Primárias argentinas: Governo CFK perde terreno para a “nova” direita, enquanto revisionistas da FIT “festejam” dividendos de sua domesticação eleitoral
O resultado do PASO
(Primárias Abertas, Simultâneas e Obrigatórias) realizadas na Argentina no
último domingo, 11 de agosto, apontou para a derrota dos candidatos apoiados
por Cristina Fernandes Kirchner (CFK) nos maiores distritos do país, apesar da
governista Frente para a Vitória (FpV) ter se mantido como principal força
política em nível nacional. Como já é costume na mídia “murdochinana”, os
principais jornais fizeram críticas direitistas à atual administração e
chegaram a anunciar o fim dos dez anos do “kirchnerismo”. Vale esclarecer aos
incautos que as eleições do PASO não elegem ninguém, por isso são apenas
prévias, e que as eleições para “valer” acontecerão em outubro. A “vitória”
preliminar mais comemorada pelo “PIG” argentino foi a de Sergio Massa, chefe de
gabinete do governo entre 2008 e 2009, que obteve uma diferença de seis pontos
percentuais (35 a 29%) na Província de Buenos Aires sobre Martín Isaurralde, o
candidato a deputado nacional que encabeçou a lista apoiada por Cristina
Kirchner. Líder da chamada Frente Renovadora, um racha de centro-direita do
“kirchnerismo”, Massa adotou durante a campanha um discurso que se aproximou
dos setores mais conservadores. Agora, até as eleições de 27 de outubro que
renovarão parte do Senado e da Câmara dos Deputados, busca galgar a simpatia de
um espectro político ainda mais reacionário que votou em De Narváez (10%). Já a
FIT - Frente de Izquierda y de los Trabajadores (PO, PTS, IS), aliança política
formada e apoiada por quase todo arco revisionista argentino obteve mais de 900
mil votos em nível nacional, um resultado eleitoral que expressa sua profunda
domesticação ao sistema da democracia dos ricos, cujo único “eixo” é “coloque
deputados de esquerda no Congresso”, adotando um programa de reformas pseudodemocráticas
dentro da institucionalidade burguesa. Para se ter uma noção do nível da
renúncia programática da FIT, nem sequer a palavra “socialismo” foi utilizada em
seus spots televisivos, tudo para não “chocar” a conservadora classe média
portenha.
Além da capital federal,
o governo CFK também foi derrotado nas principais cidades e províncias argentinas:
em Santa Fé e Mendoza ficou em terceiro, enquanto em Córdoba caiu para o quarto
posto. Em todos os casos ficou pelo menos a dez pontos percentuais de distância
dos respectivos ganhadores. A aliança governista Frente para a Vitória (FpV)
obteve o primeiro lugar da somatória global das eleições primárias
legislativas, chegando a 30% dos votos. Em segundo, ficou a Frente Renovadora
(de ex-kirchneristas aliados à centro-direita) que obteve 13%. No dia 27 de
outubro serão realizadas as eleições que vão definir a composição legislativa
de parte do Congresso Nacional nos dois últimos anos de mandato de Cristina. O
resultado do PASO deste dia 11 indica que a coligação governista deve manter a
maioria no Congresso Nacional, porém com uma margem apertadíssima, o que
representa que CFK terá muitas dificuldades em eleger seu sucessor nas próximas
eleições presidenciais, já que o plano da “re-reeleição” deve ser descartado. A
substituição da centro-esquerda argentina por um governo de corte mais
direitista na Casa Rosada representa justamente a tendência política do próprio
continente latino-americano, com a ofensiva dos setores conservadores a
voltarem a gerência burguesa para se aliar ao “amo do norte”. O vergonhoso
acordo comercial para a exploração do petróleo argentino recém fechado entre a
YPF (estatizada em nome da “soberania”) e a transnacional ianque Chevron
apontou na direção de um deslocamento econômico da burguesia nacional em
direção aos EUA. O mais escandaloso deste processo foi a virulenta defesa feita
pela esquerda revisionista do “descolamento” da Argentina de um suposto “imperialismo
Chino”, o governo Obama agradeceu a “ajuda”. Não por coincidência, a PETROBRAS
segue no mesmo rumo!
