NOSSA HOMENAGEM A PAULO LEMINSKI: HÁ 34 ANOS NASCIA O POETA BRASILEIRO QUE ADMIROU TROTSKY E SUA LUTA REVOLUCIONÁRIA!
O poeta curitibano Paulo Leminski falecido em 07 de junho de 1989, há 34 atrás, admirava Trotsky e escreveu poemas e textos sobre o revolucionário soviético e também sobre a Libelu (Liberdade e Luta), tendência trotskista do movimento estudantil nos anos 1970. Passadas mais de três décadas de sua morte, sua obra permanece mais viva que nunca. Leminski é o autor de uma biografia de Leon Trotsky em português, “A Paixão Segundo a Revolução”, publicada pela editora Brasiliense em 1988. O poeta revela nas dedicatórias que escreveu inspirado por uma pergunta da filha de 15 anos sobre o que tinha sido a Revolução Russa. De modo fascinante, Leminski compara o que aconteceu em outubro de 1917 ao enredo de Irmãos Karamazov, o clássico de Dostoievski.
LEON TROTSKI: A PAIXÃO SEGUNDO A REVOLUÇÃO
Por Paulo Leminski
Na estratégia e na tática de ação política, a inteligência de Lenin supera em muito a de Trotski, mais hesitante, mais sujeita a erros e leituras equivocadas dos fatos. Mas a máquina mental e intelectual de Trotski era mais complexa que a de Lenin. Seus interesses eram mais plurais. Suas leituras, mais diversificadas. Seu horizonte, muito mais amplo. Leia-se, por exemplo, o vôo utópico do final do ensaio Arte Revolucionária e Arte Socialista, capítulo oitavo do seu livro Literatura e Revolução.
Lenin jamais poderia ter escrito essas páginas de um sopro
verdadeiramente épico-utópico, sobre o novo homem que o socialismo poderia
criar. Nem poderia dizer, como diz Trotski, nesse mesmo livro: “a arte se
fundirá com a vida, quando a vida enriquecerá em proporções tais que se
modelará, inteiramente, na arte”.
Lenin sempre olhou meio de lado, desconfiado, para as
manifestações de vanguarda artística que marcaram o início do comunismo na
Rússia (futurismo, suprematismo, Eisenstein, Maiakovski, Meyerhold, Tatlin).
Seus gostos em matéria de arte eram bem conservadores. Há testemunhos de que
chorava ao ouvir o Pour Élise, de Beethoven. E sua visão de cinema era
pedagógica e doutrinária: bom para educar as massas.
Dessa vanguarda, Trotski, agudíssimo crítico literário, fez
leituras mais ricas, como nos ensaios O Futurismo, de 1922, e O Suicídio de
Maiakovski, de 1930, incluídos em Literatura e Revolução, o mais extraordinário
livro sobre literatura que um político jamais escreveu.
Quando, já exilado no México, nos anos 30, Trotski assina um
manifesto surrealista com André Breton, vindo da França para conhecê-lo, o
velho leão está apenas sendo fiel a algumas das suas riquezas da juventude.
A robustez e saúde de pensamento, Trotski deve ter herdado
do pai. Mas a sofisticação intelectual, que sempre o distinguiu entre os
bolcheviques e lhe atraiu invejas e ódios surdos, só pode ter vindo da mãe, que
era assinante de uma biblioteca de livros de empréstimo, e lia em mais de uma
língua.
O que importa guardar dos primórdios de Lev Davidovitch é
que Trotski teve uma infância e adolescência sem penúria, como, aliás, Lenin,
filho de um funcionário público, de alguma graduação na máquina burocrática.
Diverso é o caso de Stalin, filho de um pobre sapateiro do Cáucaso, o único dos
chefes da Revolução de Outubro a ter origens realmente populares.
Aos sete anos, os pais de Lev Davidovitch o enviaram para
uma escola judaico-alemã, a quilômetros de distância da fazenda Yanovka. Não se
adaptou, e os pais o trouxeram de volta, sem que tivesse chegado a aprender nem
o iídiche nem o hebraico das Escrituras. Em compensação, tinha aprendido bem o
russo, ele que só falava o ucraniano dos camponeses. Ao voltar, já escrevia bem
em russo, e começava a ler avidamente livros na língua oficial.
Pouco depois, pelas mãos de um parente mais velho, de nome
Spentzer, vai estudar em Odessa, o maior porto do Mar Negro, uma cidade de
clima quente, fervilhante de vida cosmopolita.
Na casa dos Spentzer, Lev iniciou-se numa vida intelectual
muito cuidada, música clássica, hábitos polidos, leituras de clássicos russos e
europeus em geral (Goethe, Pushkin, Tolstoi, Dickens).
O jovem camponês ucraniano transforma-se num judeu urbano de
classe média, um europeu culto e educado.
Em Odessa, frequentou uma escola alemã, ligada à Igreja
Luterana, onde estudou, entre as matérias do currículo, francês e alemão. Nessa
escola, a Realschule, parece ter sido aluno excepcionalmente sério, sempre o
primeiro da classe.
Já podemos ver aí os germes da vaidade intelectual que sua
figura sempre irradiou, a certeza de ser mais inteligente do que os outros, de
ver mais longe ou pensar mais fundo, vaidade que só se transformava em modéstia
diante da figura superlativamente carismática de Lenin (e isso só depois de muita
briga entre os dois…).
Em Odessa, cidade esfuziante de atrações, frequenta a ópera,
como os outros estudantes, veste-se com elegância (traço que sempre o
distinguiu) e apaixona-se, platonicamente, por cantoras líricas, como um poeta
romântico do século 19.
Aos 17 anos, o futuro chefe da Revolução de Outubro ainda
não ouviu falar de marxismo. E seu talento para a matemática o inclina a sonhar
com uma carreira universitária dedicada à matemática pura.
Tais eram seus dons nesse terreno que, consta, eminentes
matemáticos lamentariam depois que tamanho talento se perdesse na mediocridade
da vida política: que grande talento a matemática estava perdendo…
A atividade política de Trotski, percebe-se já, não vai
nascer de uma revolta contra um estado pessoal de carência.
Como em Lenin, outro bem-nascido (como Mao e Fidel), em
Trotski, a revolução vai ser uma paixão intelectual, uma certeza lógica, uma
convicção feita de ferro em brasa. Uma das cruéis ironias da vida: só os bem
alimentados podem lutar pelos famintos. Os muito miseráveis nem sequer se
revoltam: deixam-se morrer à míngua. É preciso muita proteína para fazer uma
revolução.
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O VELHO LEÓN E NATALIA EM COYOACÁN
Desta vez não vai ter neve como em petrogrado aquele dia o
céu vai estar limpo e o sol brilhando você dormindo e eu sonhando
nem casacos nem cossacos como em petrogrado aquele dia
apenas você nua e eu como nasci eu dormindo e você sonhando não vai mais ter
multidões gritando como em petrogrado aquele dia silêncio nós dois murmúrios
azuis eu e você dormindo e sonhando
não vai mais ter multidões gritando como em petrogrado
aquele dia silêncio nós dois murmúrios azuis eu e você dormindo e sonhando
nunca mais vai ter um dia como em petrogrado aquele dia nada
como um dia indo atrás de outro vindo você e eu sonhando