EM 3 DE JANEIRO DE 1898 NASCIA LUÍS CARLOS PRESTES: DO
TENENTISMO AO STALINISMO, A TRAJETÓRIA DO CAVALEIRO DA CONCILIAÇÃO DE CLASSES
Luís Carlos Prestes nasceu em Porto Alegre no dia 3 de
janeiro de 1898. Foi durante 37 anos, o principal dirigente do antigo Partido
Comunista do Brasil, o PCB, e faleceu em 7 de março de 1990. Em geral as
comemorações e homenagens a Prestes em nada contribuem para esclarecer o papel
desempenhado ele e o PCB em momentos decisivos da luta de classes no Brasil,
onde o Prestismo destacou-se pela submissão do movimento operário aos
interesses da burguesia nacional e do imperialismo
O CARÁTER PEQUENO-BURGUÊS DO TENENTISMO
O fenômeno do prestismo tem suas origens ligadas ao
movimento dos tenentes da década de 20. Foi exatamente dois anos após o
fracassado levante do Forte de Copacabana, que explodiu a rebelião tenentista
em São Paulo (05/07/1924), desencadeando outras revoltas e culminando na
formação da Coluna Prestes. Motivado por
seus delírios pequeno-burgueses de moralização política e aperfeiçoamento do
Estado burguês, mediante a realização de eleições honestas e do estabelecimento
do voto secreto, o movimento tenentista acreditava que a ação isolada de uma
elite militar, adotando métodos putchistas em nome de um programa democrático,
poderia substituir as lutas das massas contra seus exploradores.
Na revolta de 1924, Isidoro Dias Lopes, expoente máximo do
tenentismo da época, recusou o apoio dos operários, negando-lhes armas para que
pudessem organizar milícias populares; depois, em entendimento com o presidente
da Associação comercial, reprimiu os saques a depósitos e armazéns promovidos
pela população; e diante da brutal ofensiva das forças de Artur Bernardes, o
general Isidoro, seguindo os conselhos de seus amigos burgueses temerosos de
que ali explodisse uma insurreição operária, preferiu abandonar a capital
paulista nas mãos da repressão bernardista.
Cinco anos mais tarde, em nome do Comitê Central do PCB,
Leôncio Basbaum propôs aos chefes da Coluna uma aliança com os comunistas para
concorrerem as eleições de 30. Embora recusando a candidatura, Prestes
apresentou-lhe uma plataforma que revelava todas as limitações
pequeno-burguesas dos objetivos políticos do tenentismo. Consistia basicamente
em: voto secreto; alfabetização; justiça; liberdade de imprensa e organização;
melhorias para os operários.
Mesmo não aceitando esse programa, o PCB decidiu estreitar
relações com Prestes, esperando tirar algum proveito, tendo em vista que as
resoluções do seu III Congresso indicavam a aproximação de uma terceira onda
revolucionária, mais ampla e radical que as revoltas de 1922 e 1924, na qual a
classe operária teria uma participação ativa.
Sob o impacto da crise de 1929 e da ruptura do regime
oligárquico com o surgimento da Aliança Liberal, os tenentes se dividem. A
maioria, entre eles Juarez Távora, Miguel Costa e João Alberto, adere ao
movimento de outubro de 1930 em apoio a Getúlio Vargas. Como interventores,
muitos acabaram aliando-se às velhas oligarquias estaduais. Outros seguirão com
Eduardo Gomes em marcha para a direita.
PRESTES ADERE AOS STALINISMO
Quanto a Prestes, já exercendo forte influência sobre o
frágil PCB, marchará rumo ao stalinismo. Em maio de 1930, Prestes lançou um
manifesto onde proclamava uma "revolução agrária e antiimperialista"
e propunha a "instituição de um governo realmente surgido dos
trabalhadores das cidades e das fazendas".
