segunda-feira, 12 de setembro de 2016

O OUTRO 11 DE SETEMBRO: 43 ANOS DO GOLPE NO CHILE, ABSTRAIR AS LIÇÕES DA TRÁGICA EXPERIÊNCIA DA “VIA PACÍFICA AO SOCIALISMO”. REVISIONISTAS DE HOJE AINDA INSISTEM NA SENDA PARLAMENTAR COMO EIXO CENTRAL DE INTERVENÇÃO DO MOVIMENTO OPERÁRIO


Há 43 anos, em 11 de Setembro de 1973, era desferido um golpe de corte fascista patrocinado diretamente pelo imperialismo ianque (em uma operação direta da CIA) contra Salvador Allende, dirigente máximo do PS. A ofensiva da contrarrevolução ganhou terreno e desferiu sua investida fatal nesta data trágica para o proletariado mundial como produto direto da política de colaboração de classes do governo da Unidade Popular encabeçado por Salvador Allende. A UP correspondeu às características clássicas de uma frente popular, onde a burguesia em crise extrema e sob a pressão do ascenso popular faz concessões e entrega as linhas gerenciais do Estado burguês  a partidos reformistas de massas (PS e PC) para que estes controlem o movimento operário nos marcos do regime político burguês, orientação conhecida como “via pacífica ao socialismo”. Como herdeiro político desta orientação reformista, nas últimas eleições presidenciais, o PC seguiu a candidatura burguesa do PS, integrando a “Concertación”, uma coalizão de centro-esquerda que englobou o PS, a Democracia Cristã e o Partido pela Democracia. Hoje, Bachelet governa o país tendo como base uma política de colaboração de classes que não ameaça o imperialismo. Esta conduta demonstra que os neostalinistas chilenos não conseguiram abstrair as trágicas lições da grande derrota de 73. Por outro lado os revisionistas do trotskismo, que dizem criticar a chamada “via pacífica ao socialismo”, ainda hoje insistem na via parlamentar como eixo central de intervenção da “esquerda” e do movimento operário, demonstrando que também são reféns da estratégia reformista de alterar o caráter de classe das apodrecidas instituições do regime político bastardo democratizante, patrocinando trágicas ilusões entre os trabalhadores, senda contrarrevolucionária que leva nos nossos dias, assim como ocorreu no passado, a derrotas sangrentas para o proletariado latino-americano. No Brasil alguns falsários da esquerda frente populista insistem em defender a “democracia” como valor universal para denunciar o “golpe” contra Dilma Rousseff, comparando a gestão neoliberal do PT com o governo nacionalista burguês de Allende. Agora chegam a reivindicar "Eleições Já" como saída para a crise do regime político burguês, visando subordinar a luta das massas ao circo eleitoral da democracia dos ricos. Em comum aos dois períodos históricos somente a política seguidista dos reformistas, que em nome do "combate à direita" abdicam da tarefa de preparar a independência de classe do proletariado frente às diversas variantes políticas das classes dominantes e pavimentam o caminho da derrota seja pela via parlamentar ou pelas armas. Com esta estratégia desastrosa os reformistas abriram espaço para o desfecho golpista, apesar de terem "jurado" que lutariam contra o fascismo até a morte. No Brasil, o PT foi golpeado no parlamento pelos seus ex-aliados das oligarquias e não ousa questionar as carcomidas instituições burguesas, como o parlamento e a justiça patronal! O esgotamento precoce do governo Dilma e o desenvolvimento do golpe parlamentar no Brasil, não partiu de uma necessidade da burguesia nacional em desfechar um Golpe de Estado, ou seja, alterar radicalmente as linhas fundamentais do regime democratizante (uma paródia de democracia burguesa) instaurado com o advento da “Nova República” no Colégio Eleitoral em 1985. Esta variante (Golpe de Estado), como ocorreu no Chile, se coloca diante de uma situação de absoluta radicalização da luta de classes, onde a liberdade de organização da classe operária (direitos democráticos) pode se transformar em avanços revolucionários que ameacem a dominação capitalista. Nenhum destes ingredientes esteve presente na atual crise política do regime burguês no Brasil, mas todos estiveram evidentes no Chile de Allende há 43 anos atrás!

