11 DE AGOSTO - DIA DOS ESTUDANTES: VIVA A ALIANÇA
OPERÁRIO-ESTUDANTIL! FORÇA A JUVENTUDE BOLCHEVIQUE!
Publicamos abaixo o artigo “As tarefas da Juventude
Revolucionária” elaborado por Lênin em 1903. Trata-se de uma contribuição
teórica ao debate sobre a construção de uma autêntica juventude comunista proletária, no seio da disputa ideológica de setores da pequena-burguesia estudantil entre os
revolucionários comunistas, socialdemocratas e as forças da reação burguesa. A
Juventude Bolchevique (JB) vem aplicando as lições nos legadas por Lênin e faz
da formação política e ideológica seu móvel de organização nas
escolas, universidades, fábricas e na juventude camponesa. Nesse dia do
estudante, 11 de agosto, quando as entidades estudantis (UBES e UNE) estão
totalmente prostradas diante do circo eleitoral da democracia dos ricos, a JB
convoca a vanguarda estudantil a cerrar fileiras na unidade revolucionária com
o proletariado, como nos ensinou Lênin. Esse terreno é o "celeiro de quadros" para forjar um autêntico Partido Revolucionário que desafia, com a rebeldia da juventude e a força da classe operária, as instituições do regime político burguês!
AS TAREFAS DA JUVENTUDE REVOLUCIONÁRIA
Lênin - Setembro de 1903
A declaração da redação do jornal Student, publicada pela
primeira vez, se não nos enganamos, no n.° 4 (28) da Osvobojdénie e recebida
igualmente pelo Iskra, testemunha, em nossa opinião, um passo em frente dado
nas concepções da redação depois da saída do n.° 1 do Student. O Sr. Struve não
se enganou quando se apressou a declarar o seu desacordo com as opiniões
expostas na declaração: estas opiniões, de fato, diferem radicalmente da
corrente do oportunismo a que tão consequente e zelosamente se agarra o órgão
liberal-burguês. Reconhecendo que «apenas um sentimento revolucionário não pode
criar a unidade ideológica dos estudantes», que «para este objetivo é
necessário um ideal socialista, que se apoie numa ou noutra concepção
socialista do mundo», e além disso numa concepção do mundo «definida,
integral», a redação do Student rompeu já no campo dos princípios com a
indiferença ideológica e o oportunismo teórico, colocando numa base correcta a
questão dos meios de revolucionar os estudantes.
É verdade que do ponto de vista corrente do
«revolucionarismo» vulgar a unidade ideológica dos estudantes não exige uma
concepção do mundo integral, antes a exclui, a unidade ideológica significa uma
atitude «tolerante» para com diferentes tipos de ideias revolucionárias, significa
a renúncia a reconhecer decididamente um qualquer círculo determinado de
ideias, numa palavra, unidade ideológica, do ponto de vista destes sábios da
politiquice, pressupõe uma certa ausência de princípios ideológicos (é claro,
oculta mais ou menos habilidosamente pelas fórmulas gastas da largueza de
opiniões, da importância da unidade a todo o custo e imediatamente, etc.,
etc.). Um argumento bastante plausível e, à primeira vista, muito convincente
que é sempre apresentado a favor deste modo de colocar a questão é apontar para
o facto do conhecimento geral e indiscutível de que entre os estudantes há e
não pode deixar de haver grupos completamente diferentes quanto às suas
opiniões político-sociais, e por isso a exigência de um carácter integral e
definido das concepções do mundo afastará inevitavelmente alguns destes grupos;
consequentemente, estorvará a unidade, consequentemente, provocará dissensões
em vez de um trabalho concertado, consequentemente, enfraquecerá a força do
avanço político comum, e assim sucessivamente, sem fim.