Embora estivesse em perfeita harmonia programática com o
PCB, a partir do Manifesto de Maio e de uma série de outros manifestos que
publicaria até 1931, sua entrada no partido era barrada pela direção, que agiu
assim, muito mais por medo de sua influência, do que por divergências
político-ideológicas decorrentes de sua origem pequeno-burguesa e de sua
vinculação histórica ao tenentismo. Dessa forma, o ingresso de Prestes às
fileiras do stalinismo ocorreu através do secretariado sul-americano do
Comintern, tendo sido admitido no PCB somente em 1934 por determinação do
Comitê Executivo da III Internacional.
A adesão de Prestes ao stalinismo se deu no momento em que
este iniciava a aplicação de sua política de frente popular em todo o mundo. No
Brasil, o PCB, juntamente com alguns liberais burgueses e tenentes rompidos com
Getúlio, organizará a frente popular brasileira, denominada ANL (Aliança
Nacional Libertadora), posta na ilegalidade em 12 de junho de 1935, três meses
depois de sua fundação.
Uma semana antes, em 5 de julho, Prestes havia lançado mais
um de seus manifestos, em que exaltava o tenentismo, apresentando o movimento
aliancista como seu continuador e concluía lançando a palavra de ordem de
"todo poder à Aliança Nacional Libertadora". Entretanto, nem a ANL
estava pronta para o assalto ao poder, nem os líderes aliancistas estavam
dispostos a isso.
O levante de novembro, porém, não foi uma resposta à
clandestinidade imposta a ANL, mas uma aventura militar bancada pelo próprio
Prestes, onde a direção da III Internacional, apesar de dar todo apoio material
para a sua organização, vacilava com relação ao momento exato para a sua
deflagração.
FRACASSO DO LEVANTE DE 1935
O fracasso da revolta de novembro de 35 é o filho legítimo
da união entre o prestismo e o stalinismo, tendo o primeiro entrado com o velho
método das quarteladas como reconheceria o próprio Prestes 19 anos mais tarde,
no seu Informe de Balanço ao IV Congresso do PCB. "A influência do
radicalismo pequeno-burguês na direção do Partido, sob a forma específica do
chamado golpismo 'tenentista', levou-nos a cometer o grave erro de precipitar a
insurreição quando eram ainda débeis nossas forças na classe operária e, por
falta de apoio na massa camponesa, quase inexistente a aliança
operário-camponesa" (Dulles, John W. F. Anarquistas e comunistas no
Brasil, p.427)
A verdade é que as massas não tiveram participação alguma, o
PCB não tomou parte de forma ativa e organizada, e o próprio comando da
insurreição foi pego de surpresa, tomando a decisão de iniciar a revolta do Rio
de Janeiro somente depois dos levantes desencadeados em Natal e Recife. Por sua vez, o stalinismo forneceu os fundamentos teóricos
que tornariam claros os objetivos políticos do movimento.
UMA POLÍTICA ABERTA DE CONCILIAÇÃO DE CLASSES
Dez anos depois, no dia 26 de novembro de 1945, Prestes
diria num comício em Recife o que não foi possível dizer em 35, diante de mais
um fracassado levante tenentista: "Concidadãos! Fomos acusados naquela
época de que pretendíamos implantar o comunismo, que pretendíamos criar governo
soviético ou ditadura do proletariado. É mentira. É calúnia. Nem naquela época
e nem hoje supomos possível uma revolução socialista imediata em nossa terra.
Nós comunistas, somos socialistas, queremos e lutaremos até o fim para liquidar
a exploração do homem pelo homem. Mas não pensamos em implantar o comunismo.
