segunda-feira, 20 de outubro de 2014



Porque os Trotskistas apoiaram Maduro para derrotar a direita golpista e não votam em Dilma contra a Tucanalha? Semelhanças e diferenças entre o nacionalismo Chavista e os neoliberais de esquerda do PT

Em meio ao debate sobre o segundo turno das eleições presidenciais brasileiras, onde diversos setores da “esquerda” não integrados diretamente a frente popular passaram a professar o “voto crítico em Dilma”, alguns revisionistas contestam porque a LBI não defende o apoio a candidata do PT “para derrotar a direta” já que em 2013 advogamos o voto crítico em Nícolas Maduro na Venezuela contra a ameaça concreta da direita golpista. Antes de mais nada é preciso compreender que a defesa do Voto Nulo (e também a participação nas eleições burguesas) não é uma questão de princípios para nossa corrente trotskista. O próprio núcleo fundador da LBI reivindica o voto crítico em Lula em 1989 porque naquele momento a candidatura da frente popular expressava (ainda que deformadamente) um enfrentamento de classe com o conjunto do regime político da “Nova República”, inclusive sendo o catalizador de diversas lutas diretas dos trabalhadores do campo e da cidade, apesar do programa de conciliação de classes do PT. De lá para cá (25 anos), houve a completa integração do PT a democracia burguesa e, mais particularmente em 2002, o partido de Lula assumiu o governo central no país em compromisso direto com o imperialismo ianque e a burguesia nativa de sustentação da ordem capitalista. O PT passou a ser um representante de classe do grande capital apesar da sua origem no movimento operário. Nesse sentido, deixou de ser um canal de expressão (mesmo limitado) da luta da classe operária contra a burguesia. O pacto social celebrado pela frente popular durante seu 12 anos de gerência é uma prova inquestionável do que afirmamos. Impôs o esmagamento das tendências de luta do povo pobre e bloqueou a radicalização dos combates nas ruas e locais de trabalho, optando-se por incrementar as políticas sociais “compensatórias” para os setores mais desorganizados e empobrecidos da sociedade capitalista e repressão a vanguarda classista enquanto foi garantido o lucro crescente aos bancos, empreiteiras e rentistas internacionais, como declarou recentemente o presidente do Bradesco, não por acaso apoiador da reeleição de Dilma. A realidade venezuelana veio no sentido inverso desde que Chávez assumiu a presidência em 1999. O quadro político-eleitoral do país foi levando a uma radicalização da luta de classes, ao ponto do próprio Chávez denunciar o seu envenenamento pela CIA, assassinato que foi antecedido por uma tentativa de golpe de Estado (2002) que teve inclusive o sequestro do presidente. A morte do líder bolivariano levou milhares às ruas em mobilizações multitudinárias contra a direita golpista/fascista e colocou a candidatura de Maduro diretamente no centro deste enfrentamento protagonizado por gigantescas marchas de cunho anti-imperialistas. Não por acaso, durante a campanha eleitoral várias sedes do PSUV foram incendiadas e houveram enfrentamentos de ruas com dezenas de mortes. A vitória apertada de Maduro contra o fascista Capriles não foi sequer reconhecida pela Casa Branca, que incentivou a continuidade das mobilizações contra o “chavismo”. Neste quadro, foi mais do que justo chamar o voto crítico em Maduro para “estimular” as tendências de radicalização do setor popular e camponês que apoia o nacionalismo burguês, estabelecendo uma unidade tática eleitoral com o chavismo contra a candidatura de Capriles e sua “oposição unificada” arquitetada e dirigida desde a Casa Branca, sem capitular politicamente ao seu programa. Os marxistas apoiaram na Venezuela a tendência de giro à esquerda do movimento operário, utilizando os próprios instrumentos concretos construídos pela luta de classes, ainda que não sejam absolutamente “puros”, do ponto de vista de uma estratégia classista. A conjuntura de brutal ofensiva imperialista de “ajuste” contra suas semicolônias e o covarde assassinato do maior símbolo contemporâneo da resistência nacionalista a esta ofensiva imperial, obrigaram os marxistas a estabelecerem a tática da frente única, que no caso venezuelano aplicou-se também no terreno eleitoral. A realidade brasileira passa há anos luz desta conjuntura, onde as tendências mais progressistas contra a democracia burguesa se apoiam hoje em uma adesão crescente ao boicote eleitoral devido a ausência de uma candidatura revolucionária, com o incremento dos votos brancos, nulos e abstenções, que instintivamente questionam o circo eleitoral e apontam que Dilma e Aécio são candidaturas que tem o mesmo caráter de classe, ainda que sejam apresentadas como um enfrentamento entre “esquerda x direita” justamente para melhor encobrir que ambas servem aos interesses do grande capital!

