Até agora as tentativas de se formar um novo governo
na Grécia fracassaram. Se até 17 de maio a situação assim se mantiver, haverá
novas eleições parlamentares em junho. A Nova Democracia (ND) junto com o PASOK
conquistaram 149 cadeiras e não conseguiram a maioria necessária (151
deputados) no parlamento para constituir o gabinete de “união nacional”. ND
buscou fechar um acordo com a extrema-direita agrupada no Aurora Dourada e
outros grupos menores, mas o fato de ter que recorrer a social-democracia (PASOK)
e mesmo a chamada Esquerda Democrática (ED) para ter maioria parlamentar
desagradou seus parceiros neonazistas que desejam um governo “puro sangue” da
direita xenófoba. A tendência é que em uma nova eleição, ND conquiste mais
votos e com o bônus de 50 deputados para o partido mais votado, como prevê a
aberrante legislação grega, consiga formar um governo que tenha o controle
absoluto.
Há, entretanto, o “Plano B” da burguesia, seu nome é
SYRIZIA. A SYRIZIA ou “Coalizão de Esquerda e do Progresso”, dirigida pelo
oportunista Alexis Tsipras, tentou até o último momento compor uma aliança com
a Esquerda Democrática (ED) e o Partido Comunista Grego (KKE), além de outros
grupos “independentes”, para a formação de um “governo de esquerda”. O objetivo
de tal acordo era compor um gabinete com uma roupagem renovada para gerir a
crise do regime grego questionando limitadamente os termos estabelecidos pela
troika em seu “plano de ajuste” que impõe mais miséria e desemprego aos
trabalhadores. Apesar de não defender a saída da União Europeia (UE) e sim a
revisão do chamado “memorando” sob o slogan “Euro sem austeridade”, em seus
discursos Alexis Tsipras chega a flertar com essa posição defendida de fato
pelo KKE como a “alternativa para a crise grega”. Frente a essa realidade, a
própria troika já admite um acordo com a SYRIZIA em torno da revisão dos termos
do “memorando”. Segundo o Financial Times, bancos centrais europeus já falam
abertamente nos preparativos para a saída da Grécia da “Zona do Euro”. Nesse
sentido, Luc Coene, presidente do BC belga declarou: “Acredito que um divórcio
amigável, se for um dia necessário, poderá ser possível. Mas eu ainda assim
lamentaria” (O Estado de S.Paulo, 13/05). Patrick Honohan, presidente do BC
irlandês, seguiu a mesma linha. “Coisas que não estão nos tratados podem
ocorrer. Tecnicamente, a saída da Grécia pode ser administrada. Não seria
necessariamente fatal, mas não é atrativa” (Idem). Para Jens Weidmann,
presidente do Bundesbank, o BC alemão, “as consequências de sair da zona do
euro são mais sérias para a Grécia do que para o resto da zona do euro”
(ibdem).
A ruptura com a UE é uma solução política tão
“ingênua” como distracionista para a verdadeira questão de fundo que nem os
stalinistas do KKE querem abordar, ou seja, a ruptura radical com o capital
financeiro e não simplesmente com a “Zona do Euro”. Não é demais lembrar que a
Inglaterra atravessa sua pior crise dos últimos vinte anos, sem nunca ter
ingressado na Zona do Euro e mantendo sua própria moeda nacional. O fulcro da
crise capitalista vai muito além do modelo monetário adotado por um país ou
mesmo uma comunidade de países, como é o caso da União Europeia. Sem abordar
com radicalidade o verdadeiro cerne da questão em debate, os trabalhadores,
principais vítimas da ciranda financeira vigente, ficaram à deriva dos projetos
populistas e “antineoliberais” para superar o impasse de uma economia
capitalista falida, mas que não deixará a cena histórica sem a construção de
uma alternativa socialista e revolucionária.
Os esforços de SYRIZIA para formar um “governo de
esquerda” também fracassaram momentaneamente até porque se os três partidos
formassem uma aliança não conquistariam maioria parlamentar. A LIT, por
exemplo, é uma apoiadora entusiasta dessa política frente populista. No artigo
“Grécia: hecatombe dos partidos da troika e necessidade de governo das
esquerdas”, os morenistas afirmam: “O que os gregos querem é um governo de
unidade das esquerdas para acabar com a austeridade sobre os trabalhadores, os
jovens, os pensionistas e o povo em geral. Nesse sentido, a extrema-esquerda
agrupada na SYRIZA foi quem melhor capitalizou o descontentamento popular, pois
o seu líder, Alexis Tsipras, vinha já há algum tempo a defender a linha de um
governo das esquerdas baseado na SYRIZA, no KKE (Partido Comunista) e no DIMAR
(Esquerda Democrática)... Para já, a alternativa do ponto de vista dos
trabalhadores e da juventude parece ter de passar por um governo unitário das
esquerdas entre a SYRIZA, o KKE e o DIMAR para romper com o programa da troika,
recusar a usura da dívida, repor as perdas salariais e os direitos laborais,
canalizar o dinheiro para o crescimento da economia e do emprego, nacionalizar
ou impedir a privatização de sectores estratégicos da economia” (sítio LIT,
07/05). Como se vê, a LIT reivindica um “governo de esquerda” que gerencie a
bancarrota do regime burguês sem qualquer ruptura revolucionária, já que sequer
fala da expropriação dos capitalistas, não denuncia o caráter de classe do
Estado burguês e nem mesmo defende da ruptura com a UE. A LIT também não emite
uma linha em defesa da saída de Grécia da OTAN, seguindo a mesma posição da
SYRIZA, até porque ambas as forças defendem a fantasiosa “revolução árabe” que
se utilizou da agressão militar da aliança imperialista para impor os
mercenários do CNT na Líbia.