Para nós, marxistas, dizer isto é dizer uma asneira, mas esses senhores da reação,
esses juizes dos tribunais de exceção não se incomodam, não têm vergonha de
dizer asneiras, desde que isto satisfaça aos interesses de sua classe. Os
comunistas, companheiros, na expressão de Marx, não pretendem criar nenhum
Estado ideal. Os comunistas, aqui no Brasil e em toda parte, lutam pela negação
dessa miséria atual, pelo contrário disso que aí está, mas esse contrário, essa
negação, só pode ser construída com os materiais de que dispomos, com os
recursos, com as condições objetivas de nossa terra e do momento histórico que
atravessamos. Portanto concidadãos, é falso, é injurioso, pretender condenar os
aliancistas em 1935 porque pretendiam implantar o comunismo. Os aliancistas
lutavam, em primeiro lugar, contra a fascistização de nossa terra e pelo
desenvolvimento econômico dentro das possibilidades do Brasil — revolução
democrático-burguesa, revolução agrária e antiimperialista, revolução que teve
lugar na França há mais de 150 anos" (Trecho do discurso de Prestes no
Parque 13 de Maio/Recife).
Tal projeto de revolução jamais foi proposto por Marx,
tampouco interessa aos operários como classe organizada em partido
revolucionário. "O objetivo imediato dos comunistas é o mesmo que o de
todos os demais partidos proletários: constituição dos proletários em classe,
derrubada da supremacia burguesa, conquista do poder político pelo
proletariado" (Manifesto Comunista).
Quanto à burguesia brasileira, em função das circunstâncias
históricas de seu desenvolvimento, desde o final do século XIX já não tinha
interesse numa revolução para desenvolver as tarefas democráticas nacionais.
Já em seu II Congresso, em 1924, o PCB caracteriza a
sociedade brasileira como marcada pela contradição entre o
"agrarismo" e o "industrialismo". Esta tese originou-se sob
a influência de uma concepção etapista de revolução, traçadas pelas Teses do
Oriente, de Bukárin, aprovadas no IV Congresso da III Internacional, que
propunham para os países semi-coloniais como o Brasil, a construção de uma
Frente Única Antiimperialista do proletariado sob a direção da burguesia
nacionalista como primeira etapa da luta pela libertação nacional e contra o
atraso agrário . O PCB defende "a necessidade de uma "revolução
democrático-burguesa", caracterizando o Brasil como uma economia
eminentemente feudal. Por meio de uma análise abstrata do modo de produção,
levantou a tese de que a revolução brasileira teria um caráter puramente
agrário e antiimperialista, desta forma, buscou justificar sua aliança com a
burguesia nacional ... Combatendo a aliança com a burguesia nacional, sócia
menor do imperialismo e incapaz de encampar as tarefas democráticas burguesas
já realizadas nos países mais desenvolvidos, surgiram os primeiros trotskistas
brasileiros, que denunciaram a traição do PCB ao movimento operário. Analisando
o movimento desigual e combinado, através de uma análise histórica,
caracterizaram o Brasil como um país capitalista, impondo-se a necessidade de
imposição das teses da Revolução Permanente" (Lutar contra o racismo é
lutar contra o capitalismo, JLO nº26, 12/96).
Para os trotskistas "as tarefas da revolução
democrática (revolução agrária, fim do analfabetismo, do atraso e dependência
econômica frente ao imperialismo) não podem ser realizadas, nem sequer podem
ser seriamente planificadas, sem uma aliança entre o proletariado e o
campesinato, numa luta implacável contra a influência da burguesia liberal
nacional ... A vitória da revolução democrática só é concebível por meio da
ditadura do proletariado" (Teses da revolução permanente, L. Trotsky).
Em busca de arregimentar a Frente Única Antiimperialista, o
PCB impulsiona a política de construir as frentes populares com o nacionalismo
burguês, desviando todas as lutas do proletariado para o pântano da colaboração
de classes.
