Ucrânia: Uma reedição no século XXI da “revolução política” saudada por Morenistas e Altamiristas na queda da URSS e do Muro de Berlim?
A estátua de Lênin
derrubada em praça pública, bandeiras vermelhas com o símbolo da foice e
martelo pisoteadas por grupos fascistas e manifestações exigindo a “unificação”
com a Europa. Estas cenas em muito se parecem com o que ocorreu em 1989 na
época da derrubada do Muro de Berlim na Alemanha Oriental (RDA) ou em 1991 com
o fim da URSS, mas estão se passando nestes exatos dias na Ucrânia, mais
particularmente na capital do país, Kiev. O estopim foi a negativa do governo
ucraniano, ligado à Rússia de Putin, de se integrar a União Europeia e seu
draconiano pacote de ataque às mais elementares conquistas sociais. Quando
houve a restauração capitalista da União Soviética e do Leste Europeu, há mais
de 20 anos (89-91) ocorrendo exatamente as cenas que hoje se passam na Ucrânia,
as correntes revisionistas do trotskismo, como PSTU e PCO, apresentaram estes
acontecimentos como uma “vitória revolucionária das massas”. Os morenistas
seguem até hoje com esta caracterização e inclusive apresentam as atuais manifestações
pró-imperialistas que ocorrem na Ucrânia como parte da “revolução” que derrotou
o stalinismo no passado, já que a ligação entre o atual presidente ucraniano
Viktor Yanukovich com Putin representaria a manutenção dos laços políticos e
econômicos com a Rússia, que ainda influencia parte das antigas repúblicas
soviéticas. Já Causa Operária, que hoje critica as posições pró-imperialistas
da LIT, finge ser defensista e contra a restauração capitalista, era uma das
correntes mais fervorosas na defesa da suposta “revolução política” na RDA e na
URSS, posição contrarrevolucionária que inclusive levou a nossa ruptura
programática com esta seita revisionista e a fundação da LBI, como iremos
recordar para os mais “esquecidos” neste artigo.
A posição pró-imperialista da LIT sobre o Leste Europeu e a URSS data do final da década de 80, quando da queda do Muro de Berlim e da URSS. Já em 91, a LIT saudava a vitória do bêbado restauracionista Yelstin sobre o bando dos oito generais, ligados à linha dura do stalinismo, como a “revolução de agosto na URSS”. Entusiasta defensora da onda restauracionista que se abateu nos Estados operários burocratizados do Leste, a LIT esteve na mesma trincheira do imperialismo ao defender as inexistentes “revoluções políticas”, que deram início à liquidação completa das conquistas sociais de Outubro na URSS e no conjunto da Europa do leste, em nome da implantação da “democracia e das liberdades civis”. Quando o imperialismo, em 89, através de um acordo entre Bush pai, Helmut Kohl e Gorbachev acertou as bases para a pilhagem da Alemanha Oriental (RDA), através de sua anexação à Alemanha capitalista, a LIT levantava a consigna, em êxtase, que a revolução em curso na Alemanha demonstrava categoricamente que “agora é a vez do trotskismo”. Sem nenhum regozijo, a história provou que tendo como referencial o marxismo revolucionário, o justo era afirmar “agora é a vez do capitalismo”. Já em 2005, ou seja, quase quinze anos após o início da contrarrevolução social aberta nestes países, que os reduziram à condição de semicolônias dos imperialismos europeu e ianque, a ofensiva da Casa Branca para pôr fim à influência da Rússia burguesa, através de regimes alinhados a Moscou sobre essas repúblicas satélites (Ucrânia, Geórgia, Quirguistão, etc.) foi saudada como uma nova “revolução” pela LIT, uma “situação avançada de ascenso das massas”. Tamanha capitulação à propaganda pró-imperialista, vinda de uma corrente que ainda tem o cinismo de se reivindicar “trotskista”, deve ser combatida política e teoricamente pelos revolucionários, porque macula o legado do velho bolchevique e educa no pântano do revisionismo mais vulgar as novas gerações que não vivenciaram o fim da URSS, mas têm conhecimento da barbárie que se tornou a vida da população da Rússia e dessas repúblicas após a restauração. O que estava (e está) em curso nas antigas repúblicas soviéticas, hoje convertidas a países capitalistas atrasados, é a segunda etapa da restauração capitalista. Nessa fase, os EUA e o imperialismo europeu desejam impor títeres nos países que ainda estão sob a influência do Kremlin e mantêm relações políticas e econômicas privilegiadas com a Rússia. Foram manifestações como as “revoluções das rosas” na Geórgia ou a “revolução laranja” da Ucrânia, designações, inclusive batizadas por Condoleezza Rice, na época