Alguns podem ainda afirmar que assim como na Venezuela estamos diante da ameaça do fascismo em nosso país para justificar o apoio crítico a Dilma! A LBI foi uma das primeiras organizações políticas a alertar o crescimento das tendências reacionárias no Brasil, inclusive em plena “Jornadas de Junho”, quando o conjunto da “esquerda” não governista saudava acriticamente as manifestações. Na época dissemos que o amplo retrocesso da consciência das massas imposta pelos mais de dez anos do governo do PT, que cooptou as direções sindicais e estudantis para impor violentos ataques aos trabalhadores e a juventude, em parte era responsável por esta situação dramática, possibilitando que o descontentamento com o conjunto do regime político burguês fosse capitalizado por forças a serviço da reação. Alertamos inclusive que se houvesse o aprofundamento da crise política, as próprias manifestações poderia vir a adotar o “Fora Dilma”, ou seja, o impeachment da gerentona petista. A primeiro momento, grupos como o “Acorda Brasil” e “o Gigante Despertou” colocaram em pauta já nas marchas a “prisão imediata dos mensaleiros do PT” e uma “faxina geral no Congresso” etc., reivindicações claramente orientadas pela tucanalha voltada a desgastar o governo Dilma para as eleições presidenciais que agora ocorrem, bandeiras que por seu conteúdo reacionário acabaram adquirindo contornos semifascistizantes, onde partidos e organizações de esquerda foram escorraçados das passeatas em nome de um “protesto cívico”, “pacífico” e “patriótico”. Naquele momento fizemos a seguinte pergunta “Frente ao curso reacionário dos atuais protestos nacionais queremos abrir o debate programático na esquerda que se reivindica anticapitalista e proletária se os revolucionários devem apoiar a campanha pelo “Fora Dilma”, orquestrada até o momento apenas de forma incipiente pelos grupos nazifascistas e o PIG?” (Blog da LBI, 23 de junho de 2013) e respondemos sem vacilar: “Os revolucionários, não podem, neste contexto, apoiar uma demanda reacionária de tal calibre, porque as verdadeiras consignas emanadas a partir da luta direta do proletariado (revolução agrária, aumento geral dos salários, fim do monopólio da mídia, passe livre, estatização do sistema financeiro) estão completamente ausentes de todo este processo político. Os marxistas leninistas devem lutar para que o proletariado entre em cena com sua própria feição de classe e em unidade com o campesinato pobre imponha uma pauta de expresse as demandas do povo trabalhador e da juventude explorada, que passa longe das reivindicações presentes nos protestos atuais. Somente com um combate aberto ao curso direitista das manifestações pode-se apontar uma alternativa revolucionária para os trabalhadores, não permitindo que o rumo político seja definido pelas mãos dos estrategistas do PIG que até agora estão conseguindo catalisar em seu favor o descontentamento com o regime político burguês. Desde a LBI, corrente que faz o combate sem trégua aos governos do PT durante os três mandatos da frente popular, inclusive identificando os ataques de Lula e Dilma ao movimento operário como responsável por abrir caminho para a reação em nosso país, declaramos que não vemos nada de progressivo no rumo que estão tomando os protestos e no chamado ao ‘Fora Dilma’ ou ao seu impeachment neste momento, já que tais demandas, se adotadas nesta conjuntura, só favorecem a reação” (Idem). Como se observa, no calor da luta de classes, soubemos combater o embrião fascista que se desenvolvia no útero das “Jornadas”. A frente popular conseguiu controlar a situação política e esta polarização política perdeu força nas ruas, tanto que na Copa do Mundo os protestos quase não ocorreram. A burguesia de conjunto, “a frio”, acordou que tudo seria resolvido por meio do circo eleitoral, inclusive com os setores de peso da classe dominante apoiando a reeleição de Dilma e não havendo qualquer ameaça fascista em nosso país neste momento, apesar do “Ovo da Serpente” está sendo chocado com o Opus Dei Alckmin. Desde já declaramos que poderíamos até mesmo estabelecer um bloco com o PT, a ala esquerda da burguesia, mas não no terreno eleitoral e em outra conjuntura, onde a direita burguesa ameaçasse realmente o movimento de massas com um golpe fascista, como ocorreu na Venezuela. Neste momento a única ameaça concreta é a continuidade da política de “ajuste” neoliberal, que já vem sendo levada a cabo pelo governo do PT e com a possibilidade da volta do PSDB com certeza se intensificará, mas se trata de uma diferença de grau dentro das gerências da burguesia e não um conflito de classe.

