terça-feira, 29 de dezembro de 2020

“LEI DO ABORTO” VAI A VOTO NO SENADO ARGENTINO: AMPLIAR A MOBILIZAÇÃO DE MASSAS PARA SUPERAR AS LIMITAÇÕES DO PROJETO  ACORDADO ENTRE O GOVERNO FERNÁNDEZ E A DIRETA!

"Não liberdade para todos, não igualdade para todos, mas luta contra os opressores exploradores, eliminação da possibilidade de oprimir e de explorar. Esta é a nossa palavra de ordem! Liberdade e igualdade para o sexo OPRIMIDO!" (V.I.Lênin, "Sobre a emancipação da mulher")

Depois de obter aprovação na Câmara de Deputados da Argentina, o projeto de lei que legaliza o aborto chega ao Senado neste dia 29 de dezembro. Manifestações estão marcadas para hoje, em uma nova vigília em Buenos Aires. A medida aprovada e que vai a voto no Senado não era a dos termos originais propostos pelo governo de Alberto Fernández, uma vez que o presidente aceitou as modificações introduzidas pelas comissões com o seu consentimento, ou melhor, com a sua promoção através de acordos com a direita. Fernández deu dois passos para trás no sentido de apresentar uma versão mais light do projeto que o aproxima das determinações do Vaticano do Papa Francisco.

Os discursos demagógicos dos parlamentares peronistas a favor da legalização, encobriram longamente todas as violências sofridas pelas mulheres submetidas a abortos ilegais durante várias décadas. Não mencionaram o papel decisivo da Igreja Católica e dos evangélicos nas perseguições contra as mulheres proletárias que foram processadas pelo Estado burguês. Os governistas da base dos Fernández evitaram qualquer menção as gravíssimas limitações que o projeto abriga: objeção de consciência individual, objeção institucional, redução dos direitos das meninas e adolescentes, e a manutenção da pena a partir da semana 14 de gravidez.

O governo  Fernández capitulou abertamente diante dos aparelhos clericais aos quais está associado o peronismo. Foram distribuídas milhares de “Cartas Abertas” alertando sobre os limites que o governo impôs à lei que acaba de ser aprovada. Muitos ativistas afirmaram que tinham acabado de tomar conhecimento das objeções institucionais introduzidas no projeto. Porém a vitória do projeto, mesmo mutilado, expressa a luta de décadas de gerações de mulheres que estiveram diante da repressão do clero, e de todos os partidos patronais que controlam o regime capitalista.

Nem com as concessões gravíssimas que contém, o governo tem garantidos os votos hoje no Senado para a definitiva sanção do projeto. Também chega mesmo a soar ridículo quando a esquerda reformista anuncia: "o fim do patriarcado", mas acaba abraçando as demandas políticas das “feministas do mercado”. O direito parcial ao aborto é fruto da ação direta nas ruas, nas escolas, na saúde, nas fábricas. É o resultado da organização dos bairros contra a fome e pelo direito à uma vida digna.

O movimento de massas deverá realizar um necessário balanço político de como o projeto original da Campanha foi rejeitado. Agora é urgente convocar assembleias populares em todos os locais de trabalho e moradia, impulsionando a plataforma de reivindicações iniciais do movimento, não tendo nenhuma ilusão na votação no Senado hoje, uma casa parlamentar burguesa ainda mais reacionária que a Câmara dos Deputados! 

LUTAR PELA REVOLUÇÃO SOCIALISTA É LIBERTAR A MULHER 

O aborto é um fenômeno ligado à maternidade, isto é, à liberdade reprodutiva da mulher. Ter ou não filhos envolve questões de cunho sócio-econômicos e culturais que respondem à necessidade de se abortar: existência de condições dignas de sobrevivência (salário, moradia, saúde, educação, lazer), segurança de relações afetivas, hipocrisia no padrão de moralidade etc. A mulher deve ter o direito de exercer sua opção de interromper uma gravidez indesejada sem qualquer interferência estatal, cujo dever é garantir-lhe plenas condições para este exercício, inclusive nos hospitais da rede pública, gratuitamente.  No entanto, a tarefa democrática de emancipação da mulher em toda sua amplitude (creches comunitárias, refeitórios e lavanderias coletivas, fim da dupla jornada etc.) não será obra do Estado capitalista caduco ou das mulheres em geral, mesmo porque as mulheres pertencem a distintas classes sociais, cujos interesses históricos são antagônicos. Assim sendo, não podemos imaginar que as mulheres que usufruem da exploração capitalista, estarão dispostas a abolí-la. 

Não é o tipo de opressão social (sexual, racial, étnica) ou quem a sofre que define o curso consequente de sua liquidação, mas sim os interesses de classe que determinam o lado da barricada desta luta. A luta pela legalização do aborto livre e gratuito, incondicional, não deve ser dirigida por grupos femininos pequeno-burgueses ou religiosos progressistas como as "Católicas pelo Direito de Decidir!" Os setores mais explorados, as mulheres trabalhadoras devem ser a vanguarda desta luta, que será consequente somente sob a sua direção. Devem intervir nos movimentos em favor do aborto, sob a perspectiva de destruir o capitalismo como saída radical à opressão sobre a mulher. 

Não se trata, portanto, de fazer uma defesa burguesa dos "direitos das mulheres", isto é, convencional, formal e acanhada, mas sim de aliar a necessidade de libertação da mulher com os interesses práticos e objetivos da revolução proletária para se poder realizar tarefas democráticas tão elementares, mas que a burguesia é incapaz de conduzir. Desse modo, "o socialismo deverá eliminar as causas que obrigam a mulher a abortar, e não fazer com que a política intervenha brutalmente na vida íntima da mulher, para lhe impor os prazeres da maternidade." (A Revolução Traída, L. Trotsky). 

Neste dia temos que levantar como principal bandeira o direito ao aborto legal e gratuito como parte da luta democrática pelo direito ao aborto universal em clínicas públicas e estatais quando a mulher desejar, independente de qualquer condição, pois ela deve dispor de seu corpo livremente. É necessário compreender que a luta pela descriminalização e legalização do aborto, tornando-o livre, gratuito e incondicional, soma-se a tantas outras reivindicações de caráter democrático dos trabalhadores, mas cuja realização é impossível nos marcos da senil democracia dos países atrasados. Desse ponto de vista, portanto, a defesa do aborto livre, legal e gratuito para as mulheres trabalhadoras deve ligar-se indissoluvelmente à destruição do regime capitalista e a superação de suas podres instituições. O fim da opressão feminina depende da capacidade da classe operária, mobilizada de forma centralizada e com seus próprios métodos de luta, liquidar o Estado burguês e sua exploração capitalista como parte da luta pela revolução socialista.