Em 19 abril de 1882 morria Charles Darwin, naturalista
britânico e pesquisador. Darwin foi um dos grandes nomes da ciência mundial ao
propor a teoria da evolução a partir da seleção natural. Suas pesquisas
revolucionaram as ciências e a forma de olhar o mundo e as espécies. A visão de
Darwin no “A Origem das Espécies” rompeu com velhas certezas. As espécies não
são mais vistas como imutáveis. A vida se diversificou por um processo de
divisão de espécies, a vida hoje é apenas parte de uma história enormemente
longa de origens, extinções e diversificação. A evolução também continuará.
Segundo a teoria de Darwin, os organismos estão razoavelmente bem adaptados a
seus ambientes, mas a adaptação raramente atinge a perfeição porque os
ambientes variam continuamente. Os que melhor se adaptam ao ambiente
transitório sobrevivem para reproduzir e transmitir seus atributos para as
próximas gerações. Vale destacar que Darwin cresceu compartilhando as visões
típicas da classe privilegiada em que nasceu. Ele não era de forma alguma um
evolucionista quando partiu no navio de pesquisa do Beagle, embora tenha sido
profundamente influenciado pelo trabalho do geólogo Lyell e tão consciente de
que a Terra é muito antiga. Ele também estava familiarizado com as ideias dos
embriologistas alemães, do biólogo Linnaeus, das visões evolucionistas pouco
ortodoxas dos naturalistas franceses, de Lamarck e assim por diante. Essa era a
mistura de ideias que o jovem Darwin ponderou quando começou a pensar
seriamente sobre a natureza. A viagem de cinco anos ao redor do mundo,
juntamente com sua leitura e estudo após seu retorno, mudou tudo. As evidências
da vida vegetal e animal na América do Sul, e em particular nas Ilhas
Galápagos, levaram Darwin a admitir o “impossível” - que as espécies não são
imutáveis. Marx leu “A Origem das Espécies” de Charles Darwin em 1860, um ano
após a publicação. Em 1873, Marx envia a Darwin a segunda edição de O Capital.
Dentro, um singelo bilhete escrito “Ao Sr. Charles Darwin, em nome de seu
sincero admirador, Karl Marx”. No mesmo ano, Darwin envia uma carta a Marx como
resposta: “Distinto senhor, agradeço-lhe a honra que me oferece ao me enviar
seu excelente trabalho O Capital. Sinceramente, penso que mereceria mais o seu
dom se eu entendesse algo mais sobre essa questão profunda e importante que é a
economia política. Embora nossos estudos sejam tão diferentes, acredito que
ambos desejamos ardentemente a disseminação do conhecimento e que, a longo
prazo, isso certamente ajudará a aumentar a felicidade da raça humana. Fico
muito agradecido senhor. Do seu, com afeto, Charles Darwin”. Para os Marxistas,
defender criticamente o pensamento evolucionário não é apenas uma questão
acadêmica, muito pelo contrário! Faz parte da luta de classes mais ampla, de
armar a classe trabalhadora contra ideologias capitalistas, distorções e
falsificações. Os Materialistas
Dialéticos entendem que, em qualquer estágio particular da história, há
perguntas que a ciência é incapaz de responder. O conhecimento humano, como
tudo o mais, tem uma história, se desenvolve o tempo todo e não há limites
fixos ou absolutos. Esse artigo do Blog da LBI é dedicado a analisar brevemente
a obra de Darwin desde as impressões de Marx, Engels e Trotsky no contexto em
que vivemos hoje um momento em que a espécie humana é atacada mortalmente por
um vírus (COVID-19) criado em laboratório como parte do bioterrorismo
patrocinado pelo imperialismo ianque, cabendo aos Revolucionários defender a
humanidade da barbárie por meio da intervenção da luta de classes em defesa do
Programa Comunista.