A vitória eleitoral de Allende e da UP em 1970 ocorreu quando as massas estavam em uma mobilização ascendente que ameaçava destruir o Estado burguês. O aniquilamento eleitoral da direita (Partido Nacional), a derrota do democrata-cristão Eduardo Frei — em condições de divisão da burguesia — era uma expressão aberta de que estava na ordem do dia para as massas chilenas a luta por construir um governo operário e camponês. Para sair dessa encruzilhada, que a própria evolução da luta de classes impunha, os partidos frentepopulistas se aliaram com a burguesia, o exército e o clero com o objetivo de preservar a ordem capitalista. Essa tarefa era impossível sem desorganizar as massas e derrotá-las. Esta foi a função política que veio a ter o governo da UP: organizar a derrota pacífica dos trabalhadores e, portanto, pavimentar o caminho para o seu esmagamento sangrento. No programa da UP, a conquista do poder deveria ocorrer a partir de mecanismos institucionais existentes através de um processo gradual, progressivo e pacífico, ou seja, rechaçava a tarefa de armar as massas para pôr abaixo o Estado burguês em um enfrentamento direto com a burguesia nacional e o imperialismo. As reacionárias instituições e estruturas capitalistas deveriam ser transformadas paulatinamente sem a necessidade de organismos de poder popular e soviéticos que superassem e destruíssem a estrutura jurídica, política e econômica que mantinha de pé o regime burguês. Essa utopia reacionária pregava que a ordem capitalista deveria ser transformada a partir da institucionalidade montada para mantê-la, a passagem do poder de uma classe para outra deveria ocorrer sem que se abrisse um processo revolucionário para sua conquista. Cumprindo esse objetivo, Allende promulgou uma lei que dava poderes ao Exército para fazer apreensões de armas sem aviso prévio. Esta medida estava dirigida às fábricas ocupadas e aos partidos de esquerda, em especial o MIR (Movimento de Esquerda Revolucionário) que possuía um contingente de mais de 16 mil homens armados, que compunham a própria UP. Ao mesmo tempo em que exigia o desarmamento dos cordões industriais, em meio à maior crise militar de seu governo, nomeou Augusto Pinochet como chefe das FFAA. A cúpula da coalizão governista apoiava-se nestes organismos de base exclusivamente para pressionar a direita e buscar uma solução negociada para a crise, conferindo-lhe funções de colaboração com o governo. Ademais, o próprio Allende e o PC se manifestam contra os organismos de base, taxando-os de esquerdistas e desestabilizadores do quadro jurídico-político e institucional. Dado o peso e a influência da UP no movimento operário e popular (CUT e sindicatos) e a ausência de um partido revolucionário que dirigisse esses setores mais conscientes, a vanguarda classista que se aglutinava em torno dos organismos de base não conseguiu se contrapor frontalmente ao governo e às instituições do Estado burguês que, naquele momento, eram apresentadas pelo PC e o PS como estando a serviço dos interesses dos explorados. Em consequência dessa política criminosa, um dos momentos de maior radicalização das massas foi desprezado e seu ímpeto contido, como forma de garantir a estratégia política reformista. Alçada ao poder para conter e desviar o avanço das massas trabalhadoras do campo e da cidade, criando a ilusão de uma “via pacífica para o socialismo”, a frente popular foi derrubada em um momento em que a classe dominante e o imperialismo conseguiram organizar a contraofensiva auxiliados pela política da UP de desarmar o proletariado e pactuar com os setores “constitucionalistas” da burguesia (DC) e das FFAA. Como bem sintetizou Trotsky: “a política conciliadora das Frentes Populares condena a classe operária à impotência e abre caminho para o fascismo” (Programa de Transição, 1938).

