Após dois dias de debate, o STF decidiu nesta quinta-feira, 12/04, que grávidas de fetos sem cérebro poderão optar por interromper a gestação com assistência médica. Apesar da decisão, o “Supremo” não considerou a sugestão para que fosse recomendado ao Ministério da Saúde e ao Conselho Federal de Medicina que adotassem medidas para viabilizar o aborto nos casos de anencefalia e também foram desconsideradas as propostas de incluir regras para a implementação da decisão. Em resumo, até mesmo para a interrupção de gravidez de feto anencéfalo a decisão é ainda extremamente limitada. Os ministros ressaltaram que o entendimento não autoriza “práticas abortivas”, nem obriga a interrupção da gravidez de anencéfalo. Apenas dá à mulher a possibilidade de escolher ou não o aborto em casos de anencefalia. A criminalização do aborto impedindo que a mulher disponha livremente de seu corpo continua e foi defendida pelo governo Dilma, sua “secretaria das mulheres” e o STF. Só nos casos de estupro e risco grave para gestante o aborto é permitido legalmente.
Tão logo foi proferida a decisão do STF, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), representante da arquirreacionária Igreja Católica no Brasil, lançou nota declarando que “legalizar o aborto de fetos com anencefalia é descartar um ser humano frágil e indefeso”. A entidade reafirma que esses fetos não podem ser considerados “mortos cerebrais” e que devem ser protegidos em seus direitos fundamentais. A Igreja Católica trata de se opor até mesmo a essa medida limitada do STF e vai para a ofensiva contra o governo Dilma. Nessa empreitada, conta com o apoio de Heloísa Helena, cristã e devota da Virgem Maria, que é ícone da cruzada burguesa reacionária contra os direitos democráticos das mulheres exercerem sua maternidade como e quando lhes convier, sem qualquer interferência do Estado. O mais escandaloso é que mesmo com todas suas posições aberrantes e sua aliança com Marina Silva, Heloísa foi chamada pelo PSTU para compor uma “frente classista” como candidata para a prefeitura de Maceió!
Enquanto a justiça burguesa e a Igreja Católica se unem ao governo da frente popular para defender a criminalização do aborto, as mulheres trabalhadoras sofrem com o desamparo à saúde pública, pelas perseguições do moralismo cristão-burguês do Estado capitalista que introduz a polícia na vida íntima da mulher, forçando-lhe, sob pena de prisão, a conhecer os “prazeres da maternidade”. Nega-se às mulheres trabalhadoras o direito democrático de disporem do seu corpo e de sua liberdade sexual, controlada pela família e Estado burguês. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), no Brasil, 31% das gestações acabam em aborto. Anualmente, portanto, ocorre aproximadamente um milhão de abortos, espontâneos e inseguros, com uma taxa de 3,7 abortos para cada cem mulheres de 15 a 49 anos. É uma verdadeira carnificina já que os abortos admitidos pela legislação no país são por razões médicas e legais, conforme previsto no artigo 128 do Código Penal que trata de risco de morte para a mulher e de gestação, fruto de estupro.
Esta é a democracia da desigualdade. Enquanto as filhas da classe média e da burguesia recorrem, à sombra da legislação hipócrita, às clínicas “clandestinas” sofisticadas com inteira segurança e higiene, as mulheres do proletariado sujeitam-se aos abatedouros de carne humana, já que abortam sem qualquer segurança ou auxílio profissional e em péssimas condições higiênicas, elevando as cifras de mutilações e complicações como perfurações uterinas, esterilidade, histerectomia e morte materna. Esta situação monstruosa é mais um exemplo que revela a farsa do chamado Estado democrático de Direito e sua democracia farsante a serviço dos ricos. Afinal, como dizia Lênin, toda classe dominante necessita, para garantir sua dominação, de duas funções básicas: a do carrasco, isto é, a repressão, e a do sacerdote, isto é, a ideologia. O Estado burguês, portanto, com suas instituições é um instrumento da violência organizada para manter a exploração da classe operária pelo capital.
Para combater essa realidade é preciso levantar um programa que defenda: salário igual para trabalho igual, descriminalização do aborto e direito universal sem qualquer restrição a todas as mulheres que queiram fazê-lo, realização do aborto com acesso gratuito e garantido pelo Estado nos hospitais da rede pública para as mulheres trabalhadoras, assim como o pleno direito de uso de preservativos, anticoncepcionais e pílulas do dia seguinte, distribuídos gratuitamente pelo Estado. Aposentadorias custeadas pelo Estado para donas de casa e empregadas domésticas. Criação de creches, lavanderias, restaurantes públicos e gratuitos próximos aos locais de trabalho, estudo e moradias. A erradicação completa da opressão social sobre a metade feminina do gênero humano requer a revolução socialista, liquidando o modo de produção capitalista e sua barbárie que usa o fantasma da crise para atacar as conquistas das trabalhadoras e seus companheiros de classe!
Para se opor à investida reacionária da Igreja Católica e à capitulação vergonhosa dos reformistas como Heloísa Helena e os setores que se dizem “progressistas” do governo Dilma, mas não desejam se indispor com os arquirreacionários representantes da classe dominante que sustentam a gestão burguesa de Dilma Rousseff, é necessário compreender que a luta pela descriminalização e legalização do aborto, tornando-o livre, gratuito e incondicional, soma-se a tantas outras reivindicações de caráter democrático dos trabalhadores, mas cuja realização é impossível nos marcos da senil democracia dos países atrasados. Desse ponto de vista, portanto, a defesa do aborto livre, legal e gratuito para as mulheres trabalhadoras deve ligar-se indissoluvelmente à destruição do regime capitalista e a superação de suas podres instituições. O fim da opressão feminina depende da capacidade da classe operária, mobilizada de forma centralizada e com seus próprios métodos de luta, liquidar o Estado burguês e sua exploração capitalista como parte da luta pela revolução socialista.