quinta-feira, 28 de agosto de 2014


Greve na Argentina: “Paro Buitre” convocado pela burocracia sindical
pró-ianque tem a simpatia da oposição
de direita e do imperialismo

A Argentina foi palco neste dia 28 de agosto (28A) de mais um “paro nacional” de 24hs contra o governo de Cristina Fernandes Kirchner (CFK) convocado pelas CGTs dos mafiosos Hugo Moyano e Luis Barrionuevo, com o apoio discreto da patronal e entusiasta da família revisionista agrupada na FIT. Somou-se a este amplo arco político o principal representante lobista dos fundos abutres na Argentina, o American Task Force Argentina (ATFA). Para não restarem dúvidas, reproduzimos (do original em castellano) o elogio à paralisação: “El paro, organizado por el militante gremial y dirigente de la CGT Hugo Moyano, busca presionar al gobierno Kirchner a reducir los impuestos a la renta, para combatir la galopante inflación de la Argentina y promover el empleo. Esto parece adecuarse a la realidad, puesto que economistas han pronosticado que la tasa de inflación de la Argentina podría superar el 30% en 2014” (grifo nosso), lê-se no relatório da ATFA de 19/08! O 28A ficou bem aquém da “greve geral” de 10 de abril porque hoje os motoristas de ônibus representados pelo sindicato da categoria (UTA) trabalharam normalmente em Buenos Aires, pois sua direção alegou que não iria compactuar com a ofensiva econômica dos fundos abutres sobre o país. A paralisação teve a cobertura simpática do Clarín e La Nación (expoentes do PIG argentino) e o apoio das reacionárias Sociedade Rural e a Federação Agrária, do Vaticano comandado pelo Papa Francisco e o aval dos partidos da oposição burguesa (PRO de Macri, Binner da “Frente Progressista” e do ex-peronista Sérgio Massa), visando desgastar ainda mais o já fragilizado governo “nacionalista burguês” de CFK para colocar na Casa Rosada um gerente ainda mais servil à Casa Branca. Não por acaso, o governo argentino o qualificou como “Paro Buitre”! Acossada pelo imperialismo ianque que tenta extorquir o Tesouro Nacional através dos fundos abutres amparados em decisão da justiça norte-americana, a gestão da centro-esquerda burguesa vem tentando sem sucesso um acordo dito “soberano” com os credores mas que, de fato, mantém a sangria nacional ao negar-se a romper com os rentistas internacionais. Em contrapartida, Cristina toma medidas paliativas de controle do câmbio e intervenção da economia para controlar os preços dos produtos cada vez mais escassos nas prateleiras. Estas limitadas iniciativas vêm sendo rechaçadas pela patronal nativa e as transnacionais que boicotam as medidas e aproveitam o “paro” previamente acertado com as CGTs e a CTA (cujas consignas são distracionistas e objetivam favorecer a corrupta burocracia sindical com a exigência de mais verbas estatais) para atacar o governo CFK pela direita usando a providencial “mão esquerda”, mais precisamente das centrais sindicais opositoras e da FIT. Esta “Frente de Esquerda”, conformada pelo PO, PTS e IS e apoiada por uma ampla franja de pequenas organizações revisionistas (LIT/PSTU, TPR, LOI-DO, CS) dá uma cobertura “combativa” aos planos golpistas da ação de “massas” orquestrada pela burocracia sindical pró-imperialista em conjunto com a direita reacionária, servindo como operadores “militantes” do teatro montado através de piquetes e cortes de rua. Tanto que o PO convocou uma marcha para ontem, dia 27, com a CTA de Pablo Micheli, para demonstrar alguma diferença com as CGTs, “mobilização” que só serviu para reforçar os planos de Moyano e não o contrário, uma vez que foi extremante fraca e se limitou a entregar uma pauta de reivindicações aos deputados dos partidos da oposição burguesa no Congresso Nacional!

A convocatória deste dia 28A teve o apoio velado da oposição burguesa conservadora (Macri, De Narváez, UCR, FAP de Binner) assim como dos meios de comunicação, que estão dando, como em abril, uma inusual ampla cobertura à mobilização, na medida em que o protesto desgasta o governo CFK, sendo apresentado na mídia como uma sequência natural do 10A e dos dois “cacerolazos” ocorridos anteriormente sob a direção da direitona argentina. Os revisionistas do trotskismo agrupados na FIT assim como o MAS e outros grupos satélites menores apoiaram unidos e entusiasticamente a paralisação. A grande família revisionista trata de encobrir o fato que o móvel político do protesto não é as reivindicações dos trabalhadores (ainda que elas estejam presentes de forma extremamente secundária entre os reclamos), mas a política de um setor da burocracia sindical que em aliança com a direita e particularmente com a oligarquia rural pretende chantagear o governo em benefício de seus próprios privilégios enquanto é funcional ao objetivo de debilitar o governo nacional. Tanto que nos sindicatos que aderiram ao “paro” não houve sequer assembleias de base para organizá-los para não haver um debate democrático sobre os eixos do protesto. Estamos, portanto, vendo mais um capítulo da gestação da unidade entre a oposição conservadora, a burocracia sindical vendida e os revisionistas do trotskismo, em uma “santa aliança” na qual fortalece os setores abertamente pró-imperialistas da burguesia que almejam substituir a gestão nacional populista dos K por uma administração ainda mais alinhada à Casa Branca.

