Hoje, mais uma morte trágica, a do jornalista âncora do
grupo Bandeirantes, Ricardo Boechat, vítima de um acidente de helicóptero na
cidade de São Paulo. A aeronave era uma sucata, fabricada em 1975, como
certamente denunciaria o próprio jornalista, sempre ácido em suas análises. O
helicóptero era do hangar Sales, no Campo de Marte, na Zona Norte da capital
paulista, que ficou destelhado após um vendaval nas últimas semanas, ou seja,
deveria estar avariado para vôos porém mesmo assim levou o jornalista para uma
palestra empresarial do ramo farmacêutico em Campinas, quando uma pane o derrubou na altura do Rodoanel. Além disso não tinha permissão para fazer o serviço de taxi aéreo. O piloto
do helicóptero enfrentava problemas na condução da aeronave e escolheu o ponto
com o menor fluxo de veículos, que era a alça de acesso para quem saia do
rodoanel para se dirigir à rodovia quando se chocou com um caminhão. Boechat e
o piloto são vítimas da sede do lucro do capital que despreza a vida humana,
como em Brumadinho e na morte dos atletas de base do Flamengo. O jornalista,
entretanto, não era em vida uma vítima do sistema capitalista, ao contrário.
Profissional renomado, militou na juventude no PCB por influência direta do
pai, diplomata, professor e assessor da Petrobras na década de 60, que foi preso duas vezes pela ditadura. O que mudou de fato os caminhos de
Boechat foi o trabalho na grande imprensa, distanciando-se do PCB quando entrou
no ramo jornalístico, enquadrando-se em nome de fazer carreira na mídia
burguesa. A carreira começou no extinto jornal Diário de Notícias, aos 17 anos.
À época, Boechat já tinha parado de estudar e havia batido à porta da família
para vender livros, ofício que era, então, exercido pelos pais (“Meu pai se
tornou o maior vendedor da Enciclopédia Barsa no Brasil”, conta). Depois de um
ano e meio no Diário, Boechat se viu trabalhando ao lado do inventor do
colunismo social carioca, Ibrahim Sued. “Ele era um jornalista selvagem, um
animal selvagem. Ibrahim era um mau patrão e, ao modo dele, um magnífico
professor: utilizava como instrumento pedagógico o porrete, no tempo em que
chefes davam esporro em jovens na redação e isso não era visto como bullying,
assédio nem nada parecido.” Foram 14 anos ao lado de Sued; durante os nove
primeiros, Boechat não tirou férias por medo de ser demitido. Ainda assim, ele
conta que há duas pessoas por quem tem “uma gratidão filha da puta na vida, a
dona Mirtes e o Ibrahim”. Quando tinha 33 anos, em 1983, Boechat deixou o
mentor e partiu para o jornal O Globo. Completamente “entrosado” na
classe dominante, em 1987, ocupou por seis meses a secretaria de Comunicação
Social no governo do canalha Moreira Franco (PMDB), o ultra-corrupto "gato angorá", ministro tanto de Dilma
como de Temer encarregado de privatizar os aeroportos e a Eletrobras. Após o
período voltou para O Globo. Em junho de 2001, Boechat foi demitido pela mesma
família Marinho, por um grampo vazado na Veja em que ele é mostrado como
“partidário” a uma das alas de uma disputa empresarial de R$ 2 bi – Daniel
Dantas x Nelson Tanure – nas privatizações da Telemig e da Telenorte. Ele
esteve presente nos principais jornais do país, como O Globo, O Dia, O Estado
de S. Paulo e Jornal do Brasil. Foi também diretor de jornalismo na Band,
trabalhou como âncora em diversos jornais do grupo. Ganhador de três prêmios
Esso, Boechat teve uma coluna semanal na revista ISTOÉ. Teve trajetória servil
aos grandes grupos de comunicação apesar de sua performática "rebeldia". Apesar de ter ares “progressistas” e de seus
comentários ácidos contra os aspectos mais reacionários da ordem capitalista,
atacava diariamente no rádio e TV as greves dos servidores públicos e as
ocupações do MST e MTST, chamando seus militantes de “vagabundos e desocupados”.
Apoiador declarado do juiz Moro e da Operação Lava Jato, era defensor da prisão
de Lula, fazendo eco com a campanha de criminalização da esquerda. Nos últimos
dias saiu publicamente em defesa da aprovação da reforma ultra-neoliberal da
previdência. Definitivamente, Ricardo Boechat não é um dos nossos mortos, não merece
as lágrimas e a dor dos lutadores sociais, militantes que tantas vezes exigiu
“no ar” que polícia prendesse e reprimisse, usando como pretexto “desobstruir
as vias públicas ocupadas por vândalos em meio a protestos populares”. Apesar dessas posições direitistas, grande
parte da “esquerda” burguesa e domesticada o admirava pelo vigor de algumas denuncias que ele fazia contra o cerceamento a direitos democráticos, como o aborto. Os Marxistas
Revolucionários, ao contrário, sempre advertiram que era um adversário inteligente e sagaz dos
trabalhadores, jamais um aliado de nossa classe!