10 DE OUTUBRO DE 1980 - FUNDADA A FMLN: O "REFORMISMO
ARMADO" LUTA PELO PODER EM EL SALVADOR MAS É DERROTADO POR SUA POLÍTICA DE
COLABORAÇÃO DE CLASSES, RENDENDO-SE POSTERIORMENTE À DEMOCRACIA BURGUESA NAS
URNAS
No final da década de 70, o PCS, conduzido por Schafik Hándal, seu Secretário-Geral, afastou-se das orientações etapistas de Moscou para formação de um governo de coalizão com a burguesia e resolveu seguir o rastro da revolução cubana e da guerrilha nicaragüense, chamando a formação juntamente com outros grupos reformistas salvadorenhos de uma frente guerrilheira a qual batizaram de Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional, tomando emprestado o nome de Martí. A FMLN foi fundada oficialmente em 10 de outubro de 1980. Apesar de terem se desgarrado da orientação oficial de Moscou, os dirigentes da FMLN pouco aprenderam com as lições da heróica insurreição de 1932.
Em 1932, o jovem PC salvadorenho (PCS), cujo principal líder
era Agustín Farabundo Martí, dirigiu a primeira insurreição comunista de toda a
América Latina, apoiando-se em amplas massas da população trabalhadora,
principalmente camponesa e indígena rebelada contra as mazelas da crise
capitalista de 1929. O movimento demonstrou a incrível força da classe
trabalhadora que se levantou em armas e logrou apoderar-se de boa parte do
país, apavorando as débeis oligarquias locais e o imperialismo. A revolta só foi
derrotada com o massacre de 30 mil trabalhadores (em um país de pouco mais de 2
milhões de habitantes), conhecido como La Matanza, que deu origem ao mais longo
regime militar do hemisfério ocidental. Seguiram-se 50 anos ininterruptos de
governos militares onde os sindicatos deixaram de existir. Um dos motivos que
levou o PCS a chamar as massas campesinas a insurgirem-se foi a fraude
orquestrada sobre as eleições de janeiro de 1932 em que os comunistas haviam
obtido uma votação espetacular. Os consecutivos golpes de Estado e as seguidas
fraudes eleitorais que caracterizaram a fictícia democracia do país por mais de
meio século obrigaram os reformistas salvadorenhos a buscarem a via armada, uma
vez que se viram completamente impossibilitados de realizar qualquer ação política legal.
A FMLN tornou-se um poderoso exército guerrilheiro que em 12 anos de guerra civil chegou a controlar um terço do país e conquistou um amplo apoio popular nas cidades e no campo, enfrentando a Junta Militar que contou com maciço apoio bélico, helicópteros, “assessores” militares e o investimento de um milhão de dólares diários dos EUA nos tempos da chamada guerra de baixa intensidade lançada pelo governo Reagan na América Central. Este período é retratado no filme “El Salvador, o martírio de um povo”, que mostra o apoio dos EUA a sanguinária Junta Militar que não poupou nem o clero. O arcebispo Oscar Romero em 1980 foi assassinado por reivindicar o fim do apoio ianque ao governo salvadorenho. No mesmo ano, quatro freiras estadunidenses foram violentadas e mortas pelos membros da própria guarda nacional. Ao todo, foram assassinadas 75 mil pessoas.
Por sua vez, apesar da FMLN reivindicar ajuda da URSS e de
Cuba, as burocracias de Moscou e Havana repetiram a traição de Stálin a frente
popular espanhola, recusando-se a fornecer o apoio logístico necessário para a
vitória da guerrilha. Muito pelo contrário, Castro instou Hándal a procurar um
“acordo político” com a junta assassina.
A estratégia política reformista de Hándal, copiada dos sandinistas
nicaragüenses de buscar uma “via intermediária” entre o capitalismo e o
socialismo, negando-se objetivamente a lutar pela expropriação da propriedade
privada e a instaurar um governo operário e camponês em El Salvador, pavimentou
o caminho da derrota.
Em 11 de setembro de 1989, justamente dois dias após a queda
do muro de Berlin, a FMLN lança sua “Ofensiva Final hasta el Tope”, onde trata
de ganhar terreno para melhorar suas condições de barganha política junto ao
imperialismo em negociações intermediadas pelos sandinistas. A ofensiva
guerrilheira é derrotada e a partir de então a FMLN inicia um processo de
negociação que resulta na entrega de suas armas e na capitulação ao fraudulento
regime apoiado pela CIA, passando a ser o principal partido de oposição e de
legitimação da ordem burguesa. Este processo de capitulação tem seu ápice em 1992
através dos Acordos de Paz de Chapultepec, patrocinados pela ONU.
Em 2004, Handal que já estava em seu terceiro mandato
legislativo candidata-se à presidência de El Salvador, mas uma nova fraude
eleitoral dá vitória a seu adversário, o empresário da mídia, Elias Antonio
Saca, da Aliança Nacionalista Republicana (Arena), partido dos esquadrões da
morte. Apesar do imenso serviço prestado a estabilização do regime que foi a
capitulação da guerrilha o imperialismo preferiu manter ainda Hándal e a FMLN
na oposição, concedendo-lhe a administração da capital San Salvador, cumprindo
o mesmo roteiro de adestramento ao “Consenso de Washington” e de provas de
confiabilidade pelo qual passaram o PT brasileiro, a Frente Grande do Uruguai,
... antes de chegarem ao governo federal de seus respectivos países.
A FMLN teve o mesmo destino de outras guerrilhas pequeno
burguesas que pactuaram com os regimes sanguinários “tratados de paz” para
trocar suas armas por uma legenda eleitoral, como o M-19 colombiano, a FSLN
nicaragüense, a UNRG guatemalteca e tantas outras. Todas as chamadas vias
“intermediárias” ou “mista” reivindicadas pelos reformistas armados só podem
resultar no sacrifício heróico de militantes antiimperialistas, em sangrentas
derrotas para os trabalhadores e, por vezes, renderam um lugarzinho no
parlamento burguês ou mesmo governos de frente popular para as direções
oportunistas após pactuarem sua integração a legalidade burguesa com os regimes
pró-imperialistas. Estes senhores não passam de candidatos a gestores da crise
capitalista. Schafik Hándal, seu dirigente, foi um caso clássico desta
trajetória, ao longo de décadas passou de um herói da guerrilha salvadorenha a
artífice da concertação democrática. A única via para romper com o jugo
imperialista está na construção de um genuíno partido revolucionário
internacionalista que leve as massas à tomada do poder, a exercer sua ditadura
de classe para expropriar o grande capital e seus sócios nativos.