28 DE SETEMBRO DE 1864 - FUNDADA A
I INTERNACIONAL: EM SEU MANIFESTO
INAUGURAL MARX LANÇA O CHAMADO REVOLUCIONÁRIO “PROLETÁRIOS DE TODO MUNDO,
UNÍ-VOS!”
A Associação Internacional dos Trabalhadores (A.I.T.),
historicamente, foi a primeira organização da classe operária de caráter
internacional. Suas origens, segundo a maioria dos que se dedicam à História do
Socialismo, remontam ao ano de 1862, durante a Exposição Internacional de
Londres, ocasião em que operários franceses, alemães e ingleses estabeleceram
as primeiras conversações no sentido da criação de um organismo internacional
dos trabalhadores. No ano de 1863, aconteceu outro encontro, novamente em Londres,
que reuniu alguns operários ingleses e franceses, convocando-se, por iniciativa
de trabalhadores franceses, um Encontro de Trabalhadores para o ano seguinte.
Ampla, abarca não só os partidários do socialismo científico, mas também
proudhonianos, bakuninistas, blanquistas, entidades sindicais e até setores
positivistas. Atuará até 1876. O Encontro fundacional acontece em 28 de
setembro de 1864 em Saint Martin's Hall, Londres, data que marca, oficialmente,
a fundação da Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT), que passou a
ser mundialmente conhecida como PRIMEIRA INTERNACIONAL. Participaram dessa
reunião delegados de organizações operárias inglesas, francesas, italianas,
alemãs, suíças e polonesas, na qual constituiu-se um Comitê Provisório formado
por 27 trabalhadores ingleses, 9 franceses, 9 alemães, 6 italianos, 2 suíços e
2 poloneses, além de emigrantes socialistas alemães e poloneses. Karl Marx não
fizera parte do grupo que fundara a AIT. Chegou até ela na qualidade de
convidado, mas, durante a Assembleia, foi indicado para elaboração dos
Estatutos e Declaração de Princípios, contando com a colaboração de Engels,
além de ter escrito a Mensagem Inaugural que reproduzimos abaixo.
MENSAGEM INAUGURAL DA ASSOCIAÇÃO INTERNACIONAL DOS TRABALHADORES
(Kark Marx - 21 - 27 de Outubro de 1864)
Operários,
É um fato assinalável que a miséria das massas operárias não
tenha diminuído de 1848 a 1864; e, contudo, este período não tem rival quanto
ao desenvolvimento da indústria e ao crescimento do comércio. Em 1850, um órgão
moderado da classe média britânica, de informação superior à média, predizia
que se as exportações e as importações da Inglaterra viessem a elevar-se 50 por
cento, o pauperismo inglês cairia para zero. Infelizmente, em 7 de Abril de
1864, o Chanceler do Tesouro Público deliciava a sua audiência parlamentar com
a afirmação de que o comércio total de importação e exportação da Inglaterra se
tinha elevado em 1863 «a 443 955 000 libras! soma assombrosa cerca de três
vezes superior ao comércio da época comparativamente recente de 1843!». Apesar
de tudo isto, foi eloquente acerca da «pobreza». «Pensai», exclamava ele, «nos
que estão na fronteira dessa região», nos «salários. . . não aumentados»; na
«vida humana. . . que em nove casos sobre dez não é senão uma luta pela
existência!» Não falou do povo da Irlanda, gradualmente substituído pela
maquinaria no Norte e por pastagens de carneiros no Sul, ainda que mesmo os
carneiros, nesse país infeliz, estejam a diminuir, é verdade que não a uma taxa
tão rápida como os homens. Não repetiu o que tinha então acabado de ser
denunciado, num súbito acesso de terror, pelos mais altos representantes dos
dez mil da alta. Quando o pânico da garrotte alcançou um certo auge, a Câmara
dos Lordes ordenou que se fizesse um inquérito e que se publicasse um relatório
acerca da deportação e servidão penal. A verdade veio ao de cima no volumoso
Livro Azul de 1863, e ficou provado por factos e números oficiais que os piores
