sábado, 22 de julho de 2023

RUPTURA NO PCB (PARTE II): CHINA É UM PAÍS CAPITALISTA? AVANÇOU AO ESTÁGIO DE POTÊNCIA IMPERIALISTA? O FALSO “SOCIALISMO CHINÊS” COMO PANO DE FUNDO DA DISPUTA ENTRE IVAN PINHEIRO/JONES MANOEL E O CC DO EX-PARTIDÃO  

Um novo “round” na ruptura entre o PCB e a dupla Ivan Pinheiro/Jones Manoel veio a público. Após as postagens dos lados em disputa, Ivan Pinheiro publicou o artigo “Antes que seja tarde! (Carta ao Comitê Central do PCB)” (21/07) buscando clarificar as supostas divergências político-programáticas que tem como centro a caracterização sobre a China e a Rússia e o caráter da guerra da Ucrânia, além de pontuar novas críticas as posições do CC do PCB, em particular a conduta anti-leninista de Sônia Manzano durante as eleições de 2022, candidata a presidente da república. Segundo Pinheiro, “Em primeiro lugar, reconheço que foi hábil a tentativa de fazer da repercussão do segundo texto que escrevi sobre essa enigmática plataforma uma cortina de fumaça, na vã esperança de tirar o foco da simplesmente inexplicável participação dos dois principais membros da CPN em uma articulação internacional bancada politicamente por um exótico partido, cuja existência era desconhecida, e financeiramente por um lado de uma guerra inter-imperialista repudiada firmemente pelo próprio CC do PCB em Nota Política sobre a guerra na Ucrânia, onde se declara: ‘Os interesses das burguesias estadunidense e russa são evidentes nessa luta pela partilha do mundo capitalista e a guerra não interessa aos trabalhadores’.” Como podemos observar tanto o PCB como os dissidentes tinham “até ontem” a convergência que está em curso uma “guerra inter-imperialista” cujo ponto visível é o conflito na Ucrânia. Ocorre que Ivan mantém essa posição enquanto o PCB se inclina cada vez mais a elogiar o “Socialismo Chinês”, retrocedendo na caracterização que a China é um país capitalista ou mesmo avançando para o estágio de potência imperialista. Com essa “mudança” de posição do PCB não haveria mais uma “guerra inter-imperialista” e sim uma disputa entre o “bloco imperialista ofensivo” (EUA-OTAN) e a Rússia, que contaria com o “apoio” da China tal como caracteriza a “Plataforma Mundial Anti-imperialista”. 

A LBI, que acompanha essa discussão, afirmou por várias vezes que tanto a China como a Rússia são países capitalistas. A guerra da Ucrânia se inscreve em uma disputa fronteiriça com um país que foi armado pelo OTAN para atacar a Rússia. Nesse contexto não se inscreve em uma “guerra inter-imperialista” como afirma Ivan e sim em um conflito entre uma aliança militar imperialista e um país capitalista que não é imperialista, mas sim uma potência regional com força devido a herança advinda da URSS. Diante da guerra na Ucrânia muitas correntes de esquerda, inclusive as que se reclamam leninistas (como o PCB), defenderam a “neutralidade” argumentando a tese revisionista que está em curso uma disputa inter-imperialista entre os EUA e a Rússia. Nada mais falso! Trata-se ao contrário de uma completa ruptura com as lições programárticas nos legada por Lenin. 

O cenário de ofensiva imperialista fez ressurgir na Rússia uma geopolítica nacionalista e que hoje funciona como uma barreira de contenção militar aos planos expansionistas da OTAN em toda Ásia e Europa. O neonacionalismo russo sob a direção de Putin não tem nada a ver com uma suposta configuração imperialista do maior país europeu, tem sim um caráter burguês, mas está muito longe de uma expansão capitalista para colonizar outras nações, como ocorreu com os EUA e mais remotamente com a Inglaterra ou Alemanha. 