Muitas polêmicas houveram na história do trotskismo acerca do apoio crítico (ou não!) aos regimes nacionalistas burgueses e várias medidas que estes adotaram, exigindo posições claras dos revolucionários, sem subterfúgios e atalhos. Alguns dos exemplos aconteceram ainda em vida de Trotsky, como quando o “velho” bolchevique propôs aos bolcheviques leninistas a tática do entrismo nos partidos sociais-democratas no final da década de 30. Tratava-se da consecução de uma operação eminentemente temporária e a serviço da estratégia da construção do partido revolucionário em meio à ascensão do fascismo e não uma medida permanente (como adotaram o pablismo e o morenismo na década de 50). O objetivo consistia em arrancar os setores mais avançados da classe operária, que oscilavam à esquerda dentro de um aparato centrista ou reformista de massas, da influência das direções traidoras da social democracia. Trotsky, em meados de 30, orientou a que o pequeno grupo francês, o POI que simpatizava com suas posições, integrasse as listas eleitorais da frente popular, pela via do entrismo no Partido Socialista. Buscava, desta forma, intervir no processo concreto de organização do proletariado francês, profundamente embriagado pelas ilusões na social-democracia, no sentido de deslocar os setores mais à esquerda e combativos da vanguarda (organizada no interior do PS) para posições genuinamente revolucionárias. O velho bolchevique baseava-se na evidência de que a frente popular, encabeçada pelo “radical” Leon Blum, era a expressão de um processo de profunda instabilidade do regime capitalista, que diante da crise revolucionária teve que recorrer a um governo de colaboração de classes (frente popular) para estancar a profunda crise política e social. O voto aos “socialistas” dado pelos partidários de Trotsky na França, não tinha por objetivo encobrir o conteúdo contrarrevolucionário da frente popular, mas ao contrário, explorar suas contradições, baseando-se nas próprias tendências do proletariado francês à sua independência de classe, torpemente desviadas pela demagogia “operária” da social-democracia. Mais recentemente, o apoio crítico dado pelos revolucionários à candidatura Lula em 1989, diga-se de passagem, reivindicado por absolutamente todas as correntes políticas que se reivindicam trotskistas em nosso país, também pode explicar como é possível apoiar criticamente no terreno das eleições um candidato reformista ou nacionalista burguês, se em determinado momento as massas usam esta candidatura para expressar, ainda que deformadamente, sua luta contra o imperialismo. Não porque se tratava de se depositar confiança ou ilusões em Lula, ao contrário, compreendia-se perfeitamente seus limites programáticos e de classe. Porém, era no momento o que representava concretamente o apoio da parcela mais consciente da vanguarda no país, expressava a radicalidade (contida) e o ascenso das massas exploradas como produto da falência do antigo regime militar-civil de Sarney. Os comícios de Lula à época concentravam centenas de milhares de pessoas descontentes com o esgotamento do regime da chamada “Nova República”, perante a qual era possível a construção de uma alternativa dos trabalhadores independente da burguesia e da frente popular encabeçada pelo PT. Em resumo, a candidatura Lula de 1989, diferente das demais, se apoiava em uma força social e no ascenso das massas, tendo as mobilizações em seu apoio um claro corte de classe, independente da vontade de Lula e da direção do PT. Quando em 94, Lula deixa de apresentar-se como “candidato dos trabalhadores” — e isto não representa apenas a troca de um slogan político eleitoral por outro qualquer — para assumir diretamente o discurso da burguesia nacional e do capital financeiro internacional, desmontando completamente as mobilizações e greves da classe operária para desenvolver sua campanha totalmente “a frio”, em uma situação de aparente estabilidade política do regime democratizante, passamos a reivindicar o Voto Nulo e adotamos esta posição até hoje, ainda mais com a candidatura a reeleição de Dilma, a “gerentona” petista que não fez nenhuma demagogia social e de “esquerda” para as massas, não tendo qualquer vínculo com o movimento operário! Estas diferenças são marcantes para definir a posição dos revolucionários tendo o marxismo como um “guia para a ação” e justamente é este o critério que adotamos na Venezuela mas que não estão atualmente presentes na realidade do Brasil.

