Neste 31 de Março completam-se 59 anos do golpe militar de
1964. A data foi escolhida pelos generais golpistas em conluio com a cúpula da
UDN e setores do próprio PSD para desencadear a ação militar que levaria à
renúncia do presidente João Goulart. O governo de João Goulart (Jango) foi o
último de uma geração de governos nacionalistas burgueses, surgidos com Getúlio
Vargas e parcialmente Juscelino Kubitschek que defendiam um desenvolvimento
nacional “autônomo” da burguesia brasileira. Para isto, tentaram melhorar as
condições de infraestrutura para o desenvolvimento da indústria de
transformação, como a expansão da siderurgia, das usinas hidrelétricas, a
instalação da indústria da construção naval, a expansão da indústria
automobilística e a abertura de novas rodovias, unindo regiões até então
isoladas do país. Todavia, a industrialização do país fortaleceu numérica e
politicamente ao movimento operário. O ascenso das massas e o amadurecimento
das condições objetivas para a revolução socialista sempre atemorizaram mais à
tacanha burguesia nacional do que submeter-se à condição de sócia minoritária
dos negócios do grande capital ianque, renunciando a seus sonhos
nacional-desenvolvimentistas.
Por isso, historicamente, a burguesia brasileira
se mostrou incapaz de romper com o imperialismo e resolver plenamente as
tarefas democráticas e de emancipação nacional pendentes no país, como a
reforma agrária, a ruptura com o atraso e a dependência econômica frente ao
imperialismo, o fim do analfabetismo e das desigualdades regionais.
As
“Reformas de Base” eram apresentadas como uma solução para a crise gerada pelo
atraso nacional. Visando a ampliação do mercado interno, medidas como a
desapropriação dos latifúndios improdutivos e a distribuição de terras às
massas camponesas tinham como objetivo, além de fomentar o crescimento do
número de trabalhadores com poder de compra, estendendo os direitos
trabalhistas às massas assalariadas agrícolas, aumentar a produção de gêneros
alimentícios a baixo custo para ampliar o mercado consumidor de produtos da
indústria nacional.
Para aumentar o poder aquisitivo dos trabalhadores urbanos,
além do salário mínimo, repouso remunerado, férias e 13º salário, o governo
prometia uma nova política habitacional que estimularia a redução dos custos
dos aluguéis. O projeto das Reformas de Base buscava também a ampliar o mercado
externo por meio do incremento das relações comerciais com os Estados
operários, como China e a URSS.
Para conter a sangria de recursos financeiros
nacionais, propunha a limitação às remessas de lucro das empresas estrangeiras
para o exterior. Mas, em si, as “Reformas de Base” estavam longe de representar
uma ameaça ao capitalismo.
O ascenso do movimento operário e popular, cujas
mobilizações, impulsionadas pela luta em defesa das reformas de base, vinham
crescendo rapidamente desde o início da década de 1960, era o que realmente
constituía o centro das preocupações da burguesia e do imperialismo ianque.
As
grandiosas manifestações de massas em defesa das reformas eram utilizadas por
João Goulart muito mais para chantagear os setores reacionários da burguesia e
o imperialismo, exigindo que estes fizessem a opção entre o projeto burguês
nacionalista das reformas ou a revolução social e o comunismo.
A essa
chantagem, os setores conservadores da burguesia nacional, com o apoio da
igreja católica e do imperialismo ianque, responderam com a reacionária Marcha
da Família com Deus pela Liberdade (que os neonazistas pretendem reeditar
agora) e com golpe contrarrevolucionário de 31 de Março, como uma ação
preventiva diante do crescimento do movimento das massas operárias e
camponesas, que se manifestava em inúmeras greves e embriões de duplo poder,
como as Ligas Camponesas no Nordeste.
Na verdade, as “reformas de base” nunca sairiam do “papel”,
ou seja, do plano das intenções nacionalistas da impotente burguesia
brasileira. Historicamente, estas reformas capitalistas constituem tarefas de
uma revolução democrático-burguesa e, portanto, já não podem ser mais
realizadas pela burguesia, que se tornou uma classe reacionária na atual etapa
de hegemonia do capital financeiro. Na fase histórica do capitalismo
monopolista em sua égide imperialista, essas tarefas só podem ser realizadas
por um poder revolucionário, como parte da revolução proletária e da construção
do socialismo.
