terça-feira, 19 de março de 2013

Leia o Editorial do Jornal Luta Operária nº 253, 1ª Quinzena de Março/2013
Impulsionar o sentimento anti-imperialista das massas! Apoiar Maduro sem capitular ao chavismo e seu programa nacionalista burguês!

A posição assumida pela LBI em apoiar criticamente a candidatura presidencial de Nicolás Maduro (PSUV) nas eleições presidenciais da Venezuela, que ocorrerão em 14 de abril, é uma inflexão política de todos nossos posicionamentos anteriores em relação ao chavismo, na medida em que nunca votamos em Chávez ou apoiamos cegamente seu governo, muito pelo contrário, defendemos publicamente o voto nulo nas eleições do ano passado como forma de publicitar a necessidade da construção de uma alternativa operária. Há de se perguntar então, quais as razões e motivações desta decisão política tão importante para o marxismo revolucionário nos tempos atuais? O intricado nó górdio da política venezuelana se apertou com a morte de Hugo Chávez, quando a população ocupou massivamente as ruas das principais cidades do país em reverência e memória ao líder bolivariano, em uma cristalina demonstração de seus sentimentos anti-imperialistas diante das incertezas para o próximo período, não obstante os obstáculos e limitações que o nacionalismo burguês lhes impunha. A esquerda reformista e seus “primos” revisionistas fez questão de apenas ver um “sentimento de dor” nas multitudinárias mobilizações que se sucederam ao assassinato do “comandante Chávez”. A nova conjuntura que se abre, de aberto assenso das massas que ainda está longe de configurar “um processo revolucionário”, foi prevista incisivamente por Barack Obama que ameaça: “Na Venezuela se inicia um novo capítulo em sua história, os Estados Unidos seguem comprometidos com políticas que promovam os princípios democráticos, o Estado de Direito e o respeito aos direitos humanos”. Ou seja, estamos na iminência da abertura de uma etapa de profundos ataques e ofensiva do imperialismo ianque contra o que o PIG classifica como a “ditadura chavista”. O povo venezuelano que apesar da mediação chavista, se confrontava com os fundamentos do establishment capitalista, deverá agora enfrentar mais duramente a oligarquia “crioula”, pela qual responde a chamada oposição liderada pelo multimilionário fascistizante Henrique Capriles, o herdeiro político dos golpistas de 2002. No dia 14 de abril, data das eleições presidenciais venezuelanas, a vanguarda do proletariado deve adotar uma política de “estimular” as tendências de radicalização do setor popular e camponês do nacionalismo burguês, estabelecendo uma unidade tática eleitoral com o chavismo contra a candidatura de Capriles e sua “oposição unificada” dos “esquálidos”, arquitetada e dirigida desde a Casa Branca, unidade tática que deverá ser materializada no apoio crítico à candidatura de Maduro, sem capitular politicamente ao “chavismo” e seu programa. Os marxistas devem se apoiar na tendência de giro à esquerda do movimento operário, utilizando os próprios instrumentos concretos construídos pela luta de classes, ainda que não sejam absolutamente “puros”, do ponto de vista de uma estratégia classista. A nova conjuntura iniciada com a brutal ofensiva imperialista de “ajuste” contra suas semicolônias e o covarde assassinato do maior símbolo contemporâneo da resistência nacionalista a esta ofensiva imperial, obriga os marxistas a estabelecer cada vez mais a tática da frente única, que neste caso venezuelano aplica-se no terreno eleitoral.

Muitas polêmicas e dissensões houve na história do trotskismo acerca do apoio crítico aos regimes nacionalistas burgueses e várias medidas que estes adotaram, exigindo posições claras dos revolucionários, sem subterfúgios e atalhos. Alguns dos exemplos aconteceram ainda em vida de Trotsky, como quando o “velho” bolchevique propôs aos bolcheviques leninistas a tática do entrismo nos partidos sociais-democratas no final da década de 30. Tratava-se da consecução de uma operação eminentemente temporária e a serviço da estratégia da construção do partido revolucionário em meio à ascensão do fascismo e não uma medida permanente (como adotaram o pablismo e o morenismo na década de 50). O objetivo consistia em arrancar os setores mais avançados da classe operária, que oscilavam à esquerda dentro de um aparato centrista ou reformista de massas, da influência das direções traidoras da social democracia. É temporária porque deve ser concluída em um curto prazo com a ruptura da fração trotskista quando as direções reformistas se verem esgotadas diante das reivindicações do proletariado. Na França, esta tática chegou a proporcionar bons frutos políticos, com a captação de centenas de novos militantes durante certo período. Evidentemente esta questão não foi compreendida por muitas seções da Quarta contaminadas pelo ultraesquerdismo, o que provocou a ruptura com Trotsky de grupos políticos ligados à oposição comunista na Bélgica, Grécia e Polônia. Na Inglaterra, a maioria de coletivos que se aproximavam do embrião da Quarta romperam com Trotsky acusando-o de capitulação à burguesia devido ao entrismo no Labour Party.