Secretária de Estado dos EUA e copiadas nada originalmente pela LIT, que buscam dar um verniz popular a esse processo de mudança de regime político em favor dos EUA e das potências capitalistas europeias. A LIT defendeu, e continua a fazê-lo, em nome do combate ao pretenso resquício do “totalitarismo stalinista” nas antigas repúblicas soviéticas, a política de reação democrática da Casa Branca. Foi esse mesmo “norte programático”, as famosas “Teses de 90”, que guiou a LIT para ser ventríloquo do imperialismo, quando esse em nome das “liberdades democráticas” patrocinava “manifestações populares” para pôr fim aos Estados operários burocratizados, “revoluções” inexistentes que impuseram o “gosto amargo” para as massas da restauração capitalista e seus trágicos efeitos (fome, miséria, prostituição, desemprego) e tornaram as economias desses países completamente controladas pelos monopólios. O conceito de “revolução” que a LIT aplica na Ucrânia, Geórgia e Quirguistão, como adotou no passado na Rússia e RDA no final dos 80 e início dos 90, não passa de uma prostituição da defesa que Trotsky faz da revolução política contra o stalinismo nos Estados operários burocratizados. O dirigente Bolchevique defendia uma revolução conduzida por um partido operário que eliminasse o regime político parasitário da burocracia stalinista preservando as bases sociais do Estado operário, um processo impossível de ocorrer atualmente nesses países, já que são capitalistas e dirigidos por governos burgueses, até então alinhados ao governo burguês de Putin na Rússia. Nesses países, a tarefa das massas é a de lutar por uma revolução social proletária, a expropriação dos meios de produção e pela ditadura do proletariado.
O apoio à restauração
capitalista na URSS foi levado a cabo não só pela LIT, mas pela esmagadora
maioria das correntes pseudotrotskistas no Brasil, como o PCO, TPOR e O
Trabalho (PT). Esta onda arrastou o conjunto da esquerda que, ao condenar as
“ditaduras totalitárias stalinistas”, aliava-se com a nascente burguesia
restauracionista “em defesa da democracia”. Romperam, desta forma,
completamente com o critério de Trotsky que defendeu até os últimos dias de sua
vida a URSS, mesmo stalinizada, da ofensiva imperialista interna e externa,
chamando a vanguarda proletária a preparar as bases da revolução política
contra a burocracia parasitária enquanto defendia incondicionalmente o Estado
operário e suas conquistas, apesar de Stálin. No curso dessa tarefa, na mesma
trincheira de classe de defesa da URSS, os revolucionários lutam pela
construção de um genuíno partido revolucionário para se postar como alternativa
de direção das massas no combate decisivo pela democracia soviética. A posição
acima foi defendida pelo núcleo de militantes que rompeu com Causa Operária em
1995 e deu origem a LBI. Na época denunciamos que o apoio integral dado por
Causa Operária, seguindo a mesma linha do seu então progenitor, o Partido
Obrero da Argentina, à reunificação capitalista da Alemanha (anexação
imperialista do Estado operário burocratizado da RDA), assim como a frente
única que estabeleceram com Yeltsin no contragolpe que destruiu a União
Soviética em 1991, significaram a passagem de CO para o outro lado do rubicão
de classe, neste caso concreto, para o lado do imperialismo, que festejou a
destruição dos Estados operários deformados, como o “fim da história”,
desencadeando a maior ofensiva militar, econômica, política e ideológica contra
os povos do planeta, no limiar deste final de século. Como polícia suprema do
planeta, o imperialismo ianque hoje tem as mãos livres para invadir e
bombardear países, recolonizar economicamente continentes inteiros, impondo
seus planos de “ajuste”, que tanto causam fome, desemprego e miséria em nossa
América Latina e na África, além de usurpar conquistas operárias históricas,
inclusive no seio de países imperialistas.
Vejamos o que dizia o
PCO na época, nas palavras de Rui Pimenta, ironizando a defesa que o próprio
Trotsky fez da URSS e atacando a posição defensista da LBI (os grifos e os sic
são do próprio Rui Pimenta): “Segundo os farsantes, contudo, esta seria a
posição do próprio Trotsky: ‘Como Trotski nos ensinou ‘Stalin derrotado pelos
trabalhadores será um passo adiante para o socialismo, Stalin aplastado (sic,
os sábios quizeram dizer ‘esmagado’) pelos imperialistas significa a
contra-revolução (sic) triunfante. Este é o sentido preciso da nossa defesa da
União Soviética em escala Mundial.’ (‘Uma vez mais a URSS e sua defesa’, L.