No auge dessa crise, ocorre o golpe militar em setembro de 1973. Os trabalhadores resistiram heroicamente, as FFAA bombardearam as fábricas ocupadas e os rendidos foram sumariamente fuzilados. As ilusões de Allende que, horas antes de sua derrubada, chamava as massas a confiarem nos militares “patriotas” foram cúmplices do massacre, ainda que o “presidente-companheiro” tenha pagado com sua própria vida por elas. Com o golpe militar, o exército sequestrou e assassinou mais de 8 mil militantes e provocou o exílio e o cárcere de outros milhares. As Forças Armadas bombardearam bairros populares, fuzilaram, prenderam milhares de pessoas nos quartéis e, principalmente, no Estádio Nacional em Santiago do Chile. Por sua vez, o imperialismo norte-americano, através da CIA, ajudou ativamente a preparação do golpe. Esse massacre esteve a serviço de assegurar a recolonização do país e a destruição das conquistas da classe operária. O “pinochetaço” e o estabelecimento da ditadura militar finalizaram a curta experiência do governo da UP. Hoje, assim como no passado, a política de colaboração de classes da frente popular limita a radicalidade do movimento de massas e sem uma plataforma revolucionária as lutas operárias e estudantis em curso tem acabado por servir à demagogia “antineoliberal” do PS que, convertido integralmente ao capital, retornou à presidência já não mais em nome da defesa da “via pacífica ao socialismo”. Bachelet  voltou à presidência para gerir a reacionária ordem burguesa “democrática” que mantém intacto o mesmo regime social de exploração da classe trabalhadora vigente na ditadura militar!

Os longos anos de colaboração de classes do PS e do PC, em razão da ausência de uma alternativa de direção revolucionária para as massas, abriram caminho para o neopinochetismo, hoje reciclado com a máscara de uma direita parlamentar, em face estar mantido intactas as bases políticas, o poder dos militares torturadores genocidas e, inclusive, a reacionária constituição de 1980, aprofundando de maneira combinada tudo isto o ataque sobre os trabalhadores com novas e antioperárias reformas neoliberais. Nas eleições de 2009-2010, o PC chileno (na coligação “Juntos Podemos Más”) no primeiro turno tinha como candidato Jorge Arrate, ex-PS, que rompeu com a Concertación, apoiando no segundo turno com todo seu cretinismo o candidato de Bachelet e da Concertación, Eduardo Frei, contra o pinochetista bilionário Sebastian Piñera (bloco RN/Coalizão pela Mudança) que então saiu vitorioso. Como consequência dos governos do PDC e PS e a colaboração de classes do stalinismo, os trabalhadores foram atomizados e dispersos em suas lutas que não ultrapassam os limites sindicais de resistência à precarização e à superexploração. Não será apoiando o atual governo Bachelet e a Concertación, dentro da institucionalidade burguesa, como almejam equivocadamente os neostalinistas do PC, que a classe operária irá derrotar o regime vigente neopinochetista de opressão às massas. Muito menos será, como faz o revisionismo do trotskismo, a exemplo do morenismo (PSTU e CST no Brasil), que dizem criticar a chamada “via pacífica ao socialismo”, mas ainda hoje insistem prioritariamente na via parlamentar como eixo de intervenção da “esquerda” ao defender o “Fora Temer, Eleições Gerais”, demonstrando que também são reféns da estratégia reformista de mudar por dentro o caráter das apodrecidas instituições do regime político bastardo democratizante. Assim como no passado, a política frentepopulista é a responsável pelas maiores derrotas impostas à classe operária em nome da institucionalidade e da ordem burguesa. Está colocada para a vanguarda classista chilena a superação deste quadro de conciliação de classes, denunciando que os partidos da “Concertación”, incluindo o PC e seus satélites patrocinam ilusões no regime cívico-militar atual, apontando sua bússola para o norte da revolução socialista para que não se repita a trágica experiência da “via pacífica ao socialismo” interrompida há exatamente 43 anos pelo genocida golpe pinochetista no Chile!