Examinemos este raciocínio plausível. Tomemos, por exemplo,
a divisão dos estudantes em grupos no n.° 1 do Student — neste primeiro número
a exigência de uma concepção do mundo definida e integral ainda não era
avançada pela redacção, da qual seria por isso difícil de suspeitar de
parcialidade para com a «estreiteza» social-democrata. O editorial do n.° 1 do
Student distingue entre os estudantes actuais quatro grandes grupos:
«a multidão indiferente» — «pessoas que têm uma atitude
perfeitamente indiferente em relação ao movimento estudantil»;
«os academistas» — partidários de movimentos estudantis numa
base exclusivamente académica;
«os adversários dos movimentos estudantis em geral —
nacionalistas, anti-semitas, etc.»;
«os políticos» — partidários da luta pelo derrubamento do
despotismo tsarista. «Este grupo, por sua vez, é composto por dois elementos
opostos — pela oposição política puramente burguesa de espírito revolucionário
e por uma criação dos últimos dias (só dos últimos dias? N. Lénine), o
proletariado intelectual revolucionário de espírito socialista.»
Se se tiver em atenção que o último subgrupo se divide por
sua vez, como toda a gente sabe, em estudantes socialistas-revolucionários e
estudantes sociais-democratas, verifica-se que entre os estudantes actuais
existem seis grupos políticos: reaccionários, indiferentes, academistas,
liberais, socialistas-revolucionários e sociais-democratas.
Pergunta-se: este agrupamento não será acidental? esta
repartição de estados de espírito não será temporária? Basta fazer directamente
esta pergunta para que qualquer pessoa minimamente conhecedora do assunto lhe
dê imediatamente uma resposta negativa.
E nem poderia haver outro agrupamento entre os nossos
estudantes, porque eles são a parte da intelectualidade que mais sensivelmente
reage, e a intelectualidade chama-se intelectualidade porque é a que mais
conscientemente, mais decididamente e com mais precisão reflecte e exprime o
desenvolvimento dos interesses de classe e dos agrupamentos políticos em toda a
sociedade. Os estudantes não seriam o que são se o seu agrupamento político não
correspondesse ao agrupamento político em toda a sociedade — «correspondesse»
não no sentido da completa proporcionalidade dos grupos estudantis e sociais
quanto à sua força e número de membros mas no sentido da existência necessária
e inevitável entre os estudantes dos grupos que existem na sociedade. E de toda
a sociedade russa, com o seu desenvolvimento (relativamente) embrionário dos
antagonismos de classe, com a sua virgindade política, com as suas vastas e
vastíssimas massas da população embrutecidas e esmagadas pelo despotismo
policial, são característicos precisamente esses seis grupos: reaccionários,
indiferentes, culturalistas, liberais, socialistas-revolucionários e
sociais-democratas. Em vez de «academistas» pus aqui «culturalistas», isto é,
partidários do progresso legal sem luta política, do progresso no terreno da
autocracia. Tais culturalistas existem em todas as camadas da sociedade russa,
e em toda a parte eles, tal como os «academistas» estudantes, se limitam a um
pequeno círculo de interesses profissionais, à melhoria de determinados ramos
da economia nacional ou da administração estatal e local, em toda a parte eles
se afastam medrosamente da «política», sem distinguir (como os academistas não
distinguem) os «políticos» de diferentes orientações e chamando política a tudo
o que diz respeito à... forma de governo. A camada dos culturalistas sempre foi
e é até hoje a ampla base do nosso liberalismo: em tempos «pacíficos» (isto é,
traduzindo para «russo», em tempos de reacção política), os conceitos do
culturalista e do liberal coincidem quase completamente, e mesmo em tempos de
guerra, em tempos de ascenso do ânimo social, em tempos de ataque crescente à
autocracia, a diferença entre estes conceitos permanece muitas vezes vaga. O
liberal russo, mesmo quando intervém publicamente numa publicação estrangeira
livre com um protesto directo e aberto contra a autocracia, nem por isso deixa de
se sentir em primeiro lugar um culturalista, e de vez em quando põe-se a
discorrer como um escravo, ou, se quiserem, de maneira legal, leal, como um
súbdito fiel: veja-se a Osvobojdénie.
