A falência do sistema
público de saúde e o virulento ódio aos médicos cubanos
As duas questões que dão
o título a este artigo estão intimamente relacionadas, fazendo parte integrante
do mesmo bloco de interesses da classe dominante. A primeira questão é a
completa falência da saúde estatal “gratuita” destinada a atender a população
mais carente, obrigada a pagar qualquer arapuca chamada de “plano de saúde”
para não acabar em um corredor imundo de um hospital público. Os dez anos da
gerência neoliberal petista não alteraram em nada o péssimo atendimento
hospitalar da população, seja nos setores de prevenção, emergência ou
tratamento clínico. A razão é uma só, seguiram com o modelo capitalista, onde a
saúde da população é apenas mais um lucrativo nicho comercial de acumulação de
capital para a burguesia. E não estamos nos referindo somente à rede privada de
clínicas e hospitais ou empresas de “seguro saúde”, o sistema estatal é um verdadeiro
“filé mingnon” para um grande mercado de fornecimento de equipamentos e
medicamentos, quase sempre superfaturados e de qualidade duvidosa. Neste quadro
de um regime capitalista neoliberal, onde o sistema de saúde (público e
privado) apresenta as melhores taxas de rentabilidade financeira para
investimentos (somente ficando atrás no país do mercado de ações), falar de
verdadeiros valores humanos como uma medicina voltada a defesa da vida e não do
lucro deve provocar o mais profundo ódio de classe de uma elite podre e reacionária.
A imagem da chegada dos médicos cubanos ao Brasil, dedicados a uma causa e a
sua pátria, entra em contradição absoluta com um mundo onde tudo deve ser
precificado, inclusive a vida humana, colocando em questão a mercantilização da
saúde e a lógica comercial das grandes empresas do setor. Para o governo
petista a adoção do programa “Mais Médicos” é um remendo na falida malha do
sistema estatal de saúde, um recurso demagógico que tenta encobrir a carência
nacional na formação universitária de profissionais de saúde e a insuficiência
de hospitais públicos em regiões onde as “taxas de retorno” não compensam os
investimentos. Já para a burguesia, o “debate” sobre a utilização dos médicos
cubanos no incipiente SUS (que mal consegue atender 20% da demanda total da
população brasileira) deve ser encarado como uma questão de “princípios”,
ferindo profundamente a doutrina da religião do “Deus Mercado”, portanto,
estamos diante da abertura de uma nova “guerra santa” para o PIG, onde todas as
armas ideológicas devem ser usadas, inclusive a de rotular os médicos cubanos
como “escravos” da “ditadura comunista totalitária” dos irmãos Castro.
Não há parâmetros de comparação entre o sistema de saúde de um Estado operário, como o de Cuba ou Coreia do Norte, e de países capitalistas inclusive os mais desenvolvidos como os EUA. Para começar, não há medicina privada em Cuba, pelo menos para seus habitantes, os índices de mortalidade infantil na Ilha são menores do que as do império do norte. Desde a revolução em 1959 Cuba já formou cerca de 150.000 médicos, em um país de dez milhões de habitantes possui uma média de atendimento melhor do que França, Inglaterra e o dobro dos EUA. A medicina cubana possui domínio científico mundial em especialidades como oftalmologia e pneumologia entre outras, e expectativa de vida de sua população já atinge a impressionante marca de 80 anos! O mais importante, porém, é a filosofia na formação profissional de médicos e outros agentes de saúde em Cuba, os valores ensinados não são os de mercado e sim o da dedicação e sacrifício para salvar vidas humanas e ajudar a “construção socialista” de um país mais justo e solidário. Na contramão desta ideologia está a medicina brasileira, “sonho de consumo” das famílias da classe média que veem a possibilidade de seus filhos acumularem status e dinheiro ao obterem um diploma de médico. Como os governos da Frente Popular impulsionaram o ensino privado nesta última década (com financiamento estatal), estrangulando as universidades públicas, começaram a surgir as faculdades privadas de medicina (um excelente negócio), que totalmente despreparadas passaram a adotar o seguinte lema para atrair alunos de renda alta: “Aqui você pode!”.
Com esta concepção
mercantil não nos surpreende que médicos brasileiros se recusem a praticar sua
profissão nos rincões mais distantes do país, alegando cinicamente falta de “condições
logísticas”. Também são totalmente coerentes as posições assumidas pelas
entidades corporativas de medicina ao combaterem furiosamente a chegada de
médicos cubanos, afinal para estes senhores a vida ou a morte é apenas uma
simples equação de custo/beneficio. Mas, enquanto atacam violentamente os
médicos cubanos, como reflexo de um anticomunismo arcaico, a burguesia
tupiniquim recebe de “braços abertos” os neoescravos bolivianos para “trabalhar”
na indústria da confecção de grifes famosas e receberem salários aviltantes sem
qualquer proteção social. Para uma classe dominante escravocrata deve ser
impossível imaginar que os médicos cubanos tenham dignidade e de livre vontade
queiram retribuir ao seu país a educação gratuita e de qualidade que receberam.
O princípio do internacionalismo e cooperação entre os povos esteve presente
nos princípios da revolução cubana, o exemplo heroico de Che Guevara marcou as
novas gerações, influenciando os jovens médicos cubanos a praticarem sua
profissão em países pobres da África e América Central ou mesmo em regiões
capitalistas periféricas onde não alcança a “mão invisível do mercado”.
O governo Dilma tenta se
apoiar no convênio celebrado com Cuba para atenuar a extrema deficiência da
saúde pública no interior do Brasil, sem falar no colapso existente nos grandes
centros urbanos. Mas será apenas uma medida emergencial que não terá a
capacidade de reverter a dinâmica geral de uma política neoliberal que
privilegia a saúde privada para potencializar o lucro das grandes empresas do
setor. É necessário destinar recursos estatais somente para a rede pública de
saúde, estatizando os “shoppings” hospitais e fechando imediatamente as
empresas de “planos e seguros” de saúde privada. Estas medidas devem ser
acompanhadas com pesados investimentos nas universidades públicas, ampliando
estrategicamente as vagas para os cursos de medicina e paulatinamente reduzindo
o crédito de acesso para as faculdades particulares, a maioria destas sem a
menor capacidade científica. Como não acreditamos que o governo do PT assuma
esta plataforma anticapitalista, seguiremos na luta pela construção de uma
alternativa revolucionária de poder proletário, sempre defendendo de forma
pedagógica para as massas, os aspectos sociais mais progressivos presentes nos
estados operários, como o sistema de saúde em Cuba.