Há 50 anos do grande
comício da Central do Brasil: A burguesia nacional decidiu “sacrificar” seu próprio projeto de
país com medo da ação independente do proletariado, optando pela via sangrenta de
subordinação ao imperialismo
O grande comício da
Central do Brasil, realizado há exatos 50 anos, no dia 13 de março de 1964, foi
o último fôlego do governo nacionalista burguês do presidente João Goulart
diante das forças mais reacionárias e golpistas, apoiadas pelo imperialismo ianque,
que tramavam abertamente para implantar um regime político semifascista da ditadura militar. Jango e os generais que lhe davam “apoio” estavam conscientes de que a realização de um grande comício das
massas radicalizadas aceleraria em muito a dinâmica golpista em pleno curso.
Mas, pressionado pela ala “esquerda” de seu comando trabalhista, como Brizola,
Darci e Almino Afonso, resolveu bancar a
iniciativa, que envolvia vários segmentos políticos, desde as ligas camponesas,
passando pelo CGT dos burocratas sindicais do PTB e até o velho Partidão. O
comício pelas “reformas” superou todas as expectativas, não só pelo número de
participantes, mas fundamentalmente pela radicalidade de suas reivindicações,
que incluíram até o armamento dos trabalhadores. Durante o comício, que reuniu
cerca de 300 mil trabalhadores e estudantes, Jango assinou decretos de
nacionalização das poucas refinarias de petróleo existentes no Brasil e a
desapropriação terras com mais de 100 hectares ao longo das ferrovias e
rodovias federais, para fins de reforma agrária. Sem o apoio dos setores
decisivos da burguesia financeira e industrial, que estava cada vez mais
vinculada aos interesses do imperialismo, Jango prometeu implantar o projeto
nacional reformista das chamadas “Reformas de Base”, em defesa das quais vinham
crescendo as mobilizações de operários, camponeses e estudantes em todo o país.
As “reformas” pretendidas
inicialmente pelo PTB “Janguista”
nem de longe ameaçavam a ordem capitalista vigente, ao contrário eram parte de
um projeto maior “desenvolvimentista” da burguesia nacional que
buscava a ampliação de um mercado interno de consumo e a redução da dependência
financeira e industrial do país em relação a economia norte-americana. Mas a
alta cúpula militar não pensava exatamente desta maneira, apesar de uma ala de
generais como Castelo Branco e os irmãos Geisel concordarem com a ideia de
superar o atraso nacional pela via da industrialização do país. Este era o
ponto de “acordo” entre Jango e seus
assessores militares mais próximos, que logo depois vieram a
protagonizar o golpe fascista contra seu “comandante em chefe”, mas
um “pequena” diferença política os separavam, era justamente o papel
a ser jogado pelas massas proletárias e camponesas da nação. Para a
“inteligência nacionalista militar” o proletariado urbano e rural
deveria ficar completamente a margem de qualquer projeto
“desenvolvimentista”, além de considerarem “sagrados” os
vínculos comerciais do Brasil com os EUA. Na ausência do consenso com seu
gabinete militar, Jango resolve tocar em frente o comício da
"Central" o que provocou a
unificação “automática” dos oficiais supostamente “leais” a legalidade do governo (Castelo e Amaury Kruel) com os facínoras
golpistas do quilate de um Costa e Silva. Naquela histórica noite, onde
milhares de trabalhadores afluíram ao chamado do governo, na expectativa de uma brusca guinada à esquerda de Jango, um
comando militar terrorista, comandado pelo coronel Murici, planejava um atentado
a vida do presidente para precipitar o golpe naquele mesmo dia, foram contidos
no local pelo general Orlando que lhes “pediu” mais duas semanas
para “finalizar” a deposição
de forma mais organizada. No
palanque da “Central” suando
muito ao lado de sua bela mulher, Maria Thereza, Jango parecia já pressentir o
seu fim, mas não se acovardou e desferiu seu “petardo trabalhista e
nacionalista”: “Aqui estão os meus amigos trabalhadores, vencendo
uma campanha de terror ideológico e sabotagem, cuidadosamente organizada para impedir
ou perturbar a realização deste memorável encontro entre o povo e o seu
presidente, na presença das mais significativas organizações operárias e
lideranças populares deste país... A democracia que eles querem é a democracia
para liquidar com a Petrobras; é a democracia dos monopólios privados,
nacionais e internacionais, é a democracia que luta contra os governos
populares e que levou Getúlio Vargas ao supremo sacrifício” (Trecho do
discurso de Jango na Central do Brasil).