A ausência de uma delimitação definida e claramente visível
por todos entre os culturalistas e os liberais é, em geral, característica de
todo o agrupamento político da sociedade russa. Poderiam dizer-nos, talvez, que
a divisão atrás mencionada em seis grupos é incorrecta, pois ela não
corresponde à divisão de classes da sociedade russa. Mas tal objecção não teria
fundamento. A divisão de classes é, naturalmente, o fundamento mais profundo do
agrupamento político; é ela que em última análise determina sempre,
naturalmente, este agrupamento. Mas este fundamento profundo só se revela no
curso do desenvolvimento histórico e à medida que cresce a consciência dos
participantes e criadores deste desenvolvimento. Esta «última análise» só se
atinge pela luta política — por vezes como resultado de uma luta longa, tenaz,
medida em anos e decénios, ora manifestando-se tempestuosamente em diferentes
crises políticas ora amainando e como que detendo-se no tempo. Não é por acaso,
por exemplo, que na Alemanha, onde a luta política assume formas
particularmente agudas e onde a classe avançada — o proletariado — é
particularmente consciente, existem ainda partidos (e partidos poderosos), como
o centro, que oculta com um distintivo religioso o seu conteúdo de classe
heterogéneo (mas no geral incondicionalmente antiproletário). Tanto menos nos
podemos admirar por a origem de classe dos grupos políticos actuais na Rússia
ser obscurecida em elevado grau pela falta de direitos políticos de todo o
povo, pelo domínio sobre ele de uma burocracia notavelmente organizada,
ideologicamente coesa, tradicionalmente fechada. É antes preciso admirarmo-nos
por ser tão forte a marca que o desenvolvimento europeu-capitalista da Rússia,
apesar do seu sistema político asiático, já conseguiu imprimir no agrupamento
político da sociedade.
A classe avançada de todos os países capitalistas, o
proletariado industrial, entrou já, também no nosso país, no caminho do
movimento massivo e organizado sob a direcção da social-democracia, sob a
bandeira do programa que já há muito se tornou o programa de todo o
proletariado internacional consciente. A categoria dos indiferentes em política
é na Rússia incomparavelmente mais numerosa, naturalmente, do que em qualquer
país europeu, mas também entre nós já não se pode falar da virgindade primitiva
e primeva desta categoria: a indiferença dos operários não conscientes —
parcialmente também dos camponeses — é cada vez mais frequentemente substituída
por erupções de efervescência política e de protesto activo, demonstrando
claramente que esta indiferença não tem nada de comum com a indiferença dos
burgueses e pequenos burgueses saciados. Esta última classe, particularmente
numerosa na Rússia devido ao seu ainda fraco, relativamente, desenvolvimento do
capitalismo, por um lado começa já, indubitavelmente, a fornecer reaccionários
conscientes e consequentes; por outro lado, e incomparavelmente com mais
frequência, distingue-se ainda fracamente da massa do «povo trabalhador»
ignorante e embrutecido, encontrando os seus ideólogos nas amplas camadas da
intelectualidade raznotchinets, com a sua concepção do mundo absolutamente não
firme e a sua mistura inconsciente de ideias democráticas e primitivamente
socialistas. É precisamente esta ideologia que é característica da velha
intelectualidade russa, tanto da ala direita da sua parte liberal-populista
como da ala mais à esquerda: os «socialistas-revolucionários».
Eu disse: «velha» intelectualidade russa. Está já a surgir
no nosso país também uma nova, cujo liberalismo se depurou quase inteiramente
(não sem a ajuda do marxismo russo, naturalmente) do populismo primitivo e do
socialismo impreciso. A formação de uma verdadeira intelectualidade
burguesa-liberal avança no nosso país a passos de sete léguas, particularmente
graças à participação neste processo de pessoas tão ágeis e tão receptivas a qualquer
sopro em voga do oportunismo como os senhores Struve, Berdiáev, Bulgákov e Cª.
