sábado, 10 de janeiro de 2015



Direita e extrema direita disputam a hegemonia da "comoção nacional" francesa: Repudiamos o ataque terrorista e não somos "Charlie"!

O ataque terrorista ao jornal Charlie Hebdo, cuja real autoria política já parece bem evidente, gerou mais do que as duas dezenas de cadáveres até o momento. Conseguiu acelerar em muito uma dinâmica política na conjuntura francesa que já estava em marcha com o prévio colapso do governo "socialista" do neoliberal Hollande. A mobilização espontânea da população de Paris naturalmente chocada com a "tragédia" que se abateu sobre chargistas renomados da "sátira política" francesa, sintetizou no bordão "Je suis Charlie" uma palavra de ordem que abre muito espaço para uma escalada de xenofobia, mais precisamente para a islamofobia em toda Europa. A abstração lógica da situação política criada com o assassinato dos chargistas é imediata: "Nós os franceses concordamos com todas as provocações e humilhações que o Charlie Hebdo promovia sistematicamente contra a população muçulmana". Neste compasso (misto de emoção, consciência e ódio de classe) caminha acelerado o aval político de grande parte da população para que se avance na ofensiva imperialista (local e mundial) contra as nacionalidades palestina, árabes e crenças muçulmanas. Fica evidente que esta nova etapa reacionária também exige um novo poder estatal, muito mais alinhado com o "sentimento nacional" aberto após a "tragédia de Paris". Neste ponto começa a disputa pela "paternidade dos cadáveres" do Charlie, onde a extrema direita melhor representada eleitoralmente pela Frente Nacional saiu na dianteira, embora existam outros grupos menores de "colorido" ainda mais neofascista. Porém a "direita tradicional", que conta com a simpatia política de Washington para voltar ao "Palais de l'Élysée", não jogou a toalha. A "marcha pelos valores da República" convocada pelo governo Hollande em nome da "união nacional", que contará com a presença de vários chefes de estado da Europa é a expressão de preparar a transição pactuada entre o PSF e a UMP de Sarkozy. Entre estes dois centros políticos burgueses de direita se polariza atualmente a sociedade francesa, onde a esquerda social democrata ou reformista parece ter simplesmente desaparecido como expressão de massas. Não se deve ignorar que não há um "consenso absoluto" na França contra os imigrantes suas religiões e culturas, a realidade da periferia de Paris não é exatamente a mesma do "Quartier Latin", porém não existe uma clara representação institucional deste enorme segmento social, que geralmente se expressa pela via da ação direta. Os setores de vanguarda do proletariado francês devem rejeitar categoricamente os "valores" da chamada "unidade patriótica nacional", seja por sua ala conservadora ou neofascista, ambas simbolizam a opressão imperialista francesa contra os povos e nações. "Repudiamos o ataque terrorista e não somos Charlie" deve ser a plataforma que  galvaniza a esquerda revolucionária e todos os setores sociais que combatem a xenofobia e a direita. Qualquer concessão programática a demagogia patrioteira ou ao populismo reacionário que tomou conta das ruas de Paris pode custar muito caro aos trabalhadores, a experiência histórica do nazismo já demonstrou a que classe serviu. Não por coincidência fenômenos políticos de extrema direita sempre são potencializados a partir de "grandes tragédias", geralmente fraudadas e "sob encomenda" (incêndio do Reichstag). A tarefa central que se delineia no horizonte para os Marxistas Revolucionários é romper a "união sagrada"  que favorece as classes dominantes, dialogando politicamente com as camadas mais oprimidas e exploradas da França imperialista.

Afirmar que o periódico Charlie Hebdo era um "apêndice" da publicidade reacionária contra os povos árabes não o converte necessariamente em um alvo imperialista. Sua redação não se constituía em um ponto logístico ou militar do Estado francês. Nem mesmo poderia ser considerado "seriamente" um centro político da imprensa capitalista francesa. Neste sentido alertamos desde as primeiras notícias que chegavam de Paris sobre o ataque, que dificilmente teria sido operado por grupos fundamentalistas muçulmanos com suporte internacional, como a Al Qaeda por exemplo. As conclusões políticas do atentado levavam sua autoria no sentido oposto, ou seja uma "armação" típica de organismos de inteligência de Israel, que tem forte presença na França em função do grande número da população islâmica (a maior em toda Europa). O Mossad estava plenamente consciente dos enormes desdobramentos políticos que sua ação terrorista poderia gerar. Esta talvez seja a única diferença qualitativa entre o antigo nazismo e o neofascismo, uma colaboração estreita deste com o sionismo. Contra o nacionalismo árabe e palestino estão hoje "aliançados" a extrema-direita europeia e o Gendarme do imperialismo ianque no Oriente Médio. Neste exata questão reside a imensa diferença entre o 11 de Setembro nos EUA e o atentado ao "Charlie", que em comum só tem o fato de terem ocorrido em países imperialistas. No primeiro caso organizações islâmicas atacaram "nada menos " que o Pentágono (quartel general das forças armadas ianques) e as torres gêmeas do WTC (que sediavam a CIA e vários trustes econômicos imperialistas). Na segunda variante o atentado foi focado em uma redação de um pasquim, operado pelo Mossad com a ajuda da própria CIA.

O caráter multitudinário das manifestações em Paris e outras cidades da França contra o que tipificam como "terrorismo islâmico" demonstra que foi obtido o resultado político pretendido com o atentado. É óbvio que estas marchas não são reacionárias "em si mesmas", ainda são produto da "comoção nacional" contra o terror a um alvo militarmente indefeso. Porém possuem uma direção política que contempla um arco estatal e imperialista, e podem dar origem social a um vasto movimento xenófobo e neofascista. Desgraçadamente a esquerda revisionista continua a repetir a versão midiática e oficial do atentado, por mais insustentável que esta possa parecer. Esta nefasta conduta da "esquerda" acaba por legitimar o discurso das lideranças burguesas contra o "radicalismo árabe", mesmo que caminhem junto com terroristas do quilate de um Benjamin Netanyahu. Nem mesmo o comunicado do combativo movimento "Free Gaza", integrado pela ativista Mary Hughes Thompson, responsabilizando diretamente o Mossad pelo ataque ao "Charlie" foi capaz de modificar as "análises" da família revisionista.

Mais cedo do que tarde a imensurável força da história fará emergir a genuína versão dos fatos acerca da "tragédia de Paris", neste momento penetra entre a população as "noções" de que é necessário defender os "valores" da civilização ocidental contra a "barbárie", sintetizada no imaginário popular com o slogan "Je Suis Charlie ". Enquanto isso esta mesma "civilização" imperialista continua a atacar nações e ocupar países inteiros, sob o lema da "liberdade". Segundo esta "lógica" racista as milhares de vítimas (ou milhões para ser mais preciso) da "outra civilização" são de menor envergadura e claro muito inferiores as dos chargistas do "Charlie". Imaginamos que que "humoristas" muçulmanos que façam piadas "pesadas" sobre os defuntos do "Charlie" seriam considerados crápulas e no mínimo condenados à humilhação e prisão em plena sociedade do "paraíso da liberdade de expressão". Seria um gravíssimo erro político para os Marxistas Revolucionários apoiar, mesmo que "criticamente", as gigantescas mobilizações contra o atentado ao "Charlie", em curso neste momento na França e em toda a Europa.