quarta-feira, 3 de julho de 2013


Estranha aliança entre militares e as “massas” prepara golpe militar no Egito

O Conselho Supremo das FFAA do Egito, histórico aliado do imperialismo ianque no país, deu um ultimato ao presidente Mohamed Morsi, eleito em 2012 pelo Partido Liberdade e Justiça (braço político da Irmandade Muçulmana), exigindo sua renúncia imediata. O prazo para que Morsi deixe o governo acaba hoje! Apoiado por um setor das massas que saldou a chantagem do exército com seus helicópteros sobrevoando a Praça Tahrir com a bandeira nacional, o general Abdel Al-Sissi, representante da alta-cúpula militar, ordenou que Morsi deixe a presidência e o país passe a ser comandado por um “governo de transição” até a convocação de novas eleições que elaboraria nova constituição, já que os militares não reconhecem o atual ordenamento jurídico do país, aprovado no parlamento em dezembro. Porém, até mesmo esse script que joga na lata do lixo as eleições recentes e a constituição recém promulgada pode ser alterado, com as FFAA assumindo diretamente o governo do país caso suas exigências não sejam atendidas através de um golpe militar, o que é o mais provável. Em resumo, não bastasse as eleições de 2012 terem sido ganhas por Morsi, candidato do reacionário Partido Liberdade e Justiça, depois de uma fraude que levou o representante da alta cúpula militar, o general Ahmed Shafik e ex-premiê de Mubarak para o segundo turno, agora o alto-comando das FFAA está preparando abertamente um golpe militar. O desenrolar dos últimos acontecimentos é uma prova cabal do que afirmamos anteriormente: não houve qualquer “revolução” no Egito, mesmo democrática; ao contrário, estamos vendo a volta da Junta Militar diretamente ao governo. Entretanto, as ácidas lições a serem apreendidas no Egito não param por aí. O fato de um amplo setor das massas apoiarem o ultimato das FFAA, que pode descambar para um golpe militar claramente orquestrado com o suporte do Pentágono, que libera anualmente uma verba milionária para o exército egípcio em troca de sua fidelidade aos interesses do imperialismo ianque, significa que na ausência de um programa e de uma direção revolucionária o “povo na rua” pode apoiar saídas reacionárias.

É exatamente isto que estamos presenciando neste momento no Egito. Ainda que não tenhamos nenhuma simpatia pela Irmandade Muçulmana e seu governo, ao contrário, sempre denunciamos seu caráter reacionário, teocrático e sua tentativa de aproximação com a Casa Branca, como vimos na atuação de Morsi na Palestina domesticando o Hamas e pactuando com o enclave nazi-sionista ou mesmo rompendo relações diplomáticas com a Síria, o certo é que o Pentágono deseja passar por cima do resultado das urnas e impor um governo títere ainda mais servil à frente do Egito, país estratégico para seus planos no Oriente Médio, no marco da preparação de uma agressão ao Irã. Morsi e o Partido da Liberdade e Justiça, o candidato “light” na Irmandade Muçulmana eleito em 2012, possui uma enorme base social e resiste em renunciar, tanto que milhares de seus partidários estão mobilizados exigindo o fim do ultimado. Diante do impasse, Morsi declarou que a “legimitidade eleitoral e constitucional são as únicas garantias contra o derramamento de sangue. Não deixem eles roubarem a revolução de vocês”. Após o discurso do presidente, a Frente de Salvação Nacional (FSN), de orientação claramente pró-imperialista e que agrupa o ex-chefe da Agência Internacional de Energia Atômica, El-Baradei e o ex-secretário da Liga Árabe, Amr Moussa, afirmaram que a fala do presidente é “uma declaração de guerra”, tendo evidentemente o apoio das FFAA e de um setor das massas, que saldou os helicópteros que sobrevoaram a Praça Tahrir com a bandeira nacional exigindo a renúncia de Morsi. Segundo comunicado do Conselho Supremo das FFFA, este deseja formar um “Conselho presidencial” que incluiria além dos militares, a oposição burguesa (FSN) e o chamado Movimento Tamarood (rebelião em árabe). Este conselho afirma ainda o comunicado “estaria sob a direção dos chefes do exército que junto de um governo provisório prepararão novas eleições presidenciais e legislativas na ordem que será determinada pela nova constituição. O Exército, durante todo este período de transição ficará encarregado de supervisionar estes procedimentos a fim de garantir sua aplicação”. Como se observa, o golpe militar está sendo preparado para impor uma ditadura cívico-militar a fim de consolidar um governo integralmente alinhado com as ordens da Casa Branca. Em resumo, nem mesmo as fraudadas eleições presidenciais de 2012 apresentadas como produto da farsesca “revolução árabe” pelos revisionistas e a mídia “murdochiana”, que elegeu o candidato da Irmandade Muçulmana será respeitada! Isto ocorreu porque os acordos entre o imperialismo, a Irmandade Muçulmana e as FFAA estavam extremamente fragilizados em virtude da instabilidade do regime político. A Casa Branca resolveu recorrer diretamente aos seus velhos generais aliados desde Anuar Saddad e Hosni Mubarak na tentativa de estabilizar a situação política interna. Obviamente, para conseguir tal objetivo o imperialismo e as FFAA se apoiam em um sentimento de descontentamento popular com o governo Morsi, preparando uma saída ainda mais à direita para a crise do regime político parido da “revolução”.