criminosos condenados, os forçados de Inglaterra e Escócia, trabalhavam muito
menos arduamente e passavam de longe melhor do que os trabalhadores agrícolas
da Inglaterra e da Escócia. Mas, isto não foi tudo. Quando, em consequência da
Guerra Civil na América, os operários do Lancashire e do Cheshire foram
lançados para as ruas, a mesma Câmara dos Lordes enviou para os distritos
manufatureiros um médico encarregado de investigar qual a mais pequena
quantidade possível de carbono e de nitrogénio a ser ministrada da forma mais
barata e mais simples que, em média, pudesse apenas bastar para «prevenir
doenças [causadas] pela fome». O Dr. Smith, o delegado médico, averiguou que 28
000 grãos de carbono e 1330 grãos de nitrogénio eram o abono semanal que
manteria um adulto médio. . . apenas acima do nível das doenças [causadas] pela
fome e descobriu, além disso, que essa quantidade estava muito perto de
coincidir com a alimentação escassa a que a pressão de uma miséria extrema
tinha efetivamente reduzido os operários do algodão. Mas, vede agora! O mesmo
sábio doutor foi, mais tarde, delegado de novo pelo alto funcionário médico do
Conselho Privado para examinar a alimentação das classes trabalhadoras mais
pobres. Os resultados das suas investigações estão contidos no Sixth Report on
Public Health [Sexto Relatório sobre Saúde Pública] publicado por ordem do
Parlamento no decurso do presente ano. O que é que o doutor descobriu? Que os
tecelãos de sedas, as costureiras, os luveiros de pelica, os tecelãos de meias,
etc, nem sequer recebiam, em média, a ração miserável dos operários do algodão,
nem sequer [recebiam] o montante de carbono e nitrogénio «apenas suficiente
para prevenir as doenças [causadas] pela fome».
«Além disso,» citamos o relatório, «no que toca às famílias
da população agrícola examinadas, verifica-se que mais de um quinto tinha menos
do que a estimada suficiência de alimentação carbonada, que mais de um terço
tinha menos do que a suficiência estimada de alimentação nitrogenada e que em
três condados (Berkshire, Oxfordshire e Somersetshire) a insuficiência de
alimentação nitrogenada era a dieta local média.» «É preciso não esquecer»,
acrescenta o relatório oficial, «que a privação de alimentação é muito
relutantemente aguentada e que, em regra, uma grande pobreza de dieta só
sobrevirá quando outras privações a precederam. . . Mesmo a limpeza terá sido
considerada cara ou difícil e, se ainda houver esforços de respeito por si
próprio para a manter, cada esforço desses representará tormentos de fome
adicionais.» «Estas são reflexões dolorosas, especialmente, se não nos
esquecermos de que a pobreza a que aludem não é a pobreza merecida pela
ociosidade; em todos os casos, é a pobreza de populações trabalhadoras. De
facto, o trabalho que fornece a escassa ração de alimento é, para a maior
parte, excessivamente prolongado.»
O relatório exibe o facto estranho, e bastante inesperado,
de que: «De entre as partes do Reino Unido», Inglaterra, Gales, Escócia e
Irlanda, «a população agrícola da Inglaterra», a parte mais rica, «é
consideravelmente a mais mal alimentada»; mas, de que mesmo os operários
agrícolas do Berkshire, Oxfordshire e Somersetshire passam melhor do que grande
número de hábeis operários do Leste de Londres que trabalham a domicílio.
São estas as declarações oficiais publicadas por ordem do
Parlamento em 1864, durante o milénio do comércio livre, numa altura em que o
Chanceler do Tesouro Público disse à Câmara dos Comuns que «a condição média do
trabalhador inglês melhorou num grau que sabemos que é extraordinário e sem
exemplo na história de qualquer país ou qualquer idade».