No que diz respeito, finalmente, às camadas liberais e reaccionárias da
sociedade russa não pertencentes à intelectualidade, a sua ligação com os
interesses de classe destes ou daqueles grupos da nossa burguesia e dos nossos
proprietários agrários é suficientemente clara para quem quer que esteja
minimamente familiarizado, por exemplo, com a actividade dos nossos zemstvos,
dumas, comités da bolsa, comités de feiras, etc.
Assim, chegámos à conclusão indubitável de que o agrupamento
político dos nossos estudantes é não acidental mas necessária e inevitavelmente
como nós o descrevemos atrás, de acordo com o n.° 1 do jornal Student. Depois
de estabelecer este facto, podemos já orientar-nos na questão controversa
daquilo que se deve entender propriamente por «unidade ideológica dos
estudantes», pela sua «revolucionarização», etc. À primeira vista, é até
extraordinariamente estranho como é que esta questão simples pode mostrar-se
controversa. Se o agrupamento político dos estudantes corresponde ao
agrupamento político da sociedade, não significará isto por si que por «unidade
ideológica» dos estudantes só se pode entender uma de duas coisas: ou atrair o
maior número possível de estudantes para o lado de um círculo perfeitamente
determinado de ideias sociopolíticas, ou aproximar o mais estreitamente
possível os estudantes de um determinado grupo político dos representantes
deste grupo fora dos estudantes? Não será claro só por si que só se pode falar
de revolucionarização dos estudantes do ponto de vista de uma opinião
perfeitamente definida sobre o conteúdo e o carácter desta revolucionarização?
Para um social-democrata, por exemplo, ela significa, em primeiro lugar,
difundir as convicções sociais-democratas entre os estudantes e lutar contra as
concepções que, embora se intitulem «socialistamente-revolucionárias», nada têm
de comum com o socialismo revolucionário, e, em segundo lugar, esforçar-se por
alargar, por tornar mais consciente e mais decidido qualquer movimento
democrático, incluindo académico, entre os estudantes.
De que modo esta questão simples e clara foi confundida e se
tornou controversa é um episódio muito interessante e muito característico. A
controvérsia travou-se entre o Revoliutsiónnaia Rossía (n.os 13 e 17) e o Iskra
(n.os 31 35) a propósito da «carta aberta» do conselho conjunto das
fraternidades e organizações estudantis unidas de Kíev (publicada no n.° 13 do
Revoliutsiónnaia Rossía e no n.° 1 do Student). O conselho conjunto de Kíev
achou «estreita» a decisão do II Congresso Estudantil de Toda a Rússia de 1902,
acerca de que as organizações estudantis entrassem em relações com os comités
do Partido Operário Social-Democrata da Rússia, e o facto perfeitamente
evidente da simpatia de certa parte dos estudantes de algumas localidades pelo
«partido dos socialistas-revolucionários» foi prudentemente encoberto com a
alegação perfeitamente «imparcial» e perfeitamente inconsistente de que «os
estudantes, como tais, não podem aderir no seu conjunto nem ao partido dos
socialistas-revolucionários nem ao partido dos sociais-democratas». O Iskra
apontou a inconsistência desta alegação, e o Revoliutsiónnaia Rossía,
evidentemente, levantou-se ardentemente em defesa dela, acusando os «fanáticos
de divisões e cisões» iskristas de «falta de tacto» e de amadurecimento
político insuficiente.
Depois do que atrás foi dito, é já demasiado evidente o
absurdo dessa alegação. Trata-se de um ou outro papel político dos estudantes.