Curiosamente, em todas as entrevistas e comunicados, a burocracia sindical da CGT e CTA ignorou a reivindicação central dos trabalhadores por um salário mínimo vital ou outras demandas que dessem um corte mais classista ao protesto, justamente para não desagradar seus aliados de direita da Sociedade Rural e Federação Agrária. A principal reivindicação é a exigência de liberação imediata de 14 milhões que dizem que o governo deve às “obras sociais” dos sindicatos, recurso controlado diretamente pelos corruptos dirigentes. Em resumo, tentando paralisar algumas atividades chaves e fazer bloqueios de rua para impedir o trânsito, Moyano e a direitona ruralista pretendem fazer mais uma demonstração de força e para isto contam com o apoio da esquerda, que sabe perfeitamente desta manobra, porém avaliza o protesto. O PO conclama “27/28: Todos ao Paro Ativo” e apresenta um “cronograma” de cortes de ruas visando demonstrar que são os mais “aplicados” peões a serviço da política da burocracia sindical competindo neste terreno com o PTS. A única crítica às CGTs que Prensa Obrera (21/08) faz é que “ Moyano e cia convocaram a paralisação para o próximo 28 de agosto, sem perspectiva de continuidade” e apresentam como “delimitação que “a Coordenadora Sindical Classista-PO e a CTA convocamos para 27 de agosto mobivilizações em todo el país”. Ocorre que a CTA é também parceira da direita em seu raivoso anti-kirchnerismo, ajudando a desgastar o governo para que ascendam figuras como Macri, Binner, Massa, etc. Desgraçadamente, a esquerda revisionista argentina perdeu todas as referências de classe em sua sede voraz de ocupar postos no parlamento burguês. Juntos, “Morenistas” e “Altamiristas”, agora colados de forma oportunista na FIT, se esforçam para maquiar a face reacionária do “Paro” imprimindo palavras de ordem “combativas” em sua plataforma, além de organizarem os piquetes para tornar esta “greve geral” minimamente “ativa”. Lado a lado com Macri e Binner, Altamira proclama o “fim precoce” de Cristina, “sonhando acordado” em ver o seu PO dobrar sua bancada parlamentar as custas da falência política do Kirchnerismo. Acontece que nesta linha o Partido Obrero atua como reboque de “esquerda” da oposição conservadora e pró-imperialista, pavimentando a vitória do ex-peronista Sérgio Massa à presidência da república em 2015.

O PTS afirma que “Pese a uma convocatória burocrática e tardia, pese o temor das demissões na indústria, pese a traição dos dirigentes sindicais dos principais grêmios, milhões de trabalhadores decidira dar uma nova mensagem de protesto ao governo e aos patrões” (sítio PTS, 28/08). Por esta caracterização exitista os trabalhadores teriam superado suas direções burocráticas e protagonizado uma luta direta contra CFK e os patrões. Nada mais falso! Justamente por esta razão o PTS e os outros membros da FIT não fazem nenhuma denúncia da direita, que apoia veladamente os protestos! Como se vê, estes calhordas sabem perfeitamente do móvel reacionário e direitoso do 28A, mas apoiam o protesto justamente porque são favoráveis à unidade “de massas” com a oposição conservadora para desgastar Cristina, achando que podem capitalizar eleitoralmente seu debacle nas eleições presidenciais e parlamentares de 2015, criticando apenas a burocracia sindical por ser “tímida” em seus métodos de luta! Repetem na Argentina a mesma fórmula que fizeram na Líbia e agora intervém na Síria: unidade com os “rebeldes” pró-imperialistas contra governos que tem algum grau de atrito com a Casa Branca, ainda que daí se fortaleça uma saída política ainda mais reacionária! Como declara a ultrarrevisionista Izquierda Socialista: “A CGT Moyano convocou um paro general para este 28 de agosto. Depois de idas e vindas e que se passaram quatro meses do exitoso paro general de 10 de abril, os trabalhadores voltam a arrancar esta medida que permitirá unificar a classe operária” (IS, 28/08). Não por acaso, a IS/UIT defendeu armas para os monarquistas “rebeldes” líbios e agora saúda os fascistas na Ucrânia, em uma “ampla unidade” que inclui até mesmo Obama e a OTAN!

