Em 11 de dezembro de 1910 nascia Noel Medeiros Rosa no
bairro de Vila Isabel, na Zona Norte carioca. Filho do comerciante Manuel
Medeiros Rosa e da professora Marta de Medeiros Rosa foi aluno do tradicional
Colégio São Bento. Muito cedo aprendeu a tocar violão e bandolim. Ele passou
rápido pela vida devido a uma tuberculosa causada pela boemia, mas deixou uma
extensa obra que redefiniu os rumos do samba no Rio de Janeiro e, por que não
dizer, da música popular brasileira. Primeiro compositor branco de classe média
a fazer parcerias com compositores negros que viviam nos morros ou bairros mais
pobres da cidade. Este é um aspecto revolucionário da trajetória artística de
Noel: a aproximação do intelectual, compositor e poeta boêmio com os sambistas populares.
Aos 13 anos aprendeu a tocar
bandolim de ouvido, com a mãe, fato marcante em sua vida, pois a partir daí,
percebera que a sua grande habilidade instrumental tornava-o importante diante
de outras pessoas. Do bandolim para o violão, foi um passo. Em 1925, dominava
completamente o instrumento, participando ativamente das serenatas do bairro.
Enquanto Noel ensaiava os primeiros acordes musicais, estava em voga a música
nordestina e os conjuntos sertanejos. O garoto logo se interessou pelas
canções, toadas e emboladas da época. Acompanhando a novidade, um grupo de
estudantes do Colégio Batista e mais alguns moradores do bairro de Vila Isabel
formaram um conjunto musical, denominado “Flor do Tempo”. Reformulado para
gravar em 1929, o grupo passou a se chamar “Bando de Tangarás”. Alguns de seus
componentes se tornariam mais tarde grandes expoentes de nossa música: João de
Barro, Almirante, e Noel, que já era um bom violonista. Ainda em 1929, compôs
as suas primeiras músicas. Dentre elas a embolada Minha viola e a toada Festa
no céu. Em 1930, conheceu seu primeiro grande sucesso “Com que roupa”,
apresentado em espetáculos do Cinema Eldorado. Já se podia notar sua veia
humorística e irônica, além da crônica da vida carioca, marcante em toda a sua
obra. "Meu paletó virou estopa/ E eu pergunto com que roupa/ Com que roupa
eu vou/ Ao samba que você me convidou?" Este samba, “Com que roupa?”, o
primeiro sucesso de Noel Rosa (1910-1937), foi composto em 1929, gravado em
1930 e estourou no carnaval de 1931. Reza a lenda que Noel fez essa letra após
uma briga com a própria mãe. Ele queria sair e, ela, para impedir, escondeu
suas roupas. Surgiu assim a pergunta “com que roupa eu vou?”, que batizaria a
canção. O sucesso de “Com que roupa?” foi decisivo para o samba nascido no
morro ser adotado pela classe média e fazer sucesso nas rádios, o maior veículo
de comunicação da época. Essa aceitação acabaria sendo decisiva não apenas no
futuro do samba, mas principalmente na história da Música Popular Brasileira. E
a nata da MPB reverenciaria o autor desse clássico. “Com que roupa” foi
gravada, entre outros, por Elza Soares, Martinho da Vila, Gilberto Gil, Caetano
Veloso e Zeca Pagodinho. Quando fez o samba “Com que roupa?”, Noel integrava o
Bando de Tangarás, fundado em 1929 com Almirante, João de Barro, Henrique Brito
e Alvinho. Em 1931 ainda compunha músicas sertanejas como Mardade de cabocla e
Sinhá Ritinha, optando depois definitivamente pelo samba. Em apenas 8 anos de
atividade compôs 259 músicas e teve mais de 50 parceiros. Em 1931 entrou para a
faculdade de Medicina, sem, no entanto, abandonar o violão e a boemia. O samba
falou mais alto pois largou o curso meses depois. “Seu garçom faça o favor de
me trazer depressa, uma boa média que não seja requentada, um pão bem quente
com manteiga à beça, um guardanapo e um copo d’água bem gelada”. Com estes
versos, Noel Rosa começa um dos seus sambas mais sensacionais, que faz a
crônica de um botequim carioca dos anos de 1930. O samba, com melodia de
Vadico, foi lançado em disco pela Odeon e logo fez sucesso nos programas de
rádio. Cantado como se fosse um papo do cotidiano, o samba traça um retrato do
Rio de Janeiro e de alguns de seus tipos, como o garçom e o freguês folgado,
que faz do boteco a sua casa. A partir de 1933 travou a famosa polêmica musical
com o compositor Wilson Batista.
Nesse mesmo ano conheceu sua futura esposa, Lindaura, que quase lhe deu um filho: ao cair de uma goiabeira no quintal de sua casa, Lindaura perdeu o bebê. Apesar de fortes problemas pulmonares, Noel não largava a bebida e, com bom humor e ironia, formulou uma teoria a respeito do consumo de cerveja gelada. Segundo ele, a temperatura fria da cerveja acabava paralisando os micróbios, livrando-o da tosse. Com isso, ia ludibriando os amigos e a si mesmo. Por essa ocasião Noel precisou transferir-se para Belo Horizonte devido à lesão pulmonar que o acometera subitamente. A capital mineira tornara-se o local ideal para o tratamento prolongado. Lá não havia bares, nem botequins ou as estações de rádio que Noel frequentava tanto. A viagem à capital mineira surtiu efeito temporariamente; Noel havia engordado 5 quilos e apresentava sinais de melhora. Entretanto, a boemia falou mais alto. Não tardaria muito para que o compositor descobrisse os segredos da vida noturna da capital mineira, entregando-se novamente às cantorias e bebedeiras. Noel e a esposa estavam instalados na casa de tios que, ao descobrirem as saídas noturnas às escondidas de Noel, mandaram o casal de volta ao Rio. Nos últimos meses de 1936, Noel não mais saía, preferindo evitar as pessoas, sobretudo as que o questionavam sobre o seu estado de saúde. A única pessoa que o poeta visitava era o sambista e compositor Cartola, lá no morro. No início de 1937, numa outra tentativa de recuperação, Noel e Lindaura rumaram para Nova Friburgo, em busca do ar puro da montanha. Em vão, pois Noel se deprimia, sentindo falta da Vila Isabel. Ao voltar para o Rio, a doença já havia o tomado por inteiro; sentia-se fraco, melancólico, apático. Alguns amigos sugeriram-lhe que passasse uns tempos na tranquila cidade de Piraí (RJ).
Na noite de 4 de
maio deste mesmo ano, nos braços de Lindaura, em seu quarto no chalé, Noel veio
a falecer aos 26 anos de idade deixado saudades para os admiradores do samba e
de sua simbiose com as vozes populares do morro. Uma tuberculose levou à morte
o magistral Poeta da Vila...