E em primeiro lugar, estão a ver, é preciso fechar os olhos ao facto de que os
estudantes não estão cortados do resto da sociedade e por isso reflectem sempre
e inevitavelmente todo o agrupamento político da sociedade. Depois, com os
olhos fechados, pôr-se a discorrer sobre os estudantes como tais ou sobre os
estudantes em geral. Chega-se à conclusão... do prejuízo das divisões e cisões,
devidas à associação com este ou aquele partido político. É claro como o dia
que para levar até ao fim este curioso raciocínio seria preciso saltar do
terreno político para o terreno profissional ou educacional. E o
Revoliutsiónnaia Rossía no artigo «Os estudantes e a revolução» (n.° 17)
realiza precisamente esse salto mortal, referindo-se, em primeiro lugar, aos
interesses gerais dos estudantes, à luta geral dos estudantes, e, em segundo
lugar, aos objectivos educacionais dos estudantes, às tarefas de preparação
para a actividade social futura, às tarefas de formação de lutadores políticos
conscientes. Ambas estas referências são muito justas — só que não têm nada a
ver com o assunto e apenas confundem a questão. A questão consiste na
actividade política, a qual, pela sua própria essência, está indissoluvelmente
ligada à luta dos partidos e exige inevitavelmente a escolha de um determinado
partido. De que modo se pode então eludir esta escolha dizendo que para toda a
actividade política é necessária a mais séria preparação científica, a
«formação» de convicções firmes, ou que todo o trabalho político não se pode
limitar apenas a círculos de políticos de uma dada tendência mas deve
dirigir-se para camadas cada vez mais amplas da população, deve ligar-se aos
interesses profissionais de cada camada, unir o movimento profissional com o
político, elevar o primeiro até ao segundo?? Com efeito, só o facto de haver
pessoas que têm, para defender a sua posição, de recorrer a semelhantes
pretextos já mostra à evidência até que ponto lhes faltam a elas próprias tanto
convicções políticas definidas como uma linha política firme! Qualquer que seja
o lado por que se aborde a questão, vê-se uma e outra confirmação da velha
verdade que os sociais-democratas há muito defendem, ao condenar o equilibrismo
dos socialistas-revolucionários — tanto no aspecto científico-teórico como no
aspecto prático-político — entre o marxismo, por um lado, o oportunismo
«crítico» europeu ocidental, por outro lado, e o populismo pequeno-burguês
russo, por um terceiro lado.(2)
De facto, imagine-se relações políticas minimamente
desenvolvidas e olhe-se para o modo de colocar praticamente a nossa «questão
controversa». Suponhamos que temos diante de nós partidos de clericais, de
liberais e de sociais-democratas. Eles actuam em certas localidades, digamos,
entre algumas camadas dos estudantes e até da classe operária. Eles esforçam-se
por atrair para o seu lado o maior número possível de representantes influentes
de uns e de outra. Pergunta-se, será concebível que eles se insurjam contra a
escolha por estes representantes de um qualquer partido determinado a pretexto
de que há certos interesses gerais educacionais e profissionais de todos os
estudantes e de toda a classe operária? Isto seria o mesmo que se discutissem a
necessidade da luta dos partidos com uma referência à arte de imprimir, que
beneficia igualmente todos os partidos sem distinção. Não há nenhum partido nos
países civilizados que não compreenda o enorme benefício das uniões
educacionais e profissionais o mais amplas e firmemente estabelecidas possível,
mas cada um esforça-se por que nestas uniões predomine precisamente a sua
influência. Quem é que não sabe que a referência ao apartidarismo destas ou
daquelas instituições não passa habitualmente de uma frase hipócrita na boca
das classes dirigentes, que querem obscurecer o facto de que as instituições
existentes estão já imbuídas, em 99 casos em cem, de um espírito político muito
determinado? Mas o que os nossos srs. socialistas-revolucionários fazem, no
fundo, é cantar ditirambos em honra do «apartidarismo». Tome-se, por exemplo, a
seguinte tirada sentimental do Revoliutsiónnaia Rossía (n.° 17):
«Que táctica tão míope, quando uma organização
revolucionária quer forçosamente ver em qualquer outra organização
independente, que não lhe esteja subordinada, um concorrente, que deve ser
aniquilado, no seio do qual deve ser obrigatoriamente introduzida a divisão, a
desunião, a desorganização.»