Voltando as diferenças entre a Venezuela de Maduro e o Brasil de Dilma, lembremos que logo após as eleições na pátria do chavismo, a direita golpista ligada diretamente ao imperialismo ianque anunciou que não reconhecia os resultados das urnas e partiu para ataques fascistas contra várias sedes do partido chavista pelo país, incendiando-as e deixando um rastro de sangue de sete mortos. Sem dúvida alguma, houve um avanço da contrarrevolução na Venezuela, com a burguesia nativa e a Casa Branca partindo para uma dura ofensiva diante da aberta polarização política e social, que definitivamente não se revolverá no terreno eleitoral. Este quadro político dramático que dividiu a Venezuela ao meio confirmou plenamente o acerto da posição principista da LBI de convocar o apoio crítico a Maduro, com total independência do chavismo e seu programa nacionalista burguês. Longe de patrocinar ilusões na candidatura do PSUV afirmamos que ela expressava deformadamente o sentimento e a tendência política das massas de lutar contra o imperialismo e seus marionetes. Por esta razão, apontamos em plena campanha eleitoral, que era necessário combater centralmente nas ruas, fábricas e no campo os inimigos de classe do proletariado, perspectiva que só se reforçou após o resultado eleitoral apertado. No caso de um êxito eleitoral de Capriles, em um cenário imediatamente após o assassinato de Chavez, as consequências políticas seriam trágicas não só para o proletariado da Venezuela, mas para o conjunto da América Latina. Os bolcheviques leninistas da LBI acertaram plenamente, nesta nova conjuntura aberta na Venezuela, em depositar pela primeira vez o apoio crítico ao chavismo, tendo como foco de análise o brutal avanço da ofensiva imperialista mundial detonada após a derrubada do regime burguês nacionalista líbio pelas forças da OTAN. Se o triunfo ou derrota histórica da classe operária venezuelana não se definirá no terreno eleitoral, um resultado desastroso nestas eleições poderia significar um “start” para a intervenção militar ianque aberta, já bem encaminhada com os golpes de estado em Honduras e Paraguay.  A tarefa que se impõe nesta polarizada conjuntura, acompanhando a evolução política das massas, é a construção do partido operário revolucionário, única forma de combate consequente ao Estado capitalista, cabendo à vanguarda do proletariado adotar uma política de “estimular” as tendências de radicalização dos trabalhadores para que se choque com os limites impostos pelo próprio Maduro e a direção do PSUV a frente do governo!

Fazendo uma “comparação”, o governo do PT expressa um alinhamento político de “centro-esquerda” burguesa, mas suas iniciativas no campo estatal estão muito aquém de governos "progressistas" da América Latina como o de Maduro na Venezuela. Dilma adota um corte neoliberal em seu governo muito próximo ao próprio tucanato (privatizações), diferente portanto do governo nacionalista burguês de Maduro, que muito se assemelha Kadaffismo e ao Sandinismo nos 60 e 70, que tinham choques abertos com o imperialismo e eram considerados seus adversários políticos publicamente. Por sua vez, a atual coalizão encabeçada pelos tucanos não pode ser definida teoricamente como fascista, apesar do seu caráter reacionário e francamente direitista. A própria dinâmica da luta de classes, indicando uma etapa de correlação de forças abertamente favorável a burguesia não impõe as classes dominantes a necessidade de um regime fascista ou mesmo algo assemelhado no Brasil. Isto não significa de modo algum que no interior do PSDB, ou mesmo do REDE, não se fomente um “feto” com simpatias políticas pelo neonazismo, estamos evidentemente falando do governador de São Paulo, Geraldo Alckimin, um candidato talhado para derrotar a Frente Popular em 2018 (ou antes mesmo do calendário eleitoral) com métodos golpistas e de “guerra civil” se necessário for. A ameaça fascista é uma resposta da burguesia a uma avanço da classe operária sobre as instituições apodrecidas do Estado burguês, corresponde a uma polarização aguda da luta de classes o que desgraçadamente está muito longe do que ocorre hoje no Brasil mas que estava presente claramente na Venezuela em 2013. São estas, em poucas linhas, as “razões” porque os genuínos trotskistas chamaram o voto em Maduro “contra o fascismo” e não apoiam Dilma “para derrotar a direita”. A vergonhosa covardia programática petista diante do nítido avanço da “nova” direita burguesa, que poderá lhe custar o posto de gerente estatal, é uma prova incontestável de nossas justas posições em defesa do boicote a esta farsa eleitoral da democracia dos ricos. A derrota efetiva dos bandos reacionários e protofascistas que acumulam forças em nosso país não se dará pela via do “voto crítico” no PT. Seja no Brasil ou na Venezuela alertamos, por fim, que para a classe operária, que já vinha sendo atacada em seus direitos e conquistas por estes governos “progressistas” que se limitam a política de “compensações sociais” aos setores mais empobrecidos e desorganizados da sociedade capitalista, a perspectiva que se avinha é de um golpe ainda mais duro sobre suas liberdades democráticas e suas condições de vida, com ataque direto ao salário, emprego e aposentadoria. Neste marco, sem patrocinar nenhuma ilusão nestes gerências “progressistas”, declaramos que a ofensiva pró-imperialista que avizinha deve ser combatida com os métodos de luta direta da classe operária na senda da construção de uma alternativa revolucionária de poder dos trabalhadores da cidade e do campo!