A Rússia não exporta capitais financeiros para outros países e tampouco possui grandes empresas transnacionais, além do seu gigantesco complexo de gás e petróleo, porém detém uma poderosa indústria bélica, uma antiga herança soviética, que pode fazer "concorrência" ao Pentágono e seus servis aliados. Somente os ignorantes na teoria Marxista Leninista (revisionistas) caracterizam a Rússia restaurada como um país imperialista, para justificar repetidos apoios prestados as agressões da OTAN contra povos e regimes de países semicoloniais. O contemporâneo expansionismo geopolítico e militar russo nada tem a ver com a rigorosa definição Leninista de imperialismo, como sendo a “exportação do capital financeiro por meio da força”, ao contrário é reflexo direto da reação nacionalista da “jovem” burguesia russa, oprimida pelo capital imperialista alemão. 

Temos que desmascarar aqueles grupos que pregam o abstencionismo alegando que a Rússia seria um país imperialista ou mesmo um subimperialismo regional. Esta “teoria” ignora ou rejeita os conceitos desenvolvidos por Lenin acerca da impossibilidade dos países atrasados, no período da égide do capitalismo monopolista, tornarem-se economias imperialistas.

Com a vitória da contrarrevolução na URSS em 1991, e aproveitando o caos dos primeiros anos de restauração capitalista sob o governo Yeltsin com a consequente decadência econômica, política e social da ex-URSS, os EUA avançaram sobre a Rússia e sua zona de influência.

Com a chegada de Putin ao governo esse curso de desintegração começou a se reverter. Putin estabeleceu um regime que fortaleceu a autoridade estatal, tomou o controle férreo dos principais recursos do país – enfrentando mesmo alguns dos oligarcas que haviam ficado com o botim das privatizações, reconverteu a Rússia de velha potência industrial em um país exportador de petróleo e gás, beneficiando-se amplamente dos altos preços destas matérias-primas e recompôs seu exército.

Isso levou a que nos últimos anos a Rússia ressurgisse como uma potência regional e que tenta resistir à política ofensiva das potências ocidentais sob sua esfera de influência mais próxima, com uma série de iniciativas como a União Alfandegária Euro-asiática, ou subsidiar o preço do gás, embora de nenhuma maneira se transformasse em uma grande potência capitalista: sua economia é cada vez mais rentista e dependente do preço do petróleo e do gás. Estrategicamente o imperialismo ianque deseja se livrar do staff de ex-burocratas restauracionistas que ajudaram a Casa Branca a liquidar as bases sociais do Estado operário soviético na década de 90 e colocar no comando da Rússia figuras de sua inteira confiança, que sequer se movimentem "defensivamente" como Putin.

Desde a destruição contrarrevolucionária das conquistas operárias na antiga URSS, o bando restauracionista, inaugurado por Yeltsin, vinha desestimulando qualquer atrito político ou militar com o imperialismo europeu e ianque, neste sentido as parcas manifestações nacionalistas russa eram duramente reprimidas pelo Kremlin.  Mas a chamada “revolução laranja” ocorrida em 2004 na Ucrânia ascendeu o “alerta vermelho” para os restauracionistas, era necessário parar de se “agachar” perante os EUA ou se transformariam em mais um “quintal” do imperialismo ianque.

Neste período este setor estatal já convertido em burguesia russa (a restauração capitalista havia terminado por completo) era comandado por Putin, um ex-dirigente da KGB e simpatizante distante do velho stalinismo. Com o fortalecimento econômico da Rússia no final da década passada, produto das exportações de Gás e Petróleo para a Europa, os projetos da poderosa indústria bélica foram reiniciados, tendo como marco o lançamento do moderno caça Sukhoi, único supersônico do planeta com capacidade de enfrentar os F-18 norte-americanos.

