Eles estão por todas as partes, dia e noite, muitos sem
luvas e máscaras nas suas motos, bicicletas e até cadeiras de rodas... são os
entregadores por aplicativos, esse verdadeiro “exército de reserva” convocado para trabalhar 24 horas por dia em condições ultra-precarizadas. Em sua
maioria, jovens, negros e da periferia eles enfrentam a barbárie da modernidade
e tomam as ruas das grandes cidades entregando de tudo, comidas, remédio,
documentos, expostos totalmente ao ataque do Coronarívus. Com o aplicativo,
qualquer um pode se alistar em poucos minutos nesse enorme exército de reserva
digital, que mantém o valor da mão de obra em níveis cada vez mais baixos. Karl
Marx cunhou o termo “exército de reserva” referindo-se ao contingente de
pessoas aptas ao trabalho no capitalismo, submedido a uma “lei dos salários”, cuja norma é a seguinte: o
sistema capitalista necessita de que haja constantemente um exército de
desempregados, de forma que a patronal possa usar os trabalhadores sem emprego
para pressionar pelo rebaixamento dos salários de quem está empregado e contratar no lugar dos que resistem a essa dinâmica perversa, os que fazem greves e lutam... Não por acaso, ao longo dos últimos
dias, esses trabalhadores realizaram protestos em vários países exigindo
condições seguras de trabalho frente à pandemia do coronavírus e um aumento dos
valores das taxas de entrega, que garanta uma renda decente aos trabalhadores. Em
São Paulo, a maior cidade do Brasil, entregadores fizeram uma primeira greve na
sexta-feira da semana passada, 17 de abril, que foi retomada na segunda-feira.
Também em 17 de abril, centenas de entregadores em Teresina protestaram exigindo segurança contra os constantes assaltos que
sofrem durante o trabalho – pelos quais não recebem qualquer compensação das
empresas. Esse protesto ganhou contornos mundiais no dia 22 de abril, chegou-se
mesmo a convocar uma “greve internacional dos entregadores”. Na Argentina houve
protestos em cidades como Buenos Aires e Córdoba. Em Quito, no Equador, dezenas
de entregadores da Glovo se manifestaram nas ruas e na frente do escritório da
empresa sediada na Espanha. Em todo o mundo esses trabalhadores estão
submetidos à exploração brutal pelas mesmas empresas transnacionais. Ao mesmo tempo, os governos burgueses de vários países
definiram seu trabalho como serviço essencial durante pandemia, sem que as
empresas, entretanto, fossem obrigadas a fornecer as condições básicas para a
preservação da saúde dos trabalhadores, muito mesmos remuneração mais alta
devido a exposição mortal ao vírus. A
maior inovação que esses serviços por aplicativo trazem é justamente
flexibilizar ainda mais a relação de trabalho entre empregados e patrões,
permitindo que os verdadeiros donos dos meios de produção, por trás do iFood,
Rappi, Glovo, Uber, etc., lucrem absurdos em cima do trabalho precarizado de seus “colaboradores
voluntários”, “empreendedores” ou qualquer outro jargão ultraneoliberal para
ocultar a exploração, isentando os capitalistas das mínimas responsabilidades
trabalhistas e maximizando seus lucros.
Os trabalhadores afirmam que as taxas de entrega repassadas
pelas empresas estão cada vez menores. “A valorização está sendo zero… Eu
arrisco a minha vida pra ganhar 2, 3, 4 reais. Desse jeito não tem como
trabalhar” decrarou um trabalhador deficiente, que faz entregas sobre cadeiras
de rodas. Enquanto os trabalhadores têm sua renda cada vez mais espremida e são
forçados a trabalhar horas intermináveis para garantir salários de fome, as
corporações transnacionais disputam ferrenhamente entre si, ávidas por fatias
cada vez maiores do mercado global. O iFood, sediado em São Paulo e com
operações em outros países da América Latina, anunciou neste mês que irá se
fundir com o Domicilios.com para criar uma das maiores empresas de entregas na
Colômbia. Controlado por acionistas como Jorge Paulo Lemann, o homem mais rico
do Brasil, o iFood disputa o mercado latino americano diretamente com a Rappi,
que é sediada na Colômbia e no ano passado recebeu um investimento de US$ 1
bilhão do conglomerado japonês SoftBank. Em meio à pandemia do coronavírus, o
número de pedidos aos aplicativos aumentou no Brasil, uma vez que os restaurantes
foram fechados nas principais cidades do país. Mas, numa proporção ainda maior,
cresceu o número de candidatos a trabalhar como entregadores. A Rappi registrou
um pico de 300% de crescimento no número de cadastros de entregadores. O iFood
recebeu 175 mil novas inscrições de entregadores em março, contra 85 mil em
fevereiro. Trata-se do exército de reseva da mão de obra capitalistas,
dessmpregados e subempregados que se submetem a condições sub-humanas para
sobreviver. Soma-se a essa “tropa” aqueles que tiveram seus salários cortados
ou foram demitidos durante a pandemia. Grande parte desses trabalhadores não
está conseguindo acessar o magro auxílio de R$ 600, cerca de meio
salário-mínimo, decretado em caráter de emergência pelo governo brasileiro.
As greves dos entregadores de aplicativos, por outro lado,
expressam uma tendência crescente de resistência da classe trabalhadora mundial
à resposta da classe capitalista à pandemia do coronavírus. No Brasil, se soma
à onda de greves e protestos contra as condições inseguras de trabalho, desde a
revolta dos operadores de call center em março até as recentes paralisações e
protestos de enfermeiros iniciados na última semana. Esse movimento deve
avançar para uma coordenação cada vez maior entre as lutas dos trabalhadores de
diferentes países, adotando um programa socialista e internacionalista. As
fortunas das corporações transnacionais e seus acionistas devem ser
expropriadas e redirecionadas para atender os interesses da maioria da
população mundial, em primeiro lugar para combater a pandemia, garantia a renda
da classe trabalhadora e salvar vidas. Desgraçadamente, a política de
colaboração de classes do PT e da CUT vem sabotando essa resistência direta,
negando-se a organizar a luta direta, como vemos na orientação de não convocar
atos de massa no 1º de Maio. Faz-se necessário romper com essa conduta e partir
para o combate de classe, como apontaram os heroicos entregadores de
aplicativos no Brasil e no Mundo!