segunda-feira, 27 de junho de 2022

LUTA PELA LEGALIZAÇÃO DO ABORTO LIVRE E GRATUITO: UMA QUESTÃO DE VIDA OU MORTE PARA A MULHER TRABALHADORA


"Não liberdade para todos, não igualdade para todos, mas luta contra os opressores exploradores, eliminação da possibilidade de oprimir e de explorar. Esta é a nossa palavra de ordem! Liberdade e igualdade para o sexo OPRIMIDO!"
(V.I.Lênin, "Sobre a emancipação da mulher")
A questão do direito ao aborto relaciona-se com o problema de opressão social a que as mulheres historicamente estão submetidas, tuteladas pela família e pelo Estado. Neste sentido, a hipócrita moral e legislação burguesas consagram esta opressão sobre o sexo feminino, discriminando a mulher na família, no trabalho e na sociedade como ser humano de segunda categoria, subtraindo-lhe direitos como o divórcio e o aborto, salário igual ao dos homens, além de duvidar de sua capacidade civil. No capitalismo, a "igualdade" na lei — quando existe — não significa igualdade na vida. Há frases pomposas em favor dos direitos das minorias, da igualdade e da liberdade, porém, tudo não passa de teatralidade burguesa. 
OS DIFERENTES EFEITOS DE CLASSE DA OPRESSÃO FEMININA

Apesar de ser lei desde 1940, o direito restrito ao aborto, significou liberdade somente para as mulheres burguesas ou pequeno-burguesas que, por terem recursos, detêm a exclusividade desse direito para abortarem seus fetos em belas clínicas, falsamente clandestinas, e com respeitáveis médicos. As mulheres operárias que, por ignorância dos métodos anticoncepcionais adequados, pela impossibilidade de obtê-los ou pelo peso de sua miséria cotidiana, obrigam-se a recorrer a um aborto clandestino doloroso, correm risco de vida pelas complicações pós-abortivas em locais desprovidos das mínimas condições higiênicas, médicas e hospitalares. A mulher operária aborta, sem amparo legal, recorrendo à ajuda clandestina sem qualquer condição de higiene, sendo mutiladas ou mortas em verdadeiros açougues humanos, enquanto a pequena burguesa aborta em clínicas médicas, à sombra da legislação hipócrita, de forma segura e confortável.

A conseqüência é que mais de um milhão de abortos clandestinos são realizados por ano, resultando na morte de 10 mil mulheres, o que oficialmente representa a quarta causa de mortalidade materna no Brasil.  A ajuda clandestina às mulheres operárias grávidas produz a sua morte e mutilação com toda a vil aprovação e complacência da Igreja católica e do Estado capitalista que, de acordo com a conveniência, utiliza o aborto como instrumento de controle demográfico.

"Mas o que espera os filhos das famílias proletárias se conseguirem expor-se a todos os perigos mortais semeados generosamente em seu caminho, antes e depois do nascimento? A que, o frio, a miséria, as reprimendas enraivecidas, os golpes de mãos cansadas, o desejo provocado pelo desprezo: 'antes não tivesse nascido!'; depois, os sombrios anos de aprendizagem e, nos momentos de lazer, a rua, as rixas, as lutas e muitos, muitos golpes..." (Marxismo e Revolução Sexual, Alexandra Kollontai).  Se hoje todas mulheres usufruem de alguns direitos democráticos como creches, jornada de oito horas, votar, abortar, divorciar-se etc., é porque tais conquistas foram fruto de mobilizações operárias e não da luta de "todas" as mulheres. Portanto, embora as mulheres de todas as classes sofram diretamente a opressão milenar, os efeitos dessa opressão social são distintos para as mulheres de diferentes classes sociais, o que coloca sobre as costas das mulheres operárias e do proletariado a tarefa de sua libertação enquanto classe, como condição primeira para impor uma real igualdade e liberdade entre homens e mulheres.

A DEFESA DA CARNIFICINA SOCIAL DO VATICANO

Em nome de uma hipocrisia moral e da mistificação da maternidade, o Vaticano mantém a carnificina social, condenando à morte ou à mutilação milhares de mulheres em clínicas clandestinas, além das crianças vitimadas pela desnutrição e miséria familiar.