Trotsky). Já na época dos padres da Igreja e do escolasticismo foi verificado
este grave problema com citações, ou seja, que tomadas abstratamente dão lugar
a todo o tipo de sandices. Então Trotski era a favor de que os trabalhadores, e
não o imperialismo, derrubassem Stalin: extraordinário!... (sic) O único
problema é que as coisas não ocorreram desta forma. O muro de Berlim não foi
derrubado pelas tropas norte-americanas estacionadas em Berlim Ocidental, mas
por um levante popular que sacudiu toda a Alemanha Oriental... Mas os
impostores não conseguiram distinguir a revolução política no panorama do Leste
europeu...” (livreto “Um grupo de impostores políticos”, Rui C. Pimenta,
pp.58-59). Ainda segundo as próprias palavras de Rui Pimenta “... para construir
um partido revolucionário no Leste europeu (em Cuba, na China etc.) seria, e é,
necessário impulsionar o movimento antiburocrático das massas e disputar no seu
interior a sua direção com todas as forças direitistas e reacionárias que
apresentassem suas candidaturas à direção deste movimento...” (Idem, pág. 60).
Para Causa Operária que agora se diz defensora de Cuba e critica o PSTU-LIT, os
trotskistas teriam que estabelecer uma frente única (movimento antiburocrático)
com os “gusanos” e a própria “CIA” norte-americana em Cuba, por exemplo, caso
contrário, estaríamos agindo “...como alguém que tivesse sofrido lobotomia,
apoiando a ditadura da burocracia contra as massas” (ibdem, pág. 60). Segundo
Causa Operária, o próprio Trotsky seria um destes “lobotomizados” quando
defendia, no Programa de Transição, exatamente o contrário: “Assim, não é
possível negar antecipadamente a possibilidade, em casos estritamente
determinados, de uma frente única com a parte termidoriana da burocracia contra
a ofensiva da contrarrevolução capitalista.” (Programa de Transição).
PSTU, Causa Operária e
uma ampla franja dos revisionistas do trotskismo cometeram uma traição
histórica ao perfilar-se ao lado de Yeltsin e seus asseclas, para liquidar as
bases sociais do Estado operário soviético. Hoje, os efeitos da restauração
capitalista na ex-URSS e em todo o Leste europeu são catastróficos para todos
os povos do mundo e, em particular, para os da antiga pátria soviética e as
ex-repúblicas da URSS, como a Ucrânia. A Rússia teve sua economia arrasada
(anteriormente, a segunda economia mundial), transformando-se em mais uma
colônia empobrecida do imperialismo. A fome, o desemprego, a prostituição
infantil, o genocídio dos velhos que perderam até suas aposentadorias são
efeitos da restauração contrarrevolucionária do capitalismo, ou seja, da
vitória do “livre mercado” e da “democracia”! A fração burguesa dominante
comandada a época por Yeltsin e parida das próprias entranhas da burocracia
stalinista, comandou a acumulação primitiva de capital, através da rapinagem
mafiosa das antigas empresas estatais. Mas a restauração capitalista, para
Causa Operária, o PSTU e seus satélites, não passava de uma “revolução
antiburocrática das massas”, o importante mesmo era liquidar o stalinismo,
sendo apenas um “detalhe” de menor importância se, junto com o stalinismo,
caísse também o Estado operário, afinal, a classe operária teria mais
“liberdade” para lutar, sobre os escombros do Estado operário, pelo verdadeiro
socialismo.
Estamos agora, com o
avanço da contrarrevolução na Ucrânia, fazendo nosso “acerto de contas” com o
conjunto do revisionismo que hoje balbucia sobre os efeitos nefastos da
restauração capitalista ainda que apoie a “revolução” na Ucrânia como faz o
PSTU ou mesmo se finja cinicamente de defensista, como o PCO. Trotsky elaborou
o “Programa de Transição” e posteriormente “Em defesa do marxismo” à época em
que a URSS sofria a ameaça real da invasão militar nazista, o que acabou por
configurar-se pouco depois. Mas apesar da ameaça militar externa, Trotsky nunca
abordava a questão da “defesa da URSS” exclusivamente sob esta ótica. Se o PSTU
e o PCO se dispusessem a pelo menos ler com atenção o Programa de Transição,
poderia observar que Trotsky alerta sobre o perigo da “‘Fração Butenko’ entrar
em luta pela conquista do poder”. A “Fração Butenko” nada mais é do que um
setor da própria burocracia stalinista, em contato direto com o imperialismo,
que acaba por romper com seu próprio núcleo original, o stalinismo, para
alçar-se como fração burguesa dominante, mediante a destruição
contrarrevolucionária das bases sociais do Estado operário, ou seja, a
socialização dos meios de produção. Como assinalou Trotsky em seu livro “A
Revolução Traída”, não poucos funcionários do aparelho stalinista serão recrutados
pela fração burocrática restauracionista na empreitada pela destruição do
Estado operário soviético e a sua conversão em um estado capitalista. Para o
Partido Obrero, na época guia teórico de CO, o contragolpe de Yeltsin, que não
conseguiu reunir mais de 10 mil funcionários medianos, deslumbrados com a
perestroika, na Praça Vermelha – significou um verdadeiro levante
revolucionário de massas: “As massas abriram caminho da revolução política e
agora abertamente social” (En Defensa del Marxismo, nº 1, outubro de 1991). E
como não houve o “cenário clássico” de uma intervenção militar imperialista,
que segundo estes revisionistas seria a única possibilidade de defenderem a
URSS, acabaram por apoiar entusiasticamente o bando restauracionista de
Yeltsin, justificando-se com o argumento de que estariam seguindo as “massas”,
pouco se importando sob que direção política se orientavam, ou mesmo por qual
setor social eram guiadas.