Aprofundando as reflexões sobre a obra de Darwin, em
dezembro de 1860, Marx escreveu a seu amigo e camarada de luta Friedrich Engels
que o livro “Embora seja desenvolvido no estilo inglês bruto, este é o livro
que contém as bases da história natural para nossa visão”. No ano seguinte,
comentou com Ferdinand Lassalle que “o livro de Darwin é muito importante e me
serve de base, na ciência natural, para a luta de classes na história”. Meses
depois, em nova carta a Engels, registra uma crítica dessa obra de Darwin,
tendo como pressuposto a sociedade vitoriana: “É notável como Darwin reconhece
entre animais e plantas sua sociedade inglesa com sua divisão de trabalho,
competição, abertura de novos mercados, ‘invenções’ e a ‘luta pela existência’
malthusiana. É o ‘bellum omnium contra ommnes’ (guerra de todos contra todos)
de Hobbes, e lembra a Fenomenologia de Hegel onde a sociedade civil é descrita
como um ‘reino animal e espiritual’, enquanto em Darwin o reino animal figura
como sociedade civil”.
Em carta a Ludwig Kugelman, de 1866, Marx comenta que “em
Darwin o progresso é meramente acidental” e A Origem das Espécies não rendeu
muito “em relação à história e à política”, embora pudesse ter “uma tendência
socialista inconsciente'”. Considera, porém, que tem “fraqueza de pensamento”
quem queira fazer a história humana depender da expressão darwiniana de “luta
pela sobrevivência”. O pensamento econômico que Darwin esposava era o de
Malthus (para quem o excesso populacional era a causa de todos os males da
sociedade). No Anti-Dühring, Engels aborda a influência do malthusianismo no
naturalista: “Darwin não sonhou sequer em dizer que a origem da ideia da luta
pela existência era a teoria de Malthus. O que ele diz é que a sua teoria da luta
pela existência é a teoria de Malthus aplicada a todo mundo vegetal e animal.
Por maior que fosse o deslize cometido por Darwin de aceitar, na sua
ingenuidade, a teoria malthusiana, vê-se logo, a um primeiro exame, que, para
se perceber a luta pela existência na natureza – que aparece na contradição
entre a multidão inumerável de germes engendrados pela natureza, em sua
prodigalidade, e o pequeno número desses germes que podem chegar à maturidade,
contradição que, de fato, se resolve em grande parte numa luta, às vezes
extremamente cruel, pela existência – não há necessidade das lunetas de
Malthus. E, assim como a lei que rege o salário conservou o seu valor muito
tempo depois de estarem caducos os argumentos malthusianos sobre os quais
Ricardo” (David Ricardo, 1772-1823, inglês, um dos fundadores da ciência
econômica) “a baseava, a luta pela existência pode igualmente ter lugar na
natureza sem nenhuma interpretação malthusiana. De resto, os organismos da
natureza têm, também eles, as suas leis de população, que estão pouco
estudadas, mas cuja descoberta será de importância capital para a teoria do
desenvolvimento das espécies. E quem, senão Darwin, deu o impulso decisivo
nessa direção?”
Engels explicou também que “É precisamente a dialética que
constitui a forma mais importante de pensar para a ciência natural atual, pois
ela oferece o análogo e, portanto, o método de explicar os processos evolutivos
que ocorrem na natureza, as interconexões em geral e as transições de uma só
vez em um campo de investigação para outro” (Dialética da Natureza). Marx e Engels
argumentaram que o capitalismo é apenas uma etapa do desenvolvimento da
sociedade humana. Eles disseram que a sociedade de classes não é eterna, mas
surgiu de condições materiais definidas, evoluindo ao longo do tempo como
resultado da pressão do desenvolvimento das forças produtivas e que chegará ao
fim de sua 'vida' e será bem-sucedida por um estágio superior da sociedade.
A evolução humana só foi sugerida em Origem das Espécies,
mas em Descida do Homem (1871), Darwin sustentou que somos descendentes de
macacos africanos. Isso era controverso na época e discutido por 100 anos, até
que a ciência moderna da biologia molecular provou que Darwin estava certo.
Darwin sublinhou os laços materiais entre mamíferos e a humanidade. Engels
explicou que havíamos aparecido como resultado de processos materiais
definidos, mas também enfatizou nossa singularidade como animal social. Que
somos o único animal que, através do trabalho, interage com a natureza. Que
alteramos conscientemente o mundo natural e que esse processo de usar o
trabalho também muda a nós mesmos. A visão idealista do “cérebro primeiro” do
desenvolvimento humano do século XIX foi contestada por Engels. Ele argumentou
que o trabalho e a organização social não são o produto do cérebro, mas a causa
do desenvolvimento da mão e do cérebro.