Sua avançada indústria bélica (herança do Estado operário soviético) sofre um duro bloqueio comercial dos EUA, sendo que poucos países têm a “ousadia” para comprar as armas russas, Venezuela e Síria fazem parte deste “seleto” grupo. Como não pode se basear na venda de equipamentos bélicos para acumular divisas cambiais, a Rússia tem organizado sua economia em torno da Gazprom, principal empresa exportadora do país. Seria tão estúpido, do ângulo científico do Leninismo, considerar a Rússia imperialista tanto como qualificar politicamente seu atual curso nacionalista burguês de enfrentamento com o imperialismo como “reacionário”.

Por sua vez a China é um país capitalista que almeja ser imperialista, porém essa “metamorfose” (de um estado operário deformado ao um país capitalista avançado) vem ocorrendo em uma quadra histórica em que surge a Governança Global do Capital Financeiro, que controla essa transição subordinando totalmente a burocracia restauracionista aos seus interesses geopolíticos. A “nova” burguesia chinesa é parceira e não adversária dos EUA, por essa razão sua posição no conflito na Ucrânia é “Em defesa da Paz”, sequer votando ao lado da Rússia no CS da ONU, se abstendo em todas as votações capitais.

O “sonho chinês” de se configurar como a nova “sede” da Governança Global do Capital Financeiro (no momento já é o coração global da indústria) depende muito mais da própria decadência do imperialismo ianque do que da autonomia política e econômica dos burocratas ditos “comunistas” em relação ao poder do rentismo internacional.

A defesa enfática que a China faz da “paz” na guerra da Ucrânia, não passa de um chamado dissimulado para a rendição total da Rússia, nos marcos dos “Acordos de Minsk”, impostos pela OTAN em 2014 no curso da chamada “Revolução Colorida”. Por isso o governo “comunista” da China recusou o pedido de Moscou para o fornecimento de blindados chineses as Repúblicas de Donetsk e Lugansk.

Somente midiotas ou ignorantes completos em conjuntura mundial, podem caracterizar a movimentação econômica e comercial da China das últimas três décadas como “anti-imperialista”, isso sem falar de sua orientação política internacional, totalmente alinhada com a Casa Branca nos principais fatos da luta de classes (Iraque, Líbia, Síria, África), excluindo é claro a questão nacional de Taiwan. Não precisamos neste breve artigo lembrar a posição chinesa na megaprodução global da farsa da pandemia Covid, onde em estreita colaboração com o Deep State ianque, Fórum de Davos e Big Pharma/Tech, patrocinaram o ingresso da Nova Ordem Mundial sob os auspícios da Governança Global do Capital Financeiro. Portanto não há nenhum aspecto revolucionário para o proletariado mundial ou chinês na “Rota da Seda”, ou na pretendida “equalização” entre dólar e yuan no mercado cambial do planeta. As aspirações chinesas de desenvolver um novo “imperialismo não voraz e humanitário”, que ainda estão longe de se materializar, não são de forma alguma um fator progressista para a classe operária mundial.

Os Marxistas Leninistas não caracterizam a China como um Estado Operário, ainda que o país tenha fortes características herdadas do planejamento central econômico. O regime de partido único, que formalmente se reivindica Comunista, mas que descartou completamente a teoria Maoísta, adotando o programa da restauração capitalista da de Deng Xiaoping, é na verdade uma garantia de estabilidade política oferecida a Governança Global do Capital Financeiro que investiu trilhões de dólares no processo de reconversão da China.

O papel da China no cenário mundial e como, no quadro de uma decadência generalizada e ao mesmo tempo de ofensiva global do imperialismo ianque e seu apêndice, a União europeia, a China está desenvolvendo uma política externa baseada no objetivo estratégico de construir uma nova polaridade imperialista.

A China tornou-se o adversário econômico “número 1” do eixo atlântico liderado pelos Estados Unidos, que se vê em franco declínio social e incapaz de manter intacta sua hegemonia econômica e militar sobre o planeta. É evidente que o governo do Partido Comunicado Chinês conseguiu feitos econômicos enormes sob o impulso de um gigantesco investimento financeiro internacional, no curso da restauração capitalista do antigo Estado Operário.