Uma política justa e
revolucionária para aqueles decisivos dias em que se encontrava a RDA no final
de 1989, passava essencialmente por desmascarar a mitificação que envolvia
parte considerável da população do “paraíso capitalista alemão ocidental”. Um
partido revolucionário deveria engatinhar sua formação no paciente trabalho de
propaganda entre a classe operária, que permaneceu inerte e confusa, diante das
mobilizações populares que exigiam a queda do Muro e a unificação a qualquer
custo das duas Alemanhas, desmistificando politicamente a noção de que os
partidos imperialistas da Alemanha capitalista poderiam garantir melhores
condições de vida para o proletariado oriental, do que a que já tinham
conquistado, apesar da opressão política stalinista. Os autênticos trotskistas
deveriam estar na linha de frente da vigorosa denúncia do controle burocrático
da economia e da vida social do país, que exercia a casta parasitária de
Honnecker, mas alertando aos operários que a unificação com o vizinho
imperialista significaria um tipo ainda pior de opressão, a opressão e
exploração imperialista. A luta pela defesa das conquistas operárias e,
portanto, a manutenção das bases sociais do Estado operário, de forma nenhuma é
contraditória com a defesa da liquidação revolucionária da burocracia
stalinista (revolução política). Abdicar desta batalha, em nome do etapismo
contrarrevolucionário dos revisionistas, ou seja, primeiro as “liberdades
democráticas”, para depois lutar pela revolução socialista, já no marco da
restauração capitalista, é sinônimo da pior traição de classe, que qualquer
corrente que se reivindica revolucionária e trotskista pode cometer. Como se
observa, o conjunto dos revisionistas esteve na linha de frente desta traição
histórica ao proletariado mundial.
Hoje, está colocado para
o proletariado mundial e, particularmente, para os trabalhadores das
ex-repúblicas soviéticas rechaçarem as investidas da UE, da OTAN, dos EUA e de
seus agentes da Ucrânia. Apesar de não depositarmos qualquer confiança no
governo burguês ucraniano de Viktor Yanukovych e do ex-burocrata
Putin-Medvedev, cuja conduta está voltada a defender os interesses da nascente
burguesia russa, as fricções com a Casa Branca objetivamente representam um
obstáculo à expansão guerreirista da OTAN na região. Nesse sentido, os
revolucionários devem denunciar as manifestações dos grupos pró-imperialistas e
seu caráter contrarrevolucionário, voltado a fazer na Ucrânia e na própria
Rússia uma “transição democrática” conservadora aos moldes da que vem sendo
operada no Oriente Médio. Opomos-nos pelo vértice à política dos grupos
revisionistas, que depois de saudarem a farsesca “revolução árabe” agora apoiam
as manifestações da direita assim como festejaram no passado as “revoluções das
cores” na Ucrânia, Geórgia, Quirguistão. Tais “revoluções” nada mais eram que a
segunda etapa da restauração capitalista em curso nas antigas repúblicas
soviéticas, hoje convertidas a países capitalistas atrasados semicoloniais,
quando o imperialismo ianque e europeu impuseram títeres nos governos que ainda
estavam sob a influência do Kremlin e mantinham relações políticas e econômicas
privilegiadas com a Rússia. Agora, a Ucrânia é novamente a bola da vez da
reacionária ofensiva do imperialismo, que tomou grande impulso com a derrubada
do regime Kadaffi pela OTAN, tendo Yanukovych como o “adversário” indesejado a
ser removido do governo, mas no fundo tendo como alvo o próprio Putin no
Kremlin! Somente genuínos trotskistas que não se deixaram levar pelo canto de
sereia “humanitário” imperialista, que se mantêm firmes na luta para que os
povos oprimidos assumam o controle dos recursos energéticos do planeta, pela
expulsão dos abutres multinacionais e expropriação do conjunto das burguesias
mafiosas, terão autoridade suficiente perante as massas ucranianas, georgianas,
ossetas e russas para conduzir a luta estratégica por uma Federação de
repúblicas socialistas e soviéticas livres, fundadas por novas revoluções
bolcheviques.