O governo Goulart e dos setores nacionalistas da burguesia eram
politicamente incapazes de levar adiante o seu próprio projeto reformista, o
que ficou confirmado quando o governo não organizou qualquer resistência contra
os golpistas, ao contrário, demoveu toda a resistência militar ao golpe,
deixando isolados todos que pretendiam organizar a luta armada.
Por sua vez, os
stalinistas do PCB, que tinham o controle de parte do movimento operário, não
desejavam a revolução socialista e a Ditadura do Proletariado, “preferindo”
fazer das reformas nacionalistas do governo Jango e da política de colaboração
de classes, os fundamentos de seu programa, preparando assim o caminho para a
derrota sangrenta do proletariado.
O governo Jango oscilava entre seguir os planos econômicos
anti-inflacionários do FMI, que causavam recessão e desemprego e torpes medidas
reformistas (extremamente radicais, se comparadas à política pró-imperialista
dos governos Lula/Dilma).
Ao mesmo tempo, Jango alimentava ilusões de que
realizaria mudanças mais profundas no futuro, flertava com os Estados operários
(China) e com o bloco dos países não-alinhados. Após o susto da Revolução
Cubana, os EUA não queriam permitir que o principal país de seu pátio traseiro,
o Brasil, corresse o risco de fugir do seu controle e fazer descarrilar toda a
América Latina em meio à guerra fria com a URSS. Esta política “centrista”
frustrou o movimento de massas e gerou desconfiança por parte do imperialismo e
dos setores mais reacionários das classes dominantes. O golpe orientado pela
Casa Branca buscava impor a hegemonia política, militar e econômica sobre o
Brasil.
O regime militar atacou importantes conquistas da luta dos
trabalhadores: revogou a nacionalização das refinarias de petróleo, as
desapropriações de terras, e anulou a estabilidade no emprego, substituindo-a
pelo FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço). Fechou várias indústrias
estratégicas, entre elas a FNM (Fábrica Nacional de Motores). No período de 1957/60
havia no Brasil cerca de 1,2 mil fabricantes brasileiros de autopeças, eles
foram dizimados neste processo, e para vender suas mercadorias foram obrigados
a associar-se às multinacionais. O mesmo aconteceu em outras áreas vitais, como
o setor farmacêutico, que foi devorado pelos grandes laboratórios
imperialistas. Até o magnata da mídia tupiniquim, Assis Chateaubriand, dono dos
Diários Associados e da TV Tupi, foi desbancado e substituído por uma
corporação associada ao grupo Time-Life, dando origem à Rede Globo.
A perda de fôlego do ciclo econômico proporcionado pelo
nacionalismo, a quebra do pacto oligárquico, a impossibilidade da emulação
estatal para a burguesia, a falência e ineficiência do movimento operário
atrelado ao Estado, foram as causas do descontentamento dos grandes
capitalistas no país. Ao mesmo tempo, no calor da vitoriosa Revolução Cubana, o
imperialismo partiu à ofensiva na América Latina para evitar a expansão da
mesma pelo continente. Na década de 60, sob o patrocínio da CIA foi aberto um
ciclo de golpes e regimes gorilas na América Latina.
Nesta conjuntura, o jovem
proletariado brasileiro começa a dar seus primeiros passos contra a situação de
penúria em que se encontrava devido à falência do projeto
nacional-desenvolvimentista levado a cabo por João Goulart. Greves e
manifestações pipocam por todo o país sem, entretanto, uma direção
revolucionária, uma vez que os stalinistas do PCB – que controlavam os
principais sindicatos e ligas camponesas – estavam completamente integrados à
legalidade do regime político, extasiados com o democratismo burguês.
Em
decorrência da crise do nacionalismo, que advinha desde o governo JK, a
burguesia associada ao capital financeiro internacional passa a exigir o fim do
modelo econômico, enquanto o latifúndio via-se ameaçado pelas mobilizações
populares. Desmoronava, assim, o castelo de cartas do pacto populista que vigia
desde a época de Vargas. Uma greve em São Paulo (6/10/1963) que mobilizaria
cerca de 700 mil trabalhadores deu o pontapé inicial para tantas outras que se
estenderiam até mesmo após o golpe, fugindo ao controle dos pelegos. No dia 13
de março de 64, o Comício da Central do Brasil, no Rio de Janeiro, foi o
pretexto dos militares para derrubar Jango poucos dias depois.
