Líbia destruída: Por que
a mídia capitalista e os revisionistas do trotskismo estão em completo silêncio
após três anos da suposta “revolução” que derrubou Kadaffi?
Um balanço político e
social faz-se necessário após três anos das primeiras “manifestações” que se
iniciaram na Líbia tendo como foco principal a cidade de Benghazi, localizada
no leste do país. O silêncio da mídia “murdochiana” que saudou
entusiasticamente o levante reacionário é completo. Já a esquerda que apoiou a
suposta “revolução” que derrubou Kadaffi não está nem um pouco interessada
neste debate crucial porque justamente sua política em favor dos “rebeldes”
mercenários se provou uma aberta orientação pró-OTAN e ao imperialismo.
Entretanto, para os marxistas revolucionários, este balanço é fundamental na
medida em que novas “revoluções” made em CIA estão em curso no planeta, como
vemos agora na Ucrânia. Os “rebeldes” líbios foram desde o início, em fevereiro
de 2011, apoiados tanto pelos revisionistas do trotskismo como pelas potências
capitalistas, como agora ocorre na ex-república soviética. Depois de ter sido
bombardeado pela OTAN na maior operação militar desde a II Guerra Mundial, com
as tropas das metrópoles imperialistas atuando em socorro aos “revolucionários“,
o território líbio foi arrasado. Estima-se que mais de 200 mil pessoas foram
mortas e o país encontra-se agora divido sob o controle de grupos armados que
disputam o domínio das reservas petrolíferas. O frágil governo do CNT, títere
das potências capitalistas, na verdade não passa de um gerente que representa
os interesses das grandes transnacionais. O quadro de desestruturação é tão
grave que em janeiro de 2014 os combates entre clãs rivais deixaram
dezenas de mortos. Os combates entre grupos tribais de etnia africana e árabe
no estado meridional de Sabha, no sul do país, deixaram 86 mortos. A situação
se complicou pela ocupação por milícias rebeldes de uma base militar na região,
o que obrigou o premiê-fantoche Ali Zeidan a mobilizar tropas instaladas no
estado de Misrata, a uns mil quilômetros de distância, para controlar a
situação. Um boletim oficial, sem confirmação independente, assegurou que a
base retornou às mãos das autoridades e que vários dos ocupantes, descritos
como seguidores do líder líbio assassinado Kadaffi foram presos. Os combates
entre milicianos Toubou, de origem africana, e os Awlad Suleiman, árabes,
recomeçaram dias atrás, após um período de tensa trégua desde março do ano
passado quando ambos se enfrentaram pelo controle de zonas petroleiras depois
de um ataque dos primeiros. A erupção de violência tribal e o ataque contra a
base aérea em Sabha agrava a situação de barbárie no país norte-africano,
ameaçado de fragmentação pela recém-proclamada autonomia de uma porção do norte
do país por milícias e chefes tribais que controlam quatro terminais de carga
de petróleo. Como parte da farsa democrática montada pela OTAN, a Líbia vai
eleger uma assembleia parlamentar agora em 20 de fevereiro para elaborar uma
Constituição em meio ao impasse político mais de três anos depois da revolta
que derrubou Kadaffi. O país do norte da África está tomado pelo caos, com um
impasse no Congresso entre islamitas e um partido tribal entreguista, enquanto
o novo exército treinado pela OTAN luta contra a resistência nacional. Pelos planos de
Bruxelas, uma vez que a Assembleia Constituinte de 60 membros seja eleita, terá
120 dias para elaborar uma nova Carta, que seria, então, submetida a um referendo
popular. Se o documento for aprovado, uma eleição para um parlamento-fantoche
será realizada no fim de 2014. Mas até mesmo esse processo de elaboração poderá
ser inviabilizado devido às diversas exigências e interesses de grupos tribais,
regionais e étnicos que já disputam influência sobre o governo de Trípoli.
