“NOVO ENTENDIMENTO” DO STF QUE PODE LIBERTAR LULA É REFLEXO POLÍTICO DA AÇÃO PREVENTIVA DA BURGUESIA DIANTE DA CRISE CAPITALISTA
O STF acaba de alterar o seu “entendimento” acerca da prisão
após condenação em segunda instância judicial, apesar do placar apertado da
decisão (6X5) não podemos deixar de registrar que é a terceira mudança da Corte
sobre este tema constitucional em menos de uma década. Todo este debate
jurídico suscitado neste momento, que obviamente teve como pano de fundo a
prisão política do ex-presidente Lula, forçando a um novo julgamento no STF, é
produto direto de uma conjuntura nacional bastante confusa e potencialmente
explosiva, principalmente diante de um cenário mundial de extrema
instabilidade, para não falar de nossos vizinhos de continente. Porém antes de
esgrimir as possíveis variantes da nova correlação de forças posta com o
Acórdão do STF, seria importante registrar que a principal regra do sistema
judicial neste país é que a classe trabalhadora e a população pobre e negra
seja presa mesmo sem qualquer condenação em primeira instância, após cometer
pequenos delitos e sequer ter direito a uma defesa inicial diante de um juiz ou
delegado de polícia. Hoje são quase trezentos mil encarcerados no regime
fechado do modelo prisional brasileiro e que nunca foram submetidos a um único
julgamento. Mas não seria porque o sistema judiciário vigente é uma
excrescência da classe dominante contra os pobres, que defenderíamos então a
manutenção das 4000 prisões que já passaram pelo crivo de um colegiado de
juízes (segunda instância) e foram encarceradas ao arrepio da lei e da
constituição brasileira, a exemplo de Lula. A presunção de inocência até o
trânsito final de todo o processo acusatório do Estado, é uma conquista
democrática não só da nossa constituição, mas da revolução francesa e dos
fundamentos do próprio direito romano. Retomando ao caso concreto do nosso
ex-presidente, o móvel real desta polêmica que “contaminou” a apertada votação
no STF, poderíamos supor, como uma primeira hipótese, que a iminente soltura de
Lula foi um “prêmio” concedido pela burguesia ao “bom comportamento”, não dele
próprio é claro, mas da “boa conduta” da CUT e do PT (Frente Popular) diante da
passividade com que atuaram no processo de aprovação da (contra)reforma da
Previdência, e que mantém diante das privatizações e pilhagem do patrimônio
nacional por parte do governo neofascista de Bolsonaro. A segunda hipótese para
a mudança “teleológica” da maioria da Corte Suprema versa sobre uma manobra
preventiva da burguesia diante do colapso econômico neoliberal que se delineia
no horizonte e da utilidade de manter viva e fortalecida uma oposição conciliadora
que não pretende radicalizar a conjuntura, ao contrário só pensa no calendário
eleitoral e na via da pressão parlamentar para as massas. Até mesmo os mais
ingênuos analistas sabem que o PT e seus apêndices não se esforçaram em desatar
grandes mobilizações pela liberdade de Lula, mantendo o pacto de
governabilidade desde a gestão do golpista Temer. A terceira hipótese, e a mais
“robusta”, que é na verdade a síntese política das duas anteriores, lança o
seguinte axioma: a burguesia brasileira está inteiramente unificada no projeto
de avançar a ofensiva rentista neoliberal do “ajuste e desmonte” do que
considera um Estado nacional “protecionista”, porém aposta em duas veredas
políticas para ter êxito nesta etapa de crise capitalista, a da “conciliação” e
a da “exceção”, esta última em pleno vigor no atual regime bonapartista.
Portanto Lula e Bolsonaro, apesar de suas abissais diferenças políticas, são
duas peças da mesma engrenagem burguesa do Estado capitalista, são “peões” no
complexo “tabuleiro de xadrez” das classes dominantes. Somente a utilização de
um outro recurso para a burguesia, de um golpe militar desferido pelo alto
comando das FFAA, descartaria por completo a opção de continuar jogando com os
dos dois “peões” antagônicos, o fascista e o frentepopulista. Mas esta variante
política extrema não está colocada neste momento, a situação da luta de classes
ainda está sob controle justamente porque a burguesia nacional ainda pode
contar com a “colaboração” de Bolsonaro e Lula, cada um à sua maneira e com
pequenas fricções, evitando que ocorra uma “explosão das massas” a exemplo do
Chile, e que neste caso ameaçaria concretamente as bases de sustentação do
Estado capitalista. A ausência de uma alternativa revolucionária de massas em
nosso país, acaba dando uma “gordura” para a manutenção da estabilidade
burguesa, porém não se enganem os arautos da “paz social”, esta “gordura” está
sendo “queimada” a cada solavanco da crise estrutural capitalista...