Na China, com 1,4 bilhão de habitantes, a fome e a pobreza extrema foram eliminadas, o desenvolvimento tecnológico foi gigantesco e em 30 anos passou de um país atrasado para uma “fábrica do mundo”. Tudo isso dirigido por um Partido Comunista burocrático que aplica uma política restauracionista chamada de "um país, dois sistemas" em que ainda coexistem o capitalismo mais “selvagem” e o planejamento econômico central.

O Partido Comunista Chinês, por enquanto, conseguiu disciplinar  a “besta” da anarquia do mercado e o setor capitalista privado é fortemente regulamentado. Nos últimos anos vimos como os setores corporativos de construção, educação e financeiro foram drasticamente monitorados e advertidos por alguns “excessos” cometidos e que colocaram a autoridade do Partido Comunista em risco.

Com a chegada de Xi Jinping como Presidente da República e líder máximo do Partido, inicia-se uma nova etapa na qual se aprofunda o desenvolvimento do capitalismo na China, promovendo políticas destinadas a favorecer o poder do rentismo financeiro e das grandes corporações imperialistas que tem no país sua “segunda casa”.

Do lado oposto, os Estados Unidos enfrentam uma realidade marcada pelo declínio econômico, social e cultural. O imperialismo ianque está deixando de ser o poder absoluto hegemônico. E a única forma que os EUA pode defender sua posição de primeira potência é com sua violenta ofensiva econômica e militar. Os EUA incendiaram todas as regiões do planeta, seja com guerras, terrorismo ou golpes de Estado e usaram a supremacia cambial do dólar para chantagear países com seus ataques especulativos.

A “guerra” econômica e os bloqueios financeiros e comerciais contra os países periféricos foram possíveis graças a um dólar fora do padrão-ouro e sustentado pela economia do petróleo. Assim o FED norte-americano tornou-se após a Segunda Guerra Mundial, o “cofre” do mundo, onde todos os governos nacionais compram seus títulos financeiros, inclusive o chinês seu principal cliente. 

É neste contexto de debilidade do (petro)dólar, em que a China lançou uma campanha para desdolarizar uma parte de suas trocas comerciais, assinando dezenas de acordos para negociar em yuan e outras divisas. Paralelamente, promove alianças regionais como a OCS e os BRICS, nas quais até países governados por oligarquias reacionárias e corruptas, como a Arábia Saudita, têm demonstrado interesse. 

Essa realidade do crescimento capitalista chinês e sua parceira cada vez mais estreita com a Governança  Global do Capital Financeiro, como ficou demonstrado na farsa da pandemia do coronavírus, força o imperialismo ianque a tentar limitar o expansionismo chinês por meio de sanções econômicas enquanto aumenta as provocações militares em torno de Taiwan e do Mar da China abrindo bases nas Filipinas, inaugurando um escritório da OTAN no Japão e militarizando ainda mais a Coreia do Sul. 

Por sua vez a burocracia restauracionista do gigante asiático não quer um confronto aberto com a Casa Branca e muito menos afugentar o enorme fluxo financeiro internacional destinado para potencializar a produção industrial de sua nação, por isso lança a retrógrada consiga de um “mundo multipolar”, ou seja um mundo capitalista com dois imperialismos hegemônicos.

Os Marxistas Leninistas declaramos que não somos neutros diante do conflito em curso e pode facilmente evoluir para uma guerra convencional nuclear. Estamos na trincheira da Rússia e seus aliados, contra o imperialismo ianque e a OTAN, mantendo a linha programática trotskista de autonomia de ação e críticas da condução de Putin. Para vencer o monstro imperialista é necessário colocar em movimento o proletariado russo e de seus irmãos de classe, tudo o que PCB e seus novos adversários abominam!