APOIO AO VARGUISMO
Sob a ditadura varguista o PCB foi quase que totalmente
destroçado, dezenas de militantes foram vitimados. Em estreitas relações com a
Alemanha nazista, Vargas entregou Olga Benário — militante e companheira de
Prestes — nas mãos da Gestapo, a política secreta de Adolf Hitler, que ajudou
Filinto Müller na caça aos comunistas após o fracasso do levante de 35. Mesmo
grávida, Olga foi jogada nas mãos dos nazistas, e depois de cinco anos de
prisão em campo de concentração da Alemanha foi executada numa câmara de gás,
em 1942.
Ainda em plena ditadura, realizou-se a II Conferência
Nacional do PCB, onde Prestes foi eleito Secretário-Geral e os comunistas
aprovam uma política de União Nacional, que consistia em total apoio ao governo
de Vargas. Quando questionado sobre o apoio dado ao regime que havia condenado
sua companheira à morte, entregando-a aos nazistas, Prestes costumava dizer que
"os interesses do povo estavam acima de suas tragédias pessoais". Não
se tratava, entretanto, dos interesses do povo, mas dos interesses do
stalinismo, que na guerra contra o fascismo preferia uma unidade com o
imperialismo e seus aliados em detrimento da revolução mundial. Na defesa
desses interesses, os stalinistas não se envergonhavam em ofender a memória
daqueles que tombaram na luta contra o nazi-fascismo, aliando-se aos seus
carrascos.
Seguindo a orientação stalinista de dar sustentáculo aos
governos que haviam lutado contra o nazi-fascismo, em 1945, o PCB lançou a
palavra de ordem "Constituinte com Getúlio". A aplicação dessa
política no movimento sindical facilitou ao trabalho de Vargas na criação do
PTB, agrupando sob esta sigla as lideranças sindicais pelegas.
Logo após sair da prisão, Prestes expôs a nova política do
PCB num comício no Rio de Janeiro: "Na realização progressiva e pacífica,
dentro da ordem e da lei, de um tal programa, está sem dúvida a única saída
para a grande crise política, econômica e social que atravessamos. E é por
estarmos convencidos disto que, num gesto de lealdade e de superior
patriotismo, estendemos as mãos a todos os homens honestos, democratas e progressistas
sinceros, seja qual for a sua posição social, assim como seus pontos de vista
ideológicos ou filosóficos e seus credos religiosos. Só assim alcançaremos a
verdadeira união nacional, sem a qual seremos presa fácil do fascismo e dos
agentes do capital estrangeiro mais reacionário que, na defesa de seus
interesses, fomenta a desordem e prega a desunião, geradora do caos e da guerra
civil que precisamos a todo transe evitar" (Discurso de Prestes no Estádio
de São Januário-RJ, em 1945).
Mas, tomando para si a tarefa de conciliar todos os
interesses de classes, mostrando sua inteira confiança na democracia burguesa,
o stalinismo encontra um papel progressista até para os agentes do
imperialismo: "Num parlamento democrático será possível legislar contra o
capital estrangeiro mais reacionário, contra os contratos lesivos ao interesse
nacional e ao progresso do país. Isto não quer dizer que sejamos contrários ao
capital estrangeiro que nas condições do mundo atual ainda pode ser, dentro das
limitações da Carta do Atlântico e após as decisões históricas de Teerã e
Criméia, um dos colaboradores mais eficientes do progresso e da prosperidade
dos povos mais atrasados" (Idem).
Em novembro daquele mesmo ano, no comício de Recife, Prestes
daria mais uma demonstração do caráter mais reacionário do stalinismo:
"Companheiros! O Partido Comunista apoiando o governo durante esses seis
meses, alertou o nosso povo contra os golpes salvadores. Partido do
proletariado, partido ligado à classe operária, o Partido Comunista não deixou
de apontar ao povo o caminho da ordem e da tranqüilidade. Mostrava e dizia aos
operários: "é preferível, companheiros, apertar a barriga, passar fome do
que fazer greve e criar agitações — porque agitações e desordens na etapa
histórica que estamos atravessando só interessa ao fascismo. O Partido
Comunista foi, durante esses seis meses, o esteio máximo da ordem em nossa
terra" (Trecho do discurso de Prestes no Parque 13 de Maio/Recife).
