quinta-feira, 26 de dezembro de 2013


Turquia: Escândalo de corrupção que abala Erdogan é produto da crise política desatada pela submissão ao imperialismo e sua fracassada “revolução síria”

O ano “termina” na Turquia com o odiado governo Erdogan imerso em uma crise política aguda, produto não só da corrupção em que está envolvido todo o gabinete, mas acima de tudo como reflexo do fracasso de sua política de apoio incondicional a mal chamada “revolução síria”. Manifestações de rua tomaram conta de Ancara, Istambul e Esmirna, as principais cidades do país, relembrando as cenas de junho de 2013. Um novo protesto gigante está marcado para esta sexta-feira, 27 de dezembro. Em resumo, há um brutal enfrentamento no interior do Partido islamita Justiça e Desenvolvimento (AKP) ao ponto do ministro do Meio Ambiente e do Planejamento Urbano da Turquia, Erdogan Bayraktar, após ter sido demitido pedir a renúncia do próprio Erdogan. Além de Bayraktar, saíram do governo os ministros da Economia, Zafer Caglayan, e do Interior, Muammer Guler, depois que seus filhos foram presos por causa de um escândalo de corrupção e suborno envolvendo aliados do primeiro-ministro. Os filhos de Caglayan e Guler, juntamente com o CEO do banco estatal Halkbank, estão entre 24 pessoas que foram presas sob acusação de suborno. Segundo informações da imprensa, a polícia apreendeu US$ 4,5 milhões em dinheiro vivo dentro de caixas de sapatos na casa do CEO do banco, Suleyman Aslan, enquanto mais de US$ 1 milhão teria sido descoberto na casa do filho de Guler. Sintomaticamente, Erdogan caracterizou a investigação de corrupção como uma conspiração das forças estrangeiras e turcas para desacreditar seu governo antes das eleições locais de março. Na verdade, a crise do governo de Erdogan advém do seu fracasso na política internacional a partir da derrota dos “rebeldes” mercenários sírios, já que a Turquia era seu maior patrocinador, servindo de “gerente” direto desta política impulsionada pelas potências imperialistas e a OTAN. Com o recuo temporário de Obama no seu plano de intervir militarmente na Síria pela fragilidade dos “rebeldes” em terra, Erdogan perdeu força e agora é alvo de um relativo isolamento político imposto pelos EUA. Tanto que o Halkbank, um dos maiores bancos da Turquia, foi criticado pelos Estados Unidos por permitir que o gás natural iraniano – alvo de um embargo de potências imperialistas – fosse negociado em troca de ouro turco em um esquema que evitava as sanções internacionais contra o país devido ao programa nuclear iraniano. Também foi solicitado pela OTAN que o envio de armas aos mercenários islâmicos da Al-Nursa fosse suspenso temporariamente até a realização da Conferência de Paz sobre a Síria em Genebra, marcada para janeiro de 2014, o que não foi implementado por Erdogan.

A Turquia é o principal responsável por entregar os carregamentos de armas dentro da Síria à Frente Islâmica Al-Nursa, o grupo rebelde que em desespero pelas derrotas que vem sofrendo diante do governo de Bashar Al-Assad invadiu a fronteira em Bab al-Hawa semana passada e tomou armas e equipamentos entregues pelo “ocidente” a mercenários não islamitas. Erdogan está fornecendo armas à Frente Islâmica financiada pela Arábia Saudita, cujo líder tem opiniões nas quais não se veem diferenças ideológicas significativas em comparação com a Al-Qaeda. A Turquia é o país onde estão instaladas várias bases da OTAN e que serve como cabeça de ponte das potências capitalistas no suporte aos mercenários “rebeldes” na Síria. Até junho, quando estouraram as manifestações populares contra Erdogan, não havia qualquer sinal de que os EUA e a União Europeia desejassem tirar de cena o seu importante aliado do governo turco. Ao contrário, a ordem era reprimir violentamente o movimento de massas para garantir a estabilidade do regime com o apoio dos amos ocidentais, justamente para a Turquia continuar dando suporte à agressão da OTAN a países como a Síria e o Irã. Agora as coisas começam a mudar. O atual escândalo de corrupção levou a União Europeia a sair em defesa da independência do Judiciário turco, além de abalar a Bolsa local e a cotação da moeda, que caiu na segunda-feira ao seu menor nível histórico, sendo negociada a 2,1025 liras por dólar. Por sua vez, o caso pode ter fortes implicações para Erdogan, inclusive por expor sua rivalidade com Fethullah Gulen, um clérigo turco radicado nos EUA, líder do movimento Hizmet (Serviço), que diz ter pelo menos 1 milhão de seguidores, incluindo policiais graduados e juízes. Neste exato momento o Hizmet vem sendo apoiado pelo imperialismo como alternativa política ao desgastado Erdogan que irá enfrentar eleições em março de 2014.

