sexta-feira, 31 de maio de 2019

10 ANOS DA MORTE DE GUILLERMO LORA (1922 - 2009): NOSSA HOMENAGEM AO HISTÓRICO DIRIGENTE TROTSKISTA BOLIVIANO NÃO ESCAMOTEIA AS PROFUNDAS DIFERENÇAS COM O REVISIONISMO DO POR


O Jornal Luta Operária nº179 (Maio/2009) publicou o obituário de G. Lora resgatando nossa intensa luta política como Marxistas Revolucionários com as várias vertentes educadas por sua tradição teórica na Bolívia, Brasil e Argentina. Reproduzimos abaixo esse texto histórico quando se completam os 10 anos de sua morte.

Guillermo Lora, dirigente histórico do Partido Operário Revolucionário boliviano faleceu no dia 17 de maio de 2009 com 87 anos em La Paz. Foi o personagem mais importante do século XX na Bolívia. Dedicou sua vida à militância política, desde a juventude, nos anos 40, quando levou o programa da IV Internacional ao proletariado mineiro. Autor das famosas Teses de Pulacayo, Lora fincou seu legado político na luta da classe operária do país. Foi um dos últimos velhos dirigentes trotskistas da geração de Cannon, Moreno, Mandel e Lambert a falecer. Não temos por objetivo neste obituário resgatar o conjunto das muitas e duras polêmicas que realizamos com Lora. Porque, longe de compartilhar da hipocrisia cristã de que "todo mundo fica bom quando morre" continuaremos a polemizar com o lorismo sempre que a luta em defesa do trotskismo ortodoxo fizer necessário. Mas o que buscamos resgatar neste momento é exatamente nossa intensa luta política como marxistas revolucionários por intervir sobre a vanguarda boliviana que se reivindica trotskista e que tem em Lora sua maior expressão, e também sobre as várias vertentes educadas por sua tradição teórica na Bolívia, Brasil e Argentina.


BOLÍVIA

Logo ao nascer, em maio de 1995 a LBI, através do Coordenador Geral do DCE da UECE, Marco Antônio Queiroz, foi convidada por Juan Pablo Bacherer para participar de seu tribunal moral internacional presidido por Estaban Volkov (neto de Trotsky). Por duas décadas Bacherer havia sido o segundo homem na hierarquia do POR boliviano e foi expulso por Lora sob graves acusações morais. Após a expulsão, Juan Pablo fundou a Oposição Trotskista ao POR. O objetivo do tribunal não era fazer um julgamento das posições políticas defendidas pelo POR, nem tampouco por J. P. Bacherer, uma tarefa que só poderia ser resolvida pelo desenvolvimento da luta de classes, mas elucidar as graves acusações morais lançadas contra um militante trotskista de ilibada trajetória revolucionária. Todavia a LBI não fez parte do Tribunal porque sua participação foi vetada com o aprofundamento das relações entre Bacherer e o Partido Obrero argentino, corrente de Jorge Altamira com a qual acabávamos de romper. Criticamos duramente a aproximação de Bacherer com o PO que comungava dos mesmos desvios do POR (defesa da etapista Frente Única Antiimperialista, antidefensismo, nacional trotskismo,...). Tanto o partido de Altamira como o de Lora carregavam a herança revisionista da corrente internacional de Lambert da qual haviam saído e que tinha, por exemplo, dado a orientação contra-revolucionária ao POR em 1952 de apoiar a ala esquerda do burguês MNR ao contrário de organizar a tomada do poder pelos mineiros armados. Depois da separação da TQI, tendência internacional dirigida pelo PO e pelo POR até 1985, a exceção da LBI, as dissidências de cada um destes dois partidos acabaram se ligando ao outro, trocando, programaticamente, "seis por meia dúzia". Por exemplo, fazendo o caminho inverso ao de Bacherer, o POR argentino é uma ruptura do PO que se ligou a Lora, assim como a TPOR brasileira originou-se a partir de ex-militantes da altamirista Causa Operária que passam a corrente de Lora.

Pouco tempo depois, Bacherer veio a falecer, vítima de uma embolia cerebral, não podendo confirmar o quanto foram corretas nossas críticas ao curso oportunista do altamirismo no qual a Oposição Trotskista embarcou, cuja maior expressão foi o chamado do PO argentino a "votar em Evo Morales e no MAS" (El Obrero Internacional Nº4, 12/2005) recorrendo à velha tática etapista da Frente Única Antiimperialista. Uma escandalosa capitulação diante do fato de que Evo e o MAS credenciaram-se junto ao grande capital para gerir a crise do regime semi-colonial no altiplano com uma política de contenção burguesa das rebeliões populares que sacudiram o país no início do século XXI, política contra-revolucionária que acabou por promover um giro à direita na convulsiva situação política do país em favor do fascismo-separatista e da chantagem imperialista sobre a Bolívia.