OS ZIGUEZAGUES DO PCB
O prestismo, já como expressão nacional do stalinismo, fez
do PCB, no momento em que este desfrutava da maior influência de massas, um
sustentáculo do Estado burguês, mesmo sob o reacionário governo de Dutra,
frente ao qual a orientação política foi de "apoio franco e decidido aos
seus atos democráticos e de luta intransigente, se bem que pacífica, ordeira e
dentro dos recursos legais, contra qualquer retrocesso reacionário"
(Informe Político da Comissão Executiva ao Comitê Nacional, 04/01/46).
Com o PCB jogado novamente na clandestinidade, Prestes
lançou um manifesto-programa em agosto de 1950 em que rompia com a política de
União Nacional e exigia a queda do governo Dutra.
Entretanto, o Manifesto de Agosto mantinha intactos os
objetivos gerais do etapismo stalinista. Defendia a instituição de um
"governo democrático e popular" que seria o "legítimo
representante do bloco de todas as classes e camadas sociais, de todos os
setores da população do país que participarem efetivamente da luta
revolucionária pela libertação nacional do jugo do imperialismo, sob a direção
do proletariado".
Como instrumento capaz de unir essas forças, o manifesto
apresentava uma ampla "Frente Democrática de Libertação Nacional".
Era uma tentativa de reviver a frente popular, a exemplo do que fora a ANL.
Incapazes de desenvolver uma política de independência de
classe frente aos distintos setores da burguesia, a frente em que os
stalinistas iriam se emblocar no início dos anos 50, foi realizada com os
pró-imperialistas da UDN contra o nacionalismo varguista.
Vargas não era, evidentemente, um antiimperialista, mas sua
política de intervenção estatal na economia e de incentivo à indústria nacional
não interessava ao capital estrangeiro e dos setores da burguesia nacional mais
diretamente a ele ligados.
Portanto, o governo de Vargas estava pelo menos teoricamente
mais próximo do campo da aliança do PCB que os políticos da oposição udenista,
onde estavam abrigados os 'agentes do imperialismo' tantas vezes denunciados
pelos comunistas. Mas naquele momento, o caminho tomado pelo PCB para chegar a
um "governo democrático e popular" passava pela derrubada do governo.
Diante da reação popular ao suicídio de Getúlio, o partido
que se dizia vanguarda do proletariado, colocou-se a reboque das massas e,
mudando subitamente sua orientação política, deu seu apoio ao governo
nacional-desenvolvimentista de Juscelino.
O PAPEL DA FRENTE POPULAR EM 64
Mais tarde, o PCB estreitaria suas relações com o
nacionalismo burguês, impulsionando a formação de um "governo nacionalista
e democrático", apoiando o governo populista de João Goulart e suas
reformas de base, reivindicando a luta "antiimperialista" e contra o
latifúndio semi-feudal.
O PCB chegou a considerar o governo Jango como "seu
próprio governo", segundo as palavras de Prestes, um governo que faria a
transição pacífica para o socialismo.
O país era sacudido pelo ascenso histórico do proletariado
brasileiro contrastando com a política frente populista do PCB. "Durante
os anos de 1961 a 1963 ocorreram cerca de 200 greves generalizadas ou gerais
por setor, a maioria por reivindicações de ordem econômica e algumas poucas,
mas significativas, de caráter político. Uma das greves mais importantes foi a
que irrompeu a 6 de outubro de 1963, em São Paulo, que mobilizou cerca de
700.000 trabalhadores, 79 sindicatos e quatro federações ligadas a CNTI –
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria" (O Partidão, a luta
por um partido de massa, Moiséis Vinhas). Mas a frente popular jogou terra nos
olhos dos trabalhadores, desarmando-os para enfrentar a reação da
contra-revolução e criando ilusões de que o governo Jango garantiria a
democracia burguesa, preparando uma sangrenta derrota.