A LBI denunciou desde fevereiro de 2011, apesar da intensa campanha da mídia “murdochiana”, que os “protestos” em Benghazi se tratam de mobilizações reacionárias patrocinadas por forças políticas pró-imperialistas, com a imprensa burguesa mundial amplificando seu peso social e superdimensionando a repressão estatal supostamente desferida. Encerrado o capítulo da saída de Mubarak no Egito, como um rastilho de pólvora, as “oposições” saem em cena em toda a região arábica. Em países onde sócios menores do capital financeiro ianque demonstraram incapacidade social em continuar do poder, a Casa Branca orientou a transição “lenta, gradual e segura”, já que estavam ou ainda estão na lista negra do “terrorismo internacional” o “conselho” foi armar a oposição e dotá-la de todo apoio político na mídia mundial. Na Líbia, logo os apoiadores do antigo monarca Idris, apeado do governo pelos coronéis em 69, foram a ponta de lança inicial para fazer eclodir o suposto movimento de massas contra o “tirano sanguinário” Kadaffi. Os monarquistas não tiveram muito trabalho para agrupar várias oligarquias tribais, muitas das quais tinham estabelecido laços financeiros e comerciais com empresas imperialistas sediadas na cidade de Benghazi. Não demorou muito, os “rebelados” contra o caudilho nacionalista já dispunham de sofisticadas armas pesadas que passaram a apontar contra o próprio povo líbio que insistia em permanecer ao lado da “ditadura sanguinária” de Kadaffi. Os primeiros confrontos resultaram em centenas de mortes de civis logo atribuídas pela mídia imperialista ao exército regular líbio, espalham-se os boatos da fuga de Kadaffi e da contratação de mercenários africanos pagos para defender o regime de Trípoli. Surgem as primeiras dissidências e fissuras no campo do regime, “nutrindo” a reacionária oposição agora composta por generais que se venderam a OTAN, jovens yuppies funcionários das petroleiras europeias e os pioneiros monarquistas com sua bandeira do monarca Idris. Forma-se um governo provisório em Benghazi reconhecido pelo covil de bandidos conhecido como ONU, que já conta com um Banco Central e até uma empresa de exportação de petróleo, isto tudo em meio a uma guerra civil. Como sabemos muito bem, o imperialismo ianque não costuma fornecer armas a movimentos sociais e, muito menos, colocar suas tropas a serviço de nenhum agrupamento de rebeldes que lutam contra uma ditadura. A história da luta de classes nos ensinou que as armas do imperialismo servem a movimentos contrarrevolucionários, como no Vietnam, na Nicarágua, em Cuba ou Angola só para citarmos alguns exemplos mais cristalinos.
Toda esta orquestração
estava voltada a debilitar o regime de Kadaffi no lastro do “efeito do dominó”
desencadeado pela suposta “revolução árabe”, tudo ao melhor estilo das
manipulações midiáticas feitas contra Chávez na Venezuela quando da época do
golpe de abril de 2002 desferido em nome da “democracia” e “contra o
autoritarismo”. A LBI foi a primeira corrente política a denunciar o caráter
pró-imperialista das reacionárias “manifestações” em Benghazi e depois
desmascarar os “rebeldes” mercenários a serviço da CIA, treinados no Catar com
o apoio do Mossad. No curso do conflito denunciamos a genocida ação da OTAN
contra o país norte-africano e defendemos a frente única militar com o governo
de Kadaffi e a vitória da resistência contra as tropas abutres invasoras. No
desenrolar da guerra se deu o brutal assassinato de Kadaffi em uma operação
conjunta entre os “rebeldes” mercenários e os bombardeios da OTAN, que depois
de meses atacando Sirte, centro da resistência, acabaram por dominar o país,
ainda que existam de forma dispersa focos de oposição ao controle da Líbia
pelos títeres do CNT. Enganou-se toda a matilha pró-imperialista que pensou que
a morte de Kadaffi foi o ponto final da resistência nacional às tropas da OTAN,
sem sombra de dúvida o tombamento em plena luta do coronel Kadaffi foi uma
grande derrota de todos os povos do mundo que enfrentam a ofensiva imperialista,
mas a guerra de libertação continua até hoje como reconhece inclusive o alto
comando do Pentágono. A situação política atual da Líbia está marcada por uma
guerra civil fratricida, só que desta vez com características bem mais
complexas e totalmente fragmentadas. As milícias “rebeldes” iniciaram uma luta
intestina pelo saque do país, disputando a “preferência” da intermediação dos
negócios com as metrópoles imperialistas. Nem mesmo a cidade de Benghazi
escapou da disputa “fratricida” dos rebeldes, a própria sede atual do governo
do CNT foi invadida várias vezes por manifestantes que exigiam o cumprimento
das inúmeras “promessas” feitas durante a empreitada para destruir as
conquistas da revolução democrática que derrubou a monarquia corrupta. Por sua
vez, houve o ataque, em setembro de 2012, à representação diplomática dos EUA
na cidade de Benghazi, cidade até então considerada segura pela OTAN, que
resultou na morte do embaixador na Líbia Christopher Stevens. O embaixador
ianque teve um papel decisivo na operação militar que derrubou o regime
nacionalista do coronel Kadaffi. Stevens coordenou desde Benghazi a oposição
pró-imperialista que durante o regime dos coronéis já estabelecia profundos
vínculos com empresas transnacionais de petróleo sediadas no litoral do Magreb.
O ataque à representação ianque em Benghazi surpreendeu a equipe de segurança
da CIA, realizada com morteiros e lança foguetes de alta precisão, fornecidos
pela OTAN aos “rebeldes” anti-Kadaffi durante a guerra civil que destruiu o
país, ou seja, foi obra de seus próprios aliados, as milícias fundamentalistas
islâmicas que combateram junto a OTAN para depor o legítimo regime da revolução
popular que destituiu a monarquia entreguista. Por ironia da história, as armas
que assassinaram o embaixador ianque foram fornecidas pelos próprios abutres
imperialistas que hoje saqueiam as riquezas do país.