O golpe veio para
ceifar as lideranças do movimento operário e atuar como profilaxia à
perspectiva de revolução social no país: intervenção nos sindicatos, proibição
do direito de greve e implantação do terrorismo de Estado para reprimir,
prender, torturar e assassinar dirigentes de esquerda. O imperialismo, para
impor à força seu modelo colonial de economia e acumulação de capitais, exigia
estabilidade do regime e, em consequência, a eliminação da vanguarda militante
a qual viria a se recompor no final da década de 70 com as greves operárias do
ABC.
O golpe militar não irrompeu na conjuntura para interromper
simplesmente um “ciclo” democrático da história política do país. A mudança do
regime político em 64 foi uma necessidade do “ciclo” da acumulação capitalista
em um país que atravessava um ritmo acelerado de associação ao capital
imperialista, particularmente ao norte-americano.
O governo João Goulart,
identificado com o velho “nacionalismo” getulista, estava claramente tensionado
por uma vertente um pouco mais à esquerda do nacionalismo burguês
latino-americano, onde ocupava um papel decisivo a figura do cunhado Leonel Brizola, que começava a
estabelecer as primeiras relações com a social democracia europeia. Neste sentido,
a fase de rápida industrialização, subordinada aos investimentos ianques no
Brasil, entrava em flagrante contradição com um regime de corte “protecionista”
de setores da burguesia nacional.
Em um período de grande polarização mundial,
onde a classe operária portava uma forte referência ideológica na antiga URSS,
a alternativa da emergente burguesia industrial era a instauração de um regime
político de “poucas liberdades” para o proletariado e que potenciasse o
processo de acumulação capitalista que levou o país ao “milagre” do patamar de
oitava economia mundial.
Semear falsas ilusões de que este regime democratizante,
seja qual for a tonalidade de sua gerência política, possa fazer um resgate
histórico dos combatentes socialistas que morreram lutando contra a dominação
capitalista em nosso país é uma trágica armadilha que serve para embotar a
consciência das novas gerações de lutadores, ou no pior dos casos, um
“trambique” para amealhar algum trocado no balcão de negócios das indenizações
pagas pelo Estado burguês às vítimas da ditadura.
Por sinal, não só os velhos
reformistas entraram de cabeça no “negócio” das indenizações. Exigir que a
classe capitalista e seu Estado “pague” pelas consequências dos atos
espontâneos de heroísmo da causa socialista corresponde à pior maculação da
memória revolucionária de nossos combatentes.
Desgraçadamente, viúvas e
herdeiros biológicos de nomes honrados como Mariguella e Lamarca vêm caindo
nesta prática cretina que denigre a escolha abnegada de cada combatente
socialista pela causa da revolução.
A verdadeira punição aos torturadores e
seus “patronos” capitalistas não poderá ser efetivada por nenhum governo
“democrático” no marco de um Estado burguês, pelo simples fato de que a
burguesia jamais se “autopunirá” de seus monstruosos crimes históricos.
Somente
a revolução socialista será capaz de “vingar” nossos heróis e combatentes
mortos e torturados por um regime militar posto a serviço das grandes
multinacionais imperialistas.
A única “reparação” possível, para os Marxistas Revolucionários, é enterrar
definitivamente da história da humanidade todo e qualquer regime que venha
“cultuar” a exploração da classe operária por um punhado de parasitas,
protegidos pelas armas de seu estado capitalista.
Sob o manto frio e escuro da democracia burguesa são
escondidos os torturadores de ontem e de hoje. Em outras palavras, a
perseguição, prisão, tortura e assassinato são por essência os instrumentos do
Estado capitalista para impedir que a classe operária se insurja contra o
establishment.
O principal objetivo do golpe foi dobrar a resistência dos
trabalhadores para permitir uma reorientação da concentração das riquezas do
país em favor do imperialismo ianque e de seus representantes aqui instalados.
É importante destacar que os principais setores capitalistas beneficiados com a
ditadura militar (banqueiros, latifúndio, burguesia exportadora, Rede Globo)
são os chamados "golpistas" de ontem e de hoje.
Somente a construção
de um partido revolucionário do proletariado, que para os marxistas do nosso
tempo é a IV Internacional reconstruída, será capaz de impulsionar a evolução
da consciência dos trabalhadores para vingar a opressão e a exploração sofridas
pelas gerações de lutadores abatida e desorganizada pela ditadura militar.
Quando se completam os 59 anos do golpe militar no Brasil e
tirando as lições da ofensiva contrarrevolucionária vitoriosa a partir de 31 de
março de 1964, a LBI denuncia política do governo Lula, chamando a oposição revolucionária a gerência Petucana, que mantém no seu governo os herdeiros civis e de farsa da ditadura militar.