Às vésperas do golpe de 64, Prestes alimentou ilusões de que
o governo de Goulart deteria a ação dos golpistas. Na verdade, Jango já se
sentia extremamente pressionado pelas massas que queriam ir além das suas
"reformas de base". Portanto, o golpe militar foi desferido contra o
movimento operário que estava em ascensão. Um ano depois, a absurda avaliação
feita pelos stalinistas indicava que deveriam ter tomado medidas para deter o
ascenso das massas, como forma de evitar o golpe!
O ESPÓLIO DO PRESTISMO
Nos anos seguintes, o PCB passou por uma profunda crise.
Como a política stalinista não impunha a necessidade de conspirar contra o
Estado burguês, devido à crença na via de desenvolvimento pacífico para o
socialismo, o partido tornou-se alvo fácil da repressão do regime. Por outro
lado, sua completa submissão política à burguesia em movimentos pela
redemocratização, como o MDB e a Frente Ampla, provocaram várias cisões.
As organizações que surgiram a partir de rupturas do PCB e,
inspirados pelo foquismo, tomaram a via da luta armada contra o regime, não
expressavam rompimento com o stalinismo.
Ao contrário, o PCdoB, por exemplo, a primeira e mais
importante ruptura ocorrida ainda em 1962, surgiu defendendo a "revolução
democrático-burguesa", reivindicando o programa do IV Congresso e acusando
seus antigos companheiros de revisionistas por se afastarem da linha de Stalin.
Retornando do exílio em 79, Prestes lançou sua famosa
"Carta aos Comunistas", rompendo com o PCB e propondo a construção de
um novo partido. Sob o impacto desse documento novas cisões ocorreram. Algumas
delas, sob o nome de Coletivos Gregório Bezerra, deram origem em 1989 ao
Partido da Libertação Proletária (PLP). Seu programa apresentava vários pontos
em comum com o Manifesto de Agosto de 1950; reivindica as "transformações
antimonopolistas e antilatifundiárias"; propunha a formação de um
"governo proletário e popular"; e pondo roupa nova sobre a velha
frente popular, a denominava "Frente de Libertação dos Trabalhadores",
revelando que não havia sido assim tão profundo o seu rompimento com o
stalinismo.
Logo no primeiro confronto de classes que vivenciou, as
eleições de 1989, essa organização se diluiu. A maioria sucumbiu à pressão das
massas e aderiu ao programa da frente popular. O grupo dissidente entrou num
processo de isolamento que resultou na completa renúncia à atividade militante.
Hoje, os restos apodrecidos do extinto PLP dividem-se entre
os que permanecem presos ao projeto de frente popular e os que cumprem o papel
de guardiões do Estado burguês como técnicos, juízes e professores
universitários dedicados à revisão do marxismo.
Quanto a Prestes, depois de tentar ingresso no PT e até no
PMDB, terminaria seus dias sob a sigla do brizolismo. A trajetória do Cavaleiro
da conciliação de classes é a prova material da política nefasta que o
stalinismo impõe ao movimento operário, subordinando-o à burguesia e à
coexistência pacífica patrocinada pelo Kremlin, quando ainda existia a URSS,
orientação reverenciada até hoje por todos os matizes ainda existentes do
stalinismo (PCB, PCdoB), pela social-democracia (PT) e por aqueles que ainda o
idolatram, como o Movimento 5 de Julho.
O balanço que a vanguarda revolucionária deve abstrair do
prestismo é que sua política de colaboração de classes significou um tremendo
obstáculo na luta por destruir o capitalismo no Brasil, estando mais do que
nunca colocada a tarefa de construir um genuíno partido comunista, a IV
Internacional, único instrumento capaz de combater decididamente as traições do
stalinismo e livrar a classe operária de sua influência, armando-a com um
programa revolucionário.