Odiado governo Erdogan, aliado incondicional da “revolução Síria”, é alvo de autênticas manifestações populares na Turquia
Uma onda de protestos
populares tomou conta da Turquia a partir da tentativa de destruição da praça
pública Taksim em Istambul pelo governo islamita do odiado primeiro-ministro
Erdogan. Tudo ocorreu ao melhor estilo de uma faísca que faz incendiar uma fogueira.
Logo, os impressionistas de sempre no interior da “esquerda” trataram de
afirmar que Istambul estava sendo palco de um novo capítulo da chamada
“Primavera Árabe”, como o surgimento de uma nova “Praça Tahrir”. Mas, ao que
tudo indica, a transição controlada que o imperialismo ianque operou com
sucesso no Egito e na Tunísia não parece estar nos planos da Casa Branca quando
se refere à Turquia. País onde estão instaladas várias bases da OTAN e que
serve como cabeça de ponte das potências capitalistas no suporte aos
mercenários “rebeldes” na Síria, não há qualquer sinal que os EUA e a União
Europeia desejem tirar de cena o seu importante aliado do governo turco. Ao
contrário, a ordem é reprimir violentamente o movimento de massas para garantir
a estabilidade do regime com o apoio dos amos ocidentais, justamente para a
Turquia continuar dando suporte à agressão da OTAN a países como a Síria e o
Irã. A fantasiosa “Primavera Árabe” não chegou à Turquia porque Ancara já se
coloca plenamente como marionete do imperialismo, o que reforça a necessidade
dos marxistas revolucionários apoiarem as manifestações contra o reacionário
Erdogan, ainda que sejam limitadas, justamente porque elas estão ocorrendo por
fora dos planos do imperialismo para a região e servem para questionar o apoio
da Turquia às provocações contra a Síria, já que grande parte da população é
contrária ao papel vergonhoso que assumiu o governo pró-imperialista do país no
Oriente Médio e Norte da África.
Erdogan, homem forte do
Partido islamita Justiça e Desenvolvimento (AKP), é odiado por um amplo setor
das massas populares além, obviamente dos kurdos, perseguidos duramente em seu
governo. Com os protestos, reprimidos pela polícia com canhões de água, spray
de pimenta e gás lacrimogêneo, que já provocou quatro mortes, o principal partido
da oposição burguesa, o Partido Republicano do Povo (CHP) tenta capitalizar o
descontentamento para um voto de desconfiança no parlamento em nome da formação
de um “governo de salvação nacional”, mas de fato visa desgastar o governo do
AKP para as eleições parlamentares de... 2015. Até o momento, porém, tal
proposta não avançou justamente porque o imperialismo ianque e a EU mantém
apoio integral a Erdogan, cujo partido controla a prefeitura de Istambul. Ele é
aliado das petromonarquias do Conselho de Cooperação do Golfo que atuaram na
Líbia e agora na Síria para derrubar governos com fricções com a Casa Branca.
Além disso, expressa um conservadorismo religioso aliado a um “neoliberalismo”
linha dura que será reforçado com a mudança do sistema parlamentarista para
presidencialista prevista para ser alterado após um referendo em 2015. Por isto,
o silêncio dos “defensores da democracia” tipo Obama, Cameron, Hollande... que
tanto ameaçam o Irã!
As contradições
nacionais têm se acirrado nos últimos anos. A questão curda tem sido a mais
candente para a estabilidade do regime político. Por esse motivo, o governo de
Erdogan desenvolveu um grande esforço para tentar viabilizar um “acordo de paz”
depois de anos de perseguição ao PKK (Partido Trabalhista do Curdistão). Os
curdos representam 20% da população total da Turquia e habitam a estratégica
província de Anatólia Oriental, estratégica para viabilizar os acordos
comerciais com a União Europeia. A preocupação da Turquia também é com os
curdos na Síria. Nos últimos meses, Assad praticamente liberou parcela dos
território sírio para eles terem uma autonomia na região fronteira com a
Turquia. Nesse contexto, os curdos na Síria incrementaram os contatos com o
Curdistão iraquiano e com o PKK, brutalmente reprimido pelo governo de Erdogan.