Destas congratulações oficiais destoa a seca observação do
Relatório oficial sobre a Saúde Pública: «A saúde pública de um país significa
a saúde das suas massas, e as massas dificilmente serão saudáveis, a menos que,
até na sua própria base, sejam pelo menos moderadamente prósperas.»
Deslumbrado pelo «Progresso da Nação», com as estatísticas a
dançar diante dos seus olhos, o Chanceler do Tesouro Público exclama num êxtase
impetuoso:
«De 1842 a 1852 o rendimento coletável do país aumentou 6
por cento; nos oito anos de 1853 a 1861, aumentou 20 por cento, na base tomada
em 1853! O fato é tão espantoso que é quase inacreditável!... Este inebriante
aumento de riqueza e poder», acrescenta o Sr. Gladstone, «está inteiramente
confinado às classes possuidoras»
Se se quiser saber em que condições de saúde arruinada, de
moral manchada e de ruína mental esse «inebriante aumento de riqueza e poder
inteiramente confinado às classes possidentes» foi e está a ser produzido pelas
classes do trabalho, olhe-se para o quadro das oficinas de alfaiates,
impressores e costureiras traçado no último Relatório sobre a Saúde Pública!
Compare-se com o Report of the Children's Employment Commission de 1863, onde é
afirmado, por exemplo, que:
«Os oleiros como classe, tanto os homens como as mulheres,
representam uma população muito degenerada, tanto fisicamente como
mentalmente», que «a criança não saudável é, por sua vez, um pai não saudável»,
que «uma deterioração progressiva da raça tem de continuar» e que «a
degenerescência da população de Staffordshire ainda seria maior se não fosse o
recrutamento constante da região adjacente e os casamentos mistos com raças
mais saudáveis.»
Dê-se uma olhadela ao Livro Azul do Sr. Tremenheere sobre os
«Agravos de que se queixaram os oficiais de padaria»! E quem é que não
estremeceu com a declaração paradoxal feita pelos inspectores de fábricas, e
ilustrada pelo Registrar General, de que os operários do Lancashire estavam
efectivamente a melhorar em saúde, quando ficaram reduzidos à ração miserável
de alimento, em virtude da sua exclusão temporária da fábrica de algodão por
falta de algodão e de que a mortalidade das crianças estava a diminuir porque
agora, enfim, era às suas mães permitido darem-lhes em vez do cordial de
Godfrey, os seus próprios peitos.
Veja-se mais uma vez o reverso da medalha! Os Relatórios do
Imposto sobre Rendimento e Propriedade, apresentados perante a Câmara dos
Comuns em 20 de Julho de 1864, mostram-nos que às pessoas com rendimentos
anuais avaliados pelo coletor de impostos em 50 000 libras e mais se tinham
juntado, de 5 de Abril de 1862 a 5 de Abril de 1863, uma dúzia mais uma, tendo
o seu número crescido nesse único ano de 67 para 80. Os mesmos Relatórios
desvendam o facto de que cerca de 3000 pessoas dividem entre si um rendimento
anual de cerca de 25 000 000 de libras esterlinas, bastante mais do que o
rendimento total repartido anualmente por toda a massa dos trabalhadores
agrícolas de Inglaterra e Gales. Abri o censo de 1861, e descobrireis que o
número dos proprietários de terras masculinos de Inglaterra e Gales diminuiu de
16 934 em 1851 para 15 066 em 1861, de tal modo que a concentração de terras
cresceu em dez anos 11 por cento. Se a concentração do solo do país em poucas
mãos se processar à mesma taxa, a questão da terra ficará singularmente
simplificada, tal como ficou no Império Romano, quando Nero sorriu com a
descoberta de que metade da Província de África era possuída por seis senhores.
