Comemoramos 55 anos do Maio Francês em meio a revolta popular
contra o governo Macron e sua reforma neoliberal da Previdência. Não por acaso em 1º de Maio cerca
de 300 protestos em todas as localidades do país, milhões de trabalhadores
franceses foram lutar, passando por cima da esquerda reformista e da burocracia
sindical, para manifestar sua oposição de classe ao governo capitalista
neoliberal de Macron, um mero fantoche do imperialismo ianque e sua OTAN. Os
manifestantes mostraram bem claro que não se rendem as derrotas institucionais
e parlamentares, como a da reforma da aposentadoria, e já anunciam que o
caminho da vitória é a via da luta direta das massas para colocar abaixo o conjunto da "V República" burguesa.
A radicalidade da luta de
classes na França 55 anos após o Maio Francês demonstra o nível da consciência
de classe, ou seja enquanto, os trabalhadores não a levarem até o final sua
vitória, isto é, até a derrubada da ordem social capitalista, o combate das
massas proletárias não cessará. Este norte programático é obviamente totalmente
oposto ao das direções burocráticas e reformistas.
55 anos após o "Maio Francês", há um profundo
abismo político-ideológico entre a situação atual na França assim como em todo
o planeta e o ímpeto revolucionário da juventude em 68, que esteve intimamente
conectado com a ascensão do movimento operário que, desde o ano anterior, vinha
produzindo uma intensa onda de greves por toda a França, refletindo a
resistência da classe operária às medidas que atacavam os salários, geravam
desemprego e atentavam contra as conquistas sociais do proletariado, tais como
a previdência social e o direito de greve, política adotada pelo governo do
general Charles De Gaulle diante da crise decorrente do esgotamento da relativa
prosperidade econômica do breve período do pós-guerra, caracterizado pela
reorganização da indústria francesa destruída durante a guerra.
A fusão das
lutas estudantis com as greves espontâneas, com piquetes e ocupações de
fábricas, transformou a revolta estudantil numa insurreição de massas, levando
10 milhões de trabalhadores a se colocarem em greve em todo o país, rompendo
com a política de colaboração de classes das direções sindicais controladas
pelo stalinismo. As principais fábricas e os setores estratégicos da economia
foram colocados sob o controle operário através dos Comitês de Greve, que
organizavam a autodefesa dos manifestantes, controlavam a produção, preparavam
as barricadas e abasteciam de alimentos os operários das fábricas em greve.
Estabeleceu-se uma dualidade de poderes que colocou em xeque o domínio da
burguesia.
Desde o início, o movimento assumiu uma clara perspectiva
revolucionária, com manifestações que exigiam a derrubada do governo De Gaulle
e questionavam os valores e a moral da sociedade burguesa. A consciência
revolucionária, expressa nas manifestações da juventude francesa em 68,
refletia uma etapa de ascenso revolucionário mundial, marcada pela vitória da
Revolução Cubana em 1959, as greves operárias que sacudiam toda a Europa, a
descolonização da África e a bem sucedida ofensiva norte-vietnamita do TET,
prenúncio da derrota e expulsão do exército ianque do Vietnã.
O estado de espírito da juventude e dos trabalhadores no
Maio Francês era também excitado pela existência da URSS e dos Estados
operários do Leste europeu que, apesar da degeneração burocrática stalinista,
exerciam uma forte referência ideológica sobre o proletariado mundial. A
existência dos Estados operários significava que a burguesia havia sido
expropriada em quase 1/3 do planeta e, em conseqüência, os trabalhadores nessa
parte do mundo haviam realizado conquistas históricas jamais alcançadas pelo
proletariado em qualquer país capitalista. As conquistas sociais do
proletariado nos Estados operários (pleno emprego, habitação, saúde e educação
gratuitas, erradicação do analfabetismo, elevação do nível cultural das massas)
obrigavam a burguesia nos países capitalistas, temendo ser expropriada pela
revolução proletária, a fazer significativas concessões aos trabalhadores.
Já as manifestações atuais e as greves defensivas contra o
governo Macron ocorrem numa etapa de profundo retrocesso ideológico, aberta a
partir da queda dos Estados operários do Leste e da URSS. Apesar da magnitude e
radicalização das lutas, não há no horizonte ideológico dessa juventude nenhuma
perspectiva revolucionária.
Com o fim dos Estados operários, a burguesia dos países
imperialistas europeus sentiu as mãos livres para dar início ao desmonte do
chamado “estado de bem-estar social”, rebaixando as condições de trabalho e
padrão de vida da classe operária. Na França, esses ataques foram iniciados
ainda no governo da “esquerda pluralista” do Partido Comunista Francês (PCF) e
do Partido Socialista (PS), agora aprofundadas no governo de Macron.
