segunda-feira, 15 de janeiro de 2024

O ALTO COMANDO MILITAR BRASILEIRO PERDEU SUA AUTONOMIA DE DECISÃO HÁ 60 ANOS ATRÁS, EM 1964: SEUS CHEFES SÃO ESCOLHIDOS E TREINADOS NO PENTÁGONO, ESTÃO SUBMETIDOS A DISCIPLINA POLÍTICA DOS GENERAIS NORTE-AMERICANOS 

Os ultrarreacionários generais e coronéis de alta patente e membros do Alto Comando das Forças Armadas Nacionais, se pudessem “decretar” um regime político para o Brasil, não optariam por implantar uma “simples” Ditadura Militar, decidiriam por impor um regime ainda mais cruento, uma Ditadura escravofascista militar! Entretanto essa escolha não está no âmbito das “preferências” ideológicas pessoais destes “gorilas” fardados. Desde o golpe militar desferido em 1964, há exatos 60 anos atrás, os comandantes militares que detém postos de controle estratégico da tropa e de armamentos, são indicados diretamente pelo Pentágono, onde são treinados pela escola superior militar norte-americana e de lá recebem suas ordens. A razão da completa perda de autonomia das nossas Forças Armadas é bem simples, foram os ianques que arquitetaram e bancaram o golpe militar contra o governo nacionalista burguês de João Goulart, e na sequência estabeleceram um regime militar que durou vinte anos no Brasil. Entretanto a subserviência dos comandantes militares brasileiros em relação as diretrizes traçadas pelos generais norte-americanos têm sua gênese um pouco antes, já no final da Segunda Guerra Mundial em 1945. Desta época surge a figura ainda nas batalhas da FEB em campo italiano, do general Castelo Branco, que é “ungido” para completar sua formação de comandante militar em Washington. Não por coincidência é o próprio Castelo o construtor local do golpe militar contra Jango e também o escolhido pela Casa Branca para ser o primeiro presidente da ditadura militar no Brasil.

A liderança do Marechal Castelo Branco no interior das Forças Armadas representava, em uma etapa de plena “Guerra Fria”, a segurança para os EUA que o Brasil não se inclinaria para o chamado “campo socialista”, independentemente da orientação política do governo de turno no país. Logo nos anos 50 foi fundada a Escola Superior de Guerra no Brasil, onde uma ampla camada de oficiais superiores recebia formação ideológica diretamente dos quadros militares do Pentágono. Com a deposição do governo nacionalista burguês de Vargas em agosto de 1954 pelo Alto Comando dos Militares, já nesta altura totalmente alinhados com as ordens da Casa Branca, o ato do seu suicídio conseguiu adiar o golpe militar “made in USA” por dez anos. Neste período a cúpula das Forças Armadas tinha um forte núcleo ideológico pró-ianque, amplamente  majoritário na caserna sobre os “nacionalistas”, formado por comandantes da mais alta patente, como Castelo, Goubery Silva(criador do IPES), os irmãos Ernesto e Orlando Geisel, Augusto Rademarker entre outros. Coube ao IPES (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais) toda formulação política e “desenho” ideológico do golpe militar desferido em Primeiro de Abril de 1964, sob os auspícios diretos da poderosa Segunda Frota Naval norte-americana, ancorada em nossa costa na chamada “Operação Brother Sam”.

Voltando um pouquinho na história, no segundo governo Vargas em meados dos anos 50, chamado de “nacionalista”, e que derrubado por um complô militar determinou a olhos de qualquer observador honesto quem de fato controlaria nossas Forças Armadas já neste período. No dia 24 de Agosto de 1954, Getúlio Vargas se suicidava no intento de deter a marcha militar para depor seu governo. A batizada “República do Galeão” (sede da base aérea da então capital da república), reunia os comandantes das três armas, que recebendo ordens via rádio comunicação, diretamente do Pentágono, era de fato o centro do poder estatal da colônia brasileira. O Palácio do Catete, assim como hoje o Palácio do Planalto, são apenas representações simbólicas institucionais e que para o Alto Comando das Forças Armadas não valem muita coisa...

Um ano e meio depois, já em 1955, os chefes militares, guiados por Washington, passam novamente a se pronunciar contra o resultado das eleições daquele ano, que elegeram o presidente Juscelino Kubitschek e João Goulart para vice. Passam a pregar um golpe contra o presidente eleito. Ocorre um fato, então, que vem a reforçar a ilusão da existência de uma “ala legalista” ou de uma “tradição constitucionalista” do Exército Brasileiro, no episódio envolvendo o então Marechal Lott. Um movimento preventivo é posto em marcha pelo então Ministro da Guerra, Marechal Lott, retardando por alguns anos o golpe militar que derrubou o presidente Jango em 1964. Este movimento aparentemente “legalista” de Lott, assim como outros ocorridos na nossa história, apenas obedecia ao amadurecimento da situação política no país, já que a Casa Branca não considerava Juscelino Kubitscheck uma ameaça aos seus interesses econômicos, caracterização geopolítica que não foi feita em relação a Jango, e por isso desfecharam o golpe militar nove anos depois, sob a “supervisão” direta do Departamento de Estado dos EUA.

