Manifestações “pela democracia” em Hong Kong estão a serviço
de abrir uma cunha imperialista em toda a China
As manifestações que vem ocorrendo nos últimos dias em Hong Kong, ex-colônia britânica que foi devolvida a China em 1997 sob a base de um acordo para torná-la uma “Região Administrativa Especial” (RAE), refletem a pressão do imperialismo ianque e europeu para que a burocracia restauracionista chinesa ceda no controle político da Ilha e da Península de Kowloon localizada na costa sul do país. Ao fomentar protestos “por democracia” voltados a questionar a escolha das autoridades locais que ocorrerá em 2017 por voto direto universal, mas cujas candidaturas necessitem obrigatoriamente ter o aval de Pequim para que possam ser eleitas, EUA e Inglaterra desejam de fato promover uma queda de braço com o PCCh, provocando tensões que possam lhe trazer benefícios políticos e econômicos imediatos e futuros. Obama e Cameron sabem pelas lições apreendidas nas “Revoluções das Cores” nas ex-repúblicas soviéticas como a Ucrânia que golpeou o governo alinhado a Moscou e na “Primavera Árabe” responsável por derrubar o regime comandado por Kadaffi que é plenamente possível patrocinar manifestações de massas aparentemente com eixos “democráticos” contra governos adversários a fim de alcançar objetivos que sirvam aos monopólios capitalistas e a sua política de recolonização de regiões geoestratégicas. A guerra desenvolvida pela Ucrânia com a ajuda da OTAN na fronteira com a Rússia a partir de protestos pela unificação com a UE demonstra bem o perigo que a China corre. A “Revolução dos Guarda-Chuvas” como vem sendo denominada pela mídia “murdochiana” as manifestações em Hong Kong protagonizadas por setores da pequena-burguesia diretamente influenciada pelo Ocidente é parte desta estratégia desestabilizadora das potências capitalistas para debilitar a China e o bloco que forma com a Rússia e os BRIC´s. Hoje, 1º de Outubro, quando se celebram os 65 anos da Revolução que em 1949 expropriou a burguesia na China edificando um Estado Operário no país mas que décadas depois foi alvo da restauração capitalista, é preciso apresentar um programa para combater a ofensiva imperialista “democrática” em curso como estamos presenciando em Hong Kong e para superar pela via revolucionária a burocracia restauracionista do PCCh. A LBI, em contraposição ao silêncio covarde da “esquerda” que teme se chocar com a opinião pública pequeno-burguesa, mais uma vez é vanguarda na denúncia do caráter reacionário destas manifestações patrocinadas pelo imperialismo para desestabilizar seus adversários políticos, como foi na Líbia, na Ucrânia e agora em Hong Kong!
A burocracia chinesa que celebrou o acordo com o Reino Unido
sobre a base da política reacionária de “um país, dois sistemas” inspirada na
orientação de coexistência pacífica impulsionada há décadas atrás por Deng Xiau
Ping encontra-se em um impasse. Como vem operando com mão de ferro a transição
de um Estado Operário deformado para uma economia capitalista na China de forma
centralizada, o PCCh sabe que não controlar de fato Hong Kong, um centro
financeiro importante mundial, é uma ameaça ao conjunto do território chinês e
sua economia. A Lei Básica, uma espécie de Constituição da “cidade”, estipula
que Hong Kong deve ter um “alto grau de autonomia” em todas as esferas, exceto
nas relações exteriores e na defesa militar. Embora tenha um sistema
multipartidário em desenvolvimento, um pequeno círculo do eleitorado ligado à
classe dominante capitalista local controla mais da metade da sua legislatura
em associação direta com os grandes grupos econômicos internacionais. Como um
dos principais centros financeiros internacionais, Hong Kong tem uma grande
economia de serviço capitalista caracterizada pelo baixo nível de impostos e
pelo livre comércio que faz da ilha um entreposto de produtos e investimentos
de todo o planeta na fronteira com a China continental. O governo britânico
anunciou que convocará o embaixador da China para pedir explicações pela
situação em Hong Kong. Cinicamente, David Cameron afirmou estar profundamente
preocupado com os protestos em Hong Kong e recordou que a China se comprometeu
a preservar a “democracia” na ex-colônia britânica: “Quando alcançamos um
acordo com a China, existiam detalhes no acordo sobre a importância de dar à
população de Hong Kong um futuro democrático sob o amparo dos dois sistemas”
(BBC, 30/09). O Reino Unido devolveu Hong Kong em 1997, sob um acordo que faria
com que a China preservasse o sistema capitalista e o “modo de vida” da
ex-colônia até, pelo menos, 2047. Com sua política reacionária a burocracia
selou este pacto e hoje é refém desse compromisso!
