LUTA PELA LEGALIZAÇÃO DO ABORTO
LIVRE E GRATUITO: UMA QUESTÃO DE VIDA OU MORTE PARA A MULHER TRABALHADORA
"Não liberdade para todos, não igualdade para todos,
mas luta contra os opressores exploradores, eliminação da possibilidade de
oprimir e de explorar. Esta é a nossa palavra de ordem! Liberdade e igualdade
para o sexo OPRIMIDO!"
(V.I.Lênin, "Sobre a emancipação da mulher")
A questão do direito ao aborto relaciona-se com o problema
de opressão social a que as mulheres historicamente estão submetidas, tuteladas
pela família e pelo Estado. Neste sentido, a hipócrita moral e legislação
burguesas consagram esta opressão sobre o sexo feminino, discriminando a mulher
na família, no trabalho e na sociedade como ser humano de segunda categoria,
subtraindo-lhe direitos como o divórcio e o aborto, salário igual ao dos
homens, além de duvidar de sua capacidade civil. No capitalismo, a
"igualdade" na lei — quando existe — não significa igualdade na vida.
Há frases pomposas em favor dos direitos das minorias, da igualdade e da
liberdade, porém, tudo não passa de teatralidade burguesa.
OS DIFERENTES EFEITOS DE CLASSE DA OPRESSÃO FEMININA
Apesar de ser lei desde 1940, o direito restrito ao aborto,
significou liberdade somente para as mulheres burguesas ou pequeno-burguesas
que, por terem recursos, detêm a exclusividade desse direito para abortarem
seus fetos em belas clínicas, falsamente clandestinas, e com respeitáveis
médicos. As mulheres operárias que, por ignorância dos métodos
anticoncepcionais adequados, pela impossibilidade de obtê-los ou pelo peso de
sua miséria cotidiana, obrigam-se a recorrer a um aborto clandestino doloroso,
correm risco de vida pelas complicações pós-abortivas em locais desprovidos das
mínimas condições higiênicas, médicas e hospitalares. A mulher operária aborta,
sem amparo legal, recorrendo à ajuda clandestina sem qualquer condição de higiene,
sendo mutiladas ou mortas em verdadeiros açougues humanos, enquanto a pequena
burguesa aborta em clínicas médicas, à sombra da legislação hipócrita, de forma
segura e confortável.
A conseqüência é que mais de um milhão de abortos
clandestinos são realizados por ano, resultando na morte de 10 mil mulheres, o
que oficialmente representa a quarta causa de mortalidade materna no
Brasil. A ajuda clandestina às mulheres
operárias grávidas produz a sua morte e mutilação com toda a vil aprovação e
complacência da Igreja católica e do Estado capitalista que, de acordo com a
conveniência, utiliza o aborto como instrumento de controle demográfico.
"Mas o que espera os filhos das famílias proletárias se
conseguirem expor-se a todos os perigos mortais semeados generosamente em seu
caminho, antes e depois do nascimento? A que, o frio, a miséria, as reprimendas
enraivecidas, os golpes de mãos cansadas, o desejo provocado pelo desprezo:
'antes não tivesse nascido!'; depois, os sombrios anos de aprendizagem e, nos
momentos de lazer, a rua, as rixas, as lutas e muitos, muitos golpes..."
(Marxismo e Revolução Sexual, Alexandra Kollontai). Se hoje todas mulheres usufruem de alguns
direitos democráticos como creches, jornada de oito horas, votar, abortar,
divorciar-se etc., é porque tais conquistas foram fruto de mobilizações
operárias e não da luta de "todas" as mulheres. Portanto, embora as
mulheres de todas as classes sofram diretamente a opressão milenar, os efeitos
dessa opressão social são distintos para as mulheres de diferentes classes
sociais, o que coloca sobre as costas das mulheres operárias e do proletariado
a tarefa de sua libertação enquanto classe, como condição primeira para impor
uma real igualdade e liberdade entre homens e mulheres.
A DEFESA DA CARNIFICINA SOCIAL DO VATICANO
Em nome de uma hipocrisia moral e da mistificação da
maternidade, o Vaticano mantém a carnificina social, condenando à morte ou à
mutilação milhares de mulheres em clínicas clandestinas, além das crianças
vitimadas pela desnutrição e miséria familiar.
A Igreja tradicionalmente é aliada do Estado na reprodução
da opressão feminina. Em nome do "amor pela vida", condena todos os
métodos artificiais contraceptivos (pílula, camisinha etc.), o que contribui
para matar pessoas numa época em que a AIDS requer toda a prevenção possível.
Na contramão do progresso da humanidade, a Igreja também é contra o divórcio;
postula o casamento indissolúvel e o adultério consentido e velado, obrigando
homens e mulheres a cumprir pena nos cárceres de uma união artificial, carente
de relações de afeto e camaradagem.
Faz-se necessário desenvolver uma ampla campanha em defesa
da legalização do aborto livre e gratuito, denunciando a postura da Igreja e
setores reformistas de restringir o caráter de classe desse combate.
LUTAR PELA REVOLUÇÃO SOCIALISTA É LIBERTAR A MULHER
O aborto é um fenômeno ligado à maternidade, isto é, à
liberdade reprodutiva da mulher. Ter ou não filhos envolve questões de cunho
sócio-econômicos e culturais que respondem à necessidade de se abortar:
existência de condições dignas de sobrevivência (salário, moradia, saúde,
educação, lazer), segurança de relações afetivas, hipocrisia no padrão de
moralidade etc. A mulher deve ter o direito de exercer sua opção de interromper
uma gravidez indesejada sem qualquer interferência estatal, cujo dever é
garantir-lhe plenas condições para este exercício, inclusive nos hospitais da
rede pública, gratuitamente. No entanto,
a tarefa democrática de emancipação da mulher em toda sua amplitude (creches
comunitárias, refeitórios e lavanderias coletivas, fim da dupla jornada etc.)
não será obra do Estado capitalista caduco ou das mulheres em geral, mesmo
porque as mulheres pertencem a distintas classes sociais, cujos interesses
históricos são antagônicos. Assim sendo, não podemos imaginar que as mulheres
que usufruem da exploração capitalista, estarão dispostas a abolí-la.
Não é o tipo de opressão social (sexual, racial, étnica) ou
quem a sofre que define o curso conseqüente de sua liquidação, mas sim os interesses
de classe que determinam o lado da barricada desta luta. A luta pela
legalização do aborto livre e gratuito, incondicional, não deve ser dirigida
por grupos femininos pequeno-burgueses ou religiosos progressistas como as
"Católicas pelo Direito de Decidir!" Os setores mais explorados, as
mulheres trabalhadoras devem ser a vanguarda desta luta, que será conseqüente
somente sob a sua direção. Devem intervir nos movimentos em favor do aborto,
sob a perspectiva de destruir o capitalismo como saída radical à opressão sobre
a mulher.
Não se trata, portanto, de fazer uma defesa burguesa dos
"direitos das mulheres", isto é, convencional, formal e acanhada, mas
sim de aliar a necessidade de libertação da mulher com os interesses práticos e
objetivos da revolução proletária para se poder realizar tarefas democráticas
tão elementares, mas que a burguesia é incapaz de conduzir. Desse modo, "o
socialismo deverá eliminar as causas que obrigam a mulher a abortar, e não
fazer com que a política intervenha brutalmente na vida íntima da mulher, para
lhe impor os prazeres da maternidade." (A Revolução Traída, L. Trotsky).