ARGENTINA

Em 1998, foi a vez do POR argentino, dirigido por Fernando Armas, romper com Lora e abrir uma jornada de discussões programáticas com a LBI, movimento que resultou na preparação conjunta entre a LBI e o POR argentino das Jornadas de Debates Internacionais pela reconstrução da IV Internacional. Mas antes das Jornadas, que tiveram a participação da LRP estadunidense e do PST colombiano, se realizarem, o POR acabou por auto-excluir-se das mesmas condicionando sua participação nas Jornadas à participação de um "grupo" oportunista e frente populista, a "Fração Trotskista", formado por um só indivíduo que havia rompido com a TPOR brasileira e hoje, apesar de não mais existir é apresentado pela revisionista LOI-DO argentina como sua seção no Brasil.

Apesar da inflexão temporária à esquerda que o POR havia realizado a partir de uma profunda luta programática travada pela LBI, que fez com que o partido argentino se aproximasse de nossas posições no campo do defensismo revolucionário, da questão nacional, da concepção leninista de partido e da estratégia da revolução proletária, o POR revelou sua incapacidade de combater a política de frente popular em suas próprias fileiras. A partir deste entrave retrocedeu de toda evolução programática que havia realizado desde sua ruptura com o lorismo. Não por acaso Trotsky insistia: "No momento atual, a questão das questões é a frente popular. Os centristas de esquerda procuram apresentar esta questão como uma manobra tática ou até técnica, para poder melhor vender sua mercadoria na sombra da frente popular. Na realidade, a frente popular É A QUESTÃO PRINCIPAL DA ESTRATÉGIA PROLETÁRIA desta época. Também oferece o melhor critério para distinguir entre o bolchevismo e o menchevismo" ("Carta ao RSAP holandês", julho/1936; grifo no original). Novamente a luta de classes dá razão às nossas críticas a Armas quando diante do levante popular argentino de dezembro de 2001, o POR defende "uma frente que unifique todos que lutam", ou seja, uma frente policassista com maoístas, com a burocracia sindical peronista, etc. A partir de então o POR vem assumindo posições cada vez mais oportunistas na luta de classes. O "obituário crítico ao velho revolucionário boliviano" (site do POR-Masas argentino) escrito por Fernando Armas sobre o falecimento de Lora é carente de qualquer conteúdo programático, mas carregado de ressentimentos políticos e pessoais, sendo a expressão mais recente da falência da corrente argentina.

BRASIL

No Brasil, toda e qualquer simpatia da base militante do TPOR pelas posições políticas e programáticas da LBI foram burocraticamente cerceadas por Lora e pela direção da TPOR que lançou mão do artifício de criar uma cortina de fumaça sobre as duras polêmicas que fizemos com o lorismo acerca da Revolução Boliviana de 1952, Frente Revolucionária Antiimperialista, contra-revolução na URSS, concepção de partido, apoio à greve de polícias e etc. no folheto "Trotskismo versus Revisionismo - Polêmica da LBI com o POR boliviano e a TPOR brasileira". Neste folheto, feito a partir de uma coletânea de artigos publicados no Jornal Luta Operária, fizemos questão de oferecer ao leitor de forma franca e honesta o conjunto das posições do debate. Publicando na íntegra vários artigos feitos por Lora e pela TPOR contra nossa corrente. Para cercear o debate franco e aberto a TPOR passou a proibir com argumentos morais a sua própria militância mais nova e da base de ter qualquer contato com a LBI, de comprar nossos jornais e publicações de nossa corrente, algo tão absurdo que lembra o artigo 13 do estatuto do PCB de 1945 que proibia aos militantes do Partido "qualquer contato direto ou indireto com trotskistas ou outros inimigos da classe operária".

Apesar desta metodologia completamente oposta ao trotskismo realizamos um chamado a TPOR para a realização de um Primeiro de Maio classista e independente dos patrões, do Estado, dos burocratas pelegos, da frente popular e da Igreja Católica em 2009 em São Paulo, ato político que construímos com o POM, outra cisão da TPOR. Mas ao nosso chamado a TPOR nem atendeu nem respondeu. Neste momento, realizamos plenárias comuns pela construção de uma oposição classista no SINDIUTE, sindicato dos professores do Ceará travando ao mesmo tempo o debate acerca de nossas diferenças políticas e programáticas.

Em 2002, a LBI tomou contato com a Corrente Revolucionária, formada a partir de uma ruptura com a TPOR de militantes docentes do Rio Grande do Norte. Naquele mesmo ano, a LBI convocou em conjunto com a CR a "Iª Plenária Internacional de Organizações e Coletivos Classistas e Revolucionários em Defesa de um Programa Marxista Contra o Imperialismo e a Frente Popular". A CR se dissolveu porque radicalizou os desvios ultra-sindicalistas do lorismo, renunciando à construção do partido revolucionário em favor de uma política trade-unista.

Apesar de nossas profundas divergências políticas com Lora, acreditamos que a melhor homenagem que prestamos a sua militância de toda vida dedicada à causa do operariado é dar continuidade com tenacidade à construção do partido mundial da revolução socialista contra as ilusões burguesas e frente populistas como o governo Evo Morales, inimigo da revolução e da ditadura proletárias e atual títere centro-esquerdista do imperialismo na Bolívia. Neste momento, de perda para todos os que acreditam nos ensinamentos do Secretário Geral do POR boliviano e para seus entes queridos, a LBI dedica um abraço fraterno e revolucionário para todos os seguidores e familiares de Guillermo Lora.