Não temos dúvidas que o governo de CFK vem cedendo às chantagens do imperialismo, muitas vezes atacando direitos dos trabalhadores e arrochando salários, política que os empresários se aproveitam para demitir como na fábrica Donnelley, porém para derrotar estes ataques a classe operária precisa atuar de forma completamente independente da direita e dos patrões e não apoiando os seus “lock out”, para que não se repita na Argentina “revoluções made in CIA” como vimos na Líbia e no Egito. Na ausência de uma direção revolucionária para o movimento de massas, o proletariado argentino atendeu o chamado da frente policlassista de oposição ao governo, reforçando objetivamente uma alternativa capitalista ainda mais conservadora e entreguista do que o atual bloco político Kirchnerista. Na prática, o que ocorreu hoje (28/08), melhor definido do que uma greve geral operária, foi uma reedição sindical dos protestos batizados de “20N”, ocorridos em 2012, onde a “pauta de reivindicações” não foi dirigida aos empresários nacionais, latifundiários ou corporações capitalistas internacionais, mas exclusivamente ao governo CFK.

É certo que o governo “nacionalista burguês” de Cristina vem assumindo uma linha cada vez mais neoliberal diante do agravamento da crise econômica que se agrava no país, notadamente com medidas de confisco salarial e maior repressão policial às mobilizações populares, porém os Marxistas Revolucionários não podem integrar-se em uma “frente de ação” com os setores mais sinistros da burguesia, sob a justificativa de apoiar uma “greve”, cujos objetivos passam bem distantes dos interesses históricos e imediatos da classe operária. Não poderíamos “ornamentar” uma convocação policlassista de direita (patrões e trabalhadores unidos pelo bem da nação contra o governo) com consignas de “independência de classe”, como tenta fazer a maioria da esquerda revisionista (FIT e agregados). Apesar do enorme descontentamento popular com um governo que reage à crise capitalista aprofundando a cartilha neoliberal dos rentistas internacionais, o movimento operário deve saber distinguir seus aliados na luta pelo poder socialista, dos “parceiros” demagógicos de ocasião que bradam ferozmente contra a presidenta CFK, mas que representam os interesses do imperialismo em subordinar a nação à banca de Wall Street. Uma verdadeira greve geral está na ordem do dia, não só na Argentina, mas de todo o continente latino atacado pela ofensiva imperial, mas uma “greve justa” sob hipótese alguma pode contar com o apoio político das transnacionais, oligarquia e rentistas, disfarçados em “companheiros de luta” contra o “autoritarismo e corrupção” dos governos da “centro esquerda burguesa”.


O que está claro é a necessidade de se construir uma alternativa própria dos trabalhadores, contra os ataques do governo “nac e pop” de CFK e a investida da direita. Nesta senda, os genuínos revolucionários declaram abertamente que não entrarão pelas portas dos fundos destas mobilizações direitistas de “massas”, como o 10A ou mesmo o atual “paro nacional” de 24 horas a serviço dos interesses de classe dos setores opositores da burguesia. O combate aos ataques de Cristina ao movimento operário e sua política de colaboração de classes não se dará no terreno do apoio às iniciativas da direita e da burocracia sindical, abdicando da completa independência política dos trabalhadores, mas denunciando justamente que estes “cacerolazos” e “paros” patrocinados por setores de alta classe média e os “sojeros” da classe dominante rural não são uma alternativa ao populismo de Cristina. É preciso levantar as demandas dos trabalhadores e usar seus próprios métodos de luta para derrotar o CFK e a oposição conservadora, nunca aliançar-se à reação para o “derrumbe” de Cristina. Os marxistas leninistas não nutrimos a menor simpatia política pelo governo burguês da senhora Cristina, mas jamais nos uniremos à escória direitista como Macri, De Narvaez ou o grupo Clarín para “derrubar” os K. Nossa tarefa é construir um campo de luta próprio e independente dos trabalhadores, denunciando vigorosamente Moyano e a burocracia sindical corrupta e mafiosa, assassina de Mariano Ferreira, como agentes patronais que não merecem nenhuma confiança dos trabalhadores, forjando uma oposição operária e revolucionária ao governo de CFK e a reação direitista. Somente a própria classe operária e seus organismos independentes de combate, e não agentes degenerados da burocracia sindical, terão as condições políticas necessárias para remover o nacionalismo burguês, a frente do estado capitalista, instaurando um novo poder, o governo operário como antessala da Ditadura do Proletariado. Uma genuína greve geral seria um bom “ensaio” para realizar esta tarefa histórica. No entanto “lutar” ao lado de bandos capitalistas reacionários para conspirar “ativamente” contra o governo CFK, só poderá ceder espaço à contrarrevolução golpista, de forma semelhante ao que ocorreu na deposição de Perón, em 1955, obrigando-o a partir para o exílio.