e ideologicamente podem admitir estabelecer uma frente única militar com a Casa Branca para derrotar um regime nacionalista burguês, como era o de Kadaffi, por maior que fossem as divergências de classe com um caudilho deste calibre. Não contente, uma parte delas ainda fazem o mesmo agora na Síria! O genuíno trotskismo não foi enlameado pela conduta criminosa destes revisionistas a serviço de Washington, colocando-se nestes três anos de luta incondicionalmente no campo militar da resistência nacional líbia para expulsar os invasores ianques e abrir caminho para a luta revolucionária contra o imperialismo e as servis burguesias árabes!