Isto foi dito a propósito do apelo de 1896 da organização
social-democrata de Moscovo(3), que censurava os estudantes por nos últimos
anos eles se fecharem no círculo estreito dos seus interesses universitários, e
à qual o Revoliutsiónnaia Rossía ensina que a existência da organização
estudantil nunca impediu aqueles que «se definiram no aspecto revolucionário»
de dedicar as suas forças à causa operária.
Veja-se quanta confusão há aqui. A concorrência é possível
(e inevitável) apenas entre uma organização política e outra organização
política, entre uma tendência política e outra tendência política. Entre uma
associação de ajuda mútua e um círculo revolucionário a concorrência é
impossível, e, atribuindo a este último o desejo de aniquilar necessariamente a
primeira, o Revoliutsiónnaia Rossía diz puros disparates. Mas se nessa mesma
associação de ajuda mútua se manifestasse uma certa tendência política — por
exemplo, não ajudar os revolucionários ou excluir da biblioteca os livros
ilegais —, então a concorrência e a luta directa é obrigatória para qualquer
«político» honesto. Se há pessoas que confinam os círculos a interesses
estreitamente universitários (e essas pessoas existem indubitavelmente, e em
1896 havia muitas mais!), então a luta entre elas e as pessoas que defendem não
o estreitamento mas o alargamento dos interesses é igualmente necessária e
obrigatória. Mas na carta aberta do conselho de Kíev que provocou a polémica do
Rev. Rossía com o Iskra não se falava da escolha entre organizações estudantis
e revolucionárias mas entre organizações revolucionárias de diferentes
tendências. Consequentemente, começaram a escolher precisamente aqueles que já
se tinham «definido no aspecto revolucionário», e os nossos
«socialistas-revolucionários» puxam-nos para trás a pretexto de que a
concorrência entre uma organização revolucionária e uma organização puramente
estudantil é míope... Isto é de facto muito incoerente, senhores!
A parte revolucionária dos estudantes começou a fazer a
escolha entre dois partidos revolucionários, e oferecem-lhe o seguinte sermão:
«não é pela imposição» «de uma determinada» (é preferível, naturalmente, a
indefinição...) «etiqueta partidária» (para uns uma etiqueta, e para outros uma
bandeira), «não é pela violência sobre a consciência intelectual dos seus
companheiros estudantes» (toda a imprensa burguesa de todos os países explica
sempre o crescimento da social-democracia pela violência dos cabecilhas e dos
agitadores sobre a consciência dos seus pacíficos companheiros...) «que se
alcançou esta influência», isto é, a influência da parte socialista dos
estudantes sobre a restante. Seguramente que cada estudante honesto avaliará
pelo seu justo valor esta acusação aos socialistas de «impor» etiquetas e
«violar consciências». E estas palavras sem carácter, frouxas e sem princípios
são ditas na Rússia, onde são ainda tão incomensuravelmente fracos os conceitos
de organização partidária, de firmeza e honra partidárias, de bandeira
partidária!
Os nossos «socialistas-revolucionários» apresentam como
exemplo aos estudantes revolucionários os antigos congressos estudantis, que proclamavam
a sua «solidariedade com o movimento político geral, abstraindo inteiramente
das discórdias de fracções existentes no campo revolucionário». Que é o
movimento «político geral»? O movimento socialista mais o liberal. Abstrair
destas diferenças significa colocar-se ao lado do movimento imediato e mais
próximo, isto é, precisamente do movimento liberal. E é a isto que apelam os
«socialistas-revolucionários»! Pessoas que se chamam a si próprias um partido
especial apelam ao afastamento da luta partidária! Não mostrará isto que
semelhante partido não está em condições de propor a sua mercadoria política
sob a sua própria bandeira e é obrigado a recorrer ao contrabando? Não ficará
clara com isto a ausência neste partido de qualquer base programática definida
sua? É o que vamos ver.