Em seu ensaio de 1876, “O papel do trabalho na evolução do
Macaco em Homem” Engels, explicou como a postura ereta liberou a mão para o
uso de ferramentas, e que o aumento da inteligência e da fala ocorreu mais
tarde. Engels declarou “A natureza é a pedra de toque da dialética, e as
ciências maternas da natureza dão-nos para esta prova um conjunto abundante de
dados extraordinariamente enriquecido cada dia que passa, provando assim que a
natureza se move, em última análise, nos caminhos da dialética e não nos da
metafísica, que a natureza não se move na eterna monotonia de um ciclo
constantemente repetido, mas percorre uma história efetiva. Antes de mais, é
preciso citar Darwin, que vibrou o mais rude golpe à concepção metafísica da
natureza, ao demonstrar que toda a natureza orgânica existente, plantas e
animais e, por conseqüência, o homem, também é o produto de um processo de
evolução de milhões de anos”.
Leon Trotsky, o fundador da IV Internacional e nosso chefe
político até os dias atuais, considerou que as descobertas de Darwin foram “o
maior triunfo da dialética em todo o campo da matéria orgânica”, ao revelar
como um processo de mudanças relativamente pequenas se acumula para produzir
mudanças qualitativas. Na prisão em
Odessa, Trotsky leu “A Origem das Espécies” de Darwin e sua Autobiografia. Anos
depois, ele escreveu “Darwin destruiu o último dos meus preconceitos
ideológicos... Na prisão de Odessa, senti algo como um terreno científico duro
sob meus pés. Os fatos começaram a se estabelecer em um determinado sistema. A
ideia de evolução e determinismo - ou seja, a ideia de um desenvolvimento
gradual condicionado pelo caráter do mundo material - tomou posse de mim completamente.
Darwin foi para mim como um poderoso porteiro na entrada do templo do universo.
Fiquei embriagado com o seu pensamento minucioso, preciso, consciente e ao
mesmo tempo poderoso. Fiquei mais surpreso quando li... que ele preservou sua
crença em Deus. Recusei-me absolutamente a entender como uma teoria da origem
das espécies por meio da seleção natural e da seleção sexual e uma crença em
Deus poderiam encontrar espaço na mesma cabeça” (Eastman, M., Trotsky: Um
retrato de sua juventude, Nova York, pp. 117-118, 1925).
Em um logo artigo intitulado “As tarefas da educação
comunista” (The Communist Review , dezembro de 1922, vol. 4, nº 7) no capítulo
“Darwinismo e Marxismo” Trotsky pontua que “Mesmo que Darwin, como ele próprio
afirmou, não tenha perdido sua crença em Deus por toda a sua rejeição da teoria
bíblica da criação, o próprio darwinismo é, no entanto, inteiramente
inteiramente inconciliável com essa crença. Nisso, como em outros aspectos, o
darwinismo é um precursor, uma preparação para o marxismo. Tomado em um sentido
amplamente materialista e dialético, o marxismo é a aplicação do darwinismo à
sociedade humana. O liberalismo de Manchester tentou encaixar o darwinismo
mecanicamente na sociologia. Tais tentativas apenas levaram a analogias infantis
ocultando uma apologia burguesa maliciosa: a competição de Marx era explicada
como a lei ‘eterna’ da luta pela existência. Estes são absurdos. É apenas a
conexão interna entre o darwinismo e o marxismo que torna possível captar o
fluxo vivo do ser em sua conexão primordial com a natureza inorgânica; em sua
particularização e evolução posteriores; em sua dinâmica; na diferenciação das
necessidades da vida entre as primeiras variedades elementares dos reinos
vegetal e animal; em suas lutas; na aparência do ‘primeiro’ homem ou criatura
humana, fazendo uso da primeira ferramenta; no desenvolvimento da cooperação
primitiva, empregando órgãos associativos; na estratificação posterior da
sociedade, consequente ao desenvolvimento dos meios de produção, isto é, dos
meios de subjugar a natureza; na guerra de classes; e, finalmente, na luta pela
elevação das classes. fazendo uso da primeira ferramenta; no desenvolvimento da
cooperação primitiva, empregando órgãos associativos; na estratificação
posterior da sociedade, consequente ao desenvolvimento dos meios de produção,
isto é, dos meios de subjugar a natureza; na guerra de classes; e, finalmente,
na luta pela elevação das classes. fazendo uso da primeira ferramenta; no
desenvolvimento da cooperação primitiva, empregando órgãos associativos; na
estratificação posterior da sociedade, consequente ao desenvolvimento dos meios
de produção, isto é, dos meios de subjugar a natureza; na guerra de classes; e,
finalmente, na luta pela elevação das classes”.