O PCCh sabe que incrementar a repressão a centenas de jovens
formados sob a orientação educacional e ideológica britânica (burguesa e sem
nenhuma referência no Comunismo ou mesmo no “Maoísmo”) que se concentram nas
ruas do centro de Hong Kong pode ter consequências políticas e econômicas
imprevisíveis, ainda mais quando se sabe que a direção do movimento “Occupy
Central “ está diretamente orientada pela CIA/M-16 através de ONGs que se
travestem de defensoras da democracia para abrir caminho aos planos do
imperialismo. O confronto entre manifestantes e as forças de segurança no
domingo à noite levou a polícia a usar gás lacrimogêneo e spray de pimenta. As
cenas alimentaram os boatos na imprensa burguesa de intervenção do Exército
chinês, desmentidos pelo governo local. Segundo a imprensa chinesa, o “Occupy
Central” nasceu no America Center de Hong Kong. Em seminários especiais,
estudantes ativistas foram instruídos a “contribuir para o aprofundamento da
compreensão mútua entre chineses e americanos”. Foi exigido que jovens
ativistas “façam avançar mudanças democráticas”, prometendo-lhes apoio de
Washington, inclusive a possibilidade de estudar e viver nos EUA. Essas
atividades foram frequentadas por funcionários do consulado geral dos EUA. O
próprio dirigente do Centro, Morton Holbrook, que havia ocupado o cargo no ano
passado, é um agente da inteligência ianque com o tempo de serviço de 30 anos.
Jornais chineses destacam também as relações próximas entre o diretor do
centro, o magnata midiático Jimmy Lai, patrocinador da oposição e o antigo
ministro da Defesa dos EUA, Paul Wolfowitz. Anteriormente, nos anos de serviço
na CIA, Wulfowitz foi um dos autores do relatório sobre a ameaça soviética.
Agora, chegou a vez da ameaça chinesa. Os protestos exigem que em 2017 sejam
realizadas eleições diretas do chefe da administração, que hoje é eleito por um
colégio eleitoral. Sob a pressão de ativistas, as autoridades de Pequim já
emendaram o sistema eleitoral, aprovando uma ordem de acordo com o qual os
habitantes podem votar num dos candidatos propostos pelo colégio. O chefe do
Governo de Hong Kong, Leung Chun-ying, que tem o apoio de Pequim, exigiu nesta
terça-feira o fim imediato das manifestações, mas os manifestante direitistas
prosseguem com a mobilização até hoje, feriado nacional da China, que comemora
a vitória do PCCh sobre os nacionalistas e a proclamação da República Popular
da China em 1949. A China transmitiu nesta terça-feira o apoio total ao governo
de Hong Kong ante as manifestações: “Apoiamos completamente o governo da região
autônoma especial de Hong Kong para tratar este problema”, declarou a porta-voz
do ministério das Relações Exteriores da China, Hua Chunying. “Somos contrários
a todas as ações ilegais em Hong Kong”", afirmou. Todas as atenções se
focam agora em Pequim: o que irá fazer o Presidente chinês Xi Jinpin? Ceder em
Hong Kong e fazer um compromisso mesmo aparente com os manifestantes arriscaria
motivar protestos em outras Regiões Administrativas Especiais (ERA) como Macau
e Tibet, além de fomentar protestos na própria China como vimos recentemente.