Trotsky, em meados de 30, orientou a que o pequeno grupo francês, o POI que simpatizava com suas posições, integrasse as listas eleitorais da frente popular, pela via do entrismo no Partido Socialista. Buscava, desta forma, intervir no processo concreto de organização do proletariado francês, profundamente embriagado pelas ilusões na social-democracia, no sentido de deslocar os setores mais à esquerda e combativos da vanguarda (organizada no interior do PS) para posições genuinamente revolucionárias. O velho bolchevique baseava-se na evidência de que a frente popular, encabeçada pelo “radical” Leon Blum, era a expressão de um processo de profunda instabilidade do regime capitalista, que diante da crise revolucionária teve que recorrer a um governo de colaboração de classes (frente popular) para estancar a profunda crise política e social. O voto aos “socialistas” dado pelos partidários de Trotsky na França, não tinha por objetivo encobrir o conteúdo contrarrevolucionário da frente popular, mas ao contrário, explorar suas contradições, baseando-se nas próprias tendências do proletariado francês à sua independência de classe, torpemente desviadas pela demagogia “operária” da social-democracia. O ponto de apoio para justificar o voto no PS era exatamente a referência política progressiva (afirmava-se a representação da classe operária) que este era forçado, pela pressão das massas, a veicular em sua campanha eleitoral. Usando este mesmo exemplo, justifica-se o apoio crítico dado ao burguês Mitterand em 1981 por parte de todos os grupos que se reivindicam trotskistas, o que é absolutamente diferente de capitular a seu governo frentepopulista, cuja expressão mais avançada foi a OCI lambertista.

Em outro cenário, mas com propriedades políticas similares, no México do general nacionalista Lázaro Cárdenas, logo após a chegada de Trotsky, as polêmicas e discussões foram bastante acaloradas em torno à caracterização do regime político levado a cabo pelo nacionalismo burguês, uma realidade que tem algum grau de paralelo com a Venezuela de hoje. Cárdenas havia estatizado a indústria do petróleo e promovia a seu modo uma reforma agrária no país asteca, o que foi suficiente para causar enormes fricções com o imperialismo. Além do mais, o período que se seguiu à crise de 29 impulsionou tensões sociais e políticas nas massas mexicanas, das quais Cárdenas era expressão destas tendências, fortemente marcado por um viés à esquerda. Não à toa, foi o único governo no mundo que concedeu asilo político ao dirigente bolchevique! Trotsky, com um balanço político fino, perspicaz e correto defendeu o apoio crítico às ações progressistas e democráticas de Cárdenas, mantendo a absoluta independência política do movimento operário em relação ao governo “bonapartista sui generis” que, apesar de suas medidas anti-imperialistas, preservava intocáveis os banqueiros, os latifundiários e os investidores estrangeiros. Mas, por outro lado, havia espaço para que as massas seguissem adiante com sua ação independente no sentido de colocar o regime político na berlinda. Contudo, a Liga Mexicana, seção da Quarta no país, lançou um panfleto que proclamava a necessidade da derrubada imediata de Cárdenas, desconsiderando as posições de Trotsky. Em carta a Diego Rivera, Trotsky criticara com veemência tal conduta, acabando por romper com esta seção, posto que significava quebrar o curso ascendente das massas mexicanas, se isolar das mesmas e, pior, mais infantilmente colocaria em risco a permanência do dirigente bolchevique no México, expondo-o à possibilidade de ser expulso sumariamente do país e não ter para onde ir. Claro, foi acusado de sacrificar os interesses dos operários e camponeses mexicanos às exigências de sua própria segurança, por isso “apoia Cárdenas” segundo seus detratores. Também por incompreensão e ultraesquerdismo, a seção argentina comandada por Libório Justo (Quebracho), segue o caminho da seção mexicana e rompe com Trotsky acusando-o infundada e delirantemente de ser um agente a serviço de Wall Street por ter declarado apoio às nacionalizações de Cárdenas. Via de regra, esses mesmos “puros” que acusaram Trotsky de “capitular ao nacionalismo” acabam se aproximando das posições mais direitistas e oportunistas, se aliando à direita reacionária e ao imperialismo!