Não está descartada a possibilidade de que se houver
novas eleições parlamentares SYRIZA conquiste mais votos e esteja na ordem do
dia a formação de tal “governo das esquerdas”, aumentando a pressão sobre o KKE
para que componha essa coligação. Como dissemos anteriormente, apesar da
negativa formal do KKE de compor uma aliança parlamentar com a SYRIZIA e ED
para formar um governo e indicar o primeiro-ministro, a política eleitoralista
dos stalinistas gregos pressionam os setores mais oportunistas do partido a
internamente se postarem a favor de uma “frente de esquerda” para gerir a
bancarrota do Estado burguês grego! Não por acaso, o KKE perdeu votos nas zonas
proletárias de Atenas para a SYRIZIA. Enquanto Alexis Tsipras fala de um
“governo de esquerda” como suposta alternativa concreta aos olhos dos
trabalhadores a atual gestão abertamente submissa a troika, o KKE propõe
vagamente um “poder popular dos trabalhadores”, mas não faz nada para
concretizá-lo limitando-se a vergonhosos pedidos ao parlamento burguês porque
para os stalinistas “as condições objetivas e a correlação de forças não estão
maduras” para uma ruptura revolucionária!
Até o momento o Partido Comunista Grego declarou que
“um governo ‘de esquerda’ é um barco furado para o povo que sofre”, denunciando
a SYRIZA como um sustentáculo do regime. Porém, o próprio KKE centra suas ações
sobre o parlamento burguês. Neste domingo, 13 de maio, a Secretária-Geral do
KKE, Aleka Papariga, propôs a anulação dos acordos que levaram à concessão de
ajuda internacional a seu país pelo próprio parlamento serviçal a troika!
Segundo Aleka Papariga: “Vamos apresentar ao Parlamento grego um projeto de lei
que determina muito especificamente a eliminação e a anulação do acordo” (O Estado
de S.Paulo, 13/05). Vale relembrar que recentemente o KKE assumiu a condição de
polícia para proteger o parlamento burguês contra os anarquistas e setores mais
radicalizados das marchas de protesto de 2011, taxando-os de “provocadores”,
sendo por isso elogiado pelas forças de direita governamentais pela sua
“responsabilidade” e “espírito cívico”! Depois de negar-se a chamar a derrubada
do governo burguês do Pasok, frente à gestão de unidade nacional controlada
pela direita, o KKE apresentou como proposta a “retirada da UE”. Não por acaso,
tal medida protecionista, que a frágil burguesia grega até poderia chegar a
recorrer desesperadamente, tem a simpatia de setores da própria direita
nacional. A entrada da Grécia na chamada zona do Euro a colocou em um colapso previamente
anunciado. A única “saída possível” para a burguesia grega seria a renúncia ao
Euro e o rompimento com o receituário draconiano da troika, mas isso é
impossível no marco estatal de uma classe dominante associada às burguesias
imperialistas europeias, em especial à alemã e francesa, que se beneficiam das
exportações primárias da Grécia e principalmente da jogatina especulativa de
que o país é refém. Em resumo, diante da covardia da burguesia nativa, o KKE
assume a defesa da tarefa... dando-lhe uma maquiagem de esquerda, mas sem
questionar em nenhum momento o próprio poder burguês.
A Troika aponta um gabinete de “união nacional” sob controle
da direita na Grécia como saída preferencial, mas tem como “plano B” um governo
de “esquerda”. São dois lados da mesma moeda. Nesse cenário, os trabalhadores
não devem dar nenhum voto de confiança a essas duas alternativas burguesas
voltadas a jogar mais uma vez nos ombros dos trabalhadores o custo da crise
capitalista. Ao contrário, é preciso alertar, preparar e organizar o
proletariado e, particularmente, sua vanguarda mais combativa para um período
de fascistização do regime político. Tragicamente, o conjunto da esquerda
grega, desde o stalinismo até os revisionistas do trotskismo apresentam nada
mais do que impotentes programas sindicalistas, opondo-se a armar de uma
plataforma revolucionária a classe para os novos embates que emergem desta nova
conjuntura dramática. Os catastrofitas da LIT que ontem apregoavam que a “revolução”
batia às portas da Grécia, agora descaradamente imploram pela formação de um “governo
de esquerda” para gerir a Estado capitalista! Já o EEK, grupo ligado ao PO
argentino, que também vendia ao mundo que estávamos às vésperas do fim do
capitalismo na Grécia em 2009, se apresentou nas eleições nacionais e
conquistou 6 mil votos, sendo uma das legendas menos votadas, isso quando Jorge
Altamira pregava há dois anos que o EEK estaria à cabeça da “revolução grega”!
Aos genuínos marxistas cabe a tarefa de intervir ativa
e pacientemente sobre estas lutas para elevar o nível de consciência dos
setores mais radicalizados, a fim de fazê-la avançar da resistência defensiva
atual para a disputa pela conquista do poder político contra seus algozes,
superando a criminosa influência política que a centro-esquerda reformista e
seus satélites revisionistas exercem sobre o proletariado. A materialização
deste longo e paciente processo de evolução da consciência dos trabalhadores é
a construção de um partido internacionalista e revolucionário que lute por
derrotar a União Europeia imperialista, sob a qual a vida das massas converte-se
em uma bárbara escravidão, para edificar em seu lugar uma Federação das
Repúblicas Socialistas da Europa, apontando a única saída verdadeiramente
progressista para o velho continente.