terça-feira, 28 de outubro de 2014


Eleição no Uruguay vai para um polarizado segundo turno, mas seguindo a "receita" de estabilidade social que a burguesia encaminhou no Brasil

As eleições presidenciais no Uruguay serão decididas em um acirrado segundo turno em 30 de novembro, com o candidato da Frente Ampla (FA) Tabaré Vázquez disputando a vaga de gerente dos negócios da burguesia com Luis Lacalle Pou, do direitista Partido Nacional. O 3º colocado no pleito deste domingo, 26 de Outubro, Pedro Bordaberry, acaba de declarar apoio a Lacalle, ou seja, a “oposição conservadora” está unida contra a “esquerda”. As pesquisas após o primeiro turno indicam Tabaré com até 46% de vantagem contra a “direita”. Como se observa no Uruguay, não apenas a data da disputa foi a mesma das eleições no Brasil, mas também a burguesia e o imperialismo estão impondo idêntica receita política que ditou na reeleição de Dilma Rousseff. Como no país vizinho não há a possibilidade da reeleição, a FA trocará o governo do social-populista Mujica pelo neoliberal de esquerda Tabaré, muito mais afinado com os “ajustes” que exigem a classe dominante nativa e os rentistas. Como a LBI alertou previamente, o ciclo de governos da “centro-esquerda” burguesa está em estágio de extrema fadiga na América Latina e a vitória apertada tanto de Dilma como a previsível recondução da FA ao governo central por uma pequena margem de votos são a antessala de futuras gestões de corte mais conservador no continente.  Assim como aqui, não há no Uruguay nenhum perigo de “golpe da direita” ou “ameaça fascista” como advogam alguns impressionistas no arco da frente popular nos dois países, porque tanto Dilma como Tabaré são gestores testados pela burguesia na aplicação da receita neoliberal no comando do Estado burguês. 

O plebiscito para introduzir uma reforma constitucional que pretendia reduzir de 18 para 16 anos a idade penal ocorrido paralelamente as eleições presidenciais recebeu o apoio de 47,1% dos eleitores, mas precisava do 50% dos votos mais um para ser aprovada. Esta medida, apesar de derrotada na urnas, demonstra bem a dimensão da pressão conservadora contra a FA, que ao mesmo tempo que fez populismo político com a legalização do uso da maconha mantém um governo tutelado pelas FFAA e servil as ordens do imperialismo. Assim como foi reeleita Dilma (que sucedeu dois mandatos de Lula), o atual presidente Mujica, ex-dirigente histórico do Movimento de Libertação Nacional – Tupamaro que hoje se denomina Movimento de Participação Popular (MPP), devolverá o governo ao seu antecessor Tabaré Vázquez, representante da ala direita da FA. Como no Brasil, há seis meses, a FA parecia ser favorita com certa folga para assegurar um terceiro mandato de cinco anos na presidência, com suas políticas econômicas voltadas a agradar os capitalistas e garantir “compensações sociais” aos setores populares mais empobrecidos. Mas depois de uma vitória inesperada nas primárias do Partido Nacional, Luis Lacalle Pou, de 41 anos, passou a subir constantemente nas pesquisas, canalizando via a defesa de uma “nova política” o descontentamento pela “direita”, algo parecido com o que Marina representou no Brasil.

Como pontuamos no artigo “As eleições na América Latina expressam a fadiga crescente dos governos da ‘centro-esquerda’ burguesa” (Blog da LBI, 10/10) portanto antes das eleições no Uruguay, Brasil e Bolívia, “Neste ano ocorrem as eleições presidenciais de várias países governados pela centro-esquerda burguesa como Brasil, Bolívia e Uruguai. Em 2015 a disputa será na Argentina e na Venezuela, neste último a direita golpista deve levar a frente o pedido de ‘referendo revogatório’ contra o governo de Nicolás Maduro. A tomar como exemplo as eleições presidenciais no Brasil, onde a direita pró-imperialista avança, quadro que se repete na Argentina e Venezuela, temos claramente um impasse político no ‘cinturão progressista’ que gerencia o Estado burguês no continente. No Uruguai, Mujica será substituído possivelmente por Tabaré Vasquez, representante da ala direita da Frente Ampla, após a realização de um segundo turno bastante disputado em novembro. Somente o governo de Evo Morales parece ter a reeleição garantida”. No caso específico do Uruguay vimos com Mujica o trânsito do “reformismo armado” a um governo de unidade nacional com as velhas oligarquias. O ex-guerrilheiro representou interesses diametralmente opostos aos da luta antiimperialista pela qual combatera há 40 anos e fez um governo de continuidade de Tabaré Vasquez, de perfil conservador dentro do bloco de governos da centro-esquerda burguesa.  Lembremos que o governo de “Pepe”, que vem publicitando mundialmente uma imagem de “progressista”, em Junho de 2014 não considerou que houvesse a supressão do estado democrático de direito no Brasil, mesmo com dezenas de ativistas políticos criminalizados e presos nos estados do Rio e São Paulo sob a absurda alegação de “terrorismo” e “formação de quadrilha”. Na verdade, o presidente Mujica não quis criar o menor atrito político com sua colega Dilma, “madrinha” da reeleição do corrupto governador Pezão. Os presidentes Dilma e Mujica ambos ex-presos políticos e também vítimas de acusações absurdas como as que foram lançadas contra os militantes sociais do Rio e São Paulo, foram cúmplices dos fascistas Alckmin e Pezão e jogaram na lata do lixo da história suas trajetórias políticas de guerrilheiros contra as injustiças do capital.

