43 ANOS DA “CHACINA DA LAPA”: NA LUTA CONTRA O “BOZOFASCISTA”,
HONRAR A MEMÓRIA DOS MILITANTES DA ESQUERDA COMUNISTA QUE TOMBARAM NA
RESISTÊNCIA REVOLUCIONÁRIA CONTRA A DITADURA MILITAR!
Há exatos 43 anos atrás, em 16 de dezembro de 1976, ocorria
a “Chacina da Lapa”, quando a ditadura militar assassinou um parte do Comitê
Central do PCdoB. Seria uma reunião de grande relevância para os rumos
políticos do partido que ocorria neste trágico dia mas as conclusões
programáticas do encontro clandestino (o mais representativo realizado após o
encerramento das atividades da guerrilha do Araguaia) não puderam chegar ao fim
devido à brutal ação policial fascista do regime militar contra o que restava
no país da direção partido após a derrota sofrida na região norte do Brasil. No
centro da pauta do CC estava o debate acerca do balanço político da ação
militar guerrilheira do partido, realizada sob orientação ideológica do Partido
Comunista Chinês. Não por coincidência a fração stalinista dirigente que
defendia o “grande acerto” da tática Maoista encontrava-se “refugiada”
justamente em Pequim. A doutrina de Mao Tsé Tung consistia fundamentalmente de
forjar a luta armada no campo e a partir deste movimento impulsionar um
"bloco de classes" com a burguesia nacional anti-imperialista para a
tomada do poder estatal. A ausência na reunião de dirigentes que na época se
colocavam mais "fiéis" a linha do PC chinês ameaçava mudar os rumos
do partido, estamos falando fundamentalmente de João Amazonas e Renato Rabelo
(atual dirigente "cânone" do PCdoB), que juntos se recusavam a fazer
qualquer movimento de autocrítica em relação aos desastrosos resultados
políticos da guerrilha do Araguaia. Do outro lado geográfico e político estavam
Pedro Pomar e Angelo Arroyo, este último comandante e sobrevivente da guerrilha
e que vivenciou a morte do dirigente histórico Maurício Grabois no desigual
combate militar com as forças da repressão. Pomar já tinha manifestado para a
militância partidária que estava em seu entorno suas diferenças de avaliação
política com Amazonas, secretário geral de fato do partido, gerando um profundo
“mal-estar” no interior da direção stalinista que não tolerava dissidências
internas. Pomar teria sido chamado para uma viagem de “advertência” a Albânia,
até então alinhada com a China de Mao, não efetivada em função do grave estado
de saúde em que se encontrava sua companheira. Como permaneceu no Brasil, Pomar
resolveu levar adiante suas posições e dar a batalha de suas ideias no âmbito
do CC do partido. Iniciada a histórica reunião do PCdoB no dia 11 de dezembro,
na rua Pio XI do bairro da Lapa em São Paulo, terminaria sob o assalto covarde
das forças de repressão do regime, levando a morte de Pomar, Arroyo e Drummond,
outros cinco dirigentes foram presos e torturados (entre eles Haroldo Lima e
Aldo Arantes) e dois não foram presos. Jover Telles e José Novaes saíram da
“casa aparelho” em dupla e foram os únicos a escapar do cerco policial. Algum
tempo depois a direção do PCdoB imputaria a responsabilidade criminosa do
ataque terrorista ao partido na “conta” de Jover Telles denunciado como um
“infiltrado” no CC. Segundo esta versão, sustentada por Amazonas, Telles teria
sido capturado pelo DOPS dias antes da “Chacina” e negociado sua liberdade em
troca da delação do partido. Mas o estranho é que somente em 1983, no sexto
congresso do PCdoB, se “oficializaria” a expulsão definitiva do “traidor”, ou
seja, quase sete anos após os gravíssimos acontecimentos da Lapa. Seguindo a
trilha das “denúncias” de Amazonas contra seus opositores internos nos deparamos
com outra acusação, desta vez o alvo seria o líder camponês José Novaes, que ao
contrário de Telles e Wladimir Pomar (filho de Pedro e também preso na Lapa),
resolveu organizar uma dissidência no seio do PCdoB. Diante das circunstancias
criadas (e nunca totalmente esclarecidas) em torno da militância de Telles,
este decide abandonar a política, Wladimir toma o rumo da socialdemocracia
europeia ingressando "dissolvido" dos ideais comunistas no PT em
1980. Coube a Novaes, principal referência política da dissidência na vanguarda
de esquerda, reunir os outros companheiros do PCdoB que estavam em processo de
ruptura com o stalisnismo (Ozeas Duarte, Genoino Neto e Jorge Paiva), fundar
uma nova organização comunista, que viria a se tornar o PRC em 1984. Mas se não
foram os “camaleões” (alcunha pejorativa atribuída por Renato Rabelo aos
dissidentes do PCdoB) os delatores do aparelho da Lapa, a quem mais
interessaria a morte de Pedro Pomar e Arroyo? Quem teria de fato “vazado” para
os genocidas a informação da reunião que poderia ter mudado a linha Maoista do
PCdoB? Seria o Telles o delator ou o próprio Amazonas teria "cantado"
a reunião do partido para os facínoras do DOPS? No seio dos aparatos
burocráticos stalinistas tudo é possível, até tratar como "agentes do
imperialismo" gigantes revolucionários como foi Trotsky.