Não resta dúvida de que estamos diante de um grave conflito interburguês, com setores das massas sendo manipulados diretamente por direções burguesas reacionárias, o que passa longe de ser expressão de qualquer “revolução democrática triunfante”, como afirmaram os revisionistas. Uma revolução, mesmo em sua fase democrática, só pode ocorrer com a formação de organismos de poder operário e popular, apoiados no armamento do povo e com demandas populares de caráter progressistas, que permitam amplas conquistas de direitos políticos e sociais. O que estamos presenciando é a contrarrevolução avançando no país dos faraós, com as FFAA assumindo definitivamente o papel de comando do governo, tendo o apoio de um setor da população. A estranha aliança entre militares e as “massas” a serviço de preparar um golpe militar demonstra que na ausência de um partido comunista e de um programa revolucionário o movimento de massas pode girar à direita. Agora mesmo, no Brasil, estamos vendo esta experiência, onde as mobilizações “espontâneas” foram paulatinamente sendo pautadas pelo PIG, abrindo espaço inclusive para a reação burguesa, setores de classe média “patrioteiros” e grupos fascistas, acossando pela direita o governo do PT. Como leninistas não fazemos nenhum tipo de fetiche teórico da espontaneidade das massas, ainda mais na ausência de norte programático e inexistência de uma direção classista e revolucionária. Reafirmamos que tanto no Egito como no Brasil, sem o protagonismo histórico do proletariado o movimento das massas pode facilmente girar à direita e convergir com interesses reacionários das classes dominantes. Não por acaso, a LIT que apoiou os “rebeldes” pró-OTAN na Líbia e saúda os mercenários na Síria, agora defende a unidade com os militares golpistas a serviço da Casa Branca. Segundo os morenistas, “Parece claro que o Conselho Superior das Forças Armadas está disposto – novamente obrigado pela força das mobilizações populares – a sacrificar outro governo para manter o regime. Por mais que se coloque a contradição de que a partir disso a cúpula militar reassumirá diretamente o controle do governo, será uma nova vitória das massas populares, parcial, mas importantíssima, pois ainda que não o destrua, terão acertado um novo golpe grande golpe no regime” (site LIT, 02/07). Esta tese demonstra que a LIT mais uma vez se alia à reação burguesa em nome da falsa “revolução” chegando ao ponto de apregoar que a ascensão dos generais reacionários ligados diretamente ao Pentágono será uma “vitória das massas populares”! Não é à toa que aqui no Brasil flertam com setores de direita que levantavam o “Fora Dilma” nas manifestações, eleitores de gente do calibre de Joaquim Barbosa. Em que direção irá o “povo na rua”, seja aqui ou no Egito, depende da intervenção consciente dos revolucionários e do programa que as manifestações levantem, onde os marxistas leninistas tentam superar a profunda confusão política e ideológica presente nos protestos populares. Por sua vez, os reformistas e alguns setores do stalinismo, como PC cubano e PKK grego, pregam que com a ascensão dos militares ao governo egípcio se romperia o eixo que o atual governo de Morsi formou com a Turquia e as petromonarquias do Golfo, como Arábia Saudita e Quatar, contra a Síria e o Irã. Nada mais falso, o alto-comando militar encastelado no poder desde Sadat e Mubarak sempre esteve alinhado com os objetivos estratégicos do imperialismo ianque, tendo em vista que é diretamente financiado e orientado pelo Pentágono. O exército egípcio é cúmplice histórico dos massacres ao povo palestino perpetrado por Israel, tanto que o país é um dos poucos no Oriente Médio que tem relações diplomáticas com o enclave sionista desde os acordos de Camp David. Na verdade, com o Conselho Supremo das FFAA perpetrando um golpe militar se aprofundaria ainda com maior força o alinhamento político e militar do Egito contra a Síria e o Irã, já que colaboram diretamente com os planos da OTAN!

Sem depositar nenhuma solidariedade política ao governo da Irmandade Muçulmana, chamamos os trabalhadores do Egito e sua vanguarda classista a derrotarem o golpe militar em curso, já que ele significa o maior controle do imperialismo sobre o país. Na medida em que combatem a contrarrevolução militar, os trabalhadores preparam as condições para superar o próprio governo Morsi, forjando no calor dos combates uma alternativa revolucionária de poder dos trabalhadores. Neste momento é crucial manter a total independência política entre os bandos burgueses e levantar um programa anticapitalista que esteja voltado a barrar o golpe militar. Mais do que nunca é necessário organizar o armamento popular e defender um programa de expropriação da burguesia baseada na formação de conselhos operários e populares. Para avançar rumo a uma verdadeira revolução no Egito, ainda que seja democrática, é preciso que o proletariado imponha suas próprias demandas de classe, sem estabelecer nenhuma “unidade tática” com a cúpula das FFAA que neste momento está abertamente a serviço do imperialismo ianque!