Os erros dos socialistas-revolucionários nas suas
considerações sobre os estudantes e a revolução não podem ser explicados apenas
pela falta de lógica que nos esforçámos por demonstrar atrás. Num certo
sentido, pode-se afirmar o contrário: a falta de lógica das suas considerações
decorre do seu erro fundamental. Como «partido» eles adoptaram desde o
princípio uma posição internamente tão contraditória, tão escorregadia, que
pessoas perfeitamente honestas e perfeitamente capazes de pensamento político
não se podiam agarrar a ela sem constantes vacilações e quedas. É preciso
recordar sempre que não é pelos diferentes erros destes ou daqueles escritores,
destas ou daquelas personalidades, que a social-democracia explica o dano infligido
à causa do socialismo pelos «socialistas-revolucionários», antes, pelo
contrário, ela considera todos estes erros como um resultado inevitável de uma
posição programática e política falsa. Numa questão como a estudantil esta
falsidade manifesta-se de modo particularmente claro, e torna-se evidente a
contradição entre o ponto de vista democrático-burguês e a capa de ouropel do
socialismo revolucionário. De facto, atente-se no curso das ideias do artigo
programático do Revoliutsiónnaia Rossía: «Os estudantes e a revolução». O autor
põe em relevo «a generosidade e a pureza das aspirações», «a força dos motivos
ideais» da «juventude». É precisamente nisto que ele procura a explicação das
suas aspirações políticas «inovadoras», e não nas condições reais da vida
social da Rússia que, por um lado, geram a contradição inconciliável entre a
autocracia e camadas muito amplas e muito heterogéneas da população, e por
outro lado dificultam extremamente (em breve teremos de dizer: dificultavam)
uma manifestação de descontentamento político que não seja através das
universidades.
O autor investe em seguida contra as tentativas dos
sociais-democratas de tratar de modo consciente a diversidade de grupos
políticos entre os estudantes, de unir mais estreitamente os grupos políticos
similares e de separar aquilo que é politicamente diverso. Não é que o autor
critique a incorrecção desta ou daquela destas tentativas — seria ridículo
afirmar que todas estas tentativas foram sempre e inteiramente bem sucedidas.
Não, é completamente estranha ao autor a própria ideia de que a diversidade dos
interesses de classe tem inevitavelmente de se reflectir também no agrupamento
político, de que os estudantes não podem constituir uma excepção a toda a
sociedade, apesar de toda a sua generosidade, pureza, idealismo, etc., de que a
tarefa de um socialista não consiste em obscurecer esta diversidade mas, pelo
contrário, em explicá-la a massas o mais amplas possível e em fixá-la numa
organização política. O autor olha para as coisas do ponto de vista idealista
de um democrata burguês e não do ponto de vista materialista de um
social-democrata.
O autor não se envergonha por isso de apresentar e de
repetir o apelo aos estudantes revolucionários para o «movimento político
geral». Para ele o centro de gravidade reside precisamente no movimento
político geral, isto é, democrático geral, que deve ser unido. Esta unidade não
deve ser perturbada pelos «círculos puramente revolucionários», que devem
agrupar-se «paralelamente à organização estudantil geral». Do ponto de vista
deste amplo e unido movimento democrático seria criminoso, naturalmente,
«impor» etiquetas partidárias e violar a consciência intelectual dos
companheiros. Era precisamente assim que a democracia burguesa via as coisas em
1848, quando as tentativas de apontar a contradição de interesses de classe da
burguesia e do proletariado provocaram a condenação «geral» dos «fanáticos da
divisão e da cisão». É também precisamente assim que vê as coisas a mais
recente variedade da democracia burguesa — os oportunistas e revisionistas, que
anseiam por um grande partido democrático unido que marche pacificamente pela
via das reformas, pela via da colaboração de classes. Todos eles foram sempre e
não podiam deixar de ser inimigos das discórdias «de fracção» e partidários do
movimento «político geral».
Como se vê, as considerações dos
socialistas-revolucionários, incongruentes e contraditórias até ao ridículo do
ponto de vista de um socialista, tornam-se perfeitamente compreensíveis e
consequentes do ponto de vista democrático burguês. Isto porque o partido dos
socialistas-revolucionários não é em essência senão uma fracção da democracia
burguesa, uma fracção predominantemente intelectual quanto à sua composição,
predominantemente pequeno-burguesa quanto ao seu ponto de vista, e que quanto à
sua bandeira teórica combina eclecticamente o oportunismo recente com o velho
populismo dos nossos avós.