A primeira questão que deve ser respondida é porque somente
ao final da reunião do CC (que durou vários dias) a polícia da ditadura decidiu
agir, pondo em risco o próprio sucesso da operação criminosa. Registros do DOPS
revelaram que os agentes do regime militar sabiam da reunião no aparelho da
Lapa com pelo menos dez dias de antecedência, mas só intervieram após o CC do
PCdoB se inclinar, por uma pequena margem de maioria, na autocrítica da guerrilha
do Araguaia. Poderia Telles ter "sinalizado" para a repressão o
momento de intervir? Na incursão da casa da rua Pio XI, a policia militar
fuzilou sumariamente Pedro Pomar e Ângelo Arroyo, o jovem militante Drummond
morreu posteriormente em uma heróica tentativa de fuga na sede do próprio DOPS.
Os outros membros do CC foram presos e torturados, mas mantidos vivos. Com a
queda do CC, até então resistindo politicamente no Brasil, somente restou ao
PCdoB a direção instalada no exílio, e esta era completamente favorável à
desconsideração das resoluções programáticas aprovadas na Lapa naquele trágico
dezembro de 76. Amazonas logo reagrupou o “velho” Diógenes Arruda
(ex-tesoureiro e homem forte do Partidão), exilado em Portugal, e junto a
Dynéas Aguiar e Rabelo consolidou uma maioria alinhada com o PTA da Albânia,
dirigido por Enver Hodja. O expurgo tardio de Telles, fato não habitual no
mundo stalinista, leva a crer que Amazonas poderia ter "incentivado"
o delator e somente anos depois, já com uma situação estabilizada para ambos,
acusar a "traição de classe" do ex-camarada de direção partidária.
Com a chegada da “anistia” política ao país em 1979, a
direção nacional do PCdoB se reorganiza, sob as bases políticas da recém
ruptura do partido com o Maoismo (seguindo os passos do PTA albanês) agora
considerado como uma das principais vertentes do revisionismo, pondo fim à
defesa da guerrilha camponesa como "tática revolucionária" para o
país. Esta inflexão programática confunde os dissidentes da pseudomaioria
“Amazonista” que não conseguem se unificar, mesmo tendo ganho a última
conferência partidária. Neste período as suspeitas que recaiam sobre o próprio
Amazonas, pela delação da Lapa, se dissiparam em função da “quebra” política de
Telles e da própria criação da corrente estudantil “Caminhando” (embrião do
PRC), impulsionada nacionalmente por Genoino Neto e Adelmo Genro. O crescimento
organizativo da tendência “Caminhando” foi vertiginoso, a ponto de chegarem a
presidência da UNE na figura do baiano Ruy Cezar, recentemente falecido. Era a
“gota d'água” que faltava para o PCdoB incluir Genoino na lista de “traidores”,
ao lado de Novaes e Telles, só que neste caso a acusação de Amazonas se
relacionaria à guerrilha do Araguaia, onde o ex-presidente do DCE da UFC foi preso.
Com a ofensiva do PCdoB sobre os “camaleões”, o ex-militante do partido que
teria toda a autoridade moral para elucidar o verdadeiro festival de calúnias
stalinistas, seria Wladimir Pomar. Filho do grande quadro teórico Pedro Pomar,
assassinado na Chacina da Lapa, Wladimir esteve presente naquela reunião do CC,
também na condição de dirigente do partido. Mas o filho não tinha a mesma
estatura ideológica do pai Pedro, e optou por calar-se para o movimento
operário diante da intensa polêmica aberta no marco da esquerda comunista,
resumiu- se a escrever alguns livros sobre a vida do PCdoB. Wladimir seguiu o
“tranquilo” o curso de assessor “intelectual” da burocracia sindical Lulista, o
que lhe rendeu até pouco tempo atrás muitas vantagens financeiras (foi responsável
por intermediar negócios do governo Lula no âmbito do comércio exterior com a
China).
Os “Ziguezagues” programáticos do PCdoB ao longo de sua
história o descredenciaram totalmente perante a vanguarda revolucionária
mundial, como transitar da acusação de social imperialistas para China e Cuba e
hoje considerar estes países como “berço do socialismo”. O respeito e admiração
adquiridos com a morte heroica de seus militantes durante a Guerrilha do
Araguaia e nos anos de “chumbo” da ditadura viraram pó quando o partido
deliberou estabelecer as alianças políticas com oligarquias burguesas
conservadoras com Tancredo, Sarney. Sobreviventes da Chacina da Lapa, como
Haroldo Lima (ex-ANP) chegaram a defender a entrega do petróleo nacional para
as transnacionais imperialistas de energia e combustíveis. A plataforma
estratégica da “luta armada” dos anos 70 foi logo substituída pela apologia da
democracia burguesa como valor universal, levando o PCdoB para a vala comum da
socialdemocracia, disfarçada de “neodesenvolvimentista”. Mais recentemente, o
PCdoB anunciou a incorporação do PPL, um partido que foi um dos que empunharam
ao lado da direita, do MBL e de Bolsonaro o “Fora Dilma” nas marchas de 2015 e
2016. Juntou-se aos venais herdeiros do MR-8 que sempre prestaram seus serviços
sujos para a burguesia desde a chamada “redemocratização” renegando o passado
revolucionário da antiga organização da luta armada, passaram a ser capangas de
Quércia e Newton Cardoso contra a esquerda classista, nos últimos anos foram apêndices
do PSDB contra o PT. Os mártires da “Chacina da Lapa” desgraçadamente não têm
herdeiros políticos, nem no campo do decomposto PCdoB, nem tampouco no terreno
dos “dissidentes” que acabaram por dissolver organicamente o PRC na “gosma”
ideológica burguesa do PT. 43 anos depois caberá a uma nova geração de
combatentes classistas, forjada na têmpera revolucionária do enfrentamento,
primeiro com as gestões petista da Frente Popular e agora com o governo
neofascista de Bolsonaro, honrar a memória e a luta de todos os militantes da
esquerda comunista que caíram sob o tacão assassino da ditadura do capital.