As constantes manifestações da revolta de jovens imigrantes
demonstram que, carente de uma direção revolucionária, mais o movimento
operário tende a retroceder em seus objetivos e em suas formas de luta. A
ausência de uma referência ideológica revolucionária limita os objetivos da
revolta à luta contra o racismo e a violência promovida pelas tropas anti-motins
da polícia francesa.Também quanto aos métodos de luta fica claro o fosso entre
as manifestações do Maio de 68 e as lutas populares da contemporaneidade ,
caracterizadas por ações extremamente radicalizadas, porém, sem expressar
objetivos políticos claros. Esse é mais um reflexo do vazio ideológico que se
abriu a partir da destruição dos Estados operários e do revisionismo da quase
totalidade da esquerda mundial que se agarrou ferrenhamente à defesa da
democracia burguesa, fazendo o movimento operário retroceder às formas de luta
do princípio do capitalismo, como foi o movimento ludista do final do século
XVIII na Inglaterra, onde os operários destruíam as máquinas e as propriedades
dos capitalistas por não terem desenvolvido ainda organizações e formas de luta
mais evoluídas como os sindicatos e as greves, nem vislumbrarem a perspectiva
histórica da revolução proletária e do socialismo, que só surgiu com o
desenvolvimento da luta de classes e do marxismo a partir do século XIX.
O retrocesso ideológico que se manifesta na consciência dos
jovens insurretos na França, produto da completa rendição da esquerda
revisionista do marxismo e da ausência de uma verdadeira organização
revolucionária de combate, é um fenômeno equivalente ao crescimento da
influência do fundamentalismo islâmico.
Apesar das limitações políticas dessas lutas, a tarefa dos
revolucionários é solidarizar-se com os combatentes, lutando para ganhar a
influência das massas e dirigi-las com um programa revolucionário. Entretanto,
a “extrema” esquerda francesa, os pseudotrotskistas, assim como não se
colocaram no campo militar das organizações fundamentalistas que patrocinaram o
ataque de 11 de Setembro contra o Pentágono e os escritórios da CIA no WTC e se
negaram a defender a vitória militar do Talebam diante das tropas de ocupação
ianque no Afeganistão, também agora não se colocam ao lado dos jovens
insurretos e imigrantes, mantendo-se inertes diante da crise, apenas lamentando
os efeitos da política neoliberal, colaborando dessa forma para manter o atraso
do nível de consciência das massas. Sua bandeira agora é a defesa da democracia
burguesa diante do crescimento eleitoral da extrema-direita.
Ao contrário dessas correntes revisionistas, que se ajoelham
frente à propaganda da mídia imperialista da “guerra contra o terror”,
colocamo-nos inteiramente no campo dos jovens insurretos, esclarecendo que a
causa essencial da atual revolta dos jovens na França está na política de
privatizações de Macron, cortes nos gastos públicos e de flexibilização
do mercado de trabalho, promovendo o aumento do desemprego, que afeta
principalmente os jovens trabalhadores descendentes de imigrantes,
majoritariamente de origem árabe e que as provocações e o ódio racista
destilado pela direita xenófoba contra os imigrantes tem como
objetivo envenenar o proletariado francês de preconceitos para impedir sua
unidade de classe na luta contra a exploração capitalista.
É necessário, portanto, unificar a revoltas dos jovens
insurretos com as greves operárias, preparando uma poderosa greve geral do
proletariado francês para derrotar a política de arrocho e ataques neoliberais do governo Macron.
É
preciso fazer com que a radicalização das formas de luta reflita o vigor de um
programa revolucionário que aponte a destruição do capitalismo e a construção
do socialismo como único caminho para superar a crise.
Se a intensa onda revolucionária que sacudiu a França em
Maio de 68 não pôde conduzir à vitória da revolução proletária, abortada pela
política de traição das direções stalinistas, diante da ausência do partido da
vanguarda do proletariado, isso significa que hoje, 55 anos depois do “Maio
Francês”, numa etapa histórica de reação e retrocesso ideológico, é necessário
mais do que nunca que a vanguarda consciente do proletariado redobre seus
esforços para construir um autêntico partido revolucionário internacionalista
no país, único instrumento capaz de levar a classe operária a desfechar um golpe
mortal contra os capitalistas, com a destruição do Estado burguês imperialista,
abrindo caminho para uma nova etapa revolucionária mundial.