Na The Communist Review, de janeiro de 1924, vol. 4, nº 9
também podemos ler sobre a polêmica entre os comunistas da época acerca do tema
da crença que Darwin teve em Deus. Ali encontramos esse trecho “Caro camarada!
Nosso camarada Trotsky, escrevendo na ‘Review’ (novembro, página 326 ), afirma
que Darwin ‘não perdeu sua crença em Deus, etc.’ Acredito que isso esteja
incorreto e ofereça algumas provas: ‘Eu gradualmente passei a descrer no
cristianismo como uma revelação divina... essa descrença tomou conta de mim
muito lentamente, mas finalmente estava completa’. (Autobiografia de Charles
Darwin - Life and Letters, Vol. 1, páginas 308-9). ‘Eu nunca desisti do
cristianismo até os quarenta anos de idade’ - e novamente – ‘estou com você em
pensamento, mas devo preferir, a palavra ‘agnóstico’ à palavra ‘ateu’”.
Desde a LBI pontuamos que avanços e recuos da compreensão do
mundo e da luta de classes levaram a que o marxismo deixasse de ser referência
para muitos cientistas. Isso se refletiu nos que continuaram na trilha aberta
por Darwin de compreensão da natureza, sem a correspondência com a compreensão
das vicissitudes da história social. Mesmo pensadores progressistas e
envolvidos nos debates dos grandes temas do momento, tratam a conduta moral do
homem (sua religiosidade, inclusive) como um aspecto da conduta natural,
biológica. Desconsideram as classes sociais e a luta e relações que elas travam
entre si. As qualidades e defeitos morais seriam instintivos, encontrados tanto
nos humanos como nos animais. Aliás, Darwin chegou a escrever que os animais
experimentam quase todos os sentimentos dos homens, como amor, lealdade etc.
Quando muito, esses cientistas, tratam do enfrentamento entre o racionalismo
(ciência) e anti-racionalismo (religião, crenças, preconceitos etc.) na sociedade.
Frases como “luta pela vida” podem ser aplicáveis à flora
e à fauna, mas Marx reconheceu que, como explicação da sociedade humana, elas
reforçavam a fantasia malthusiana de que o excesso de população era a força
motriz da economia política. Marx, Engels e Trotsky observaram em certa medida
as visões politicamente conservadoras de Darwin, que permitiam que os “social
darwinistas” usassem essas frases em defesa da exploração capitalista. A
“sobrevivência do mais apto” e a “luta pela existência” não foram usadas
inicialmente por Darwin, mas depois foram adotadas por ele como metáforas para
descrever sua teoria. Os darwinistas sociais argumentaram que o progresso
social estava na competição econômica entre os vários proprietários de fábricas
vitorianas e que as tentativas de reforma social para ajudar os pobres e os
vulneráveis deveriam ser condenadas como sendo contra as “intenções da
natureza”.
Esta concepção tem a “fraqueza de pensamento”' apontada pelo
revolucionário alemão e reafirmada por Engels. Embora reconheçam a importância
das teorias de Darwin, os Marxistas são críticos a ela. “Aceito a teoria da
evolução da doutrina darwiniana, mas considero o método de prova de Darwin
(luta pela vida, seleção natural) apenas como uma primeira expressão provisória
e imperfeita de um fato recém-descoberto.” (Engels em uma carta a Lavrov,
1875). Para os materialistas dialéticos e históricos, o homem é criador e
transformador da natureza, conhece e conquista a sua própria natureza e
transforma a realidade que o cerca. Por isso, a indicação de Marx de
apropriar-se das descobertas de Darwin “para a nossa visão”. Daí a compreensão
de conjunto apontada por Engels, no discurso diante do túmulo de Marx, em 1883:
“Assim como Darwin descobriu a lei da evolução na natureza humana, Marx
descobriu a lei da evolução na história humana”.