A melhor refutação da fraseologia unificadora do democrata
burguês é o próprio processo do desenvolvimento político e da luta política.
Também na Rússia o crescimento do movimento real conseguiu já conduzir a essa
refutação. Eu tenho em vista a separação dos «academistas» como grupo
particular dos estudantes. Enquanto não houve verdadeira luta, os academistas
não se separaram da massa «estudantil geral», e a «unidade» de toda a «parte
pensante» dos estudantes parecia indestrutível. Mas logo que se chegou à acção
a divergência de elementos diversos tornou-se inevitável(4).
O progresso do movimento político e do ataque directo à
autocracia foi imediatamente marcado por um progresso na definição do
agrupamento político — apesar de toda a espécie de palavras ocas acerca da
unidade de todos e de cada um. Dificilmente alguém duvidará de que a divisão
dos academistas e dos políticos é um grande passo em frente. Mas significará
esta divisão que os estudantes sociais-democratas «romperão» com os
academistas? Parece ao Revoliutsiónnaia Rossía que sim (ver n.° 17, p. 3).
Mas só lhe parece isto devido à confusão que revelámos atrás.
A plena demarcação das tendências políticas não significa de modo nenhum a
«ruptura» das associações profissionais e educativas. Um social-democrata que
se coloca como tarefa trabalhar entre os estudantes esforçar-se-á
necessariamente por penetrar ele próprio ou através de agentes seus no maior
número possível dos círculos «puramente estudantis» e de auto-educação o mais
amplos possível, esforçar-se-á por alargar os horizontes daqueles que apenas
reivindicam a liberdade académica, esforçar-se-á por fazer propaganda
precisamente do programa social-democrata entre aqueles que ainda andam à
procura de um programa.
Resumamos. Uma certa parte dos estudantes quer adquirir uma
visão socialista do mundo definida e integral. O fim natural deste trabalho
preparatório só pode ser — para os estudantes que querem participar
praticamente no movimento revolucionário — a escolha consciente e irreversível
de uma das duas tendências que se formaram actualmente no meio revolucionário.
Quem protesta contra essa escolha em nome da unidade ideológica dos estudantes,
em nome da sua revolucionarização em geral, etc., obscurece a consciência
socialista, prega de facto apenas a falta de ideologia. O agrupamento político
dos estudantes não pode deixar de reflectir o agrupamento político de toda a
sociedade, e o dever de todo o socialista é esforçar-se por conseguir a
demarcação mais consciente e consequente possível de grupos politicamente
diversos. O apelo aos estudantes feito pelo partido dos
socialistas-revolucionários no sentido de «proclamar a sua solidariedade com o
movimento político geral e abstrair inteiramente das discórdias de fracções no
campo revolucionário» não é no fundo senão uma exortação a andar para trás, do
ponto de vista socialista para o ponto de vista democrático-burguês. Não há
nisto nada de surpreendente, pois o «partido dos socialistas-revolucionários» é
apenas uma fracção da democracia burguesa na Rússia. A ruptura de um estudante
social-democrata com os revolucionários e políticos de todas as outras tendências
não significa de modo nenhum a ruptura das organizações estudantis gerais e
educativas; pelo contrário, só adoptando o ponto de vista de um programa
perfeitamente definido se pode e deve trabalhar nos mais amplos círculos de
estudantes para alargar o horizonte académico e para fazer propaganda do
socialismo científico, isto é, do marxismo.
P.S. Nas cartas seguintes gostaria de conversar com os
leitores do Student sobre a importância do marxismo para a elaboração de uma
visão do mundo integral, sobre as diferenças de princípio e tácticas entre o
partido social-democrata e o partido dos socialistas-revolucionários, sobre as
questões da organização estudantil e sobre a relação dos estudantes com a
classe operária em geral.