Porém, aprofundar o uso da força contra manifestantes apresentados ao mundo
pela mídia murdochiana como “ jovens pacíficos” em um centro financeiro global
é algo que terá reação das potências imperialistas, processo que a burocracia restauracionista não deseja neste
momento. A possibilidade de um acordo limitado ao fim dos protestos é mais
tangível, demonstrando que as manifestações “pela democracia” em Hong Kong
estão a serviço de abrir uma cunha contrarrevolucionária contra a China de
conjunto.
A mídia “murdochiana” já compara a “Revolução dos Guarda-Chuvas”
com os protestos da Praça da Paz Celestial (Tiananmen) ocorridos em junho de
1989, em Pequim, capital da China. Naquele momento tropas do exército avançaram
com tanques sobre manifestantes, a maioria estudantes universitários, que
estavam em greve desde o final de abril. Lembremos que as manifestações de
protesto tiveram início após da morte de Hu Yaobang, ex-secretário geral do
Partido Comunista Chinês, em 15 de abril de 1989, vítima de um ataque cardíaco
durante uma reunião do Politburo do PCCh. Yaobang, que havia sido destituído do
cargo de secretário geral em 1987, era partidário da aceleração do processo de
restauração capitalista iniciado com as reformas de Deng Xiaoping, em 1979. Os
protestos, organizados principalmente por estudantes das universidades de
Pequim e por intelectuais reformistas, reivindicavam do governo do
primeiro-ministro Li Peng a adoção da linha advogada por Hu Yaobang, tendo como
eixo político o fim da corrupção e a implantação de liberdades democráticas em
geral. A maioria das correntes que se reivindicam do campo do trotskismo (LIT,
PO, UIT, CMI, PTS) proclamaram a defesa dessas manifestações como parte de uma
nascente revolução “democrática” ou mesmo uma revolução política incipiente,
abortada violentamente pela repressão stalinista. Agora apoiam a “Revolução dos
Guarda-Chuvas” em nome da democracia
contra a “ditadura chinesa do PCCh” . A principal fonte de inspiração
ideológica e política dos manifestantes de Tiananmen, em 1989, era a política
restauracionista da Perestroika/Glasnost, formulada por Mikhail Gorbachev que,
inclusive, visitou a China em maio, no auge das manifestações estudantis. Esses
protestos foram, na verdade, os primeiros de uma onda contrarrevolucionária
influenciada em parte pela plataforma restauracionista de Gorbachev, que logo
em seguida teve como consequência a queda do Muro de Berlim (novembro de 1989),
a ascensão de Lech Walesa na Polônia (1990) e a própria destruição da URSS
através da contrarrevolução imperialista encabeçada por Boris Yeltsin em agosto
de 1991. O fato de não nos colocarmos naquela época no campo dos defensores das
manifestações de protesto de 1989 na China, não significa, entretanto, que
estejamos incondicionalmente de acordo com os métodos repressivos que a
burocracia do PCCh lançou para acabar com o movimento. Era preciso uma política
audaz para ganhar a base dos protestos para as posições revolucionárias, que
chegava a cantar o hino da Internacional enquanto estavam acampados na praça e,
ao mesmo tempo, fazia-se necessário denunciar vigorosamente a política
restauracionista que movia os dirigentes do protesto, alinhados com o
imperialismo, reprimindo esses líderes pró-restauracionistas na medida em que
colocassem em xeque a existência do próprio Estado operário. Mas a casta do
PCCh obviamente era incapaz de adotar essa linha e preferiu impor a repressão
indiscriminada ao manifestantes. Mesmo porque, a fração da burocracia que
decidiu reprimir o movimento não tinha como objetivo romper com a orientação
restauracionista, mas, pelo contrário, pretendia conduzir e consolidar o
processo de restauração capitalista sob seu rigoroso controle político e
militar, como vem ocorrendo atualmente.