Insistimos tanto tempo nestes «factos tão espantosos que são quase
inacreditáveis », porque a Inglaterra está à cabeça da Europa do comércio e da
indústria. Estaremos lembrados de que, há uns meses atrás, um dos filhos refugiados
de Louis Philippe felicitou publicamente o trabalhador agrícola inglês pela
superioridade da sua sorte sobre a do seu camarada menos florescente do outro
lado do Canal. Na verdade, com as cores locais alteradas e numa escala algo
contraída, os factos ingleses reproduzem-se em todos os países industriosos e
progressivos do Continente. Em todos eles, teve lugar, desde 1848, um inaudito
desenvolvimento da indústria e uma inimaginável expansão das importações e
exportações. Em todos eles, «o aumento de riqueza e poder inteiramente
confinado às classes possidentes» foi verdadeiramente «inebriante». Em todos
eles, tal como em Inglaterra, uma minoria das classes operárias viu os seus
salários reais algo aumentados; embora, na maioria dos casos, a subida monetária
dos salários denotasse tanto um acesso real ao conforto como o facto do hóspede
do asilo de mendicidade ou do orfanato da metrópole, por exemplo, em nada ser
beneficiado por os seus meios de primeira necessidade custarem 9£ 15s. e 8d. em
1861 contra 7£ 7s. e 4d. em 1852. Por toda a parte, a grande massa das classes
operárias se estava a afundar mais, pelo menos à mesma taxa que as acima delas
subiam na escala social. Em todos os países da Europa, tornou-se agora uma
verdade demonstrável a todo o espírito sem preconceitos e apenas negada por
aqueles cujo interesse está em confinar os outros a um paraíso de tolos que
nenhum melhoramento da maquinaria, nenhuma aplicação da ciência à produção,
nenhuns inventos de comunicação, nenhumas novas colónias, nenhuma emigração,
nenhuma abertura de mercados, nenhum comércio livre, nem todas estas coisas
juntas, farão desaparecer as misérias das massas industriosas; mas que, na
presente base falsa, qualquer novo desenvolvimento das forças produtivas do
trabalho terá de tender a aprofundar os contrastes sociais e a agudizar os
antagonismos sociais. A morte por fome, na metrópole do Império Britânico,
elevou-se quase ao nível de uma instituição, durante esta época inebriante de
progresso económico. Essa época fica marcada nos anais do mundo pelo regresso
acelerado, pelo âmbito crescente e pelo efeito mais mortífero da peste social
chamada crise comercial e industrial.
Após o fracasso das Revoluções de 1848, todas as
organizações partidárias e jornais partidários das classes operárias foram, no
Continente, esmagados pela mão de ferro da força, os mais avançados filhos do
trabalho fugiram desesperados para a República Transatlântica e os sonhos
efémeros de emancipação desvaneceram-se ante uma época de febre industrial, de marasmo
moral e de reação política. A derrota das classes operárias continentais, em
parte, devida à diplomacia do Governo inglês, agindo, então tal como agora, em
solidariedade fraterna com o Gabinete de Sampetersburgo, cedo espalhou os seus
efeitos contagiosos para este lado do Canal. Enquanto a derrota dos seus irmãos
continentais desanimou as classes operárias inglesas e quebrou a sua fé na sua
própria causa, restaurou para o senhor da terra e para o senhor do dinheiro a
sua confiança algo abalada. Retiraram insolentemente concessões já anunciadas.
As descobertas de novas terras auríferas conduziram a um imenso êxodo, que
deixou um vazio irreparável nas fileiras do proletariado britânico. Outros dos
seus membros anteriormente ativos foram apanhados pelo suborno temporário de
mais trabalho e salários melhores e tornaram-se «fura-greves políticos». Todos
os esforços feitos para manter ou remodelar o Movimento Cartista[N7] falharam
assinalavelmente; os órgãos de imprensa da classe operária foram morrendo um a um
pela apatia das massas e, de facto, nunca antes a classe operária inglesa tinha
parecido tão inteiramente reconciliada com um estado de nulidade política. Se,
então, não tinha havido qualquer solidariedade de ação entre as classes
operárias britânica e continental, havia, para todos os efeitos, uma
solidariedade de derrota.