Erdogan anunciou nesta quarta-feira, 25 de dezembro, a troca de dez ministros de seu gabinete após uma reunião de quase uma hora e meia com o presidente, Abdullah Gül. Ele apareceu diante das câmeras visivelmente abatido e sem sua habitual eloquência reacionária. As horas de incerteza entre as três renúncias e as novas nomeações sinalizam que o escândalo deixou Erdogan em situação difícil entre seus correligionários, principalmente depois que o titular do Meio Ambiente, Erdogan Bayraktar, o acusou de compartilhar responsabilidades e sugerir que renunciasse também. Entre os novos nomes para assumir os ministérios não está nenhum peso pesado do partido governamental AKP, exceto Bekir Bozdag, até então vice-primeiro-ministro, que assumirá a Justiça. Sem dúvida, o escândalo de corrupção foi um duro golpe no governo a apenas três meses das eleições locais, marcadas para 30 de março. A própria imprensa turca noticia que a investigação tem relação com a luta pelo poder no partido AKP e o influente movimento do pregador Fethullah Gülen, um religioso conservador que durante anos foi aliado de Erdogan e agora está nos EUA preparando uma alternativa a ele.

A fantasiosa “Primavera Árabe” não chegou à Turquia porque Ancara já se coloca plenamente como marionete do imperialismo, o que reforça a necessidade dos marxistas revolucionários apoiarem as manifestações contra o reacionário Erdogan, denunciando que o movimento Hizmet liderado por Fethullah Gulen não é uma alternativa ao odiado Erdogan já que ele vem sendo apoiado pelo imperialismo como uma saída política ao desgastado do AKP. Ainda que sejam limitadas, as mobilizações populares estão ocorrendo por fora dos planos do imperialismo para a região e servem para questionar o apoio da Turquia às provocações contra a Síria, já que grande parte da população é contrária ao papel vergonhoso que assumiu o governo pró-imperialista do país no Oriente Médio e Norte da África. Como a Turquia é um estado-membro da OTAN, a aliança imperialista pode agredir a Síria sem a necessidade de aprovação formal de outras instâncias internacionais como a ONU se o país alegar que foi atacado. Na verdade, a Turquia já invadiu várias vezes o espaço aéreo sírio e montou uma verdadeira base militar do ELS na fronteira com o país, onde os mercenários recebem armas e treinamento. Não esqueçamos que em 2003 a mesma Turquia pediu assistência da OTAN para garantir sua segurança diante da iminência da guerra do Iraque.

Para que a luta contra o governo Erdogan avance é preciso que ela reivindique não só a queda do seu governo, mas que tenha uma perspectiva mais ampla, o que passa pela reivindicação de que o país não preste nenhum apoio aos mercenários “rebeldes” na Síria. Não se pode lutar consequentemente contra o governo Erdogan apoiando sua política se prestar suporte logístico e militar, via OTAN, aos “rebeldes” na Síria! Além da corrupção generalizada, a questão síria também polariza as mobilizações na Turquia, o que coloca na ordem do dia a luta pelo fim das bases da OTAN do país, exigindo sua saída da aliança militar imperialista como um passo concreto para derrotar Erdogan, que não passa de uma marionete das potências capitalistas a frente do governo da Turquia e para construir uma alternativa dos trabalhadores no país!