Na atualidade, como marxistas-leninistas declaramos que a
campanha orquestrada pela Casa Branca e a “City de Londres” está voltada a
gerar a fragmentação territorial da China e a desestruturação social, política
e econômica do país, forçando que o PCCh reprima as manifestações em Hong Kong
para provocar um enorme desgaste da burocracia restauracionista visando
fomentar uma oposição pró-imperialista interna em toda a China com peso de
massas, como vimos na Ucrânia recentemente. A esse trágico “filme” já
assistimos na extinta URSS e na antiga Iugoslávia, quando estas nações que
restauraram o capitalismo foram pulverizadas pelo imperialismo ianque e europeu
para melhor impor seus interesses políticos, econômicos e militares na região.
No caso específico da China, um país que transita ao capitalismo e tende a
converter-se em uma poderosa semicolônia, porque as bases econômicas do
desenvolvimento chinês se apoiam em relações de produção capitalistas onde a
burocracia restauracionista cada vez mais assume o papel de sócia subordinada e
dependente do capital financeiro internacional. Na medida em que na China está
em curso um processo de acumulação primitiva de capital para forjar a nova
burguesia, a Casa Branca e o imperialismo europeu buscam incentivar no curso
dessa transição divisões políticas que lhes favoreçam. Nesse terreno, se
colocam as manifestações pela “autonomia total” de Hong Kong, pela
independência no Tibet para “recriar” uma classe dominante baseada na dinastia
lamaísta e as tentativas de patrocinar, desde o governo Clinton, o separatismo
islâmico e muçulmano em algumas províncias chinesas via patrocínio da CIA às
atividades da Al Qaeda na região. Historicamente, o imperialismo tem recorrido
a vários meios políticos e militares para impor seu controle nos países que
consideram adversários ou desejam fragilizar.
Ainda que hoje a China seja um país convertido ao
capitalismo e, portanto, não mais um Estado Operário burocratizado, os
revolucionários não defendem as manifestações por “democracia” em Hong Kong mas
a construção de uma oposição operária e revolucionária ao governo local,
alertando o caráter reacionário da direção do “Occupy Central” e propagandeando
um programa comunista junto aos trabalhadores que reivindique liberdades
democráticas para luta por seus direitos e conquistas. Apesar disso estamos
contra a repressão estatal desferida neste momento contra o movimento das ruas
porque este não é o melhor método para combater os protestos direitistas.
Combatendo tanto a camarilha restauracionista que deseja fazer da hoje região
administrativa especial mais um elo da cadeia da restauração capitalista como a
classe dominante de Hong Kong que almeja via a ilha ajudar a converter o país
de conjunto em uma poderosa colônia capitalista, os operários e camponeses
devem rechaçar as manifestações patrocinadas pela velha elite local ancorada no
imperialismo ianque e europeu voltada a fragmentar o estado nacional chinês,
debilitando-o ainda mais frente ao imperialismo. Nesse contexto, o fato do
imperialismo ianque e europeu usar as “manifestações” em Hong Kong para
tensionar e disciplinar ainda mais o governo chinês em sua vereda
restauracionista, nada mais é que uma consequência do “jogo” que o próprio PC
chinês aceitou “participar” quando, em seu último congresso, ratificou todas as
orientações econômicas e políticas que preparam a transição definitiva para a
criação de uma nova burguesia nacional. Para o proletariado chinês e os seus
irmãos de classe das RAE está colocada, na ordem do dia, a luta por uma nova
revolução proletária no antigo Estado operário, hoje em conversão ao
capitalismo, já que tanto as alavancas fundamentais de sua economia socialista
foram todas suprimidas pela camarilha restauracionista, assim como parte da
burocracia stalinista inicia o processo de acumulação primitiva para
transformar-se em classe burguesa, orientando abertamente todos os setores do
Estado em favor de uma apropriação privada de capital. Só uma revolução
socialista na China, assim como no Tibet, Taiwan e Hong Kong, encabeçada por um
genuíno partido revolucionário, pode retomar a economia e o controle do Estado
para as mãos dos trabalhadores, unindo de forma revolucionária a China em torno
da construção do socialismo, como foram dados os primeiros passos neste caminho
há 65 anos.