E, contudo, o período que passou desde as Revoluções de 1848
não deixou de ter os seus aspectos compensadores. Apontaremos aqui apenas para
dois grandes fatos.
Após uma luta de trinta anos, travada com a mais admirável
perseverança, as classes operárias inglesas, aproveitando uma discórdia
momentânea entre os senhores da terra e os senhores do dinheiro, conseguiram
alcançar a Lei das Dez Horas. Os imensos benefícios físicos, morais e
intelectuais daí resultantes para os operários fabris, semestralmente
registados nos relatórios dos inspetores de fábricas, de todos os lados são
agora reconhecidos. A maioria dos governos continentais teve de aceitar a Lei
Fabril inglesa em formas mais ou menos modificadas e o próprio Parlamento
inglês foi cada ano compelido a alargar a sua esfera de ação.
Mas, para além do seu alcance prático, havia algo mais para
realçar o maravilhoso sucesso desta medida dos operários. Através dos seus
órgãos de ciência mais notórios — tais como o Dr. Ure, o Professor Sénior e
outros sábios desse cunho —, a classe média tinha predito, e a contento dos
seus corações, provado, que qualquer restrição legal às horas de trabalho teria
de dobrar a finados pela indústria britânica que, qual vampiro, não podia senão
viver de chupar sangue, e ainda por cima sangue de crianças. Em tempos idos, o
assassínio de crianças era um rito misterioso da religião de Moloch, mas só era
praticado em algumas ocasiões muito solenes, uma vez por ano, talvez, e, mesmo
assim, Moloch não tinha uma propensão exclusiva para os filhos dos pobres. Esta
luta acerca da restrição legal das horas de trabalho enfureceu-se tanto mais
ferozmente quanto, à parte a avareza assustada, ela se referia, na verdade, à
grande contenda entre o domínio cego das leis da oferta e da procura que formam
a economia política da classe média e a produção social controlada por previsão
social, que forma a economia política da classe operária. Deste modo, a Lei das
Dez Horas não foi apenas um grande sucesso prático; foi a vitória de um
princípio; foi a primeira vez que em plena luz do dia a economia política da
classe média sucumbiu à economia política da classe operária.
Mas, estava reservada uma vitória ainda maior da economia política
do trabalho sobre a economia política da propriedade. Falamos do movimento
cooperativo, especialmente, das fábricas cooperativas erguidas pelos esforços,
sem apoio, de algumas «mãos» ousadas. O valor destas grandes experiências
sociais não pode ser exagerado. Mostraram com factos, em vez de argumentos, que
a produção em larga escala e de acordo com os requisitos da ciência moderna
pode ser prosseguida sem a existência de uma classe de patrões empregando uma
classe de braços; que, para dar fruto, os meios de trabalho não precisam de ser
monopolizados como meios de domínio sobre e de extorsão contra o próprio
trabalhador; e que, tal como o trabalho escravo, tal como o trabalho servo, o
trabalho assalariado não é senão uma forma transitória e inferior, destinada a
desaparecer ante o trabalho associado desempenhando a sua tarefa com uma mão
voluntariosa, um espírito pronto e um coração alegre. Em Inglaterra, os
gérmenes do sistema cooperativo foram semeados por Robert Owen; as experiências
dos operários, tentadas no Continente, foram, de facto, o resultado prático das
teorias, não inventadas, mas proclamadas em alta voz, em 1848.