Foi no seio do “núcleo duro” do Alto Comando das Forças Armadas, por quase uma década, entre a deposição do “suicidado” Getúlio e o golpe militar de 1964, que o processo de homogeneidade ideológica dos oficiais brasileiros de alta patente deu seu “salto de qualidade”, em favor da doutrina militar do imperialismo norte-americano. Poderíamos conceituar estes chefes militares sob a disciplina de ferro do Pentágono, como a “fração Castelista”, em referência a liderança do Marechal Castelo Branco. Porém é preciso contextualizar essa situação de subordinação das nossas Forças Armadas muito além somente de uma questão de identidade ideológica, ou até mesmo de uma inferioridade bélica abissal em relação ao “poder de fogo” dos ianques. Estamos falando de uma etapa histórica onde a revolução socialista “rondava pela esquina“ dos regimes capitalistas latino-americanos. A pequena ilha de Cuba tornara-se o primeiro Estado Operário do continente em 1960, logo após a revolução popular armada. As guerrilhas da esquerda marxista, cruzando os países andinos e caribenhos, estava dando seus primeiros passos. A trajetória política da URSS e China significava um contra-ponto real ao chamado “mundo democrático”, onde os EUA era o tutor global absoluto da “liberdade de mercado”. Neste quadro germinal de correlação de forças no planeta, não é muito difícil entender porque as Forças Armadas brasileiras, defensoras até a medula da propriedade privada dos meios de produção, abdicaram de sua autonomia para tomar decisões estratégicas sobre os rumos políticos, sociais e econômicos do país.

Como nos ensinou Marx, “os acontecimentos na história humana ocorrem como tragédia e são únicos, sua repetição só pode ocorrer como farsa. Os fenômenos da luta de classes de determinada época e tipo de sociedade são os mesmos, porém ocorrem em tempos diferentes dessa época e em realidades particulares”. Tentar apresentar a farsa do “8 de Janeiro” como uma tentativa real de golpe de Estado, inclusive a comparando com o “Primeiro de Abril de 64”, por iniciativa das ordens de uma meia dúzia de milicos aposentados ligados politicamente ao ex-presidente Bolsonaro, beira o cômico da esquerda reformista que desconhece inteiramente a própria história do Brasil e da subordinação da suas Forças Armadas ao imperialismo ianque. Com a ala dos Castelistas no controle geral do regime militar desde 1964 até 1984, sofrendo uma breve interrupção no governo Garrastazu Médice por conta do recrudescimento da repressão contra a guerrilha urbana e rural, o Departamento de Estado dos EUA pode traçar as linhas gerais do desenvolvimento econômico dependente da sua semi-colônia, assim como do início da chamada “Abertura Política”, abrindo caminho para a “Transição Transada” que pariu no Colégio Eleitoral da própria ditadura a “Nova República” de Tancredo e Sarney em 1985. 

Deve-se abrir um parêntese especial no caso da “Transição Transada” do regime militar que teve sua gênese ainda na “Abertura Segura” e na “Anistia Geral“ outorgada respectivamente pelos generais Geisel e Figueiredo, sob as “diretrizes democráticas” traçadas pelo presidente Carter desde Washington para toda a América Latina em 1977. No Brasil o “operador” intelectual de todo esse intricado processo transicional, foi o general Goubery do Couto e Silva, considerado até hoje o mais capaz quadro militar da ala Castelista das Forças Armadas. Goubery, ainda no governo Geisel, estabeleceu a criação de novos partidos políticos, em substituição a velha Arena e MDB, organizando a fundação do PT como um novo partido trabalhista(ao modelo do Labour Party inglês), e catapultando Lula como uma jovem liderança operária, porém anticomunista até a medula. Com a segurança de que a retirada dos militares da gerência estatal no Brasil não abriria as portas para uma alternativa “comunista ou socialista”, a Casa Branca deu seu pleno aval político para o ingresso do regime democratizante, que com a Constituição reacionária de 1988 vige até nossos dias.

De Sarney, passando por Collor, FHC e Bolsonaro até Lula, o Alto Comando das Forças Armadas, que segue sob a herança doutrinária do Castelismo, não teve grandes percalços em sua tutoria do do regime, tampouco foi ameaçado por algum “general rebelde fascistóide”, a exceção de Silvio Frota rapidamente ceifado como já foi relatado aqui. Em geral os milicos da extrema direita mais estridentes, como Bolsonaro e Heleno, são de baixa patente ou já estão de “pijama” ocupando algum cargo público na esfera política e não mais na hierarquia ativa das Forças Armadas. O Pentágono mantém um acompanhamento rígido na formação dos generais brasileiros de “4 Estrelas”, os selecionando a dedo para cursos ideológicos sistemáticos e trenamentos táticos em Washington. Em uma etapa histórica mundial que atravessamos neste momento, onde vivenciamos o retorno da “Guerra Fria segunda temporada”( novamente com o cerco da Rússia), seria até risível supor que nosso Alto Comando tupiniquim pudesse ter alguma autonomia decisória sobre questões de relevância estratégica, como um Golpe de Estado no Brasil. A lenda de que Bolsonaro e seu carcomido entorno militar teria capacidade de implantar um regime fascista no Brasil, simplesmente porque não venceu as eleições de turno, é produto da mente de energúmenos desqualificados, acompanhados por uma exquerda reformista que tem hoje a exclusiva função política de distrair o povo ingênuo com seus espetáculos circenses…