O PKK está organizando bases militantes no norte da Síria, o que impede as
ações de sabotagem dos mercenários nas fronteiras com a Síria e também o uso do
território turco nesta região do país para o lançamento de drones (aviões
não-tripulados) com o objetivo de bombardear as principais cidades sírias como
já vem ocorrendo. O centro da preocupação turca é que os curdos se fortaleçam
ainda mais na região, porque o estabelecimento do governo autônomo curdo no
norte do Iraque e a posse de cidades iraquianas de Mosul e Kirkut, após a
ocupação, importantes centros de reserva e extração petrolífera, deu grande
impulso a um sentimento popular que exige a constituição de um Estado
independente. O ascenso do movimento nacionalista curdo também desestabiliza
internamente a própria Turquia, já que em seu território existem mais de 12
milhões de curdos vivendo sob um férreo regime de opressão nacional, cuja
expressão mais conhecida é a prisão do líder curdo nacionalista do PKK,
Abdullah Ocalan. A consequente defesa do direito à autodeterminação curda
através de um programa marxista revolucionário passa, neste momento, pelo
chamado à unidade revolucionária dos trabalhadores turcos, iraquianos,
iranianos, sírios e curdos, conformando milícias multiétnicas para derrotar o
imperialismo e seu agente Erdogan.
Por outro lado, grande
parte da população turca se opõe à política pró-imperialista de ataque ao Irã e
a Síria. Como a Turquia é um estado-membro da OTAN, a aliança imperialista pode
agredir a Síria sem a necessidade de aprovação formal de outras instâncias
internacionais como a ONU se o país alegar que foi atacado. Na verdade, a
Turquia já invadiu várias vezes o espaço aéreo sírio e montou uma verdadeira
base militar do ELS na fronteira com o país, onde os mercenários recebem armas
e treinamento. Não esqueçamos que em 2003 a mesma Turquia pediu assistência da
OTAN para garantir sua segurança diante da iminência da guerra do Iraque. Não
por acaso, o primeiro-ministro turco anunciou durante uma reunião especial da
OTAN no final do ano passado que se as tropas sírias se aproximarem da
fronteira com a Turquia serão considerados alvos militares, o que significa uma
verdadeira declaração de guerra contra a Síria.
Para que a luta contra o
governo Erdogan avance é preciso que ela reivindique não só a queda do seu
governo, mas que tenha uma perspectiva mais ampla, o que passa pela
reivindicação de que o país não preste nenhum apoio aos mercenários “rebeldes”
na Síria. É sintomático neste sentido, que a LIT, que alega ter um grupo
simpatizante no país (RED), na sua declaração política não dedique uma linha
sequer sobre a questão síria e muito menos reivindique o fim das bases
militares da OTAN no país, pois sabe claramente que um dos pontos de
descontentamento popular com o governo do AKP é seu apoio a agressão das
potências capitalistas ao país vizinho. Não se pode lutar consequentemente
contra o governo Erdogan apoiando sua política se prestar suporte logístico e
militar, via OTAN, aos “rebeldes” na Síria, como faz a LIT! Segundo comunicado
o Partido Comunista da Turquia (TKP) “Enquanto as massas entoam a palavra de
ordem ‘Renuncia, governo!’, as negociações limitadas ao futuro do parque
Taksim-Gezi perdem o sentido. O governo finge não entender que a velha
correlação foi abalada em seus fundamentos e não pode ser restaurada. Todos
sabem que o movimento popular não é produto da sensibilidade quanto às árvores
do parque Gezi. A ira das pessoas vem dos projetos de transformação urbana, do
terror do mercado, das intervenções abertas e diretas em estilos de vida
diferentes, do americanismo e da subordinação aos EUA, das políticas
reacionárias, da inimizade dirigida contra o povo sírio” (Declaração do Comitê
Central do Partido Comunista da Turquia, 04/06). Como se vê, a questão síria
polariza as mobilizações na Turquia, o que coloca na ordem do dia a luta pelo
fim das bases da OTAN do país, exigindo sua saída da aliança militar
imperialista como um passo concreto para derrotar Erdogan, que não passa de uma
marionete das potências capitalistas a frente do governo da Turquia!