Mais recentemente, o apoio crítico dado pelos revolucionários à candidatura Lula em 1989, diga-se de passagem, reivindicado por absolutamente todas as correntes políticas que se reivindicam trotskistas em nosso país, também pode explicar como é possível apoiar criticamente no terreno das eleições um candidato reformista ou nacionalista burguês, se em determinado momento as massas usam esta candidatura para expressar, ainda que deformadamente, sua luta contra o imperialismo. Não porque se tratava de se depositar confiança ou ilusões em Lula, ao contrário, compreendia-se perfeitamente seus limites programáticos e de classe. Porém, era no momento o que representava concretamente o apoio da parcela mais consciente da vanguarda no país, expressava a radicalidade (contida) e o ascenso das massas exploradas como produto da falência do antigo regime militar-civil de Sarney. Os comícios de Lula à época concentravam centenas de milhares de pessoas descontentes com o esgotamento do regime da chamada “Nova República”, perante a qual era possível a construção de uma alternativa dos trabalhadores independente da burguesia e da frente popular encabeçada pelo PT. Em resumo, a candidatura Lula de 1989, diferente das demais, se apoiava em uma força social e no ascenso das massas, tendo as mobilizações em seu apoio um claro corte de classe, independente da vontade de Lula e da direção do PT. Quando nós, da LBI, apontamos em nossa ruptura com Causa Operária em 1995, as profundas contradições políticas que cercavam a frente popular em 89, e a referência classista que Lula era obrigado a difundir, mesmo que deformadamente, pela pressão das massas em uma conjuntura de profunda instabilidade do regime da Nova República, fomos acusados por alguns “puros” de “apologistas de Lula”. Quando em 94, Lula deixa de apresentar-se como “candidato dos trabalhadores” — e isto não representa apenas a troca de um slogan político eleitoral por outro qualquer — para assumir diretamente o discurso da burguesia nacional e do capital financeiro internacional, desmontando completamente as mobilizações e greves da classe operária para desenvolver sua campanha totalmente “a frio”, em uma situação de aparente estabilidade política do regime democratizante, passamos a reivindicar o voto nulo. Estas diferenças são marcantes para definir a posição dos revolucionários e justamente é este o critério que adotamos agora na Venezuela.

Ácidas lições históricas como estas devem ser abstraídas da luta de classes para dar a dimensão exata do significado de apoiar criticamente, em determinados momentos de confronto com o imperialismo, regimes nacionalistas burgueses. Por isto, diante do ascenso multitudinal das massas venezuelanas após a morte provocada de Chávez (desde a Guerra Fria a CIA vem trabalhando com afinco para desenvolver substâncias que podem matar líderes “inconvenientes” de países não-alinhados sem deixar qualquer vestígio ou provas de envenenamento), as ameaças declaradas do monstro imperialista e da “oposição” golpista a soldo da Casa Branca e uma possível “mobilização democrática” organizada pela CIA, nada mais correto do que os genuínos revolucionários lançarem a palavra de ordem de acompanhar o apoio a Maduro sem capitular ao chavismo. Com o objetivo de impulsionar e dar vazão às enormes expectativas anti-imperialistas das massas em relação ao futuro político da Venezuela, deve-se apontar o voto crítico no PSUV. Isto porque sob a intensa pressão das massas o regime chavista foi obrigado a se confrontar, em certa medida, com os interesses políticos do imperialismo, como o apoio dado a Líbia e a Síria contra a intervenção militar da OTAN, apesar de nunca ter rompido os laços comerciais com os EUA (fornecimento do óleo cru às petrolíferas ianques). Cabe, portanto, aos Marxistas-leninistas potenciar o justo ódio das massas exploradas ao imperialismo demarcado após a morte (assassinato) de seu líder internacionalmente reconhecido, Hugo Chávez.

Com a ofensiva neoliberal do capital financeiro, que tem como sócias as oligarquias reacionárias, das quais o fascistizante Capriles (candidato único do bloco pró-imperialista), é a expressão mais acabada, os trabalhadores venezuelanos devem intervir taticamente neste processo eleitoral de forma independente, apoiando criticamente a candidatura de Nicolás Maduro no sentido de se constituir como alternativa aos setores patronais do chavismo, sem capitular uma vírgula sequer ao seu programa nacionalista burguês, estabelecendo uma profunda demarcação de campos com a reação pró-imperialista. Ao mesmo tempo, não devem depositar nenhuma confiança nas direções “bolivarianas” que a qualquer momento podem ceder às investidas da Casa Branca e às pressões da “oposição”, uma vez que desejam manter o regime de exploração capitalista seja com matizes “nacionalistas” ou entreguistas. A senda correta a ser percorrida é a luta em defesa e ampliação das conquistas sociais da classe operária, forjando no calor da batalha um programa genuinamente comunista de completa ruptura com o nacionalismo burguês. Devemos convocar a vanguarda classista para a ação direta, contemplando uma plataforma de ocupações de fábricas, nacionalizações de grupos econômicos sob o controle dos trabalhadores e socialização do latifúndio. A tarefa que se impõe nesta polarizada conjuntura, acompanhando a evolução política das massas, é a construção do partido operário revolucionário, única forma de combate consequente ao Estado capitalista.

LIGA BOLCHEVIQUE INTERNACIONALISTA