A Igreja tradicionalmente é aliada do Estado na reprodução da opressão feminina. Em nome do "amor pela vida", condena todos os métodos artificiais contraceptivos (pílula, camisinha etc.), o que contribui para matar pessoas numa época em que a AIDS requer toda a prevenção possível. Na contramão do progresso da humanidade, a Igreja também é contra o divórcio; postula o casamento indissolúvel e o adultério consentido e velado, obrigando homens e mulheres a cumprir pena nos cárceres de uma união artificial, carente de relações de afeto e camaradagem.

Faz-se necessário desenvolver uma ampla campanha em defesa da legalização do aborto livre e gratuito, denunciando a postura da Igreja e setores reformistas de restringir o caráter de classe desse combate.

LUTAR PELA REVOLUÇÃO SOCIALISTA É LIBERTAR A MULHER

O aborto é um fenômeno ligado à maternidade, isto é, à liberdade reprodutiva da mulher. Ter ou não filhos envolve questões de cunho sócio-econômicos e culturais que respondem à necessidade de se abortar: existência de condições dignas de sobrevivência (salário, moradia, saúde, educação, lazer), segurança de relações afetivas, hipocrisia no padrão de moralidade etc. A mulher deve ter o direito de exercer sua opção de interromper uma gravidez indesejada sem qualquer interferência estatal, cujo dever é garantir-lhe plenas condições para este exercício, inclusive nos hospitais da rede pública, gratuitamente.  No entanto, a tarefa democrática de emancipação da mulher em toda sua amplitude (creches comunitárias, refeitórios e lavanderias coletivas, fim da dupla jornada etc.) não será obra do Estado capitalista caduco ou das mulheres em geral, mesmo porque as mulheres pertencem a distintas classes sociais, cujos interesses históricos são antagônicos. Assim sendo, não podemos imaginar que as mulheres que usufruem da exploração capitalista, estarão dispostas a abolí-la.

Não é o tipo de opressão social (sexual, racial, étnica) ou quem a sofre que define o curso conseqüente de sua liquidação, mas sim os interesses de classe que determinam o lado da barricada desta luta. A luta pela legalização do aborto livre e gratuito, incondicional, não deve ser dirigida por grupos femininos pequeno-burgueses ou religiosos progressistas como as "Católicas pelo Direito de Decidir!" Os setores mais explorados, as mulheres trabalhadoras devem ser a vanguarda desta luta, que será conseqüente somente sob a sua direção. Devem intervir nos movimentos em favor do aborto, sob a perspectiva de destruir o capitalismo como saída radical à opressão sobre a mulher.

Não se trata, portanto, de fazer uma defesa burguesa dos "direitos das mulheres", isto é, convencional, formal e acanhada, mas sim de aliar a necessidade de libertação da mulher com os interesses práticos e objetivos da revolução proletária para se poder realizar tarefas democráticas tão elementares, mas que a burguesia é incapaz de conduzir. Desse modo, "o socialismo deverá eliminar as causas que obrigam a mulher a abortar, e não fazer com que a política intervenha brutalmente na vida íntima da mulher, para lhe impor os prazeres da maternidade." (A Revolução Traída, L. Trotsky).

Neste dia temos que levantar como principal bandeira o direito ao aborto legal e gratuito como parte da luta democrática pelo direito ao aborto universal em clínicas públicas e estatais quando a mulher desejar, independente de qualquer condição, pois ela deve dispor de seu corpo livremente. É necessário compreender que a luta pela descriminalização e legalização do aborto, tornando-o livre, gratuito e incondicional, soma-se a tantas outras reivindicações de caráter democrático dos trabalhadores, mas cuja realização é impossível nos marcos da senil democracia dos países atrasados. Desse ponto de vista, portanto, a defesa do aborto livre, legal e gratuito para as mulheres trabalhadoras deve ligar-se indissoluvelmente à destruição do regime capitalista e a superação de suas podres instituições. O fim da opressão feminina depende da capacidade da classe operária, mobilizada de forma centralizada e com seus próprios métodos de luta, liquidar o Estado burguês e sua exploração capitalista como parte da luta pela revolução socialista.