Os números da apuração na eleição presidencial argentina foram divulgados no final da noite deste domingo (27/10). Com mais de 80% dos votos apurados, Alberto Fernández tem 47,4 % (Frente Para a Vitória com Cristina Kirchner como vice-presidente) e o ultra neoliberal Mauricio Macri obteve 41,2 % (Cambiemos). Pelas regras eleitorais vigentes no país, o primeiro colocado será eleito em primeiro turno se tiver 45% dos votos ou, então, 40%, desde que tenha 10 pontos percentuais a mais que o segundo colocado. Neste caso a eleição já se definiu logo neste primeiro turno, impondo o retorno do Peronismo, versão Kirchnerista, a Casa Rosada, após uma retumbante derrota nas eleições presidenciais de 2015. Em terceira colocação vem Roberto Lavagna (cerca de 6,5%), um candidato da centro direita e por fim em quarta posição ficou Nicolas Del Cano, representante da FIT(U), uma composição de várias correntes revisionistas do Trotskismo (PTS, PO, IS, MST e PSTU), que conseguiu a marca de 2,1%, seu pior resultado desde a formação da Frente em 2011, quando conquistou 2,3% dos votos ou em 2019 cravando 3,2% do cômputo geral. Fernández nunca concorreu a um cargo majoritário, ele é um dirigente peronista conservador que esteve presente nos governos Kirchner como um neoliberal ministro de Estado, e foi escolhido pela ex-presidente Cristina Kirchner para encabeçar sua chapa como forma de agradar o “Mercado” e demonstrar “boa vontade” com o imperialismo ianque, que maneja as operações de “Lawfare” em todo continente latino-americano.
Como já tínhamos apontado em artigos anteriores, após a
realização das eleições primárias (PASO), a burguesia argentina buscava alterar
seu “modelo econômico” em função do desastre nacional provocado pela política
do governo Macri. Se o “ajuste” ultra neoliberal foi útil para recompor as
finanças públicas, sob a ótica do rentismo é claro, em uma etapa mundial onde a
“bolha de crédito” não mais pairava sobre os céus do Mercosul, agora já estava
na hora de descartar Macri, e recompor a posição do “Pacto Social” tão familiar
da história peronista. Alberto&Cristina assumem a tarefa de evitar uma
explosão social, à semelhança do que ocorre hoje no Chile, mantendo a
continuidade da política neoliberal com “retoques sociais” e clamando por uma
trégua ao movimento operário. Para se ter uma pequena dimensão do tamanho da
crise econômica que assola o país basta lembrar que a Argentina está sob
emergência alimentar desde setembro, quando o Congresso aprovou um projeto de
lei que permite alocação de mais recursos aos programas sociais do governo. A
moeda argentina desvalorizou 70% desde janeiro de 2018, e nos dias que
antecedem as eleições, os mercados estão reaquecendo a taxa de câmbio que já
excede 63 pesos por dólar. Neste quadro não foi à toa que durante a campanha, e
já com a vitória praticamente assegurada, Fernández propôs uma “trégua social”
de 180 dias para sindicatos operários e movimentos sociais para tentar
“descolar a indústria e assim o país retomar o crescimento econômico”, uma
ficção neoliberal tomada de empréstimo do macrismo.
Mesmo diante da profundidade da crise capitalista, o que
exigiria de qualquer organização revolucionária a adoção de uma energética
plataforma de ação direta das massas, a FIT ingressou no processo eleitoral com
o único objetivo estratégico de eleger mais deputados nacionais. Para isso
abriu suas portas para a entrada da corrente mais oportunista da esquerda
revisionista argentina, o venal MST, rebaixando ainda mais o programa da FIT a
uma crítica do “modelo fundomonetarista”.
Para os dirigentes da FIT, agora adicionada de um “U”, a questão central
era derrotar nas eleições o “Regime do FMI”, vergonhosamente não afirmaram uma
única linha sobre a necessidade da derrocada do Estado Burguês, pela via da
revolução socialista, assumindo o norte programático da Ditadura do
Proletariado. Para a FIT(U), tudo se resumia ao objetivo central de eleger uma
bancada de vinte ou no mínimo dez deputados nacionais, para “combater o FMI” no
Congresso, isto sem falar que neste mesmo parlamento votaram recentemente o
próprio projeto do FMI de “Emergência Alimentar”. Seria até cansativo repetir
aos nossos leitores que a FIT(U) rejeitava energicamente a consigna do “Abaixo
Macri”, considerada um delírio esquerdista para as lideranças do PTS e PO que
sonhavam com a aprovação das reformas institucionais. Porém o sonho dos
reformistas da FIT(U) virou um “pesadelo”, ao não conseguirem eleger sequer um
único parlamentar no Congresso Nacional, apesar de na reta final da campanha
terem lançado mão até do “corte de boleta”, um chamado velado para sufragar
Fernández&Cristina, mantendo o voto nos candidatos a deputado do PTS e PO.
Sem passar na prova elementar da luta de classes, assumindo um cretinismo
parlamentar que em nada deve a criminosa política stalinista, a FIT(U) deve se
esfacelar muito em breve, tal qual já ocorreu no seio do PO. A vanguarda da
classe operária argentina, deve abstrair as ácidas lições programáticas da
crise capitalista que desmoraliza todas as forças políticas que apregoam as
“reformas” como alternativa ao caos do modo de produção baseado na acumulação
privada de capital.