Já na capital portenha,
a unidade eleitoral de centro-esquerda entre Pino Solanas e Elisa Carió, (UNEN)
conquistou a maioria dos votos para o senado (32%) com Solanas (movimento
Projeto Sul-PS) sendo o candidato mais votado da lista, que também foi muito
bem sufragada na disputa pelos deputados nacionais (35%). Esta coligação já não
contava com os ex-morenistas do MST, que foram obrigados a deixar o PS em
função do escandaloso acordo eleitoral firmado entre Solanas (PS) e a ultradireitista
Elisa Carrió da corrente ARI. Quase às vésperas do PASO para habilitar os
partidos a disputarem uma parte do parlamento argentino, o MST “descobriu” que
sua diluição no PS poderia conduzi-los a estabelecer uma frente com políticos
que nem a maquiagem da “esquerda” burguesa possuem. Até descobrir a “novidade”
passou dois anos no interior do PS, o que rendeu ao MST a eleição de um
vereador na capital federal argentina, além de um completo distanciamento do
restante das correntes revisionistas que participam da FIT, que passaram a
considerar a ex-seção da UIT como parte orgânica de um partido burguês. Neste
intervalo de tempo, o MST estabeleceu profundos acordos com a reacionária
oposição “sojera”, declarando seu ódio visceral a qualquer medida “progressiva”
do governo Kirchner. Tanto é assim que a UNEN agora se apresenta como
alternativa ao direitista PRO de Macri, já que disputará os votos de seu
espectro político postando-se como oposição a CFK. A débâcle do MST se fez
sentir nos desastrosos resultados que obteve no PASO, não atingindo sequer o
piso de 1,5% na capital federal e na província de Buenos Aires.
A FIT celebrou ter
conquistado nacionalmente cerca de 900 mil votos (5% em média). Jorge Altamira,
dirigente do PO, logo afirmou depois da divulgação dos resultados: “A FIT fez
uma eleição extraordinária... marca uma tendência na possibilidade do ingresso
da Frente de Izquierda no Congresso Nacional, nas províncias como Salta,
Córdoba, na Capita Federal e na província de Buenos Aires. De modo que para a
esquerda argentina, para os trabalhadores, a Frente de Izquierda é a única
alternativa eficaz daqui a outubro para ingressar ao Congresso Nacional.
Passamos do piso eleitoral e nos colocamos na disputa direta para o ingresso ao
Congresso por dois deputados na Província de Buenos Aires” (sítio PO, 11 de
agosto). As declarações ufanistas do PTS e IS vão no mesmo sentido, além as
declarações exultantes dos outros grupos (CS, PSTU, TPR...) que apoiaram a FIT.
Salivando por entrar no parlamento burguês, a FIT se apresentou como uma
plataforma sindicalista, empunhando consignas democráticas e buscando se colar
no sentimento direitista contra o governo CFK, onda reacionária que foi inflada
pela mídia “murdochiana”. Estes elementos demonstram que este bloco
revisionista perdeu todas as referências de classe, tanto que chegou a se unir
“taticamente” à oposição conservadora e a burocracia sindical direitista contra
o “kirchenerismo” nos chamados “cacerolazos”.
As declarações da FIT
festejando no PASO os dividendos de sua domesticação eleitoral demonstram
absoluta indiferença da “esquerda” no debate programático, ao mesmo tempo em
que está unida de forma sólida em torno de posições cada vez mais
pró-imperialistas (Líbia, Síria, apoio ao golpe no Egito). Longe de ser uma
vitória dos trabalhadores, o (improvável) ingresso da FIT no parlamento burguês
em outubro significaria justamente a celebração da profunda integração do
revisionismo às instituições do regime, sendo parte da “esquerda” que longe de
apontar uma alternativa revolucionária ao “Kirchenerismo” acaba engrossando o
coro da direita e da Casa Branca contra os governos da centro-esquerda burguesa
do continente. Sem a existência de um partido revolucionário na Argentina, a
tarefa que se impõe no país platino é o da recomposição programática dos
setores classistas do movimento operário, rumo à construção de uma ferramenta
política independente do nacionalismo burguês e das oligarquias reacionárias
“opositoras”. Neste sentido, longe de embarcar na pressão pelo “voto útil” na
FIT em outubro, cabe aos marxistas revolucionários denunciarem sua completa
incapacidade de se constituir como um ponto de apoio para construir uma
alternativa de poder revolucionário dos trabalhadores!