Foi com a ascensão da FA ao governo central do país nas eleições de 2005 que se acentuou o controle do capital internacional sobre a terra, o favorecimento do agronegócio exportador de papel e soja, ou seja, agudizou-se a dependência externa. O investimento estrangeiro saltou da média em torno dos 280 milhões para dois bilhões de dólares. Também se agravaram o monocultivo e o êxodo rural. Pelo menos 800 mil dos quase três milhões de habitantes país saíram do país, “exilados pela pobreza”, restando quase tão somente os idosos e as crianças. Mesmo assim, quando quase um terço da população foi obrigada a fugir da miséria imposta pelo parasitismo internacional que impôs uma profunda desvalorização da força de trabalho, Mujica defendeu uma política econômica que dê ainda mais garantias aos investidores externos e legalize o trabalho de crianças com mais de 10 anos. Conclusões: O Uruguai jogou por terra o mito neoliberal de que o chamado investimento estrangeiro produz emprego e ajuda a desenvolver o país. Enquanto sob o governo da FA o investimento estrangeiro cresceu em mais de 700%, quase um terço da população foi obrigada a sair do país para trabalhar.

Por seu turno, a gestão anterior de Tabaré (que deve ser reconduzido à presidência) aumentou o contingente militar uruguaio na criminosa ocupação do Haiti pelos governos da centro-esquerda burguesa a serviço do imperialismo e também participou da invasora missão de paz genocida no Congo. Acelerou as negociações para um acordo comercial bilateral com os EUA, o TIFA, privatizou o porto de Montevidéu, derrotou as tentativas de anulação da Lei da Caducidade (que consagrou a impunidade dos bárbaros crimes cometidos pela ditadura que teve como principais alvos a população trabalhadora e a guerrilha) e também vetou a lei que despenalizava o aborto, aprovada no Congresso e mais recentemente aplicada por Mujica. Por fim, aprovou uma Lei de Educação que liquida a Autonomia e a “administração compartilhada” entre professores e estudantes e permite a ingerência dos mercenários da educação privada nos planos da educação pública. Tudo isto o governo frenteamplista fez dispondo da direção do executivo e do legislativo, onde possuía a maioria parlamentar em ambas as casas do Congresso. Esta conjuntura extremamente favorável em que a Frente Ampla assume a condição de partido principal do imperialismo no país joga por terra a surrada justificativa usada pelas frentes populares de que apesar de dirigirem o executivo seriam reféns de um parlamento controlado pela direita.

Nestas eleições no Uruguay defendemos o Voto Nulo e reafirmamos que é preciso construir uma ferramenta política revolucionária, dos trabalhadores e de combate aos gerentes populares do imperialismo. As massas trabalhadoras uruguaias precisam de um partido operário revolucionário para acabar com a profunda dependência do país ao imperialismo, combater a concentração de terras, realizar a revolução agrária, punir os que perseguiram, torturaram, assassinaram e desapareceram com milhares de lutadores proletários e populares, conquistar o direito ao aborto garantido pelo Estado para as trabalhadoras, reverter o exílio da pobreza e impedir que a juventude seja superexplorada. Para tudo isto é preciso derrotar tanto a reação burguesa como a FA e sua política de unidade nacional com os patrões, através de uma luta sem tréguas que exige a fundação de uma genuína seção da IV Internacional no Uruguay.