As “Reformas de Base” eram apresentadas como uma solução para a crise gerada pelo atraso nacional. Visando a ampliação do mercado interno, medidas como a desapropriação dos latifúndios improdutivos e a distribuição de terras às massas camponesas tinham como objetivo, além de fomentar o crescimento do número de trabalhadores com poder de compra, estendendo os direitos trabalhistas às massas assalariadas agrícolas, aumentar a produção de gêneros alimentícios a baixo custo para ampliar o mercado consumidor de produtos da indústria nacional. Para aumentar o poder aquisitivo dos trabalhadores urbanos, além do salário mínimo, repouso remunerado, férias e 13º salário, o governo prometia uma nova política habitacional que estimularia a redução dos custos dos aluguéis. O projeto das Reformas de Base buscava também a ampliar o mercado externo por meio da ampliação das relações comerciais com os Estados operários, como China e a URSS. Para conter a sangria de recursos financeiros, propunha a limitações às remessas de lucro das empresas estrangeiras para o exterior.
Mas, em si, as “Reformas
de Base” estavam longe de representar uma ameaça ao capitalismo. O ascenso do
movimento operário e popular, cujas mobilizações, impulsionadas pela luta em
defesa das reformas de base, vinham crescendo rapidamente desde o início da
década de 1960, era o que realmente constituía o centro das preocupações da
burguesia e do imperialismo ianque. As grandiosas manifestações de massas em
defesa das reformas eram utilizadas por João Goulart muito mais para chantagear
os setores reacionários da burguesia e o imperialismo, exigindo que estes
fizessem a opção entre o projeto burguês nacionalista das reformas ou a
revolução social e o comunismo. A essa chantagem, os setores conservadores da
burguesia nacional, com o apoio da igreja católica e do imperialismo ianque,
responderam com a reacionária Marcha da Família com Deus pela Liberdade ( que
os neonazistas pretendem reeditar agora) e com golpe contrarrevolucionário de
1º de abril de 1964, como uma ação preventiva diante do crescimento do
movimento de massas operárias e camponesas, que se manifestava em inúmeras
greves e embriões de de duplo poder, como as Ligas Camponesas no Nordeste.
Na verdade, as
"reformas de base" nunca sairiam do "papel", ou seja do
plano das intenções nacionalistas da impotente burguesia brasileira. Historicamente, estas reformas capitalistas
constituem tarefas de uma revolução democrático-burguesa e, portanto, já não
podem ser mais realizadas pela burguesia, que se tornou uma classe reacionária
na atual etapa de hegemonia do capital financeiro. Na fase histórica do
capitalismo monopolista em sua égide
imperialista, essas tarefas só podem ser realizadas por um poder
revolucionário, como parte da revolução proletária e da construção do
socialismo. O governo Goulart e dos setores nacionalistas da burguesia eram
politicamente incapazes de levar adiante o seu próprio projeto reformista, o
que ficou confirmado quando o governo não organizou qualquer resistência contra
os golpistas, ao contrário demoveu toda a resistência militar ao golpe,
deixando isolados todos que pretendiam organizar a luta armada. Por sua vez, os stalinistas do PCB, que
tinham o controle de parte di movimento operário, não desejavam a revolução
socialista e a Ditadura do Proletariado, "preferindo" fazer das
reformas nacionalistas do governo Jango e da política de colaboração de
classes, os fundamentos de seu programa, preparando assim o caminho para a
derrota sangrenta do proletariado.
Frente às “Reformas de
Base” do governo nacional populista de João Goulart, as chamadas políticas de
“inclusão social” dos governos da frente popular (Lula/Dilma) parecem uma
"brincadeira inofensiva", perfeitamente
palatáveis e até elogiadas pela burguesia conservadora e o imperialismo. Mas, a
enorme distância entre populismo do governo Jango e o atual governo da frente
popular, apenas revela o profundo retrocesso ideológico e político do movimento
operário nesses 50 anos. Porém, diante do acirramento da luta de classes, os
governos burgueses sempre utilizaram as chamadas reformas estruturais ou de
base como instrumento para enganar as massas trabalhadoras e preparar o caminho
da derrota do proletariado. Hoje, portanto, o papel da vanguarda classista mais
consciente, que reivindica o legado do Marxismo Leninismo , continua sendo o de
construir um autêntico partido operário revolucionário para assegurar a independência política da
classe operária e apontar a revolução proletária e o socialismo como único
caminho da vitória do proletariado.