Neste quadro de crise da
ocupação imperialista, que tenta inutilmente dar uma fachada democrática ao
novo regime, a tendência das massas é de luta contra o embuste que prometia
“liberdade”, mas acabou trazendo a fome e o desemprego para o proletariado
líbio, destruindo suas conquistas sociais históricas que o colocavam no mesmo
patamar de países europeus, segundo a própria ONU. O desemprego a falta de
habitação e a fome castigam severamente as massas, destituídas de todas as suas
conquistas sociais históricas após a ascensão do governo do CNT. Os amos
imperiais dos bandos “rebeldes” só cobram a “fatura” da guerra e pouco se
importam com a miséria do povo. O país que apresentava, até o início de 2011, o
maior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) da África, um PIB per capta
superior ao brasileiro e uma taxa de crescimento de 10,64%, segundo dados do
próprio FMI, encontra-se agora às voltas com uma infraestrutura liquidada,
principalmente pelos “bombardeios humanitários”. Está em curso a divisão do
país por grupos tribais ligados ao imperialismo ianque, francês e britânico.
Longe dos salões luxuosos dos “Amigos da Líbia”, as ruas das principais cidades
do país são ocupadas agora por milícias armadas, onde tiroteios, sequestros e
torturas tornaram-se lugares comuns. As vítimas preferenciais desses grupos
formados pelos ex-rebeldes são os simpatizantes do antigo regime e africanos
subsaarianos. Registre-se que essas ocorrências são todas pós-queda de Kadaffi
e, obviamente, não têm causado sequer suspiros de indignação em nome dos
“direitos humanos”. Três anos depois do suposto início da “revolução” na Líbia
está claro que a vitória da OTAN, que teve o apoio de grande parte da esquerda
revisionista do trotskismo sob o pretexto de combater uma suposta “ditadura
sanguinária”, significa o recrudescimento da ofensiva imperialista contra os
povos e nações oprimidas que se incrementa desde a queda do Muro de Berlim e o
fim da URSS. Os alvos imediatos desta arquirreacionária cruzada moderna são
particularmente no Oriente Médio o Irã e a Síria, mas também tem como objetivo
próximo a Venezuela, o Estado operário cubano e a aniquilação das FARC. Por
outro lado, está ocorrendo uma verdadeira invasão da África, na medida em que o
imperialismo ianque via AFRICON (Comando Militar da África) está instalando
tropas em 35 países a começar pela Líbia, Sudão, Argélia e Níger. O objetivo
desta ofensiva é recuperar o mercado e a exploração do território que estava
sendo alvo da influência chinesa. A nova intervenção imperialista na região do
Magreb africano foi extremamente facilitada pela ação da OTAN na Líbia ano
passado. Agora que as potências capitalistas fizeram do território líbio uma
verdadeira base militar, se sentem mais livres para impor seus interesses na
região.
Atualmente, o genuíno
trotskismo se posta ao lado da resistência nacional líbia em combate aos
trânsfugas que, como a LIT, se colocam a serviço da Casa Branca em nome da
defesa da fantasiosa “revolução árabe”, clamando para que a mesma sanha
neocolonialista seja vitoriosa na Síria e no Irã. Lembremos que o PCO, que hoje
critica as posições pró-imperialistas do PSTU, também apoiou os “rebeldes” líbios
e a época declarava: “A crise na Líbia, governada pelo ditador Muamar Khadafi,
se agrava mais a cada dia que passa. As manifestações estão crescendo e a
repressão está sendo extremamente violenta contra os manifestantes. Somente nas
manifestações que estão ocorrendo nesta sexta-feira (18/02) foram mortos 27
pessoas, sendo 20 em Benghazi e 7 em Derna. As manifestações, assim como
ocorreu no Egito, pode (sic) derrubar o Khadafi e sua política de apoio ao
imperialismo” (sítio PCO, 18/02). Somente correntes de “esquerda” muito
degeneradas moral e ideologicamente podem admitir estabelecer uma frente única
militar com a Casa Branca para derrotar um regime nacionalista burguês, como
era o de Kadaffi, por maior que fossem as divergências de classe com um caudilho
deste calibre. Não contente, uma parte delas ainda fazem o mesmo agora na
Síria! O genuíno trotskismo não foi enlameado pela conduta criminosa destes
revisionistas a serviço de Washington, colocando-se nestes três anos de luta
incondicionalmente no campo militar da resistência nacional líbia para expulsar
os invasores ianques e abrir caminho para a luta revolucionária contra o
imperialismo e as servis burguesias árabes!