Ao mesmo tempo, a experiência do período de 1848 a 1864
provou fora de qualquer dúvida que o trabalho cooperativo — por mais excelente
que em princípio [seja] e por mais útil que na prática [seja] —, se mantido no
círculo estreito dos esforços casuais de operários privados, nunca será capaz
de parar o crescimento em progressão geométrica do monopólio, de libertar as
massas, nem sequer de aliviar insusceptivelmente a carga das suas misérias. É
talvez por esta precisa razão que nobres bem-falantes, filantrópicos
declamadores da classe média e mesmo agudos economistas políticos,
imediatamente se voltaram todos com cumprimentos nauseabundos para o preciso
sistema de trabalho cooperativo que em vão tinham tentado matar à nascença,
ridicularizando-o como Utopia do sonhador ou estigmatizando-o como sacrilégio
do Socialista. Para salvar as massas trabalhadoras, o trabalho cooperativo deveria
ser desenvolvido a dimensões nacionais e, consequentemente, ser alimentado por
meios nacionais. Contudo, os senhores da terra e os senhores do capital sempre
usarão os seus privilégios políticos para defesa e perpetuação dos seus
monopólios económicos. Muito longe de promover, continuarão a colocar todo o
impedimento possível no caminho da emancipação do trabalho. Lembremo-nos do
escárnio com o qual, na última sessão, Lord Palmerston deitou abaixo os
defensores da Lei dos Direitos dos Rendeiros Irlandeses. A Câmara dos Comuns,
gritou ele, é uma casa de proprietários de terras.
Conquistar poder político tornou-se, portanto, o grande
dever das classes operárias. Parecem ter compreendido isto, porque em
Inglaterra, Alemanha, Itália e França tiveram lugar renascimentos simultâneos e
estão a ser feitos esforços simultâneos para a reorganização política do
partido dos operários.
Possuem um elemento de sucesso — o número; mas o número só
pesa na balança se unido pela combinação e guiado pelo conhecimento. A experiência
passada mostrou como a falta de cuidado por este laço de fraternidade, que deve
existir entre os operários de diferentes países e incitá-los a permanecer
firmemente ao lado uns dos outros em toda a sua luta pela emancipação, será
castigada pela derrota comum dos seus esforços incoerentes. Este pensamento
incitou os operários de diferentes países, congregados em 28 de Setembro de
1864 numa reunião pública em St. Martin's Hall, a fundar a Associação
Internacional.
Outra convicção influenciou esta reunião.
Se a emancipação das classes operárias requer o seu concurso
fraterno, como é que irão cumprir essa grande missão, com uma política externa
que persegue objetivos criminosos, joga com preconceitos nacionais e dissipa em
guerras piratas o sangue e o tesouro do povo? Não foi a sabedoria das classes
dominantes, mas a resistência heróica das classes operárias de Inglaterra à sua
loucura criminosa, que salvou o Ocidente da Europa de mergulhar de cabeça numa
cruzada infame pela perpetuação e propagação da escravatura do outro lado do
Atlântico. A aprovação desavergonhada, a simpatia trocista ou a indiferença
idiota com que as classes superiores da Europa assistiram a que a fortaleza de
montanha do Cáucaso caísse como presa da Rússia e a heroica Polónia fosse
assassinada pela Rússia; as imensas e irrestritas usurpações desse poder
bárbaro, cuja cabeça está em Sampetersburgo e cujos braços estão em todos os
Gabinetes da Europa, ensinaram às classes operárias o dever de dominarem elas
próprias os mistérios da política internacional, de vigiarem os atos
diplomáticos dos seus respectivos Governos, de os contra-atacarem, se
necessário, por todos os meios ao seu dispor, [o dever de,] quando incapazes de
o impedirem, se juntarem em denúncias simultâneas e de reivindicarem as simples
leis da moral e da justiça, que deveriam governar as relações dos indivíduos
privados, como as regras supremas do comércio das nações.
O combate por semelhante política externa faz parte da luta
geral pela emancipação das classes operárias.
PROLETÁRIOS DE TODOS OS PAÍSES, UNI-VOS!